Noite.
O mordomo esperou até que todos na mansão estivessem dormindo e caminhou até a garagem.
Antes mesmo de se aproximar do carro, um odor insuportável invadiu suas narinas.
Quanto mais avançava, pior ficava.
No chão, um líquido escuro e viscoso já começava a se mover.
Vermes rastejavam por entre as frestas do porta-malas.
Um pressentimento horrível lhe subiu à cabeça.
Meu espírito se colocou na frente dele.
— Volta.
Minha voz foi firme.
— Não olha. Vai se arrepender. Nunca mais vai conseguir comer na vida.
O mordomo sempre foi um homem bom.
Tentou interceder por mim antes…
Mas era um empregado e precisava daquele trabalho. Não podia fazer nada.
Por um instante, hesitou.
Depois, deu alguns passos para trás e virou as costas. Se foi, sem olhar para trás.
Manhã seguinte.
O dia amanheceu, e meu pai estava de ótimo humor.
Depois do café da manhã, pegou um presente cuidadosamente embrulhado.
Esperou o momento certo e, quando Mafalda não estava prestando atenção, colocou a caixa diante dela.
— Mafalda, feliz aniversário.
— Olha seu presente.
Os olhos dela brilharam de empolgação.
— Obrigada, papai!
Ela rasgou o papel ansiosamente.
Dentro, uma chave de carro.
Um modelo muito mais caro e luxuoso que o meu.
— O carro da Taiane já estava velho. Você merece algo novo, não um veículo de segunda mão. Escolhi esse para você. Veja se gosta.
Mafalda pegou a chave, sorrindo satisfeita.
— Eu adorei!
O mordomo se aproximou.
Parecia… contido.
— Senhor… — Sua voz soou tensa.
— Acho que já está na hora de soltar a senhorita Taiane.
A expressão do meu pai se fechou.
— Você está falando demais.
O mordomo não recuou.
Engoliu em seco.
— Senhor, hoje já faz oito dias. Com esse calor… qualquer um teria sucumbido.
Ele já sabia.
O cheiro de ontem disse tudo.
Agora, sabia que ali perto, a poucos metros…
… havia um cadáver em decomposição.
E só de pensar nisso…
A bile subiu em sua garganta.
— Sim, Taiane com certeza já refletiu sobre seus erros. Solte-a logo.
Mafalda sorriu, angelical.
Meu pai, ao ouvi-la, amoleceu imediatamente.
— Está bem. Vou perdoá-la.
Fez uma pausa.
— Mas assim que sair, cancelo todos os cartões dela. Ela que vá trabalhar e ganhar o próprio dinheiro. Não criei uma filha tão venenosa.
Que piada absurda.
Ele só tinha o que tinha por causa da minha mãe.
Se tirassem o título de pai, ele não passaria de um pobre diabo volúvel e ingrato.
Nesse momento, era mais do que isso.
Era um assassino.
O mordomo obedeceu a ordem imediatamente.
Juntou alguns empregados e correram para a garagem.
O cheiro que antes já era ruim, agora era insuportável.
Todos taparam os narizes e alguns, incapazes de suportar, vomitaram ali mesmo.
— Que diabo de cheiro é esse?!
— Puta merda, isso não é normal!
Meu pai e Adriana vieram por último.
Mesmo incomodados com o odor, torceram o nariz de nojo.
Mas ao ver os empregados perdendo o controle na frente deles, sua arrogância entrou em cena.
— Parem com essa gritaria! Que falta de postura é essa?!
O olhar frio e impaciente.
— Isso deve estar vindo da Taiane.
— Presa aí dentro por tantos dias, sem banho, sem escovar os dentes, sem banheiro… óbvio que estaria fedendo.
— Depois que ela sair, joguem esse carro fora. Não quero mais ver essa coisa no meu caminho.
Os empregados se entreolharam.
O pavor subindo.
Meu pai estreitou os olhos.
— Abram logo essa merda! Ou estão todos demitidos!
Os empregados se enrijeceram.
E então, com mãos trêmulas, foram até o porta-malas.
O abriram.
E sob a luz fraca da garagem subterrânea…
… dentro do carro rosa brilhante…
… jaziam os restos apodrecidos de um cadáver.