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Memórias...

— Mãe? — A chamo sem saber aonde exatamente estou. Um barulho me faz olhar para frente, para a imensa escuridão e uma pequena luz surge no final dela. — É você? Mãe para com isso, vem cá. Estou morrendo de saudades de você. — Caminho no meio da escuridão, em busca da pequena luz. Sinto o meu corpo estremecer, tenho medo, mas não paro. — Mãe? Mãe?

...

Abro os olhos abruptamente encontrando o quarto semiescuro, se não fosse pela lua cheia a brilhar através da janela de vidro transparente. Sento-me no colchão a procura dela, mas logo a minha ficha cai e eu sinto uma vontade incontrolável de chorar, mas respiro fundo e decido tomar um banho para tentar me acalmar. Sigo para o pequeno banheiro, deixo a minha roupa cair no cesto de roupas sujas, ligo o chuveiro e entro debaixo da água morna que cai imediatamente molhando o meu corpo e isso vai me relaxando pouco a pouco. Fecho os meus olhos e molho os meus cabelos. A sensação do calor da água em meu corpo é maravilhosa, mas ela não me livra das lembranças. Essas invadem a minha mente sem me pedir licença e logo as lágrimas se misturam as águas que molham o meu rosto. Desolada, eu me sento no chão do box e me deixo levar por um tempo, até sentir que estou completamente vazia outra vez. Saio do chuveiro depois de um longo tempo, seco o meu corpo e envolvo os meus cabelos em outra toalha. Ponho um babydoll de seda, seco os meus cabelos e, quando volto para cama, Mônica entra no quarto. Ela traz uma xícara em suas mãos. Com um meio sorriso eu seguro a xícara e sinto o aroma delicioso da camomila, quando tomo um gole do líquido morno e adocicado. Ele me aquece por dentro.

— Imaginei que estivesse acordada, como está se sentindo?

— Mais calma agora. — Dou de ombros. Depois de beber calmante o meu chá e de conversamos um pouco, finalmente volto para cama e Mônica cobre o meu corpo, deixando um beijo cálido em meus cabelos.

— Descanse, amiga — pede baixinho e automaticamente os meus olhos começam a pesar. Não sei se por consequência do meu choro compulsivo de minutos atrás, ou devido às várias noites mal dormidas… talvez tenha sido o banho morno, ou chá que a minha amiga fez. Só sei que não demorou muito para que eu finalmente adormecesse. Um sono sereno e cheio de sonhos com lembranças da minha mãe.

Memórias...

— Mãe, olha isso! — falo com empolgação, entrando em casa e lhe entrego o papel.

— O que é isso, filha? — Ela pergunta com curiosidade, abrindo o papel dobrado ao meio.

— Eu consegui! Passei com uma pontuação máxima. Já fiz até a minha matrícula — respondo com um sorriso bobo no rosto. Minha mãe tira os olhos do papel e olha para mim, abrindo um sorriso que lhe ilumina o rosto.

— Sério, filha? Meu Deus, você conseguiu! — Feliz, ela me puxa para os seus braços.

— Sim, no mês que vem começo o meu curso de Medicina — falo em seus braços.

— Doutora Ana Júlia Falcão! — Rose fala como se lesse uma faixa no ar. Sorrio com a sua felicidade. — Estou muito orgulhosa de você, querida! — Ela sussurra emocionada e me aperta em seus braços. — Não será fácil, filha, mas não desista nunca! Seja forte, lute e sorria sempre para vida. Acredite em você, meu amor. Você é capaz! Eu te amo tanto!

 ...

Hoje faz três dias que ela partiu. Não é nada que eu possa me conformar, mas posso dizer que hoje dói um pouco menos do que ontem. Pelo menos o meu egoísmo de filha já reconhece que foi o melhor para ela. Abro os meus olhos e encaro a pequena janela, que me mostra o dia lindo que me espera do lado de fora. Juro que não queria sair dessa cama hoje, na verdade, não queria sair desse quarto. Daria tudo para ficar aqui quietinha e perdida em minhas memórias fabulosas. Curtindo os melhores momentos que ela me proporcionou durante toda a sua vida. Suspiro e olho encaro o teto branco do quarto. Eu simplesmente não posso ficar aqui deitada na cama vendo o tempo passar. Preciso levantar e tentar reconstruir a minha vida, tenho que juntar todos os meus caquinhos e seguir.

Promete que não desistirá, Ana.

Tenho uma promessa para cumprir e preciso continuar por ela. Também não posso ficar aqui esperando que Mônica resolva tudo por mim, ela já tem responsabilidades demais. Forço o meu corpo desanimado a sair da cama e após tomar uma ducha demorada, ponho uma roupa, escovo os meus dentes, seco os meus cabelos e saio do quarto. Encontro Mônica na sala, ela está arrumada e pronta para ir trabalhar. Ao me ver, ela sorri para mim.

— Bom dia, Ana! Como você está hoje, querida? — Antes de lhe responder, penso na minha noite. Realmente, consegui dormir apenas metade da noite e o pouco que dormi, sonhei com a minha mãe o tempo todo dizendo para eu não desistir. Acordei pouco mais das três da madrugada e tive tempo suficiente para refletir e ver por onde recomeço a minha vida.

— Bom dia, Mônica! Estou bem melhor, obrigada por perguntar! — Sorrio e vou até ela. — Estou mais tranquila também e mais conformada.

— Que bom, querida!

— Sonhei com a minha mãe esta noite — digo e Mônica me encara com expressão preocupada. — Ela me dizia para eu não desistir.

— E como se sentiu? — pergunta, tomando um gole do seu café logo em seguida. Dou de ombros.

— Resolvi que não é deitada na cama e chorando, que resolverei os meus problemas. — Ela sorri.

— É assim que se fala, amiga! — diz empolgada.

— Então, começarei a correr atrás da minha vida, Mônica. Ainda não sei como, mas eu vou.

— Estou orgulhosa de você, Ana! E sabe que tem todo o meu apoio, não é? Você verá, vai dar tudo certo! — Mônica me dá um sorriso encorajador e eu me sinto mais animada.

— Eu sei que vai.

***

À tarde resolvi ir à faculdade trancar a minha matrícula de vez, coisa que eu deveria ter feito há três meses. Não foi fácil ter que fazer isso. Na verdade, me machucou ainda mais, porque sei que era o seu sonho dela me ver formada, mas nesse exato momento eu preciso de um emprego e de um lugar para morar. Não é justo ficar na casa de Mônica e não é justo tirar o seu conforto fazendo com que ela durma em um sofá velho e desconfortável, e ainda lhe dar mais uma despesa. Após sair da faculdade, comprei um jornal em uma banca que fica na esquina de casa. Optei por me acomodar em um banco de concreto, debaixo de uma árvore, para aproveitar o clima ameno, pois o inverno está próximo e deixa o clima bem agradável. Abro o jornal e olho os classificados, marcando com círculos as oportunidades de emprego que achei favorável e quando terminei, fiquei um pouco mais apreciando a calmaria do lugar. Amanhã será outro dia. Pensei quando vi o sol se escondendo no horizonte e as nuvens alaranjadas já começavam a se espalhar pelo céu. Amanhã quero acordar bem cedo e. visitar algumas empresas que marquei no jornal. Nossa, espero conseguir algo quanto antes.

Ao chegar em casa fui direto para o quarto. Deixei o jornal e minha bolsa em cima da cama e segui para o banheiro. Tomei uma ducha rápida, pus uma roupa casual e voltei para a sala. Mariana estava brincando com a Belly no tapete da sala e o Senhor Genaro parecia maravilhado com a sua neta. Ele está em sua cadeira de rodas, observando a brincadeira da menina. Depois de cumprimenta-los, sento-me no sofá em um dos sofás e ligo a TV, à procura de algo interessante para assistir, mas não encontro nada. No início da noite a casa está silenciosa e eu resolvo ir para a cozinha preparar algo para comermos. Perto das sete, Mônica abre a porta e entra com um semblante cansado.

— Oi, gata! — diz largando as chaves em cima do balcão e logo em seguida sua bolsa.

— Oi, dia cheio? — questiono. Ela dá de ombros.

— Como sempre, mas não reclamo, você sabe que eu gosto. — Sorrio. — O que está fazendo aí?

— Macarrão com almondegas.

— Ôh! Papai, que delícia! — Sua animação me arranca mais uma risada. — Vou tomar um banho e volto para o jantar. Tenho faculdade em alguns minutos — avisa e sai levando as suas coisas. Admiro muito a força que a minha amiga tem e acho lindo que além de trabalhar durante todo o dia, ela ainda encontra tempo para dar atenção ao pai e a sobrinha. É algo bem corrido, mas ela sempre lhes dá um pouco de atenção e carinho antes de ir para o trabalho e antes da faculdade também. Jantamos juntas, mas nenhuma palavra é dita na mesa. Logo depois ela sai para o seu curso e eu sigo para o quarto.

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