POV de Isadora
Fiquei na cama o dia todo.
Ninguém me incomodou, graças a Deus. Provavelmente acharam que eu estava de ressaca, ou fingindo estar.
À hora do jantar, alguém bateu na porta.
— Ei, Izzy. — Disse Damian, gentilmente, do outro lado da porta. — Você está bem? Perdeu todas as refeições hoje.
— Estou bem. — Menti debaixo das cobertas, a voz abafada.
— Vamos. Só vem jantar com a gente.
Claro que ele não veio sozinho.
— Isadora! Venha comer com a gente! — Alessia falou logo em seguida.
E então, porque o destino parecia me odiar, minha mãe também entrou na conversa. Eu estava oficialmente sem escapatória.
Então me arrastei até a mesa, sentei e esperei que ninguém me dirigisse a palavra.
Cassian se sentou ao lado de Alessia, cortando sua carne com precisão, como se ela fosse uma debutante indefesa.
— Cassian. — Alessia fez uma voz doce. — Sei cortar a minha comida. Não sou uma criança.
Ela disse isso como se fosse uma piada.
O olhar de Cassian se fixou em mim, afiado, ardente.
— Você é minha namorada. Quem mais eu teria que cuidar?
Foquei no meu bife, como se fosse a coisa mais fascinante do mundo. Mas o desempenho deles era impossível de ignorar.
Eles estavam praticamente grudadinhos. Sussurrando. Tocando. Se beijando. Interpretando o casal feliz como se estivesse fazendo uma audição para um reality show.
O resto de nós ficou em um silêncio constrangedor.
Até que Damian bateu o garfo na mesa.
— Não te custa nada ter um pouco de educação? — Ele estourou. — Tem mais gente aqui à mesa.
Alessia riu, doce e arrogante.
— Ah, não se preocupem. Estamos naquela fase, sabe? Recém-juntos, não conseguimos tirar as mãos um do outro. — Então ela se voltou para mim, com a voz açucarada. — E tudo graças à Isadora. Se não fosse por ela, Cassian e eu não estaríamos juntos tão rápido.
Ela ergueu a taça.
— À Isadora, a casamenteira.
Ela piscou.
Parecia fofa. Mas eu sabia o que era uma faca quando via uma.
Sorri de volta, sem esforço.
— Claro. Vocês dois merecem um ao outro.
Bati minha taça contra a dela.
Saúde ao inferno.
O olhar que cruzou o rosto dela, breve e irritado, foi quase compensador.
Me levantei, empurrando minha cadeira com graça.
— Estou cheia. Se me dão licença... — E, assim, saí.
…
Mais tarde naquela noite, Damian me encontrou, andando de um lado para o outro como uma tempestade sem rumo.
— Você viu o que aconteceu. — Ele disparou. — Como o Cassian pode fazer isso? Na minha frente, na sua, como se fôssemos estranhos.
Ele socou o lado da cama, dentes cerrados.
— Ele sabia. Sempre soube o que você sentia por ele. E, ainda assim, ficou ali, ostentando Alessia como se fosse um troféu.
— Damian, deixa disso. — Minha voz estava suave. Firme. — Eu não gosto mais do Cassian.
Isso o fez parar.
— Você… não gosta mais?
— Não. — Sorri, recostando-me nos travesseiros como se fosse uma novidade velha. — Tem muitos homens bons por aí, não é? Não tem outros amigos bonitos e emocionalmente equilibrados? Me apresente a eles. Estou oficialmente aceitando inscrições.
Ele piscou e depois sorriu largo.
— Eu te disse! Pra quê perder tempo suspirando pelo Cassian, se tem um buffet de homens melhores por aí?
Ele me envolveu em um abraço de urso.
— Na verdade. — Disse ele, se afastando e com os olhos brilhando. —Lembra daquele cara que papai e mamãe tentaram te apresentar? Aquele que disseram ser perfeito pra você e que poderia até ajudar a impulsionar o negócio do cassino?
Levantei uma sobrancelha.
— Quem?
— Kai Drenner. — O sorriso de Damian se ampliou. — O império dele? Dez vezes maior que o do Cassian. Armas, clubes, entretenimento. O cara basicamente espirra e fecha um contrato de milhões. Ele não mora em Nova York o tempo todo, mas adivinha? Ele está na cidade. Agora.
Meu coração deu um salto.
— Sério?
— Vou te mandar o número dele. Na verdade, vou marcar o encontro eu mesmo. Você quer jantar? Ou algo mais privado? — Ele piscou.
Digitei o nome de Kai no meu celular e senti, alívio. Alívio real, limpo, inegável.
Deixar o Cassian para trás já parecia a coisa mais difícil do mundo.
Agora, parecia liberdade.
Dessa vez, não estava correndo atrás de um homem que não me queria. Estava escolhendo um futuro para mim e para o meu filho.
…
Na manhã seguinte, Alessia me encurralou com um sorriso exageradamente radiante.
— Você não se importa se a gente se mudar pra cá um tempo, né? — Ela perguntou, com o braço entrelaçado no de Cassian, como se estivessem em uma lua de mel. — Cassian redesenhou a casa dele pra mim, mas ainda está em reforma. E hotéis são tão… impessoais.
— Claro. — Respondi, minha voz fria e suave como vidro. — Fiquem à vontade.
Nossas casas ficavam no mesmo bairro, a mansão do Cassian ficava apenas duas ruas abaixo. Deixar eles ficarem aqui foi eficiente e estratégico. Economizava tempo e esforço. Além disso, os laços comerciais ainda importavam, afinal, e eu não estava disposta a queimar uma ponte só porque não queria uma relação pessoal com eles.
Cassian fazia o papel de namorado perfeito. Contratou uma equipe de mudanças para cuidar de tudo. Embalou, enviou e desembalou tudo em poucas horas.
Eu fiquei perto das escadas, observando-o de canto de olho. E, por um breve e vergonhoso momento, minha mente vagou para uma outra versão dessa vida.
Após aquela noite impensada com ele, ele mandou Alessia para a França, como se fosse frágil e não pudesse lidar com a verdade. Então ele foi até lá e desapareceu da minha vida, como se eu fosse um erro que deveria ser mantido escondido.
Quando voltaram, cinco anos depois, eu ainda era o segredo sujo.
Cassian sempre me olhou como se eu fosse inferior a ele. Como se eu tivesse sorte de até respirar o mesmo ar que ele.
Ele nunca me olhou do jeito que olhava para ela.
Virei para subir as escadas quando ouvi o estrondo thump-thump-thump de alguém caindo.
Alessia. Ela desceu as escadas em uma queda dramática, rolando, até cair no fundo com um grito agudo.
Cassian estava ao seu lado em segundos.
Ela explodiu em lágrimas, com o rosto enterrado no peito dele… até virar a cabeça para me encarar.
Fazendo beicinho. Inocente. Perigosa.
— Por que você me empurrou, Isadora? — Ela gemeu. — Eu pensei que fôssemos bem-vindos aqui… Por que você fez uma coisa dessas?
— O quê? — Eu pisquei. — Eu não…
— Chega! — A voz de Cassian cortou o corredor como um chicote. — Eu já te disse pra parar com esses joguinhos. Se não somos bem-vindos, vamos embora hoje mesmo.
Ele a pegou no colo, mandíbula tensa, e saiu caminhando.
E Alessia, ela apenas virou a cabeça no ombro dele e sorriu para mim. Esse sorriso presunçoso, superior, de vadia que dizia: Eu venci.
…
Mais tarde naquela noite, ouvi uma batida na porta.
Cassian.
— Você ainda tem aquele colar de diamantes que te dei no seu aniversário de dezoito anos? — Ele perguntou.
Eu pisquei, surpresa.
— Tenho.
— Você se importaria de emprestar para a Alessia? Temos um jantar formal, e ela não teve tempo de comprar um.
Eu hesitei, então fui até minha caixa de joias.
— Claro. — Disse, pegando a delicada caixa de veludo. — Aqui.
O colar, o único presente que ele já me dera, era antes meu bem mais precioso.
Agora?
Era apenas vidro e ouro.