Na véspera de sua partida para o exterior, Naiara foi até a igreja católica mais antiga da cidade.
Desde o aborto espontâneo, todas as noites ela sonhava com um bebê coberto de sangue chorando para ela.
Por isso, ela entrou em contato com um padre, pedindo para realizar uma missa de descanso para o espírito do bebê.
No entanto, assim que entrou na igreja, viu um homem alto ajoelhado bem em frente ao altar.
Aquela silhueta lhe era mais do que familiar.
— Vocês ouviram? Dizem que o Sr. Afonso está com o coração aflito porque sua amada está gravemente doente. Para conseguir um medalhão sagrado para ela, ele subiu da base da montanha até aqui, ajoelhando-se a cada passo...
— No último trecho, o caminho era tão íngreme que ele quase caiu do penhasco, por pouco não perdeu a vida!
Os sussurros dos fiéis chegavam aos ouvidos de Naiara aos poucos.
Ela parou de repente.
Na direção do seu olhar, o braço do homem estava enfaixado, e o ferimento ainda sangrava levemente.
Naiara se lembrou de que Afonso sempre fora um ateu convicto.
Ele nunca entrava em igrejas, não mantinha nenhuma imagem sagrada em casa.
No sorteio do distintivo de bênção na festa de Natal da empresa, ele nem olhou e logo deu para a secretária.
Até mesmo quando ela quis ir ao cemitério visitar o túmulo da mãe, ele apenas apagou o cigarro com indiferença e disse calmamente:
— Quando alguém morre, tudo acaba. Não importa quantas flores ou velas se ofereçam, é só para aliviar a consciência dos vivos.
E, naquele momento, ele estava ajoelhado diante do altar solene, a testa tocando levemente o frio piso de mármore, com uma devoção quase submissa.
Naiara esboçou um leve sorriso de amargura, sentindo uma onda de ironia amarga no peito.
Afinal, Afonso não desprezava a fé.
Ele apenas nunca tivera alguém por quem estivesse disposto a se curvar.
......
Quando Naiara saiu da igreja, já estava quase anoitecendo.
O vento no vale estava um pouco frio.
Ela apertou o casaco ao corpo.
Estava prestes a descer os degraus de pedra quando uma sombra negra saltou repentinamente da floresta à sua frente!
O movimento foi tão rápido que Naiara não teve tempo nem de gritar, sendo imediatamente tapada na boca e no nariz, e logo perdeu a consciência.
Ao reabrir os olhos, ela estava sentada, apoiada em uma grande árvore, enquanto alguns socorristas corriam apressados com uma maca em direção ao penhasco.
— Depressa, o ferido está lá embaixo do penhasco!
Naiara se apoiou nos braços e se levantou cambaleando.
Antes que pudesse entender o que estava acontecendo, uma figura alta se aproximou, trazendo consigo um vento gelado.
— Naiara, eu pensei que você tinha amaldiçoado Catarina só por despeito, mas não imaginei que realmente a empurraria do penhasco! — Afonso, com a mão de dedos longos e definidos, apertou o pescoço dela, empurrando-a com força contra a árvore atrás de si. — Ainda bem que Catarina teve sorte e caiu sobre uma pedra, senão eu faria você pagar com a própria vida!
Naiara ficou sem ar.
Ao encarar o olhar sombrio de Afonso, compreendeu tudo de imediato.
Ela conseguiu soltar a voz com esforço:
— Eu... não...
— Ainda quer negar? Você e Catarina estavam aqui ao mesmo tempo, e agora ela está lá embaixo do penhasco — Afonso disse, com a voz gélida. — Naiara, me diga: como pode haver tanta coincidência assim no mundo?
Naiara agarrou a mão de Afonso, a respiração cada vez mais difícil.
Quando já estava prestes a desmaiar, o assistente apareceu correndo, ofegante:
— Sr. Afonso, conseguiram resgatar a Srta. Catarina!
Ao ouvir isso, Afonso soltou Naiara rapidamente e correu na direção de Catarina.
Naiara se curvou, tossindo forte.
Com os olhos embaçados pelas lágrimas, viu Catarina na maca agarrar a manga de Afonso, assustada:
— Afonso, estou com medo...
Afonso apertou a mão dela e disse com voz firme:
— Enquanto eu estiver aqui, ninguém poderá te machucar.
Com muito cuidado, ele ajudou Catarina a entrar na ambulância e, em seguida, disse algo ao assistente.
No instante seguinte, o assistente voltou para junto de Naiara, segurou seu pulso e falou:
— Senhorita, desculpe a ousadia.
Logo depois, ele a arrastou à força até a beirada do penhasco e a empurrou!
Com uma sensação intensa de queda livre, Naiara despencou sobre uma pedra, sentindo uma dor lancinante nos ossos.
Lá do alto, o assistente declarou friamente:
— O Sr. Afonso disse que você passou dos limites desta vez. Esta é a punição, para que você também sinta a dor da Srta. Catarina.
Os passos se afastaram e Naiara ficou sozinha.
A dor por todo o corpo era insuportável. Ela tentou subir várias vezes, mas sempre falhou.
Encolhida entre as pedras frias, o desespero tomou conta de Naiara como uma maré.
Ela queria perguntar a Afonso: Catarina quase morreu, que motivo teria para machucá-la?
Mas, mais gelada que o vento da montanha, era a resposta que já conhecia.
No coração de Afonso, ela jamais se compararia a Catarina.
E ele nunca acreditaria nela.
......
Sem sinal de celular na montanha, Naiara sabia que não podia mais ficar parada. Forçou-se a se levantar.
As unhas cravaram nas fendas das pedras, as palmas sangraram.
Ela caiu incontáveis vezes, mas tentou subir outras tantas.
Assim, repetidas vezes, até que seu corpo ficou ensanguentado, Naiara finalmente conseguiu subir.
O teleférico já estava fora de operação, então ela desceu a montanha cambaleando, com o corpo machucado.
Quando chegou em casa, o dia já estava clareando.
Com esforço, limpou seus ferimentos e desabou na cama, adormecendo.
Entre o sono e a vigília, a porta do quarto foi escancarada de repente.
No instante seguinte, ela foi erguida de uma vez e jogada sobre o chão frio.