Helena estava bem empolgada em contar seu dia de lazer com o pai (esse que depois da nossa conversa comeu no mais silêncio).
Não entendi como de uma hora para a outra nossa conversa desandou, mas também não me ative a sua falta de humor e chatice. Eu não falei por mal, ele que é muito ranzinza para a idade dele, que não deve passar dos 35 anos.
— Tia Amely — Helena me chama de tirando dos meus pensamentos.
— Sim, meu anjo.
— A senhora quer ir na minha festa de aniversário no domingo?
Sua pergunta me pega de surpresa, pois não costumo misturar o lado profissional com o pessoal e por um segundo fico com receio do que responder.
— Helena…
— Por favor, professora Amely, meu papai deixa, não é papai?
— Helena, não insista, sua professora deve ter compromisso para esse dia. Não a incomode.
— Ela não tem não é professora? — sua pergunta é carregada de esperança.
— Não, meu anjo, não tenho, mas não é certo eu ir na sua festa, sendo que não vou na dos outros alunos.
Ela me olha triste. Continuo com a explicação.
— Eu não posso envolver minha vida profissional na pessoal, você me entende?
— Mas… mas eu queria você lá — ela levanta da mesa correndo e se j**a no sofá para chorar.
Sinto-me mal por vê-la assim e me levanto indo até ela.
— Não chore, meu anjinho.
— Eu te queria lá. Já que não terei minha mamãe, queria ter pelo menos você tia Amely.
Sua declaração me parte o coração e me deixa sem reação por alguns minutos.
Como uma mãe pode rejeitar uma filha assim?
Entendo que existem mães de vários tipos, contudo Helena é uma criança maravilhosa e seu pai é rico, não entendo porque Safira a abandonou.
— Mas meu amor — o pai dela a pega no colo e ela esconde o rosto em seu pescoço — a Amely, não pode ir ao seu aniversário, mas ela gosta muito de você.
— Ela não gosta papai, ela não quer ir na minha festa, ela não me ama igual à mamãe.
Seu choro se intensifica, me deixando aflita.
— Filha…
Eu não aguento isso, me parte o coração saber o quanto ela se sente abandonada. Se sentir rejeitada na idade dela pode se tornar um trauma grande na vida adulta.
— Eu vou a sua festa. — ela levanta a cabeça do pescoço do pai e me dá um dos seus lindos sorrisos.
— Vai mesmo tia Amely? — pergunta cheia de esperança parando de chorar — De verdade?
Balanço a cabeça concordado e ela se j**a em meus braços me dando vários beijinhos no rosto.
— Mas é muito linda essa minha professora, não é papai lindo?
Ela pergunta ao seu pai e ele me olha de um jeito que me deixa desconcertada.
— Sim, filha, muito linda — ele fala me dando uma piscadela e lá estou eu corando para o de novo. Droga.
— Está na hora de irmos para casa filha. Já está tarde e amanhã a senhorita tem aula.
— Mas já papai. Nem comemos o bolo — fala chateada.
Ela sorri e concorda nos despedimos e eles vão embora. Limpo a cozinha e guardo o bolo na geladeira.
Tomo um banho e vou dormir. Amanhã terei um dia cheio e uma boa noite de sono é fundamental para aguentar o dia sem surtar.
[...]
— Fernando?
— Fernandooo?
— Fernando, isso não tem graça, aparece ou vou embora.
Saio pela escola procurando o Fernando e entro novamente no auditório, ele me enviou um recado para encontrá-lo no auditório, mas me deu um bolo. Vou dar na cara dele, odeio esses garotos babacas que se acham garanhões e ficam curtindo com a cara dos outros.
Já deveria saber que era só resenha, um menino bonito e popular como ele nunca me chamaria para ficar. Ficar com a gorda da escola, que patético.
— Que droga, porque me disse para vir aqui se não estaria me esperando? — falo comigo mesmo.
— Oi! Gorda — uma voz seguida de risadas ecoa pelo auditório da escola.
— Quem está aí? Fernando é você? Isso não tem graça.
— A baleia está com medo! — mais risadas.
Não quero mais saber quem é e me viro para ir embora, mas porta está trancada.
— Me deixa sair — grito e vejo Fernando e seus amigos saírem da salinha onde fica o material de projeção do auditório.
— Aonde pensa em vai, hein? — ele se aproxima e agarra meu braço — você achou mesmo que eu ficaria com uma gorda.
— Se enxerga garota.
— Se não queria ficar comigo, era só me falar não armar isso aqui — apontei para seus amigos ao nosso redor — me deixa sair — eles apenas riem de mim e me cercam.
Eram quatro garotos e duas garotas e eu estava com muito medo do que podem fazer comigo. Eu não deveria estar aqui, não deveria ter acreditado nele e ter vindo nesse encontro sozinha. A Duda me avisou que poderia ser uma brincadeira, mas eu estava cansada de ser a garota da escola que não tinha namorado e nem ficava com ninguém, então acreditei nele e aceitei. Mas ela estava certa e ele só queria rir de mim.
— Eu não quero ficar com nenhum de vocês me deixam sair ou vou gritar — aviso.
— Pode gritar Amely. Não tem mais ninguém na escola. Porque você não deixa de ser uma chata e dá para nós hein carne você tem — Ricardo, o melhor amigo de Fernando, fala arrancando risadas dos outros. Um calafrio percorre todo meu corpo e tenho vontade de chorar.
Fernando e Ricardo me agarram enquanto os outros dois meninos tentam tirar minha roupa, eu os chuto, mas isso só os deixa com raiva e eles puxam meu cabelo.
Tento gritar, mas minha boca é tampada, rasgam minha farda me deixando só de sutiã e as meninas pegam um pote de tinta — que até então não tinha visto — e começam a desenhar na minha barriga e seios me sujando toda. Até minha calça elas sujam enquanto os meninos riem da cena.
Mordo uma das mãos que estavam tampando minha boca e consigo gritar.
— Não...
— Por favor… parem — choro.
Eles só fazem rir e fotografam o meu estado deplorável. É muita maldade fazer isso com uma pessoa só porque ela não se encaixa nos padrões impostos pela sociedade.
— Olha que lindo, Amely, esses desenhos combinam com você.
Elas me mostram as fotos e vejo que desenharam um peixe grande com a palavra baleia escrito em baixo. Entre meus seios desenharam uma boneca com uma bola no lugar da barriga e também escreveram palavras como: gorda, feia, bujão, porca...
Sujaram minha calça com tinta vermelha para ficar como se eu estivesse menstruado e tiraram várias fotos para enviar aos outros alunos da escola. Os meninos puxaram meu cabelo e quando as meninas iam cortar...
— Não… — acordo gritando e suada, mais um pesadelo.
— De novo não — me encolho na cama e choro.
Pensei que tinha conseguido superar isso, anos de terapia para superar o trauma de ter sido humilhada aos 16 anos na minha antiga escola, mas não consegui.
Há tempos não tinha pesadelos com o pior dia da minha vida, o dia que deixei de esperar pelo amor e o príncipe encantado. O dia no qual eu fui humilhada pelo menino por quem tinha sentimentos.
O dia que mudou minha vida e decidi apenas usar os homens para apenas meu o prazer.