Capítulo 01
O Príncipe Adormecido
Rafique Al-Nahyan não era apenas um nome que ecoava pelos salões de mármore do palácio real em Dubai; ele era a tempestade encantadora que incendiava as noites douradas da cidade. Aos 25 anos, o jovem príncipe era o reflexo mais puro da primeira união do grande sheik Al-Hassan com a princesa Annia Al Salim, herdeira direta de uma linhagem nobre e extremamente devota. Isso tornava Rafique o mais respeitado dos filhos do sheik, o único de sangue totalmente puro e, por isso mesmo, herdeiro natural dos títulos e do poder do pai nos Reinos Unidos de Dubai.
Era difícil saber se ele era mais conhecido pelos discursos brilhantes nas conferências econômicas ou pelas madrugadas em iates privados no Golfo Pérsico, regadas a Dom Pérignon, neon e música eletrônica importada de Ibiza. Rafique era tudo o que um herdeiro do trono moderno deveria ser: culto, bilíngue, estrategista, mas também imprevisível, indomável e perigosamente sedutor.
Durante o dia, era comum vê-lo nas pistas de tênis do clube privado de Palm Jumeirah, onde ele derrotava os executivos ocidentais com uma facilidade irritante. À tarde, cavalgava em silêncio no deserto com seu puro-sangue árabe, Azure, um animal tão indomável quanto seu dono. À noite? Ah, à noite, ele se tornava lenda.
Enquanto o sol ainda dourava as areias do deserto, Rafique se preparava para mais uma noite entre os salões iluminados de ouro e cristais, onde apenas os filhos dos mais ricos, líderes políticos e jovens príncipes tinham acesso. A festa era exclusiva, organizada por um magnata do petróleo aliado da família.
Vestia um traje preto de corte impecável; seu relógio Rolex cintilava como os olhos das mulheres que sempre o esperavam com desejos não ditos.
O salão reluzia. Lá estava Rafique, rindo alto, brindando com champanhe francês, mesmo sem beber muito. Seu estilo era aproveitar o momento, mas sempre com os olhos atentos um negociador em potencial, um líder que, mesmo nas festas, era cortejado por empresários. Um jovem que, mesmo nobre, já pensava em novas rotas comerciais, formas de digitalizar os negócios da família e impulsionar a expansão do império Al-Nahyan Salim.
— É assim que se conquista um império moderno — dizia ele.
A um amigo de infância, sobrinho de um embaixador, enquanto indicava no celular um projeto para transformar parte do deserto em campos de energia solar.
No entanto, a verdadeira essência de Rafique se revelava nos momentos mais íntimos, como aquele jantar tradicional, onde os homens da família comiam separados das mulheres, num grande salão circular coberto de tapeçarias vermelhas e talheres de ouro.
O sheik Al-Hassan, homem imponente de olhos escuros e olhar firme, estava à cabeceira. Ao seu lado, Rafique, com seu semblante de quem sempre tinha algo a dizer.
— Rafique. — o sheik começou, rompendo o burburinho de conversas entre primos e irmãos, fazendo-se ouvir.
— Sim, pai.
— Escute, filho, está na hora de pensarmos em seu futuro. A cidade te ama, o povo te admira, e os conselheiros não escondem que esperam sua liderança. Então, está na hora: você precisa de uma esposa. Uma mulher digna de sua linhagem. Para dar início à sua descendência e seguir com sangue forte e puro que você carrega.
Rafique sorriu com leveza, pousando os dedos sobre a taça de prata.
— Com todo respeito, grande Sheik e meu pai... — fez uma pausa. — Eu ainda tenho 25 anos. Pela tradição, sou livre até os 30. A não ser que o senhor queira me transformar em um velho como Tariq, casado antes de aprender a seduzir uma mulher.
Os homens ao redor riram contidos. O próprio Tariq, o segundo filho, fez uma careta. Mas dentro dele, sendo filho da segunda esposa do Sheik Hassan, odiava o irmão por ele sempre demonstrar que era herdeiro principal e por isso podia decidir seu destino.
— Pelo menos eu tenho estabilidade, Rafique. Diferente de você, que vive como Salomão entre os corpos das filhas do deserto. — rebateu o irmão, sarcástico.
— Salomão teve mil mulheres e ainda foi considerado sábio. — retrucou Rafique, arrancando gargalhadas. — Eu ainda estou longe disso, mas me envaidece ser um homem como ele.
O sheik Al-Hassan apertou os lábios, mas, no fundo, havia orgulho. A arrogância do filho mais velho era diferente: ela vinha do saber, do charme inato que herdara de Annia, sua primeira esposa. Aquela mulher foi uma promessa feita entre duas famílias nobres e, ela, foi o resgate do poder total para Hassan, porém ao cumprir seu dever ao dar-lhe um herdeiro, Annia pediu algo incomum: liberdade. Desde então, vivia em um palácio moderno e reservado, mergulhada na fé, distante das intrigas e dos luxos supérfluos do poder.
Mais tarde, naquela mesma semana, Rafique dirigiu ele mesmo até a mansão da mãe, localizada nos arredores do deserto, uma construção clara com jardins interiores e fontes límpidas.
Annia, com seu véu dourado e olhar sereno, recebia o filho como sempre fazia: com um beijo na testa e um abraço demorado.
— Vim ver minha rainha. Ouvi boatos de que está tramando minha prisão…?
Annia olhou séria para o filho e mudou de assunto.
— Já não estás cansado de encantar as filhas das cortes estrangeiras, meu filho? — brincou ela, servindo chá de jasmim em porcelana fina.
— O que posso fazer, se todas querem um beijo meu? — respondeu ele, sentando-se aos pés dela como quando era menino.
Ela riu com delicadeza, acariciando-lhe o rosto com os dedos finos.
— Seu pai está certo. — ela disse com doçura. — Você deve escolher uma mulher adequada, que lhe dê um herdeiro e caminhe ao seu lado. Depois disso, poderás voar como quiser. A liberdade verdadeira vem após o dever cumprido.
Ele suspirou, levantou e sentando-se no divã ao lado dela.
— Mãe, a liberdade eu já tenho. Eu a construí. Mesmo no palácio, mesmo entre os muros da tradição.
— Liberdade verdadeira, meu filho, é saber o tempo de agir... e o tempo de esperar. — respondeu ela, com serenidade.
Rafique a olhou com carinho.
— Mas eu já sou livre, mãe. Sou filho da princesa de Al Salim, lembra? A senhora mesma me ensinou a não aceitar prisões que não escolhi.
Annia sorriu, tocando-lhe o rosto.
— Ainda assim, honra a sua linhagem primeiro, rapaz. E serás mais livre que qualquer um.
Sorrindo com charme para não desagradar a mãe, ele se foi, como gostava veloz pela estrada do deserto.
No dia seguinte, Rafique estava de volta ao centro comercial do império Al-Nahyan Salim. Participava de uma reunião com os diretores das holdings da família. Apresentava ideias ousadas: investir em tecnologia blockchain para rastrear exportações de diamantes; implementar inteligência artificial nos campos de extração de gás natural; e criar um fundo de investimento para jovens empreendedores dos Emirados Árabes Unidos.
— Vamos deixar de ser apenas herdeiros. — disse ele, convicto. — Vamos ser os criadores e donos do nosso próprio destino com prosperidade.
O sheik Al-Hassan assistia de longe, fingindo indiferença, mas com o coração pleno. Seu filho, apesar da rebeldia, era uma força natural. Um homem que não apenas estava pronto para o poder, o poder nascera nele.
E enquanto os olhos de todos ainda o viam como o príncipe festeiro, Rafique já era, aos poucos, o arquiteto de um novo reino, o seu próprio.
À noite, em meio às luzes douradas de um salão majestoso, decorado com tapeçarias ancestrais e colunas em mármore branco, Rafique surgia vestindo túnica de seda marfim com detalhes em dourado. Ao redor, uma seleta elite da região brindava sua chegada com sorrisos discretos e referências respeitosas. Naquela noite, ele era o convidado principal de um encontro entre os grandes magnatas do petróleo e os novos investidores tecnológicos do Emirado. Era ali que ele brilhava. Inteligente, articulado e irreverente, conquistava com sua oratória firme e sua ousadia jovial.
— Dubai é o centro do mundo, todos estão de acordo! — disse cheio de arrogância.
Finalizando um discurso, risadas foram ouvidas, seguidas de aplausos em concordância do salão repleto de poderosos de todo o mundo.
Era impossível ignorá-lo: o brilho nos olhos, a segurança nos passos, o charme inato. Mas nenhum escândalo o acompanhava. Era livre, mas não leviano. Era intenso, mas não vulgar. Seu nome era temido entre os rivais e desejado pelas mulheres. Mas o trono exigia mais. E ele naquela noite só queria se divertir.
O local da festa era requintado, candelabros de cristal marroquino pendiam sobre tapetes persas originais, e garçons vestindo branco distribuía taças de champanhe artesanal.
Foi lá que ele a viu.
Calista era uma exímia dançarina de origem desconhecida que roubava olhares com sua beleza hipnotizante. Era uma espécie de bruxa dos tempos modernos, com seus jogos de cartas, adivinhações e algum feitiço escondido no decote do sutiã. Ela definitivamente não era como as outras.
Havia mistério em seu sorriso. Ele a tirou para dançar uma dança lenta, quente, quase proibida para a cultura local. Ela sussurrava em francês no ouvido dele, e ele sorria com aquela calma arrogante de quem sabe que pode ter qualquer mulher que quiser. Mas, após vê-la de tão de perto, perdeu o interesse.
— Você dança como se fosse o rei do mundo... e talvez seja. Você não é o príncipe de ouro de Dubai? — ela disse, convicta.
Cheia de interesse, mas como ele já não a queria mais, por algum motivo que o alertou no próprio íntimo devido a proteção das orações fervorosas de sua mãe, ele a despistou, saindo sem se importar.
Calista ficou furiosa e lançou seu maior feitiço para derrubar aquele arrogante que a ignorou. Ela havia planejado dormir com ele entre lençóis de seda negra como parte de um plano diabólico de um inimigo secreto dele. Ainda não acreditava que havia perdido o príncipe de ouro, mas a verdade é que ele não a quis. Então, rubra de ódio pela riqueza que perderia do seu serviço não concluído, ela ainda o amaldiçoou.
Autora: Graciliane Guimarães