– Eu vim pegar as cartas de minha avó, Claire Wright-Jones.
Eu fiquei olhando pra cara dele, ainda sem acreditar direito.
– Você... Você é neto dela! Da Claire!Eu li e reli aquelas cartas tantas vezes que me sentia próxima a eles, Claire e Ronald. Era como se eu participasse da história deles, um personagem que estava ali, um coadjuvante apenas observando.
– Sim, Christian Wright-Jones. – disse sério estendendo a mão e eu aceitei.– Muito prazer.Seu aperto era firme e sua mão estava um pouco gelada. Era uma mão forte, de quem estava acostumado a trabalhar duro.
– Ah, por favor, entre, fique a vontade.Dei passagem e ele entrou, Chase pulou em cima do homem e eu corri pra tirá-lo.
– Ah me desculpa! Chase sai! Ele é sociável, às vezes até demais. Chase!– Tudo bem, eu gosto de cães.Então ele sorriu, um sorriso que iluminou sua face enquanto brincava com o meu cachorro. Não podia imaginar uma cena mais encantadora, um homem daquele tamanho, com aquele jeito intimidador se derretendo por um cão.
– Me desculpe. – pediu sem graça ao ver que eu o observava.– Tudo bem, não tem problema. Vamos até a sala.Christian me seguiu e quando me virei, ele estava olhando ao redor.
– Fazia tempo que eu não vinha aqui.– Não foi de vocês que eu comprei ela? – perguntei interessada e indicando o sofá para ele sentar.– Obrigado. Não, nós a vendemos há dois anos mais ou menos, quando minha avó precisou de cuidados especiais. Meu pai ficou surpreso quando a corretora da imobiliária entrou em contato com ele falando a respeito de cartas antigas.– Seu pai, o filho de Claire e Ronald. Então o sonho dele estava certo, foi um menino.– Como?– Na última carta enviada por seu avô, ele dizia que havia sonhado que o filho era um menino, e ele acertou.– A senhorita leu as cartas? – sua pergunta me pareceu ao mesmo tempo uma reprimenda.– Sim, eu não sabia do que se tratava e acabei lendo uma delas. Fiquei apaixonada pela história deles e não pude resistir em continuar.– Está com elas agora? As cartas?– Sim, é claro. Eu vou pegá-las. Espere um momento.Subi a escada correndo pra ir pegá-las na minha bolsa. Eu mal podia acreditar que isso estava acontecendo! Eu tinha tantas perguntas a fazer! Betthany já tinha levantado e usava o banheiro no final do corredor.
Desci devagar e o vi mais uma vez brincando com Chase. Ele era um homem bonito, pra ser sincera, lindo. Difícil encontrar um cara como esse por aí.
– Pronto, estão aqui.Entreguei-lhe as cartas e ele ficou olhando com veneração, como se fosse um tesouro.
– Minha avó achou que as tinha perdido na mudança. – a voz dele estava um pouco emocionada.– Desculpe, mas não posso resistir em fazer essa pergunta, como ela está? A Claire.Ele ergueu o olhar me encarando e por um segundo pude ver uma centelha de dor em suas íris azuis.
– Minha avó morreu senhorita Marshall, há quase um ano.Foi difícil descrever o que eu senti naquele momento, mas a primeira sensação que me tomou foi a da perda. Ela estava... Morta? Eu imaginei tantas vezes em conhecê-la, falar sobre a sua história, mas isso agora é impossível porque ela está morta.
Meus olhos ficaram marejados e uma imensa vontade de chorar me tomou.
– A senhorita está bem? – Christian perguntou preocupado e eu assenti.– Sim... Só preciso de... Um minuto... – levantei e fui até a cozinha inspirando fundo várias vezes.Eu fiquei tão envolvida na história que é como se eu a conhecesse pessoalmente. É doloroso pra mim saber que esse encontro nunca vai acontecer.
– Se eu puder ajudá-la em algo...Virei-me e ele estava em pé à porta da cozinha me olhando.
– Você deve estar me achando uma louca, pra dizer o mínimo.Ele sorriu de canto e se aproximou apoiando as mãos na mesa.
– Na verdade não, minha avó costumava causar esse efeito nas pessoas.– Pode me falar um pouco mais dela? – pedi com simplicidade e ele levou a mão à nuca coçando os cabelos. – Na verdade senhorita Marshall, eu preciso ir buscar minha filha.– É claro, eu não quero atrapalhar. – falei tentando disfarçar a pitada de desapontamento na voz, ele era casado. Apesar de não usar uma aliança, constatei isso observando suas mãos enquanto seguravam o encosto da cadeira.– Bom dia. – Betty apareceu na porta olhando de um para o outro com uma expressão curiosa.– Bom dia querida, esse é Christian Wright-Jones, ele é neto da dona das cartas.– Ah sim. – minha irmã sorriu simpática e se aproximou dele estendendo a mão. – Eu sou Betthany, irmã da Jessie, muito prazer.– Olá.Ele sorriu encantador e minha irmã só faltou se derreter por aquele sorriso, por que pra mim ele não sorriu assim quando se apresentou?
– Foi um prazer conhecê-las, mas eu preciso ir.– Não quer tomar um café? Eu faço rapidinho. – ofereci.– Não é necessário.– Por favor, só uma xícara. – Betty pediu sorrindo meiga. – O café que a Jessie faz é uma delícia.Ele olhou pra mim e depois pra minha irmã e sorriu.
– Nesse caso, eu aceito sim.– Eu vou a padaria comprar pãezinhos de queijo bem quentinhos, eu já volto.– Não precisa... – Christian ia dizendo, mas ela o interrompeu sorrindo.– Ah eu faço questão, o senhor tem que provar os pães de queijo da melhor padaria de Bayside, eu não demoro.– Leva o Chase com você. – falei me segurando pra não rir, e ela me respondeu já fechando a porta.– Pode deixar!Voltei a olhar para o meu visitante que parecia encabulado.
– Vai ser rápido. Fique a vontade.Ele assentiu com um sorriso e puxou uma cadeira pra sentar enquanto eu fui até o armário pegar o pó de café. Vi meu reflexo na porta de vidro e só então me toquei que ainda estava de robe e com os cabelos levemente bagunçados, agora já foi.
Virei-me e ele estava lendo uma das cartas, parecia concentrado. Então como se sentisse que eu o estava observando, ele ergueu o olhar e seus olhos azuis me encararam com intensidade.
– Senhor Wright-Jones, eu...– Por favor, me chame de Christian. – ele pediu gentilmente e eu assenti sorrindo.– Claro, me chame de Jessie.– Certo, Jessie.Ouvir aquela voz rouca chamando meu nome me parecia quase uma carícia. Foquei no que interessava e empurrei esses pensamentos para o fundo da minha mente.
– Christian, eu gostaria de fazer uma proposta a sua família.– Proposta? – ele arqueou uma sobrancelha ainda me encarando e assenti me aproximando da mesa.– Sim, eu acho que a história de amor dos seus avôs merece ser contada. Um amor tão puro, tão forte que sobreviveu aquela época, as pessoas precisam conhecer essa história e se encantar, exatamente como eu me encantei.– Onde exatamente você quer chegar? – Eu sou jornalista, trabalho na editora Wintrop que fica no Brooklyn e...– Eu sei onde fica. – ele me interrompeu levantando. – E conheço também a fama que ela tem, por gostar de escândalos.– Sim, nós temos uma revista voltada para a vida das celebridades, mas eu trabalho em outro setor, na revista Woman Entertainment. Voltada para o público feminino, suas opiniões, seus sonhos.– Não são do mesmo dono?– Sim, pertence ao mesmo dono, mas tem conteúdos completamente diferentes.Senti nele uma leve exaltação e cruzei os braços empinando o nariz demonstrando que ele não me intimidava.
– O que você quer Jessie? Seja sincera.– Quero a autorização de sua família para publicar as cartas de sua avó.Mandei na lata e seus olhos me encaravam, logo depois ele sorriu sarcástico e me senti ofendida com aquela atitude.
– Eu devia ter adivinhado, você é mais um daqueles urubus.– Urubus? – repeti chocada com aquele adjetivo. – Malditos repórteres que vivem de escândalos, espionando as pessoas e publicando sobre elas em suas malditas revistas!– Você está me ofendendo. – falei me segurando para não expulsá-lo da minha casa.– Sabe quando vai ter essa autorização Jéssica Marshall? Nunca. A história da minha família não é mais um dos seus casos que você quer expor para o mundo, procure outra carniça.Fechei as mãos com força cravando as unhas na carne.
– Saia da minha casa, agora!Surpreendi-me por minha voz estar calma, quando na verdade queria estar gritando e jogando alguma coisa em sua cabeça dura e preconceituosa.
– Com prazer.Ele foi para a porta e eu fui atrás, com a mão na maçaneta, se virou e me encarou novamente, o olhar sério e as feições duras.
– Se eu ver essa história publicada em algum lugar, eu processo você sem pensar duas vezes.– Fora! – ordenei apontando para a rua e ele virou as costas saindo.Bati a porta com força e encostei à parede esfregando as mãos no rosto. Lágrimas de ódio me vieram aos olhos, não sei o que doía mais, os insultos que aquele arrogante me fez, ele ter negado a autorização ou saber que Claire estava morta. Acho que era uma mistura de tudo isso.
Voltei para a cozinha secando o rosto com a manga do robe e terminando meu café. Quando Betty e Chase chegaram minutos depois, eu estava sentada na cozinha tomando uma xícara.
– Desculpem a demora, a padaria tava cheia e... – ela olhou ao redor notando que eu estava sozinha. – Cadê ele? – Foi embora. – respondi simplesmente e ela se aproximou.– Como foi embora Jessie? O que houve?– Ele me chamou de urubu.– O que?!– Disse que todos os repórteres são urubus atrás da próxima carniça.– Que cara grosso! Não creio nisso!– E por último, que a história da família dele não é um caso para eu expor ao mundo, e que se visse qualquer coisa publicada relacionada ao clã Wright-Jones, eu seria processada.– Nossa irmã, sinto muito. Você queria tanto publicar essa história.– Pois é, mas a vida é assim. – levantei deixando a xícara na pia. – A gente tem que aprender a lidar com derrotas. Toma seu café que eu vou me arrumar, nós vamos ao mercado.Enquanto tomava banho, me permiti lembrar seu rosto quando ele se virou ainda parado a porta. Apesar de ser tão arrogante e preconceituoso, ele é um homem muito bonito. Talvez se não fosse casado, eu...
Não! Pare com isso Jessie! O homem pode ser lindo como um deus grego, mas é um grosso, um estúpido. Coisas que você abomina. E ter uma boa aparência não é suficiente, apesar daqueles olhos maravilhosamente azuis.
Saí do chuveiro tentando afastar esses pensamentos, tudo que eu não quero é me envolver com um homem desses. Espero nunca mais ver Christian Wright-Jones na minha frente de novo.