FOI APENAS UM BEIJO
FOI APENAS UM BEIJO
Por: Virginia Rocha
Capítulo 1: Habeas corpus

Ela chegou atrasada para uma despedida de solteiro que fariam no mesmo dia em que assinou o próprio divórcio. Ele a viu de relance. Toda de preto num vestido elegante e caro, poucas jóias além do relógio pequeno e de um designer famoso, mas que ele não sabia identificar dada a distância entre eles.

Ele sorriu para ela, mas ela nem percebeu. Caminhou rapidamente para a mesa onde as amigas estavam e se sentou apos pedir uma garrafa d'água com gás e um copo com gelo, hortelã e limão para disfarçar que não bebia.

Quando ela ficou sozinha na mesa enquanto as amigas corriam para dancar na pista de dança, foi um amigo do escritório de Willian quem indicou.

- Aposto que não consegue.

- Sabe muito bem que eu consigo qualquer uma.

- Sei não! Ela é muito elegante para sucumbir ao seu charme. Ela já deu um fora em três.

- Talvez esteja menstruada.

- Já está inventando história pro fracasso eminente? Vai ou não vai?

Willian virou o resto do whisky e foi até a mesa. Valentina ergueu os olhos meio sem vontade e riu quando deu de cara com ele, sentado diante dela com cara de predador.

- Ai, meu Deus! Você está velho! Você continua passando as noites bebendo e dormindo pouco?

- Nos conhecemos?

- Caramba! Você deve estar muito bêbado para se lembrar.

- Caramba, mulher. Eu nunca me esqueço de um rosto. Você deve ter ficado mais bonita desde a última vez que nos vimos.

- Ai, meu Deus! Você continua o mesmo cara metido a conquistar todas.

- Quanto tempo a gente não se vê?

- Sei lá! Uns quinze anos. Eu acho. Talvez menos. Você foi bem obediente e parou de me perseguir depois que me casei.

- Valentina Heloise Harper. Você foi a única que eu persegui por mais de um ano. Como vai a vida de casada?

- Encerrada.

- Uau! De volta ao jogo?

- Não tão rápido, Don Juan! Assim o divórcio hoje.

- O que foi? A filha mais gostosa do Juiz Harper vai entrar em quarentena?

- Não seja mal educado! Você pode ser um tremendo safado, mas deveria ser mais cortês.

- Quer conhecer o meu apartamento?

- Não! Aposto que você leva todas para lá.

- De jeito nenhum! No meu apartamento nem Sarah entra. Viu? Só levaria você.

- Safado! Hoje eu estou de luto.

- Caramba! Voce gostava mesmo daquele filho da puta? Ele é um tremendo de um imbecil.

- Luto pela minha virgindade mal usada.

- Está bebendo o que?

- Água com gás.

- Ninguém curte um luto bebendo água com gás, Valentina. Ei! Um whisky para mim e um martini...

- De jeito nenhum! Odeio martini.

- Tequila?

- O cheiro me enjoa.

- Mojito?

- Nunca tomei. Eu estou sozinha, Will. Eu não queria beber.

- Olha só, eu levo você para casa. Quer comer alguma coisa?

- Batatinha.

- Batatinha e uma torta de frango. Se ela gostar, traga outra. Conseguiu um filho?

- Não!

- Eu lhe disse para fugir comigo e deixar aquele fudido incompetente para trás.

- Acha que se eu tivesse fugido com você ainda estaríamos juntos?

- Claro! Cercados por belas crianças loiras e morenas. Desistiu dos bebês?

- Está doando algum?

- Aposto que consigo lhe engravidar em menos de um ano.

- Quer mesmo transar comigo?

- Transar? Nada disso, Valentina. Eu quero compromisso sério.

- Cara de pau! Nem um amasso?

- A gente pode entrar numa negociação.

- Sem vergonha, Willian! Senti a falta da sua cara de pau.

- Senti falta do seu beijo. Do seu cheiro... Só um beijo, Valentina?

- Tem muitas testemunhas...

- Você já assinou a porra do divórcio.

Valentina sorriu quando sentiu a boca dele se aproximando. Willian tinha um sorriso lindo e o seu perfume era melhor do que ela lembrava. Se não tivesse sido uma garota tão rigorosa com a sua reputação, poderia ter se divertido mais ao invés de se casar com alguém a quem pensava amar. O divórcio mostrou que não havia amor, mas uma conformidade.

Valentina sentiu as mãos dele a puxando cada vez para mais perto dele, criando um clima cheio de sensualidade, principalmente quando ele começou a se colocar entre as suas pernas.

De longe as amigas riam e aplaudiam sem parar sem que Valentina nem desconfiasse.

- Mojito, batatinhas e torta de frango. Whisky.

- Obrigada!

- Você vermelha.

- A culpa é sua.

- Caramba! O dia hoje foi perfeito.

- Perfeito?

- A Sarah está grávida, a vovó ja esta em casa, eu ganhei mais um caso e você, finalmente, está livre.

- Nunca achei que o meu fracasso lhe faria feliz.

- Eu sempre disse que eu amava você. Você nunca acreditou.

- É dificil acreditar quando você saía de um relacionamento para outro rapidamente.

- Eu era solteiro, Valentina. Eu só estava aproveitando com as erradas enquanto a certa não me assumia.

- Você nunca foi levado a sério por suas atitudes.

- Você nunca quis me assumir na frente dos seus pais.

- Claro! Você lembra como foi quando eu saí com você? Aquele monte de mulher se jogando em cima de você.

- Não é mais assim.

- Tenho as minhas dúvidas.

- Ainda sente ciúme de mim?

- Odeio isso, Willian!

- Ainda gosta de mim?

- Talvez.

Depois de meia hora ele pegou um táxi e foi embora para o seu apartamento bem localizado de frente ao mar em Ipanema. Mas primeiro a deixou em casa como o prometido a beijando na frente do portão da casa dos pais.

Em casa, tirou a roupa, foi ao banheiro fazer xixi e se deitou na cama pelado e sozinho.

- Sem condições para entrar em campo, amor. Adoro a sua compreensão.

Ele dormiu até o despertador mostrar que estava atrasado. Tomou um banho, vestiu-se, escovou os dentes, penteou os cabelos e ajeitava a gravata quando entrou no elevador.

Mal havia deixado o prédio onde morava e já se deparava com um engarrafamento enorme. Se tivesse um metrô descente no Rio de Janeiro, iria de metrô para o trabalho.

Olhou ao redor e encontrou um rosto conhecido no carro ao lado, o juiz Heitor Harper. Era um velho conhecido por ser rígido e ser pai de quatro filhas adoráveis que todo advogado que passou por ele sonhava em comer só para se vingar. Nunca entendeu o que aquela mulher linda e meiga viu nele. Talvez as filhas se parecessem com ela..

Provavelmente.

Na entrada do prédio onde trabalhava Willian se identificou depois de uma longa fila. A conversa com o porteiro sobre o engarrafamento e ele acabou contando sobre um acidente. Os dois homens lamentam o fato e é nessa hora que o amigo da noite anterior no bar, o Roberto, pergunta o que houve. Willian sorri.

- Sabia que é a filha do juiz Harper? Perguntou sorrindo.

- Sim. Sabia que ela se divorciou recentemente? Nós conversamos muito.

- Eu vi. Conversaram muito. Dormiu com ela?

- Acha mesmo que eu estaria aqui se tivesse dormido? O perfume dela me enlouquece. Ru a levei para a casa dela e fui para casa sozinho.

- Sabe que ela é doida para ter um bebê, nao sabe?

- Sim.

- Cuidado!

- Cuidado? Meus pais estão querendo netos. A minha mãe adora a Valentina. Passei todos esses anos ouvindo ela dizer que deixei escapar a garota perfeita.

- Eita! Vai encontrá-la quando?

- Eu estou meio enrolado esta semana.

- Ela vai vir me ver hoje a tarde. Tem algumas pendências no processo de divórcio dela. O cara está tentando voltar atrás.

- Me avisa quando ela chegar.

Não precisou chamar. Dava para ouvir os gritos de Valentina pelos corredores quando o advogado do marido tentou fazer um acordo para não continuar com o processo.

- Roberto, querido, pode me arranjar um notebook para colocar um vídeo para o advogado desse maluco assistir?

- Claro!

- Valentina, amor...

- Cala a boca! Eu não quero ouvir a sua voz ou eu juro que faço cópias das fotos que eu tenho e distribuo como cartao de Natal para a sua família.

- Valentina, aqui está o equipamento.

Valentina colocou os óculos, abriu o programa e pôs o seu pen drive com videos e algumas fotos. O advogado abriu a boca quando viu as atividades de seu cliente.

- Acha mesmo que vou continuar casada com ele? Eu deveria ter apresentado isso para o juiz. Roberto, quero anexe todo o conteúdo do pen drive ao processo. Eu nao vou criar o filho de um marido infiel com uma piranhazinha iludida.

- Você não pode ter filhos, Valentina!

- Sério? Vai usar isso para quê? Você traiu e eu pedi o divórcio. Acabou a reunião. Não haverá reconciliação. Passe muito bem.

- Valentina?

- Voce trabalha aqui?

- O escritório é do meu pai. Venha!

- Para onde vai me levar? Minha cabeça está estourando.

- Minha sala. Até você que acalmar.

Eles caminharam pelo corredor rapidamente e ele a fez sentar num sofá de três lugares que ele usava para dormir após o almoço. Ela estava tensa, falando sem parar, enquanto ele a olhava

- Fique calma! Esta tudo bem. Vou lhe levar para casa assim que eles forem embora.

- Não quero ir para a casa, Will. Eu não quero ver a cara de ninguém.

- Tudo bem.

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