Inês
Inês
Por: ABDENAL CARVALHO
Capítulo 1 - O Maior Sonho

Ela nasceu numa pequena tribo localizada a alguns quilômetros de Luanda, na Angola, no Continente Sul Africano. Apesar de serem um povo miserável, com escassez de tudo, mesmo assim ainda encontrava forças para sobreviver a tantas desgraças e ao mesmo tempo sorrir, brincar com as outras crianças e acreditar em dias melhores para suas vidas.

   Seu maior sonho era poder um dia sair da sua tribo e seguir após outros caminhos, ir bem longe e deixar aquela vida de extrema pobreza para trás, estudar e chegar no ponto mais alto possível de suas conquistas, deixando de ser vista apenas como uma menina pobre da pele escura e ter o respeito que acreditava merecer, apesar de suas origens.

   Igual a todos os outros que ali nasceram e cresceram nunca havia ido além das estreitas fronteiras do povoado onde habitava com seus pais e os seis irmãos mais velhos, mas sonhava conhecer o Brasil.

 Um lugar onde diziam ser lindo em todos os sentidos e possuir uma natureza belíssima. Seus pais eram descendentes dos antigos escravos e faziam muitos elogios sobre aquele país, mesmo que no passado seu povo tivesse sido martirizado em terras brasileiras diziam que não foram os brasileiros e sim os portugueses quem os escravizaram.

Os mesmos que depois da abolição da escravatura ocorrida em 13 de maio de 1888 passaram a habitar em vários Estados, principalmente na Bahia e no Maranhão. Seus avós paternos residiram por um bom tempo na cidade de Santa Inês, depois regressaram de volta a África à procura de familiares e nunca mais quiseram retornar ao Brasil.

 Porém ADOWA, seu pai, era saudoso de seus tempos de criança daquele lugar. Ele amava tomar banho de cachoeira, pescar e nadar nos riachos que existiam por lá. Daí ter recebido o nome Maria Inês em homenagem à padroeira da primeira cidade que os antigos escravos habitaram após receberem a liberdade. Ela era a única mulher entre tantos homens em sua Casa e bastante inteligente, trazia dentro de si a certeza de que muito em breve realizaria seus sonhos, onde um deles seria se tornar uma pessoa muito rica, influente e tomaria banho nas águas dos mares e rios brasileiros.

Sua vida era uma completa rotina, acordava todas as manhãs e ajudava sua mãe a preparar bolinhos do fubá de milho, uns doces e outros salgados, que após assados num forno feito de barro e aquecido à base de lenha seca eram vendidos para vender na feira ou pelas ruas do pequeno vilarejo.

A menina pobre, negra, de cabelos rebeldes e sem nenhum tratamento adequado, saia com um tabuleiro sobre a cabeça, contendo uma vasilha feita de alumínio antigo e em grande parte amassado, onde guardava as guloseimas. Enquanto caminhava gritava bem alto, anunciando sua venda afim de chamar a atenção de possíveis clientes.

 No final de cada manhã retornava para casa com algumas moedas e repassava para a mãe que comprava o que lhes iria saciar a fome. Seus irmãos ajudavam o pai como podiam, fazendo trabalhos braçais aqui e ali, recebendo algumas migalhas por seus serviços prestados na cidade mais próxima, localizada cerca de uns dez quilômetros da aldeia onde moravam.

 Passavam a semana inteira por lá e faziam de tudo um pouco. Catavam lixo, limpavam quintais, pintavam casas, serviam até de mula ao transportar as bagagens de alguns turistas no terminal de ônibus. Infelizmente não era possível fazer esse tipo de trabalho no aeroporto.

 Eram impedidos pelos seguranças. Alegavam que era pelo fato deles não estarem vestidos adequadamente para atuarem no local, mas todos sabiam que era pelo fato de eles serem pobres e negros.

Como eram pessoas muito necessitadas possuíam uma aparência horrível e sem dúvida passariam má impressão aos passageiros que por ali circulassem. Como era muito distante eles só retornavam para casa aos finais de semana, trazendo nos bolsos tudo aquilo que ganhavam e enquanto isso as duas sobreviviam como podiam.

Sua mãe chamava-se ABEBA, que significa Flor no seu idioma arcaico. Ela era oriunda da Etiópia e foi trazida por seus avós para a aldeia ainda pequena, onde cresceu e se estabilizou naquela região da África, formando ali sua grande família. A negra velha de pele cinzenta nada possuía da beleza de uma flor por viver décadas a fio sob a opressão da miséria que dominava aquele lugar amaldiçoado por Deus.

O pai chamava-se ADOWA, cujo significado é Nobreza. Ele de fato fazia jus ao nome que lhe foi atribuído, pois era um homem calmo, paciente, humilde e demonstrava um ar de gentileza enorme no trato com as pessoas.

Apesar de nunca ter ido à escola mesmo assim era um exemplo de nobreza, sentia orgulho de ser sua filha. Interessante é que nenhum de seus irmãos herdaram essas características do pai, eram todos uns brutamontes.

Na tribo onde nasceu todos a conheciam e era muito popular entre os moradores, por onde passava recebia o carinho dos vizinhos que admiravam seus esforços diários ao lado de ABEBA que era uma verdadeira guerreira na criação dos filhos e no sustento do lar, onde mesmo sob o castigo da pobreza tentava sobreviver como podia em companhia de ADOWA, seu esposo.

Entretanto, seu principal objetivo não seria seguir o exemplo da mãe e se tornar mais uma mulher casada com um africano sem futuro e envelhecer naquele vilarejo cheia de filhos. Guardava no seu coração sonhos bem maiores do que estes, vislumbrava na sua mente um futuro maior e melhor, superior àquela forma de vida que tantas outras de sua tribo escolheram.

Sonhava ter em breve a oportunidade de sair daquele lugar, ir para algum outro país menos miserável onde teria a chance de estudar e se tornar alguém importante, poder retirar sua família daquela situação deprimente. Aquela menina de pele escura e cabelos rebeldes sequer imaginava que muito em breve seus planos iriam se realizar.

 Pois lá de cima alguém percebeu seu desejo imenso de mudança e a insistente busca pela transformação em todas as áreas de sua triste existência foi ouvida, tudo aconteceria de forma tão intensa que nem mesmo ela acreditaria.

A história de Maria Inês, uma africana que viveu a infância e parte de sua adolescência morando num velho barraco de madeiras, comendo raízes de paus e vendendo bolos do fubá de milho pelas ruas afim de ajudar no sustento de casa seria surpreendente. Brevemente experimentaria o luxo e conforto da cidade grande, depois de chegar no topo de grandes conquistas.

— Então ficamos assim, viajarei pra cidade à procura de trabalho e vocês duas deem um jeito de conseguir algo para comer até que eu e os meninos voltemos com alguma coisa que arranjaremos por lá. Inês eu conto com você, obedeça e ajude sua mãe em tudo, não seja teimosa

— Nossa papai, e desde quando fui rebelde com vocês?

— É só jeito de falar, minha filha, comporte-se

— Tá bem, vão em paz

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