Narrado por Giovavi Ferreti:Eu a levei para o hotel.Precisava tirá-la daquele apartamento, daquele espaço impregnado do cheiro podre das intenções da minha mãe. Queria lhe dar um pouco de paz — ou talvez aliviar a dor que vi em seus olhos assim que a encontrei.Mas era inútil.Eu sentia a tensão em cada músculo do corpo dela.Antonella se manteve calada, me olhava como quem engole um grito. Como quem quer confiar, mas ainda está à beira do precipício.E eu sentia.Sentia o medo, a confusão, o peso de algo que ela ainda não dizia.A cada vez que seus olhos me atravessavam em silêncio, uma parte de mim queria protegê-la do mundo — e a outra queria arrancar dela tudo o que estava escondendo.— Não se preocupe, amore mio... — tentei acalmá-la. — Aquele infeliz nunca mais vai tocar em você. Nem em ninguém.Ela balançou a cabeça.— Não é isso... — a voz saiu baixa, quase sem força. — Ele só... fez o que sua mãe mandou. Giovani, ela não sabe que eu me entreguei a você.Trinquei os dentes.

Narrado por Giovani Ferreti:O silêncio da madrugada era cortado apenas pela respiração suave de Antonella, dormindo ao meu lado.A pele dela ainda estava quente contra a minha, o cheiro dos nossos corpos misturado no lençol.Ela dormia... e eu a observava.Linda. Entregue. Minha.Meu peito se apertou. Eu sabia que não conseguiria descansar enquanto aquele nome ainda queimasse na minha cabeça.Lorenzo Cassani.O médico. O homem que ousou tocá-la.O desgraçado que esteve perto demais da minha mulher.Me levantei sem fazer barulho. Me vesti rápido. O desejo ainda martelava em mim, mas o ódio era mais urgente.Procurei, me informei sobre o suposto médico, até encontra-lo.Ele ainda nem havia chegado. Mas eu já estava lá. Esperando.Quando entrou, mal teve tempo de reagir. Tranquei a porta atrás dele, empurrei contra a parede com força. Os olhos arregalados, a pasta caindo no chão.— G-Giovani?! Que diabos é is—Meu punho encontrou o rosto dele antes que terminasse a frase.— Você tocou n

Narrado por Giovani Ferreti:Retornei a San Marino quase pela tarde, a cidade respira fumaça, pólvora e silêncio comprado.E eu sou o homem no topo, o que carrega o sobrenome que ainda mete medo.O nome Ferreti não é mais o mesmo de antes, mas o suficiente para que ruas se calem quando passo.Para que homens cuspam o chão antes de pronunciar.Para que mulheres se ajoelhem, oferecendo sexo como moeda de sobrevivência ou acesso.E eu? Aprendi cedo a engolir o asco.Aqui não existe “não gosto”. Aqui ou você domina, ou vira mercadoria.E hoje, a mercadoria era gente.Mais uma remessa do porto chegou com nomes falsos e passados forjados — servos modernos do tráfico humano. A máfia nunca dorme.A máfia se alimenta de carne, de alma, de medo.Entrei na sala abafada do Cassino Il Canto, que esconde mais cadáveres do que máquinas caça-níquel. Gabriele me esperava, terno molhado de suor, gravata frouxa.— Chegaram mais doze meninas. Doze. — disse ele, como se contasse sacos de batata.Respi

Narrado por Giovani Ferreti:O jatinho pousou às 07h43, como programado, embora eu, entre acordos, negócios, tivesse me passado. Pontualidade suíça, cortesia de Antoni que organizava as viagens dos meus pais adotivos como quem lida com relíquias, e eles são, os nossos bens preciosos. Eles não gostavam de voar, mas por mim voariam até o inferno.Eu desci do carro com Matteo ao meu lado, silencioso como sempre, e mais um dos rapazes que vinha ganhando minha confiança — eficiente, observador, e, acima de tudo, discreto, sempre me alertando das saídas repentinas de Irina, das chegadas. Quando a porta da área VIP se abriu, respirei fundo, A ausência daqueles dois havia se tornado um buraco mais fundo do que eu imaginava.Mas o que me surpreendeu não foi vê-los. Foi quem já estava com eles, um passo a frente.— Giovani! — a voz doce, acelerada, quase chorosa da minha mãe adotiva rompeu o ar frio.Ela correu na minha direção, ignorando segurança, regras ou constrangimentos.Estava linda, s

Narrado por Giovani FerretiAntonella me olhava pela janela do quarto de hotel, como se o mundo lá fora tivesse respostas que ela ainda não estava pronta pra aceitar.Fazia calor naquela manhã na capital, mas ela se encolhia sob o lençol como se estivesse em pleno inverno. A pele nua das costas dela parecia ainda marcada pelas minhas mãos. As marcas do que fomos na noite anterior. Do que nos tornamos todas as vezes que nos tocamos sem freio.Ela queria adiar o semestre. Eu sabia.A boca dela dizia que dava tempo, que conseguiria conciliar, mas os olhos...Os olhos gritavam o contrário.Faltavam duas semanas pro nosso casamento. Meus pais adotivos estavam em San Marino.Se partissem agora, não voltariam para a cerimônia, eu queria a presença deles. Não gostava da ideia de pedir que ela deixasse algo importante por mim. Mas, por outro lado, era a nossa vida que começava.Me aproximei devagar, sentei na beira da cama. Ela nem se virou.— Você quer mesmo voltar a San Marino agora? — per