Mallory
O som da água cortada pelos nadadores se misturava ao burburinho das arquibancadas, mas minha mente estava em qualquer lugar, menos na competição. Meu estômago revirava, meu peito apertava, e a tensão que pairava sobre mim desde que Karev descobriu a verdade tornava impossível ignorar o peso do momento.
Ele sabia.
Sabia que Gabriel Dixon era seu pai biológico.
O que ele não sabia... era que eu já sabia disso muito antes dele.
Tentei me concentrar na piscina, mas era inútil. Meus olhos o buscavam entre os atletas. Karev Khalid. O prodígio da natação. O garoto indomável que, de alguma forma, conseguiu fazer com que eu, Mallory Reynolds, baixasse a guarda.
E agora ele me odiava.
— Lory, para de apertar os braços assim, você vai acabar se machucando. — A voz de Cameron, minha irmã trigêmea, me trouxe de volta.
Soltei o ar lentamente, relaxando os dedos contra a pele. Eu nem tinha percebido que estava me abraçando tão forte.
— Desculpa — murmurei.
Cameron me olhou de lado, sua expressão suavizando.
— Ele vai voltar para falar com você.
Não tive coragem de responder.
A verdade era que eu não sabia se queria que ele voltasse. Não porque não me importava — pelo contrário. Mas porque quando Karev olhou nos meus olhos depois daquela revelação, eu vi algo que nunca quis ver ali.
Mágoa.
E não pela mentira que os pais dele esconderam por tanto tempo.
Mas porque eu sabia. Eu sabia e nunca contei.
Respirei fundo quando vi Gabriel Dixon parado perto das arquibancadas, os olhos fixos na piscina, mas sem realmente enxergar nada. Ao seu lado, Ragnar — meu cunhado e Alfa Supremo — tinha a expressão rígida. Gabriel parecia à beira do colapso.
E eu não podia culpá-lo.
Karev dissera coisas duras para ele.
E, pela primeira vez, eu não podia defendê-lo.
Ele tinha razão em estar com raiva.
***
Ele me encontrou antes da prova, no vestiário masculino. Como sempre, não se importou com formalidades. Apenas entrou, me puxou pelo braço e me arrastou para um corredor menos movimentado.
O olhar dele estava diferente.
Bruto. Afiado. Cheio de raiva.
— Você sabia. — A voz de Karev saiu num sussurro cortante.
Meu coração disparou.
— Karev, me escuta...
— Você sabia e nunca me disse! — Ele deu um passo para trás, como se minha presença o machucasse. — Quanto tempo, Mal? Quanto tempo você ficou olhando na minha cara, fingindo que nada estava acontecendo, sabendo quem ele era?
Engoli em seco.
— Eu queria te contar.
— Então por que não contou?! — O verde dos seus olhos queimava. Intenso. Ferido.
— Porque eu não sabia como... — minha voz saiu mais fraca do que eu gostaria.
Ele passou as mãos pelos cabelos, exasperado.
— Merda, Mallory. Você era a única pessoa em quem eu confiava de verdade nesse lugar. A única.
Cada palavra era uma lâmina rasgando algo dentro de mim.
— Eu confiei em você.
Aquelas palavras pesaram mais que um soco.
Eu tentei me aproximar, mas ele recuou.
— Karev...
Ele desviou o olhar.
— Não agora.
E então ele foi embora.
***
— Irmã, você está fazendo de novo. — Os dedos de Cameron envolveram minha mão com carinho.
Minhas unhas cravaram nas palmas das mãos enquanto eu me forçava a focar no presente.
Ele não voltou.
A prova terminou. Os vencedores foram anunciados. E Karev não voltou.
A arquibancada começava a esvaziar quando tomei minha decisão.
— Eu vou atrás dele.
Cameron não tentou me impedir dessa vez.
Saí do centro aquático, o ar frio da noite me atingindo em cheio. Meu coração acelerou quando o vi.
Karev estava encostado no carro, cabeça baixa, os punhos cerrados ao lado do corpo.
Ele parecia estar respirando fundo, como se tentasse segurar algo dentro de si.
— Você não devia estar aqui.
A voz dele era baixa, carregada de emoções.
Me aproximei devagar.
— Nem você.
Ele soltou uma risada sem humor.
— Então o que você quer, Mal? Quer mais um showzinho?
A provocação me irritou.
— Não me testa.
Ele levantou os olhos para mim e, por um segundo, vi algo diferente. Algo sombrio.
— Me diz uma coisa, Mallory... Se eu não tivesse descoberto, você teria me contado?
Engoli a resposta automática. Não adiantava mentir.
— Não sei.
Ele riu de novo. Dessa vez, havia dor naquela risada.
— Pelo menos é honesta.
O silêncio caiu entre nós.
Eu queria preencher aquele vazio, queria dizer algo que fizesse a dor desaparecer. Mas o que poderia consertar aquilo?
Talvez nada.
Mas havia uma coisa que eu ainda precisava fazer.
— Eu menti para você.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Ah, jura? Nunca teria imaginado.
— Mas não sobre isso.
Isso chamou sua atenção.
Respirei fundo.
— Tem outra coisa que você precisa saber.
Ele cruzou os braços.
— Vai, Mal. Surpreenda-me.
Me aproximei até ficar cara a cara com ele.
— Você não é só humano.
Karev franziu o cenho.
— Como é?
Meu coração martelava.
— Você. Não. É. Humano. — Abaixei a voz. — Você é um lobo.
Ele piscou.
Abriu a boca.
Fechou.
E então riu.
— Você está brincando, né?
Eu apenas o encarei.
A risada morreu em seus lábios.
— Mallory...
Eu dei um passo para trás.
— Pergunta pro seu pai.
Os olhos dele se arregalaram.
Eu não esperei por uma resposta. Apenas me virei e caminhei para longe, sentindo meu coração bater desenfreado.
Atrás de mim, ouvi Karev praguejar baixinho.
E então, ele disse algo que fez um arrepio percorrer minha espinha.
— Que porra está acontecendo comigo?
Ele sentiu.
Ele sempre soube.
Ele só não entendia o que era.
Mas agora, não havia mais volta.