Doce como Mel {5}

Sinto meu corpo ser acordado por vozes vindo lá debaixo, o que faz com que meu corpo acorde. Olho ao redor ainda grogue pelo sono, percebendo que estou completamente sozinha. Já escureceu, e são cerca de seis da noite de acordo com o relógio digital no armário logo na frente da cama. Me levanto da cama disposta a molhar a minha garganta, já que a mesma se encontra seca, e eu desço as escadas com o colar da minha mãe entre os meus dedos, lembrando dos acontecimentos de mais cedo. As vozes familiares aumentam e eu logo vejo Cristina, Tadeu e Benjamin na sala de jantar, todos conversando sobre algo bastante animado.

— Mel, como está se sentindo? — Cristina pergunta e todos levantam seu olhar, percebendo a minha presença.

Puxo uma cadeira à frente de Cristina na longa mesa de doze cadeiras e sorrio, me sentando.

— Estou me sentindo melhor, tudo o que eu precisava era de um banho, de algo para comer e dormir.

— Eu sabia que iria gostar daquele sanduíche. Foi eu que fiz. — Tadeu comenta todo orgulhoso e eu sorrio, lembrando que ele estava realmente saboroso em comparação aos sanduíches comuns.

— Meu Deus, nem parece que foi ontem que você se perdeu. Tudo está passando tão rápido na minha cabeça, daqui uns dias será o seu aniversário. — Cristina murmura pensativa e eu assinto, quando Benjamin olha para mim com curiosidade.

— Quantos anos vai fazer?

— Dezessete. — Respondo e ele quase se engasga com a sua bebida posta numa xícara de café.

Cristina esfrega as têmporas parecendo sem graça e desviando o seu olhar do meu, que é pura confusão para os dois. Mas o que está acontecendo?

— Ela só tem dezessete… — Ele murmura para si mesmo, ainda olhando para Cristina enquanto eu os observo intrigada.

Eu não vejo como a minha idade pode interferir nesse assunto de trabalho em relação a essa viagem. E eu mesma pensei que ele sabia da minha idade, já que mais cedo ele citou que não se interessaria por alguém tão nova como eu. Talvez pensasse que eu ao menos fosse maior de idade?

Ouço Tadeu limpar a garganta ao meu lado logo após se levantar da mesa com seu usual sorriso.

— Eu estava pensando em fazer uma sopa, mas não tenho certeza se irão gostar. O que acha de me ajudar, Mel? — Ele estende sua mão para mim e eu o encaro, tentando me decidir se devo ou não.

Volto a olhar para Benjamin que nesse momento encara Cristina com uma sobrancelha erguida, parecendo impaciente para falar algo. E é quando eu me decido que o melhor é deixar que eles conversem, mesmo que o assunto seja a minha idade. Seguro na mão de Tadeu deixando que ele me guie até a cozinha. Talvez por ser um trabalho importante ele não goste do fato de alguém tão nova estar ali para realizar o trabalho com eles. Talvez ele não acredite que alguém tão novo seja capaz desse trabalho. Mas se esse for o problema, eu vou mostrar a ele que eu sou muito mais do que capaz, ainda mais quando o assunto é pagar o tratamento de câncer da minha mãe.

Após isso, ambos fizemos a sopa, cortando os legumes e verduras. Não vou mentir que Tadeu tinha alguma noção do que estava fazendo. Ele parecia usar e cortar os legumes com bastante facilidade, e quando eu perguntei sobre o assunto ele respondeu que já teve o sonho de montar seu próprio restaurante, sendo um chefe de cozinha, mas seu sonho foi por água abaixo assim que seu pai morreu e ele teve que cuidar de sua empresa, deixando de lado suas aulas e práticas de cozinha. E foi quando eu parei para pensar sobre como eu poderia acabar igual a ele, deixando meus sonhos de lado por conta das exigências do meu pai. Eu não gostaria nada do que estaria fazendo, e imagina se as suas exigências vão além dos meus sonhos e sim na minha vida amorosa. Me obrigando a casar com um homem igual a ele.

Esse é algo que eu definitivamente…. Não quero para mim.

— Isso está muito bom. Eu acho que deveríamos nos juntar mais vezes na cozinha. — Tadeu comenta logo após experimentar da sopa, e eu sorrio saboreando a mesma, que me faz sentir saudade de quando era a minha mãe que me preparava.

— Se eu soubesse que você cozinhava tão bem, eu lhe chamaria para dormir lá em casa comigo toda vez que minha mãe viajava a trabalho. — Cristina murmura logo após um gemido de apreciação.

— Com como aprendeu a cozinhar? — Tadeu pergunta parecendo realmente curioso.

— Ah, eu sempre dividi momentos na cozinha com a minha mãe. — Murmuro tentando não olhar para Benjamin, mas eu sentia seus olhos diretamente a mim logo após ele experimentar e seus olhos brilharem.

E eu não vou mentir que fiquei satisfeita.

Após o jantar, nos juntamos todos na sala de estar para gastar um pouco do tempo já que nem mesmo eu me encontrava com sono, por ter dormido uma parte da tarde.

— Já estamos indo, já é muito tarde e eu sinto que preciso de um relaxamento; — Cristina murmura olhando de uma forma sugestiva para Tadeu, que somente sorri e se levanta do sofá junto com ela. — Vocês vão ficar por aqui? — Ela pergunta a mim e à Benjamin, que se encontra neste momento na poltrona da sala.

— Estou sem sono. — Respondo dando de ombros e ela assente, voltando o seu olhar para Tadeu.

— Vamos indo gatinho. — Ela entrelaça seus dedos nos deles.

— Boa noite para os dois. — Tadeu diz e logo vejo os dois subindo as escadas com Cristina parecendo realmente animada com algo.

Só nesse momento percebo que estou sozinha com Benjamin, sem termos absolutamente nada para conversar. Me levanto do sofá e me sento de frente à lareira, estendendo minhas mãos para aquecê-las.

— A sopa estava boa. — Ele comenta me surpreendendo, e eu viro meu rosto, me deparando com ele concentrado em um livro.

— Obrigada. — Limpo a minha garganta sentindo minhas bochechas corarem, enquanto busco na minha mente um assunto para que o silêncio não se torne algo estranho. — O que está lendo?

Seu olhar se levanta, se encontrando com o meu e um sorriso aparece no canto dos seus lábios.

— O Código da Vinci; — Seus olhos parecem me analisar e seu sorriso aumenta. — Mas não se encaixaria em seu gosto literário. — Ele dá de ombros voltando a encarar o livro em suas mãos, e é quando eu ergo a minha sobrancelha.

— Por acaso envolve crimes como assassinatos? Ele dá medo? — Questiono intrigada já que esse é o único tipo de livro que eu li uma única vez para nunca mais.

— Pode-se dizer que sim; — Ele murmura ainda concentrado em seu livro, e eu assinto, disposta a ficar calada e não o atrapalhar mais. — Não gosta de livros desse gênero? — Ele questiona levantando o seu olhar e eu dou de ombros.

— Coisas assustadoras não fazem o meu estilo. Gosto mais de romances com finais clichês. — Lanço-lhe um sorriso e ouço uma risada de zoação da sua parte.

— Típica filhinha de papai. — Ele comenta e eu franzo o meu cenho, surpresa por seu comentário, no qual me sinto um pouco ofendida.

— O quê?

— Não diria que é mimada. Mas é a típica filhinha de papai. Não sai debaixo das asas dos pais, precisa de autorização para tudo na sua vida. Não faz nada por si só. Age como se eles comandasse a sua vida. — Ele continua, dessa vez com um sorriso de canto em seus lábios.

— Eu não sou assim! — Retruco quando suas palavras parecem mais ásperas do que talvez ele quisesse passar.

Ele fecha o livro subitamente e eu arfo pelo susto. Ele se levanta pondo o livro na estante e então direciona o seu olhar para mim.

— Então me diz uma única coisa que fez sem precisar da autorização deles. Me diz… — Ele questiona dando alguns passos na minha direção.

— Eu… — Tento me lembrar de algum momento da minha vida que já fiz isso, mas nada vem na minha cabeça. — Eu só tenho os mesmos gostos que eles… — Murmuro baixinho como uma explicação que nem mesmo eu acredito.

Ele sorri ainda se aproximando, e logo agacha na minha frente, me encarando com sua sobrancelha erguida. Mordo meu lábio nervosa por sua aproximação, então sinto seus dedos tocarem a minha bochecha, logo pondo uma mecha do meu cabelo atrás da orelha. Eu não me movo, pois sua aproximação ainda me intimida. Então somente encaro suas íris escuras.

— Ruivinha… Dessa forma você me decepciona. — Ele murmura ainda encarando os meus olhos e é quando eu sinto um friozinho na barriga.

— Eu não sou filhinha de papai. — Sussurro numa forma de me defender, mas eu sinto o efeito da sua aproximação mexendo comigo.

— Não? — Ele questiona, mas dessa vez o seu olhar desceu até os meus lábios, enquanto eu sinto minhas bochechas esquentarem. — Então, prove.

Por alguns instantes o encaro hipnotizada, sem conseguir desviar o meu olhar das suas íris escuras, sua feição e sua barba. Seu rosto se aproxima do meu, e é quando eu me assusto e o afasto pelos ombros, me levantando logo em seguida.

— Eu não tenho que te provar absolutamente nada! Boa noite, eu vou dormir! — Exclamo me sentindo irritada ao lembrar de como me chamou agora há pouco.

Dou a volta, subindo as escadas o mais rápido que posso enquanto sinto uma onda elétrica atravessar o meu corpo. É quase como se eu estivesse a um passo de provar algo delicioso. Mas eu não vejo o porquê de eu me sentir assim, tão pouco entendo. Eu me senti ofendida por suas palavras, ele citou como se eu fosse apenas uma marionete.

Entro no quarto fechando a porta atrás de mim. Meus olhos se fecham quando eu me lembro do seu toque, que por mais que seja algo proibido me deixou com esse formigamento no corpo.

Eu não sei o que ele pretende comigo me tratando dessa forma, mas suas palavras… Deus! Talvez o que ele disse possa ser realmente a realidade em que vivo, e isso dói ainda mais quando penso dessa forma. Falta muito pouco para eu completar meus dezoito anos, e eu me pergunto se será a minha chance de poder fazer minhas escolhas por conta própria. Eu sempre vou respeitá-los, mas gostaria de fazer coisas na qual sinto vontade. Gostaria de poder passear por outros lugares e conhecer mais pessoas.

Mas a verdade é que ele jamais permitirá isso. Não enquanto eu continuar vivendo como sua marionete.

Me deito de costas na cama, sentindo a borda dos meus olhos se encherem de lágrimas. Eu não faço ideia se é pela situação que vivo com meu pai, ou porque lá no fundo eu sinto como se estivesse fazendo algo errado. Sobre essa viagem, na qual nesse momento eu já não tenho mais certeza se deveria continuar. Sei bem que a situação da minha mãe exige que eu faça qualquer coisa para salvá-la, mas eu poderia pegar um empréstimo escondido dos meus pais. Eu tenho certeza que a mãe de Cristina não pensaria duas vezes em me ajudar em relação a isso. Sei que ela se sente comovida com o que a minha mãe está enfrentando.

Me levanto da cama decidida a pegar o meu celular e ligar para a minha mãe, logo após eu sentir meu peito se comprimir de saudade. Quero ouvir a sua voz, ouvir ela dizer mais uma vez que ficará tudo bem. Mas então congelo quando lembro da última vez em que estive com o meu celular em mãos. Na sala, com Benjamin a apenas alguns minutos atrás. Suspiro frustrada e meus ombros caem, enquanto repenso sobre ir lá e pegar o meu celular. Depois do que aconteceu eu não sei se tenho coragem de encará-lo mais uma vez, mesmo que eu esteja morrendo de saudades da minha mãe.

Decidida, eu caminho até a porta, rapidamente a abrindo, mas logo me interrompo quando dou de cara com dois ombros largos. Levanto o meu olhar, deparando com Benjamin um pouco surpreso por esse nosso encontro repentino. E eu não estou diferente, na verdade eu até mesmo senti uma batida do meu coração mais acelerada.

— Você esqueceu seu celular lá embaixo. — Ele murmura ainda me encarando enquanto segura o celular entre nós dois.

— Ah, obrigada. — Pego o meu celular, recuando e agradecida de que com isso ele evitou mais constrangimento.

— Ruiva, eu quero me desculpar; — Ele começa entrando no quarto logo atrás de mim. — Eu não deveria falar daquela forma com você.

Me viro para ele, encarando suas íris escuras e profundas, e então logo lanço-lhe um sorriso tranquilizador. Por mais que as suas palavras tenha me chateado, eu não acho justo prolongar esse assunto, no qual nem mesmo eu devo ficar relembrando.

— Não precisa se desculpar, está tudo bem. Na verdade, eu preciso fazer uma ligação Benjamin, esqueça o que aconteceu. — Murmuro saindo do quarto enquanto digito o número de uma das enfermeiras do hospital que está de prontidão para a minha mãe.

Me encosto na parede do corredor, a fim de que mais ninguém possa escutar essa ligação.

— Alô? — Ouço uma voz feminina do outro lado da linha, um pouco borrada por conta da interferência.

— Belinda? Aqui é a Mel? Lembra de mim? Você me deu o seu número, disse que estaria a cuidar da minha mãe.

— Ah, claro. Agora me lembro. Mas infelizmente não poderá falar com ela neste momento. Sua mãe se encontra dormindo. Há algo que queira que eu fale para ela? — Ela questiona e eu fecho meus olhos, um pouco chateada de não poder falar com ela.

— Não, obrigada Belinda. Só avise que eu liguei. Mas me diga, como ela está?

— Ela está bem, mas é necessário dar início nesse tratamento o quanto antes. Você deve imaginar como essas coisas são, e ela já está entrando em um estado avançado. — Ela avisa e imediatamente sinto um aperto em meu peito, já que por agora não há nada que eu possa fazer.

— Estou tentando Belinda… — Suspiro mordendo meus lábios, preocupada. — Por enquanto avise a ela que estou morrendo de saudade e assim que puder vou ligar novamente. É só isso, obrigada e boa noite.

Encerro a ligação sentindo um gosto amargo na boca. Deus sabe o quanto eu quero que a minha mãe se trate e se recupere logo para assim poder voltar para casa. Mas eu preciso de uma quantia considerável de dinheiro para isso acontecer. Por enquanto tudo o que posso fazer é ter fé e torcer para que ela fique bem e o seu câncer não avance mais.

Seguro o pingente do colar em minha mão, tentando renovar minha coragem e força para apoiar ela.

Ela vai ficar bem. Tem que ficar.

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