O peso do silêncio

O dia parecia ter parado para Gabi, como se o mundo tivesse desacelerado só para deixá-la viver o caos dentro de si. O café estava frio quando ela o tocou nos lábios, e o cheiro que antes era acolhedor agora parecia distante, irrelevante. Laura havia saído para o trabalho, deixando-a sozinha com seus pensamentos, e isso, de algum modo, piorava as coisas. Gabi não queria estar sozinha, mas também não queria ninguém perto.

O celular na mesa parecia um peso, como se ela soubesse que, a qualquer momento, poderia vibrar e trazer mais um fardo para seu coração já dilacerado. Mas nada aconteceu. As mensagens não chegavam. Ela olhou para a tela, fixando os olhos na foto de Miguel com Laura. Eles estavam sorrindo, tão felizes, tão seguros, e ela se sentiu como uma estranha naquela cena que nunca deveria ter feito parte.

Ela se levantou do sofá, andando pela casa vazia, os passos ecoando no silêncio que a consumia. Foi até a janela e olhou para a rua lá fora. As pessoas passavam apressadas, como se todas tivessem algo para fazer, algo para viver, enquanto ela estava ali, suspensa no limbo, sem saber o que fazer com o turbilhão de sentimentos que a invadia.

“Eu não posso sentir isso. Eu não posso sentir isso”, ela repetia mentalmente, como um mantra, mas as palavras pareciam tão vazias quanto as promessas que fizera para si mesma.

A última coisa que ela queria era ser a mulher que destrói a felicidade de outra. Laura confiava nela, e, mais do que isso, ela a amava como uma irmã. Mas Miguel… Miguel era um enigma. Um pedaço de algo que faltava em sua vida, e ela não sabia mais como se afastar disso. Não quando tudo dentro dela gritava para estar perto dele, para tocá-lo, para fazer com que ele a visse de uma forma diferente.

Gabi se pegou caminhando em direção à porta de entrada. O vento lá fora estava frio, e ela não tinha nem mesmo um casaco. Mas a necessidade de respirar ar puro, de fugir daquele ambiente sufocante, era maior. Ela precisava sair, precisava encontrar algo que a fizesse sentir que ainda tinha controle sobre sua vida. Ou talvez, ela apenas quisesse perder-se um pouco, afastar-se da confusão que a consumia.

Ela andou pelas ruas sem destino, o corpo se movendo automaticamente, enquanto a mente se afundava cada vez mais na espiral de sentimentos conflitantes. Como poderia ter se apaixonado por Miguel? Como alguém como ela poderia desejar algo tão errado?

Os minutos pareciam horas, até que, finalmente, ela encontrou um pequeno parque. Sentou-se em um banco vazio, fechando os olhos e tentando se concentrar na respiração. Mas não adiantava. Cada vez que ela fechava os olhos, a imagem de Miguel surgia, os olhos dele fixos nela, aquele sorriso sincero que a fazia se sentir frágil e, ao mesmo tempo, tão viva.

A raiva começou a se misturar com o medo. Medo do que ela queria, medo do que poderia acontecer se ela cedessem a esse desejo proibido. Ela sabia o que estava em jogo. Sabia que, ao cruzar a linha, não haveria volta. Laura jamais a perdoaria, e Miguel… Miguel a veria como uma traidora. Não havia saída. Era um labirinto sem fim.

O som de passos interrompeu seus pensamentos, e, ao abrir os olhos, encontrou alguém parado à sua frente. Era Miguel. Seus olhos a encaravam com uma intensidade que a fez gelar. Ela sentiu um turbilhão de emoções, e tudo o que conseguia fazer era respirar fundo.

— Gabi? — ele perguntou, sua voz suave, mas carregada de algo que ela não conseguia entender.

Ela forçou um sorriso, tentando disfarçar o peso que sentia no peito.

— Oi, Miguel. O que está fazendo aqui?

Ele olhou ao redor, como se procurasse palavras, antes de se sentar ao seu lado, tão perto que ela podia sentir a presença dele invadir todo o seu espaço.

— Eu… queria saber se você estava bem. Você sumiu depois daquela noite, e eu me preocupei. Você parecia distante.

Ela tentou rir, mas o som que saiu de sua boca soou forçado.

— Só estava precisando de um tempo, sabe? Muitas coisas acontecendo…

Mas, enquanto ela falava, algo nos olhos de Miguel mudou. Ele se inclinou um pouco mais para frente, e o mundo ao redor de Gabi começou a desaparecer. Só existia ele. E ela. E aquele espaço entre eles que parecia mais estreito a cada segundo.

— Gabi… — ele sussurrou, e a voz dele parecia preenchê-la por dentro, queimando cada parte do seu ser.

Ela olhou para ele, os olhos brilhando com a luta interna que consumia sua alma. O ar estava espesso, como se, de alguma forma, ela estivesse prestes a tomar uma decisão irreversível.

— Miguel… — ela começou a dizer, mas as palavras morreram na garganta. Ela não sabia o que estava prestes a acontecer, mas sabia que algo dentro dela já estava quebrado.

O destino havia os colocado ali, juntos, e talvez, ao contrário do que ela queria acreditar, não havia mais como voltar atrás.

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