por dentro.Paul e Patrick trocaram olhares sérios.— Isso é... grandioso. Mas também ousado — comentou Paul. — Vai incomodar muita gente.— Eu sei — disse Robert com firmeza. — Mas alguém precisa começar. Eu não posso mais fazer vista grossa. Já compactuei demais com a omissão.Ele então tirou da pasta um livro de capa escura, cuidadosamente encapado, e o colocou sobre a mesa. Era o Amor Zero, de Pınar Selek.— Estou lendo isso — disse ele, batendo levemente no livro com os dedos. — É sobre relacionamentos abusivos, sobre narcisismo e a desconstrução emocional que certos padrões familiares causam. Eu fui criado num ciclo assim. E infelizmente, por muitos anos... repeti esses comportamentos.Patrick se inclinou, olhando a capa.— Leitura pesada, hein?— Necessária — respondeu Robert, com a voz mais baixa. — No começo, achei que era só mais um livro de autoajuda. Mas não é. É um espelho. E quando você se olha ali

Paul observou Elise por um momento. Ela estava em silêncio, mas os olhos brilhavam de lágrimas contidas. Ele respirou fundo, tirou algo do bolso interno do paletó e estendeu para ela.— Elise, aqui em Boston nós temos excelentes profissionais... Terapeutas, psiquiatras, psicólogos com abordagens modernas e humanas. E eu não estou falando isso por obrigação, estou falando porque eu vi um homem se reerguendo com a ajuda deles.Ela o olhou, confusa, ao ver o que ele lhe entregava: um Kindle.— O Robert nos mostrou os livros que ele está usando. Ele chama de “as bíblias dele”. E não está errado, porque pela primeira vez ele está se guiando por algo que não seja orgulho, violência ou poder.Ela passou os dedos pelo aparelho, devagar, como se não entendesse.— Eu comprei para você — disse Paul com firmeza. — Todos os livros da Silvia Malamud já estão aí. E também o Amor Zero. Ele estava lendo quando conversamos. E me disse: “esse livro está me

Ashley estava sentada no sofá da sala, com o pequeno Felipe Benjamin aninhado em seus braços, enquanto os raios dourados da tarde banhavam a casa. O bebê já dava os primeiros passinhos, ainda inseguros, mas cheios de vida.— Amor... — ela disse, com a voz doce, olhando para Philipe que acabava de sair do banho, — nosso bebê vai completar um ano.Philipe sorriu com ternura ao vê-la assim, com aquele brilho maternal nos olhos.— Já? Como passou tão rápido… — ele disse, aproximando-se para beijar a testa do filho e em seguida a dela.— Vai ser só pra gente mesmo, tá? Nada de festa. Só os avós, os tios, a Elise… Nós dois aqui com ele. Ele ainda não entende mesmo — disse Ashley com um riso leve, enquanto acariciava a cabecinha do filho.Philipe assentiu, sentando-se ao lado dela no sofá.— Assim é ainda mais especial.Ela respirou fundo.— Amor, eu preciso voltar a trabalhar… — disse com delicadeza. — Eu não estou ac

A porta da clínica se fechou atrás de Elise com um leve clique, mas dentro dela o impacto era o de um estrondo. Como se, ao deixar aquele consultório, tivesse deixado para trás também um pedaço das correntes que a prendiam ao passado.Ashley estava sentada no banco de espera, mexendo distraidamente no celular. Quando levantou os olhos e viu a prima, ergueu-se de imediato.— E aí? — perguntou suavemente. — Como foi?Elise respirou fundo. Havia algo diferente nela. Os olhos estavam inchados, sim. Mas havia também algo de mais calmo em sua postura. Como se, depois de muito tempo, tivesse conseguido respirar com menos dor.— Eu chorei. Falei tudo. Até achei que nunca conseguiria contar a ninguém. E sabe o que é pior? — sua voz falhou — Eu descobri que... eu ainda estou sangrando. Por dentro.Ashley segurou a mão dela com carinho.— Isso é um ótimo começo, prima. Feridas expostas podem, enfim, começar a cicatrizar.Elise asse

O som suave da porta da cobertura se abrindo preencheu o ambiente com aquele sinal silencioso que só uma casa em harmonia conhece. Ashley entrou carregando duas sacolas e uma bolsa leve de papel da livraria. No exato instante, o riso do pequeno Ben ecoava da sala principal, acompanhado de um “cadê o papai?”, seguido por gargalhadas deliciosas.— Olha quem chegou, filhote... — disse Philipe, com um sorriso iluminado no rosto, sentando no tapete de espuma colorido enquanto Ben batia palminhas, com a babá observando de canto, segurando a mamadeira.Ashley parou por um momento, só observando aquela cena. O marido, de jeans e camiseta preta, de barba feita, mas com aquele ar despojado de quem finalmente encontrara a paz. E Ben, o reflexo puro daquele amor que tinha atravessado memórias perdidas, mentiras e recomeços. O menino estava crescendo forte, esperto, risonho. Seu coração se encheu de gratidão.— Você foi levar a Elise? — perguntou Philipe, ao