05

Kesie Ferraz

Caminho em passos largos distraída ao desbloquear meu celular. Sem ao menos notar que as ruas estão desertas, vejo que são quase três da manhã. 

Um vento frio b**e em meu rosto, e quando percebo um homem estranho parado encostado na parede, fico preocupada, a frase de Hugo me invade à mente "A cidade é perigosa neste horário." depois de tudo que passei é quase impossível não sentir medo.

Passo pelo homem misterioso e começo a caminhar mais rápido quando noto que seus olhos vem em direção ao meu corpo mal coberto, logo sinto que estou sendo seguida, aquela sensação de insegurança me invade novamente, arrependo por não ter ouvido Hugo.

— Droga!— resmungo baixo e trêmula de medo.

Olho sobre meus ombros de forma sutil e vejo que o homem está muito perto, meu coração b**e mais forte e de repente ele se apressa ficando à minha frente e grita;

— Me passa o telefone! 

Desesperada, fico sem reação. Não posso deixá-lo levar meu celular, pois não salvei o áudio, na verdade nem ao menos desliguei a gravação. Se ele levá-lo será em vão tudo o que estou passando nesta m*****a noite.

Começo a sentir um nó na garganta, as lágrimas estão queimando meu rosto novamente.

Quase gelo quando sinto ele tocar meu braço com violência.

— Eu mandei me passar o telefone, vadia!

— Pelo amor de Deus, moço. Meu telefone não! — imploro desesperada.— pode levar minha bolsa— lhe entrego.— aí tem dinheiro, cartões...

Ele analisa a bolsa, no entanto começa a ficar nervoso.

— Eu pedi o seu celular! Você é surda?

Ele toma o meu aparelho das minhas mãos. Por favor, não leve meu celular...

Somente agora percebo que não está armado, sei que ele tem muito mais força do que eu, porém estou desesperada, não posso perder o conteúdo deste celular. Então eu avanço pra cima dele. Consigo pegar no aparelho, ele deixa minha bolsa cair espalhando meus cartões e documentos pelo chão. Insisto em não soltar o aparelho.

Neste momento o farol de um carro nos interrompe assustando o ladrão.

— Sua, vadia louca! Solta isso — ele grita me empurrando com força tentando fugir.

Me desequilibro com meus saltos altos e caio no chão, o celular acaba indo junto e o vejo cair dentro de uma poça d'água enquanto o homem foge me insultando com vários palavrões. Estou simplesmente paralisada, em choque ao ver todo meu esforço sendo destruído, era a única prova que eu tinha contra Maicon, acabo me esquecendo do carro parado bem a frente.

De repente um homem desce, e quando reconheço a imagem, me sinto um pouco mais aliviada. Era Hugo, me salvando mais uma vez.

Ele se aproxima rapidamente com a mesma expressão séria, se certifica que o ladrão fugiu e se aproxima. 

— Está tudo bem com você?

Estou tão angustiada que começo a chorar feito uma criança, as lágrimas descem em desespero.

— Meu celular...— falo apontando o aparelho dentro da poça, estou desolada.

— Droga! Porque você não me ouviu? Eu te disse que a cidade é muito perigosa a essa hora!

Ainda no chão, limpo meu rosto com a mão após um soluço, ignorando suas palavras, pois sei que ele tem toda razão, mas estou muito envergonhada para encará-lo. Então me ajeito e ainda arrasto com as mãos no chão até o meu aparelho.

Antes que eu o alcance, Hugo se coloca a frente e o faz primeiro. O vejo abaixar de forma elegante e viril, pega o telefone de dentro da água, e a outra mão livre me estende, pela primeira vez na noite ele me encara de uma forma diferente, sem toda aquela hostilidade e indiferença. Ainda envergonhada, toco sua mão e ele me ajuda a erguer. Estamos na mesma altura, consigo notar que os olhos dele são realmente um verde incrível, e não entendo porque causam um arrepio por todo meu corpo, afinal, olhos verdes são tão comuns.

Ele me ergue com todo cuidado, e na sequência me entrega o aparelho encharcado.

— Talvez ainda tenha conserto!

Não consigo dizer nada, e talvez para quebrar o clima ele ainda se abaixa e recolhe meus pertences jogado ao chão colocando um por um dentro da minha bolsa.

Hugo segura minha carteira de motorista por um instante e me olha.

— Kesie Ferraz, então esse é o seu nome?

— Sim…Kesie.

Ele permanece no chão e recolhe meu batom, após guardar tudo, se levanta e me entrega a bolsa.

— Olha… Hugo… me perdoe por ter sido tão… tão…— tento encontrar a palavra para descrever minha atitude ao não ouvi-lo.

Ele completa:

— Teimosa?

O tom que usa é diferente, sem toda aquela formalidade, poderia dizer que quase vi um sorriso de canto.

Hugo ainda retira o paletó mais uma vez e me entrega.

— Tudo bem. Apenas veste isso, está muito frio.

Seguro a peça e me visto a fim de ficar mais confortável sem estar quase nua a sua frente.

— Você me ajudou muito naquele quarto com o maldito do Maicon e eu no entanto nem lhe dei ouvidos quando tentou fazer ainda mais por mim…

— Kesie, está tudo bem  — ele repete.— Mas aqui ainda não é um lugar seguro. Vamos entrar no carro.

Ele tem toda razão, este lugar não é seguro, além do mais aquele bandido pode voltar. Então obedeço e entro.

O vejo dar a volta. Fico tentando entender quem verdadeiramente era Hugo, não sei porque ele está fazendo tudo isso por mim. Quando entrei naquele quarto de hotel, ele parecia se divertir com toda aquela porcaria, mas se é amiguinho de Maicon não faz sentido ele ter o socado. Me sinto confusa.

Já dentro do carro, ele trava as portas e liga o veículo, quando começamos a nos movimentar eu pergunto:

— Por que você está fazendo isso tudo, se… nem me conhece?

Ele demora alguns instantes para falar.

— Kesie... Eu sei que você não confia em mim. Mas eu não sou amigo do Maicon — fala enquanto dirige.

A cada minuto ele me deixa mais confusa.

— Como assim não é amigo do Maicon? Por que estava participando daquela... Orgia...?

Noto ele ficar constrangido com o meu comentário mesmo atento a direção.

— É uma longa história... Eu queria muito experimentar algo novo nesta noite, e sabia da fama de Maicon, no início parecia uma boa ideia... Mas... Me equivoquei.

Olho para o celular em minhas mãos ainda desolada.

— Eu também me equivoquei indo até lá. Só queria gravar aquele canalha confessando todo mal que me fez, assim eu teria uma prova ao denunciá-lo…— fungo. — e eu tinha… droga! Até meu telefone cair na água.

— Entao você por isso que estava lá, você gravou o que aconteceu?

— Sim. Mas agora perdi tudo. Não cheguei nem a salvar aquela gravação, talvez tenha perdido.

O sinto respirar fundo e soltar o ar, agora Hugo entende meus motivos.

— Por isso ficou tão chateada por seu aparelho ter caído na água…

— Sim. É como se tudo tivesse sido em vão…Pelo menos você estava lá... Ou ele teria outra vez me ...— não consigo continuar a falar, minha voz sai esganiçada.

Sinto como se Hugo estivesse parando o carro. Ele se vira pra mim e me encara daquela forma séria de antes, porém cheio de indignação.

— Então não é a primeira vez que aquele maldito tenta fazer isso com você?

Não lhe encaro. Apenas faço um gesto de cabeça lhe respondendo afirmativamente.

Ele fica muito bravo, dá vários golpes no volante xingando.

— Maldito!

Hugo respira rápido contendo sua raiva. Realmente não parece ter muita afeição por Maicon.

Não consigo segurar a dor com as lembranças de tudo novamente, todos esses meses de terapia foram jogados no lixo em apenas um droga de noite. 

Então as lágrimas descem enquanto falo:

— Maicon não vale nada…ele precisa pagar por seus crimes.

Então, de repente sinto a mão de Hugo tocar meu ombro de forma carinhosa. Quando nossos olhos se encontram vejo algo bom em seu rosto, por algum motivo confio nele.

— Mais cedo ou mais tarde ele vai pagar.

Logo ele afasta sua mão como se tivesse se sentido evasivo. O clima fica estranho entre nós, há um silêncio e noto os traços rígidos de seu rosto. Apesar de toda seriedade, ele é um homem atraente, atraente ao extremo. Aquele tipo de homem descrito em histórias de deuses e super heróis, forte, imponente e viril, porém, Hugo parece carregar algum tipo de dor, há algo meio sombrio nele. 

Neste momento me lembro que não liguei pra minha irmã. Elizabeth deve estar surtando de preocupação.

Fungo, e limpo o rosto com as mãos.

— Me empresta o seu celular, preciso fazer uma ligação?

Ele abre o porta luvas e me entrega o aparelho. 

Ainda trêmula pego no celular que é um pouco maior que o meu e digito o número de Elizabeth.

Ligação On

— Quem está falando?— ela quase grita do outro lado.

De alguma forma sinto um enorme alento ao ouvir a voz dela.

— Beth, sou eu, Kesie.

Olho para o chão, não consigo encarar Hugo.

— Graças a Deus Kesie! Mais um minuto se você não ligasse eu juro que iria chamar a polícia pra aquele filho da puta!

Elizabeth fala tão alto que parece estar no viva voz. Vejo que Hugo está ouvindo.

— Beth me desculpe por não ter ligado antes é que...— começo a chorar novamente. Não sei como vou dizer a ela sobre o quanto estou ferrada.

— Kesie? Está tudo bem?— Minha irmã pergunta preocupada.

Eu fungo.

— Sim, agora está tudo bem.— olho para Hugo e sorrio agradecida. Graças a ele estava tudo bem. 

— Por que você disse que agora está tudo bem? Aquele animal fez algo com você?

Eu lhe interrompo, pois quando Beth começa a insultar Maicon ela não para até que use todos os palavrões existentes.

— Não fez. Uma pessoa me ajudou. — continuo olhando para Hugo.  Consigo respirar fundo. — Olha, eu estou bem. Vou pra casa e amanhã a gente se fala..

— Ele vai te trazer? A pessoa que está te ajudando?— Beth pergunta.

— Nãaao, ele já fez demais por mim. Vou apenas pedir a que me consiga um Uber, meu telefone caiu na água.

— Céus, Kesie, e a gravação?

Olho para Hugo e depois para o painel do carro frustrada.

— Depois a gente conversa, preciso desligar.

 — Tudo bem. Kesie, se cuida viu. Eu te amo maninha.

— Tá eu também te amo.

Ligação Off

Desligo o celular e respiro fundo novamente. Devolvo para ele o aparelho e nossas mãos tocam. Uma corrente elétrica percorre meu corpo, e pela forma que seu olhar paralisou em nosso contato visual, acho que sentiu a mesma coisa, porém Hugo disfarça rapidamente, ele permanece com sua expressão séria. 

O telefone toca quebrando o clima que se instaurou, e ele atende.

Ligação On

— Oi — Hugo diz meio confuso.

Escuto a voz estridente de Elizabeth de onde estou.

— Quem é você?

Ele me olha um pouco perdido.

— Sou... Hugo Castro…

Então de repente um flash vem em minha mente ao ouvi-lo dizer seu sobrenome. Me recordo de Maicon ter praguejando contra um Hugo Castro muitas vezes.

Elizabeth continua:

— Ah... Sim. Olha aqui, Hugo. Só vou te avisar que Kesie é minha única irmã. Se você não trouxer ela sã e salva eu juro que te encontro no inferno e corto suas bolas fora!

Fico pasma ao ouvir as ameaças de minha irmã, Hugo fica ainda mais austero que antes, uma ruga se forma entre suas sobrancelhas. Coloco as mãos no meu rosto envergonhada.

— Está tudo bem... Prometo que não vai acontecer nada com ela.

Não consigo encarar ele. Juro que mato Elizabeth quando ver ela.

— Então está bem. Tenha uma boa noite. Hugo Castro...

Ligação Off

Ela ainda diz o nome dele como se reforçasse a ameaça.

Quando desliga, inicialmente há um silêncio longo entre nós, mas na sequência algo surpreendente acontece, Hugo começa a rir, e não se trata de um sorriso singelo como vi em poucas vezes, mas ele abre um sorriso de verdade, emitindo sons e modificando toda sua expressão facial, aquela é a primeira vez que o vejo tão espontâneo, e isso parecia ser algo impossível levando em conta sua seriedade.

— Ela até parece ser uma pessoa bacana.

Então, não consigo me conter, começo a rir também do papelão da minha irmã, ela é sempre exageradamente protetora.

— Me desculpe, Hugo…

— Está tudo bem, não precisa se desculpar. — ele diz ainda sorrindo.

Não sei o que aconteceu com Hugo para ele ser tão fechado, mas, ele fica muito à vontade sorrindo, deveria fazer isso mais vezes.

Então percebi que ele ficou tempo demais me analisando. Ainda sem graça, continuo sorrindo de volta.

— Elizabeth exagera…

— Valeu a pena pra te ver sorrir um pouco.

Fico surpresa mais uma vez com suas palavras.

As coisas começam a ficar mais leves entre a gente, como se aquela muralha que antes existia começasse a se romper aos poucos.

Ele liga o carro.

— Bom, mas agora preciso levá-la pra casa, ou se acontecer mais alguma coisa com você, já viu o que sua irmã vai fazer comigo.

Ele diz como se estivesse com medo de Elizabeth, fazendo tudo ser ainda mais cômico. Meu rosto queima de vergonha.

Por um momento consegui me esquecer de toda dor e tristeza que estou sentindo.

Ainda insisto que ele não precisa me levar pra casa, e Hugo ameaça ligar para Beth se eu não disser meu endereço. Então não tenho alternativa, ou minha irmã poderá me fazer passar por mais vergonha.

Falo o endereço e o vejo colocar no GPS. A viagem durará alguns minutos, ou seja, será necessário puxar algum assunto a fim de aliviar o silêncio entre a gente.

Felizmente ele fala primeiro:

— Então... Qual é a relação entre você e Macon, se não se importar em dizer?

Procuro as palavras certas para contar a ele. Sinto que preciso ser sincera.

— Atualmente, nenhum. Terminamos há seis meses. — paro de falar e olho pela janela imaginando se realmente isso terá fim. Maicon ainda é capaz de vir atrás de mim.— porém ele não aceitou o nosso término. É um homem muito possessivo, sempre foi.

Percebo Hugo ficar um pouco desconfortável.

— Mas... Você sabe que ele é casado, não sabe?

Estou queimando de vergonha mais uma vez, entretanto é a oportunidade perfeita para esclarecer tudo.

— Sim, eu sei. Foi por isso que terminei, quando descobri que ele havia reatado com a esposa.

Noto que Hugo deseja falar mais e que também está escolhendo as palavras certas.

— Kesie... Eu sou um grande amigo dos Bacellar, principalmente de Evelyn, a esposa de Maicon. Trabalho para seu pai no escritório de advocacia da família.

Fico chocada com suas palavras e em silêncio ouvindo, me sentindo muito mal. Droga! Agora sim sei quem ele é. Maicon já havia falado de Hugo, acho que ele é o braço direito de seu sogro, Artur Bacellar. Maicon tinha muito ciúmes da forma que Artur o tratava. 

— Hugo, eu não quero mais nada com aquele patife…

— Não se preocupe. Eu acredito em você.

A forma que ele diz me deixa muito mais confortável. Porém continuo:

— Meu relacionamento com Maicon sempre foi conturbado, além de me enganar, ele era um homem agressivo... Violento... 

Eu respiro fundo mexida com as lembranças.

— Se não quiser falar sobre isso, não precisa.

— Tudo bem, eu preciso falar. Acabei enxergando que eu me sentia intimidada, Maicon já ficou impune várias vezes por seus crimes — tento controlar as palavras  mas elas saem automaticamente — o seu escritório é especialista em defender bandidos.

Vejo Hugo engolir seco.

— O senhor Arthur Bacellar sempre priorizou o nome da família, por isso defende Maicon, mas eu nunca estive a favor disto. Talvez meu tempo naquele escritório tenha se findado.

Sinto que ele está desabafando, e consigo sentir sinceridade em suas palavras.

— Maicon acredita que nunca irá pagar pelos crimes que comete, isto só o induz a cometer mais — falo desejando ir mais além, dizer que o maldito rouba os Bacellars, mas ainda não sinto que é o melhor momento.

— Aquele é um maldito canalha… Você deseja denunciá-lo, mas se sente intimidada não é?

— Sim. Como eu disse, apenas fui naquele hotel porque eu desejava gravar um áudio com a confissão daquele maldito sobre todo mal que me fez. Eu queria muito denunciar ele para a polícia!— falo colocando pra fora tudo de uma vez.

Paramos em um semáforo e Hugo me olha.

Ao me lembrar de meu desastre, bufo.

— Droga! Droga! — bato no vidro da janela.— Mas deu tudo errado.

— Calma! Talvez ainda dê pra recuperar a memória. Você fez bem em trazer o aparelho. Não imagina a quantidade de suspeitos que tentam destruir provas de crimes jogando seus aparelhos de celulares na água. Eu conheço uma pessoa especialista nisso que pode te ajudar, talvez consiga recuperar a memória recente do aparelho.

Nesse instante uma chama de esperança se acende dentro de mim.

— Você está falando sério?

— Sim. Vou te passar o cartão dele. É um perito criminal de assistência técnica, está aposentado, e é um grande amigo.

— Obrigada — falo suspirando fundo.

Noto que ele me analisa pelo retrovisor do meio, não há nenhum vestígio de sorriso, no entanto ele me olha de uma forma agradável e reconfortante.

Estou tão exausta que repouso a cabeça na janela, gentilmente ele liga o som do carro e toca uma música suave a fim de aliviar toda tensão da noite, então, "Esperando na janela- Rosa de Saron- acústico" começou a tocar…

Um som suave de delicioso invade meus ouvidos e consigo relaxar por alguns instantes.

Quando me perdi

Você apareceu

Me fazendo rir do que aconteceu

E de medo olhei, tudo ao meu redor

Só assim enxerguei que agora estou melhor

Você é a escada da minha subida

Você é o amor da minha vida

É o meu abrir de olhos no amanhecer

Verdade que me leva a viver

Você é a espera na janela

A ave que vem de longe tão bela

A esperança que arde em calor

Você é a tradução do que é o amor.

Quando Hugo abaixou o som, eu nem havia notado que estávamos à porta do meu prédio, me sentia mais tranquila, era absurdamente estranho como eu estava me sentindo à vontade agora.

— Rua sete, residencial Acácias, acho que chegamos ao seu destino.

Me ajeito da melhor forma no banco e o encaro agradecida por tudo.

— Sim, chegamos.

Um silêncio nos invade e ele quebra trazendo as palavras de Beth de forma séria:

— E minhas bolas estão salvas.

Fico morta de vergonha pelos modos de Elizabeth.

Apenas sorrio, então ele também. Um sorriso leve e tímido.

— Céus, Elizabeth! — resmungo baixo.

Por um instante noto o quanto Hugo parece exausto, e ao se mexer fico preocupada com o ferimento em seu braço que agora parece mais feio que antes. Me recordo que ele levou o corte ao me defender.

— Hugo, você precisa cuidar disso.— Estico a mão para tocá-lo.

Ele me olha surpreso pelo toque, me esquivo temendo estar sendo invasiva.

— Desculpe.

Ele me olha e após um instante se inclina e me oferece o braço.

— Tudo bem. Só está doendo um pouco.

Ainda fico parada por um instante pensando se tocá-lo seria realmente uma boa ideia. Devagar ergo as mãos, seguro seu braço. 

De repente sinto meu coração se atrapalhar em meio às batidas.

Somos os dois num silêncio profundo e inquietante.

Começo a afastar a manga de sua blusa delicadamente até os bíceps, é inevitável não notar como ele é forte. 

Observo o corte que parece ser mais profundo do que eu imaginava, retiro um fiapo de tecido que estava por cima e Hugo geme.

— Você… tem que ir ao hospital, talvez precise de pontos.

Mas ele parece não me ouvir, permanece me olhando fixamente. Minha boca fica seca.

— Não precisa — ele fala após um tempo.

Um remorso gigante me invade, sinto pena dele estar machucado assim por minha causa.

— A culpa é minha...

Bufo.

— Eu fiz o que precisava ser feito. E seu nariz?

Ele pergunta se importando.

Levo a mão ao meu nariz. Está apenas dolorido, não quebrou. Hugo ergue o braço livre e repete o gesto, toca a ponta do meu nariz devagar. Seus olhos pousam tempo demais sobre os meus e me perco na imensidão verde que eles têm… Estamos muito próximos. Sinto uma carícia delicada em minha pele. Fecho os olhos imaginando várias coisas, e a primeira é a mais estranha de todas, os lábios dele tocando os meus. Então… abro os olhos e me afasto rapidamente.

— Meu nariz está bom… não está nem doendo mais — minto. — Bom...Obri-gada! — falo  e nem percebi que estou gaguejando.

Merda! O que está acontecendo comigo?

Levo a mão até a maçaneta para abrir a porta, mas paro no mesmo instante quando uma ideia insana surge. Mas é o mínimo que eu posso fazer em agradecimento por tudo que ele fez 

— Hugo… Se você quiser… posso fazer um curativo em seu braço e te dar um analgésico, isso deve estar doendo.

As palavras saem num impulso e no mesmo instante já me arrependo. Porém certamente ele não irá aceitar, Hugo parece não querer se envolver mais e tem toda razão…

Enquanto penso várias coisas me surpreendo quando ele diz:

— Por acaso seu seus métodos de enfermagem envolve agulhas?

A forma austera que ele diz nem ao menos parece se tratar de uma brincadeira. Hugo teria medo de agulhas?

— Quer dizer que um homem tão corajoso como você está com receio de uma simples e pequena agulha?— falo não me contendo.

Ele respira fundo, uma ruga se forma em sua expressão. Acabo sorrindo por vê-lo tão nervoso.

— Digamos que se eu fosse o super homem, agulhas seriam minha kryptonita.

Então ele sorriu, e sorriu de verdade pela segunda vez naquela noite.

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