Na manhã seguinte, disse ao Sam:
— Vamos juntos até a alcateia Rosa Branca?
Por um instante, o rosto dele ficou tenso, mas logo retomou o semblante sereno de sempre.
— Claro. Mas entregamos o presente e voltamos em seguida, tudo bem?
Eu sabia que ele não queria que eu fosse. Tinha medo de que eu estragasse a festa de celebração da Lily. Mas eu só queria ver minha família uma última vez.
Afinal, depois de amanhã, eu partiria para sempre.
Ao chegarmos à Rosa Branca, encontramos Lily cercada pelos convidados, todos com trajes elegantes, parabenizando-a pela gravidez e pela nomeação como candidata à mestre curandeira. Os anciãos da alcateia também lançavam a ela olhares de admiração.
— Lily criou a fórmula que neutraliza o veneno da raiz do veneno de lobo. Essa eleição será dela, sem dúvidas.
— Incrível. Normalmente, esse tipo de avanço só vem dos laboratórios da associação de alquimia.
— Pois é, a associação até já emitiu o certificado. O talento dela é extraordinário.
Meus passos hesitaram. Parei à entrada do salão de festas.
“Há pouco tempo, eu mesma havia desenvolvido essa fórmula, com a ajuda da minha mestra. Seria apenas uma coincidência?”
Logo percebi que não era.
Meus olhos se fixaram no certificado da associação, exposto bem no centro da celebração. Li a descrição da fórmula e os dados da pesquisa. Eram tão familiares que meu peito se apertou de dor.
“Essa era a mesma poção na qual trabalhei arduamente durante dois anos. Agora, atribuída a ela, como se fosse obra sua.”
Lily notou minha presença. Por um breve instante, seu rosto se fechou. Mas logo vestiu um sorriso impecável e se aproximou de mim. Sua voz saiu doce, mas com um tom cortante de escárnio:
— Any, você gostou da fórmula do remédio? Pois agora ela é minha. O que vamos fazer com isso?
Fitei-a com raiva, prestes a responder, quando ela de repente deu um grito e se jogou para trás, segurando o ventre com expressão de dor distorcida.
O salão caiu em total confusão.
— O que aconteceu?
— Lily está grávida. Como você pôde empurrá-la?
Em meio ao tumulto, ouvi uma voz cheia de desespero:
— Lily!
Talvez os outros não tivessem notado, mas eu reconheci na hora. Era a voz do Sam.
A angústia no tom dele era nítida. Tão crua, tão sincera, que esmagou por completo o último resquício de esperança que ainda restava em mim.
Percebendo meu olhar, Sam rapidamente mudou sua expressão. Virou-se para mim. Em sua voz serena, havia uma reprovação sutil, porém firme:
— Não importa o que aconteça, a Lily está grávida. Você não devia tê-la empurrado.
Fiquei ali, parada, encarando o homem com quem vivi nos últimos cinco anos. A preocupação nos olhos dele era tão genuína, tão verdadeira, que nada tinha a ver com o olhar falso que sempre me dirigia.
Nesse momento, uma nova notícia se espalhou pelo salão. Com a fórmula do novo antídoto, Lily havia superado quatro concorrentes e conquistado oficialmente o cargo de mestre curandeira.
Nos olhos de Sam surgiu um brilho de alegria que ele não tentou esconder. Uma felicidade pura, intensa... Uma expressão que eu jamais tinha visto em todos os anos ao lado dele.
Então perguntei em voz baixa:
— Por que a fórmula da poção criada pela Lily é idêntica à minha pesquisa?
O corpo dele enrijeceu levemente, mas logo recuperou a compostura. Fingiu surpresa, como se não soubesse de nada.
— Talvez seja coincidência. Ela pode ter seguido uma linha de pesquisa parecida com a sua...
Soltei uma risada seca, sem dizer mais nada.
A única pessoa que sabia que eu estava trabalhando naquele antídoto contra o veneno da raiz do veneno de lobo... Era o próprio Sam.
A fórmula estava guardada no nosso escritório, em casa. Não restavam dúvidas sobre como ela tinha sido exposta, nem quem estava por trás disso.
A verdade era óbvia.
Esse remédio... Eu o desenvolvi por causa do próprio Sam.
Um ano atrás, ele havia ingerido acidentalmente a raiz do veneno de lobo e sofrido uma crise de fúria temporária.
A fórmula que eu criei neutralizava o veneno, mas os casos de contaminação variavam muito.
Por isso, o tratamento exigia ajustes delicados, conforme o nível de intoxicação.
Mas agora... Já não fazia sentido continuar a pesquisa.
Tudo havia perdido o propósito.