Grace
Quando cheguei ao local da festa, vestindo um vestido verde de coquetel, a comemoração já corria em pleno andamento, com as pessoas conversando animadamente enquanto uma melodia suave de piano preenchia o ambiente.
Assim que adentrei o salão da Mansão Whitlock, que ainda era ou ao menos costumava ser minha casa, vários olhares se voltaram para mim, sobretudo de parentes que conheciam apenas a versão que Lily apresentara dos fatos e por isso me culpavam por ter supostamente forçado a fuga dela no casamento três anos antes.
Eles também não acreditavam em mim porque minha irmã mais velha é a filha adorada por todos, perfeita em cada gesto e capaz de amolecer até o mais endurecido dos corações com sua beleza.
Era justamente isso que ela fazia naquele momento, pois estava no centro do salão cercada por um grupo de convidados.
Os cabelos escuros caíam em ondas até a altura das costas, realçando a pele clara e o semblante delicado enquanto os olhos cinzentos hipnotizavam de um jeito bem diferente dos meus, negros e sem brilho como meus traços simples. A confiança transbordava dela e, por onde passasse, atraía todos os olhares.
Em comparação, eu nunca me sentia à vontade em meio a tanta gente e preferia ficar em casa, ocupada com atividades que me confortavam junto àqueles que amava, em vez de socializar de forma forçada. Isso ficava evidente e fazia com que muitos acreditassem que eu os desprezava.
— Grace! — Sua voz doce ecoou nos meus ouvidos de repente.
Pisquei, desviando o olhar até ela. Todos os olhos se voltaram para mim e meus pais, ao lado dela, trocaram um olhar carregado de raiva e decepção. Os demais familiares me examinaram dos pés à cabeça com desprezo.
Balancei a cabeça, tentando convencer a mim mesma de que já estava acostumada a esse tipo de tratamento, mas cada vez que me encaravam como se eu devesse ter desaparecido há muito tempo, algo dentro de mim se quebrava. Ainda assim, segurei a dor com a esperança de que em breve Ethan recobraria o juízo e voltaria para mim. O mundo não importaava enquanto ele estiver lá.
— Vem aqui! — Lily sorriu amplamente, os lábios vermelhos realçando ainda mais sua beleza.
Com o coração pesado, caminhei até ela e me coloquei ao seu lado, o que lhe bastou para me abraçar com força.
— Por que demorou tanto, maninha? Me odeia a ponto de nem querer vir à minha festa de aniversário? — Ela sussurrou com falsa tristeza.
— Que tipo de irmã você é? Depois de tantas maldades ainda tem a audácia de agir como se nada tivesse acontecido! — Mamãe disparou irritada.
— Mamãe, por favor, não fique brava com Grace. Você sabe que ela amava demais Ethan. Eu fui embora porque ela o queria, mas não foi culpa dela. Foi minha escolha. — Lily se afastou, voltando-se para nossa mãe, que continuava a me fulminar com o olhar.
Ela sempre soube tirar vantagem, conseguia culpar e fingir inocência ao mesmo tempo, e isso não era novidade. Durante toda a vida, Mamãe e Papai a haviam tratado como um tesouro, concedendo a ela tudo o que quisesse, mesmo que fosse algo meu, mesmo que eu chorasse por muito tempo.
No fim, sempre diziam que Lily precisava mais do que eu, que eu era forte e sobreviveria, mas ela não.
Lily era inocente. Lily era sensível. Lily tinha o coração frágil e eu deveria abrir mão de tudo em prol da minha irmã mais velha, não valia a pena competir com ela.
— Que irmã mais sem vergonha! Querer o homem da própria irmã e ainda fingir que é inocente! — Tia Maria resmungou ao lado.
Um sorriso amargo e resignado escapou de meus lábios. Como meu marido podia ser dela? Não fazia sentido algum. Aquelas pessoas haviam se mostrado agradecidas quando eu me casara com Ethan no lugar de Lily, mas agora me odiavam apenas porque ela voltara.
— Ela sempre foi assim. A culpa foi minha por não ter corrigido seu comportamento antes. — Mamãe suspirou, pousando a mão no peito.
— Salma, está tudo bem. Os filhos é que devem ser responsabilizados pelos próprios erros. — Papai abraçou Mamãe e me lançou um olhar de puro desprezo.
Seus olhos gritavam que me odiavam. Todos me odiavam.
— O que está esperando? Peça desculpas à sua mãe e à sua irmã! — Papai exigiu.
— Papai, por favor, não seja tão duro. Grace não quis nos magoar. — Lily correu até nós e agarrou o braço de Papai.
Daquele jeito, os três pareciam uma família perfeita. Eu não existia.
O que eu fiz?
Por que precisava suportar tudo aquilo?
Em silêncio, encarei meu pai enquanto meu coração doía no peito. Por que eles não conseguiam me amar também?
— Grace! — O grito dele ecoou, atraindo a atenção de todos ao redor.
Meu coração foi à garganta, e tudo o que pude fazer foi piscar para conter as lágrimas.
— Pai, mãe... — Sussurrei, esforçando-me para manter a voz firme. — Eu não vou pedir desculpas porque não fiz nada de errado. Casar com Ethan foi decisão de vocês para proteger a família. Abandonei tudo para preservar a reputação de vocês. Como podem agora dizer que a culpa é minha?
— Como ousa! Criança ingrata! — Mamãe gritou, erguendo a mão como se fosse me bater.
Pá!
Estalou um tapa seco que ecoou nos meus ouvidos e fez minha cabeça virar.
Até então meus pais nunca me haviam agredido fisicamente. Levei a mão ao rosto e o choque me deixou entorpecida por alguns segundos.
— Que vergonha.
— A mãe finalmente está mostrando limites.
— Bem feito, quem sabe assim aprende a ficar no seu lugar.
As pessoas cochichavam sem baixar o tom. Tentei respirar, mas senti o peso de cada olhar. Olhei de novo para meus pais e notei um breve instante de surpresa no olhar de mamãe, mas logo a raiva voltou. Ela apontou o dedo trêmulo para o meu rosto.
— Mamãe, por favor, não bata na Grace. A culpa é toda minha. — Lily soluçou, agarrando-se à minha mãe.
Imediatamente, o choque some dos olhos de Mamãe e a raiva volta a tomar conta. Ela aponta um dedo trêmulo para o meu rosto.
— É melhor parar de causar confusão, Grace, ou vamos deserdar uma filha tão terrível como você. Não aceitamos quem apunhala a própria irmã pelas costas!
— Eu apunhalei ela pelas costas? — Murmurei, com as mãos tremendo ao lado do corpo.
— Pare de negar. O mínimo que pode fazer é se desculpar como uma pessoa decente. — Papai cuspiu, franzindo o rosto em desprezo.
Fiquei encarando o chão enquanto minha mente girava em mil pensamentos. Não havia ninguém por mim ali. Talvez fosse melhor ser deserdada do que continuar vivendo tanta humilhação.
Virei de costas, decidida a ir embora, mas Lily correu e segurou meu braço.
— Por favor, não vá embora, Grace. Mamãe só se exaltou agora, mas você sabe que ela te ama. Sempre amou mais a mim.
Suspirei.
— Lily...
— Você precisa ver o presente que preparei para você. — Ela inclinou-se e sussurrou algo malicioso no meu ouvido, sem que os outros ouvissem.
Antes que eu pudesse perguntar qualquer coisa, ela começou a chorar e implorar para que eu ficasse.
Meu corpo pareceu congelar no lugar enquanto o coração latejava dentro do peito. Por que ninguém conseguia enxergar quem ela realmente era?
Devagar, ergui os olhos para o homem encostado no canto, que tomava um cálice de vinho com calma. Meu coração falhou uma batida quando seus olhos verdes encontraram os meus.
Ethan permaneceu impassível diante do tapa, da humilhação e de todo o tratamento que eu recebia, parecendo até desejar se aproximar e participar de tudo aquilo.
Foi nisso que nos transformamos?
Uma parte do meu coração ficou fria, e meus olhos se endureceram quando soltei o braço de Lily com um puxão. Caminhei rapidamente, incapaz de suportar mais.
— Quem é aquela? — Perguntou uma mulher espantada.
— Aquela é Grace Whitlock? — Outras vozes se uniram.
Parei lentamente. Não sabia por que, mas algo horrível me aguardava. Se eu me virasse agora talvez nunca mais conseguisse me erguer.