Ao despertar mais uma vez na tumultuosa cidade de Luanda, Marie Dos Santos Anthony revê o seu diário, que serve de ponto de ignição para uma fusão temporal entre o seu presente e o seu passado, detalhado pela própria personagem. De uma maneira particular, a personagem narra tudo o que viveu na transição da adolescência para a idade adulta e descreve a arte da camuflagem humana nos mais variados contextos e demonstra que, somos autênticos mestres do disfarces.
Ler maisComo se tratasse de um sonho, eu acordei em uma cama de casal em um quarto enorme, e com uma poltrona junto da cômoda que me faz olhar para o meu reflexo no espelho sempre que eu me sento nela. As janelas sanfonadas deste quarto são enormes, a vista é incrível, consigo sempre ver o céu, as nuvens, o sol e uma linda avenida junto ao mar, assim que abro as cortinas. Dentro do baú está alguém que eu não vejo há muito tempo, o único que sabe tudo sobre mim, o meu diário.
O céu nublado anunciou um novo amanhecer na tumultuosa cidade de Luanda. Logo ao acordar, levantei da minha cama, direcionei-me para o espelho e olhei para o meu reflexo. Ainda presa no meu reflexo, apreciei a minha pele mestiça e admirei os meus olhos castanhos. A maior parte da humanidade é refém do mito da raça ariana que originou a obsessão por olhos azuis, mas eu não me arrependo de não ter nascido com os olhos azuis, sempre amei os meus olhos castanhos como a cor do mel e o meu um metro e oitenta e dois centímetros de altura que alimentava o meu sonho adolescente de ser uma modelo das passarelas internacionais. Quanto ao cabelo, o meu cabelo crespo herdado da família da minha mãe fazia-me sentir única e natural. Sou filha de um homem de raça branca e de uma mulher de raça negra. Todavia, nunca precisei de ver ou ler artigos sobre negritude. Longe da perfeição, os meus pais e eu dialogamos muito sobre a minha condição racial e isto algumas vezes já me fez sentir que não sou branca como o meu pai e muito menos negra como a minha mãe. Uma pessoa parda é uma pessoa negra. A verdade é que eu podia tudo, menos viver uma ilusão racial, porque apesar de todos os benefícios raciais atribuídos aos seres humanos com o tom de pele mais claro no meu país, eu precisei admitir a tempo certo que na realidade sem camuflagens sou negra.
Durante a minha fase adolescente, quase todos tiveram uma descrição simples e superficial sobre mim. Sempre fui vista como uma rapariga demasiadamente tímida, mas aquela concepção era uma conclusão rasa e precipitada. Sempre estive longe de ser uma rapariga tímida, em uma análise correcta. Definitivamente, sou uma mulher reservada e bastante selectiva. Naquela época, expressava-me abertamente apenas nas minhas conversas com a Evandra, a minha melhor amiga.
Diferente da maioria do povo angolano, tenho apenas um nome próprio, porque, para o meu pai, um segundo nome arruinaria a homenagem feita para a minha avó, Marieth. Filha de um pai inglês e de uma mãe angolana que nasceu em Benguela, sou uma angolana de ascendência britânica que nasceu em Luanda no actual distrito da Maianga. Foi no distrito da Maianga onde passei toda a minha infância. Anos depois, mudamos para o Talatona, lugar onde conheci o Márcio, um rapaz moreno, alto e bonito, com covinhas nas bochechas. Aparentemente, o Márcio era diferente de todos os outros rapazes, apesar de supostamente o odiar, me apaixonei por ele e senti o acelerar dos batimentos do meu coração. Perdi o norte, as minhas pernas ficaram bambas de tão trêmulas que estavam, em suma, era uma junção de sensações e sentimentos, que pensei ter encontrado o amor da minha vida naquele momento. Apesar de sentir o desabrochar daquele sentimento puro, lembro que entrei em um período de implicância com o Márcio. Nas aulas, nos corredores da escola, no refeitório, não importava o sítio. Ele e eu implicávamos um com o outro a partir do momento que passávamos a respirar o mesmo ar.À Vladmira Alfredo, por toda a sua luz.FICHA TÉCNICACopyright © Elizandro Joel, 2020TÍTULORealidades CamufladasAUTORElizandro JoelREVISÃOAlmirante SamuelARTE DE CAPAJosemar Ferino, Kainat KiranAUTOPUBLICAÇÃO2ª EdiçãoISBN: 978-989-20-9860-9Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sob quaisquer meios existentes sem autorização.BREVE INTRODUÇÃO SOBRE A CAMUFLAGEMA camuflagem se consubstancia num acoplamento de técnicas que permitem um dado organismo ou objecto, permanecer semelhante ao ambiente que o circunda. Camuflar é em poucas palavras disfarçar.Na natureza os animais predadores e as presas usam a cam
Aterramos no Aeroporto Internacional De Gaulle e, finalmente, chegamos a Paris. Pegamos o terminal de trens e fomos de metrô até ao centro da cidade. Paris é uma cidade fantástica, os edifícios são quase todos do mesmo tamanho. A estrutura mais alta de Paris é a Torre Eiffel. Sem receio algum, atesto que está por existir uma cidade melhor que Paris. Por mim, todo o parisiense é privilegiado por nascer em Paris.Fomos para Paris simplesmente com as roupas do corpo, pois para mim era desnecessário levar malas para o maior refúgio do mundo moda. Era certo que ao amanhecer já estaríamos em França. Dito e certo, fomos até à mais bela avenida do mundo da moda e fizemos compras nas diversas lojas de roupas, onde comprei tudo o que uma mulher precisava, desde os artigos da Michael Kors aos da Gucci. A moda vive em Nova Iorque, Tóquio, Londres, Milão e Paris, por isso é quase impossível conter os gastos nestas cidades.Quanto à nossa estadia, reservamos um apartamento em um Apart
Deu-se início à cerimónia, a mesma contou com presença de gente muito importante. A família da Matilde era muito influente na alta sociedade portuguesa. Muitos ainda os tinham como membros da burguesia, poucos sabiam que naquela altura a família “Albuquerque” estava falida, por causa da grave crise financeira que o Estado português atravessava, a empresa da família da Matilde estava em processo de insolvência. As atenções estavam voltadaspara o Padre que os apresentou para a Igreja.- Irmãos, estes dois jovens presentes aqui no altar estão prontos para celebrar o santo sacramento do matrimónio, a legítima união entre um homem e uma mulher aos olhos de Deus. Jovens, de livre e espontânea vontade, vocês estão a celebrar o sacramento que une duas vidas de uma forma eterna aos olhos do Senhor. Entre nós irmãos aqui presentes, alguém sabe alguma coisa que poderá impedir a realização deste matrimónio?Estava feita a derradeira pergunta, mas o David não executou o que hav
Aeroporto de Lisboa, Olivais, Portugal.01h:18 PM.Aterrei na grande Lisboa com os objectivos e as metas traçadas. Passadas algumas horas, encontrei-me com o David no restaurante do Hotel Imperial, local onde eu me hospedei naquela altura. Estava a 0,6 km da Sé Patriarcal de Lisboa, a Igreja de Santa Maria Maior. Uma das maiores construções da era românica em terras de Camões.O meu âmago estava afligido por um enorme receio de perder o amor da minha vida. A imagem do sorriso do Davi não me saia da mente e antes de tudo eu precisava saber tudo o que se passou enquanto eu e o Davi estivemos longe um do outro. O David explicou-me a situação por completo, acrescendo a minha força para ir avante e lutar pelo amor da minha vida. Juntos, nós estruturamos a maquete do plano final, tudo dependia daquele plano, e o sábado prometia ser um dia de loucos e desaforados.Sábado. O dia do casamento de Davi e Matilde.Era meio-dia e o dia estava ensolarado, e bastante
Entrada de Nova Chamada... Número Desconhecido. Portugal.Uma chamada de um número desconhecido a esta hora?! – me dizia a Alexandra. – Não atendas, Marie! Deve ser mais uma dessas brincadeiras de péssimo gosto.- Como também pode ser importante, Alexandra.- Já disse, não o faças, Marie.- Já o fiz – retruquei, atendendo o telemóvel. – Alô! Estou... Quem fala?Tirei o telemóvel do ouvido e voltei-me novamente para a Alexandra.- Alexandra, deixa-me ouvir, pouco barulho, não me vai acontecer nada, a chamada pode ser importante.Levei outra vez o telemóvel ao ouvido.- Alô!- Sim, alô. Tudo bem, Marie?Aquela chamada parecia misteriosa e todo mistério causa alguma desconfiança. - Depende. Quem fala? - Ouve, daqui quem fala é o David, o gêmeo do Davi.- Oh, David! Há quanto tempo! Que surpresa! Como conseguiste o meu terminal tel
O tema escolhido por mim para o meu trabalho de final do curso foi...A Desvalorização da Vida Humana Em África.O subdesenvolvimento do continente africano é tão grande que há quem pense que África é um país e não um continente. O que notamos durante as questões e analíses que foram feitas ao longo do nosso trabalho é que nós africanos precisamos ser mais honestos e parar de continuar a procurar culpados para os nossos próprios erros. É indubitável que fomos colonizados, mas os grandes culpados da nossa situação são os governantes africanos que são dominados pela ambição desmedida que afundou o continente em genocídios, segregações, guerras e graves crises políticas. A vida humana em África tem sido muito desvalorizada, o povo africano vive uma vida infernal e os Estados regidos por regimes totalitários são a prova de que a democracia é fictícia em África. Também há que se admitir que os 500 anos de escravidão prejudicaram o continente em vários sentidos, entretanto, es
Último capítulo