Capítulo 02

RUBY PORTMAN

O ambiente tornou-se eletricamente tenso, cada centímetro quadrado do escritório parecia vibrar com a energia carregada entre nós. O homem, cujos olhos penetrantes cortavam como facas afiadas, estudava-me meticulosamente. ~

Os nossos olhares colidiam, mas as intenções por trás de cada vislumbre eram distintas.

— Quem és tu? — A sua voz, profunda e sedosa, preencheu o ar como uma melodia grave, ecoando pelas paredes do espaço fechado. Cada sílaba era uma nota arrastada, causando arrepios intensos que dançavam ao longo da minha espinha. A incerteza sobre a origem desses arrepios só aumentava a atmosfera já carregada.

Um segundo arrepio, mais intenso, percorreu o meu corpo, deixando-me arrebatada pela corrente fria do ar condicionado ou pela presença imponente do homem diante de mim. Os meus sentidos estavam alertas, capturando cada pequeno detalhe da sala, como se estivesse prestes a desvendar um mistério.

Num esforço para recuperar a compostura, percebi com um choque repentino que estava encarando abertamente o meu chefe. Uma onda de desconforto percorreu-me enquanto eu lutava para desviar o olhar daqueles olhos que pareciam ler mais do que eu estava disposta a revelar. Pigarreei de leve, oferecendo-lhe um sorriso trêmulo na tentativa de dissipar a estranheza do momento, mas logo deparei-me com a carranca que adornava o seu rosto, uma expressão de desaprovação e desconfiança.

— Sou Ruby Portman, senhor — murmurei, sentindo a necessidade de introduzir-me formalmente. No entanto, o meu gesto foi recebido com um silêncio tenso. A atmosfera ao nosso redor parecia suspensa, aguardando a próxima jogada no tabuleiro tenso daquele encontro.

Os seus olhos, como lentes de aumento, percorreram-me intensamente enquanto ele guardava o celular no bolso. Um passo à frente, sua presença tornou-se mais iminente, preenchendo o espaço entre nós com uma aura que sugeria autoridade e mistério. Cada palavra que proferia era calculada, mantendo-me na borda de uma expectativa nervosa.

— Srta. Portman — ele pronunciou o meu nome com uma cadência peculiar, arrastando as sílabas de maneira que parecia explorar o sabor de cada letra. O seu tom de voz era um murmúrio grave, roubando a minha atenção e envolvendo-me na sua teia. — Penso que é de conhecimento geral que se deve bater à porta antes de entrar. Certo? — A pergunta era feita com calma, mas continha um subtexto pesado, como se estivesse testando a minha capacidade de seguir regras básicas.

O que tem de bonito tem de arrogante.

— Mas bati, senhor, mais vezes do que deveria — rebati, ajustando automaticamente a minha postura para uma expressão mais confiante. Não permitiria que ele me intimidasse.

Eu certamente não deixarei ele intimidar-me.

Não abaixaria a guarda. Enquanto eu enfrentava o seu olhar penetrante, consciente de que cada palavra que proferíamos era parte de um duelo silencioso, mudei a minha abordagem.

— Como não obtive resposta, senti-me na responsabilidade de me apresentar formalmente ao senhor, penso que é o certo a se fazer — continuei, mantendo a firmeza na minha voz. Cada palavra era uma afirmação de que eu não seria facilmente subjugada.

Seu olhar desviou-se do meu para pousar nos arquivos sobre a sua extensa mesa.

— Se eu não permitir nada ou der autorização, Srta. Portman, nem você, nem qualquer outra pessoa deverá ultrapassar esse limite — ele declarou, sua voz mantendo a calma, mas com uma seriedade intransigente. A tensão atingiu o seu ápice quando ele me dispensou com uma ordem direta. — Pode se retirar. Eu a chamarei quando for necessário.

Assenti com um gesto rápido, absorvendo a informação e analisando cada nuance da situação. Seu olhar estava agora concentrado nos documentos diante dele, e eu aproveitei o momento para me retirar daquele espaço carregado de energia hostil.

A sua arrogância dissipa rápido qualquer mera atração.

• ────── ✾ ────── •

O tempo parecia escorrer rapidamente conforme eu observava os minutos restantes para a minha pausa para o almoço. Wall Street não era exatamente o meu habitat natural para refeições, e isso me fazia ponderar entre procurar um restaurante próximo ou optar por uma refeição rápida na empresa.

Enquanto fechava alguns documentos relacionados aos eventos planejados pelo Sr. Radcliffe, o telefone fixo interrompeu os meus pensamentos. Distraída, atendi enquanto Katherine começava a falar sobre Melissa Maribor, mas antes que pudesse ouvir os detalhes, uma mulher entrou abruptamente na sala, avançando em direção à porta do meu chefe com uma confiança desarmante.

De pele clara e esguia, os seus longos cabelos castanhos caíam em ondas perfeitamente alinhadas em torno do rosto. Vestindo um terno verde musgo que realçava os seus olhos da mesma tonalidade, ela emanava uma presença imponente. O som dos seus saltos ecoava no piso de mármore, quase hipnotizando-me, enquanto o seu andar seguro quase me fazia esquecer das responsabilidades que tinha diante de mim.

Ela era simplesmente deslumbrante.

No entanto, eu rapidamente recuperei-me do breve devaneio. Desliguei o telefone com rapidez e me levantei para impedi-la de avançar mais.

— Bom dia — cumprimentei educadamente, sorrindo artificialmente enquanto ela me observava de cima a baixo. — Suponho que seja a Srta. Maribor.

Ela respondeu com um sorriso falso, varrendo-me com um olhar crítico.

— Supõe certo, menina…? — indagou, procurando o meu crachá, que ainda não estava pendurado. Senti um leve desdém no seu olhar quando os seus olhos retornaram ao meu rosto.

— Ruby Portman, a nova secretária executiva. Como posso ajudá-la, Srta. Maribor?

A mulher, Melissa Maribor, exibiu um sorriso enquanto cruzava os braços, anunciando a urgência da sua necessidade em falar com Harry. A sua atitude confiante parecia desafiar a minha autoridade.

— Se me der licença, eu o avisarei primeiro — respondi com firmeza, afastando-me para alcançar o telefone fixo na minha mesa. Ela sustentou o meu olhar, desafiadora, como se buscasse testar os meus limites.

Enquanto aguardava a chamada ser atendida, eu perguntava-me qual era o problema com aquela mulher. Uma sensação de desconforto crescia à medida que eu lidava com a sua postura arrogante.

Finalmente, a chamada foi atendida, e a voz de Harry Radcliffe soou do outro lado da linha. Após uma breve pausa, ele autorizou a entrada de Melissa Maribor. Um clique indicou o fim da chamada, e o meu olhar recaiu novamente sobre a figura desafiadora diante de mim.

— O Sr. Radcliffe a espera — informei, mantendo a compostura apesar do ar de superioridade que ela exibia. Era apenas mais uma complicação no meu novo papel como secretária executiva.

A mulher virou-se nos seus saltos altos e seguiu em direção à sala de Harry. Suspirei, irritada com a situação, mas mantive a calma até o horário de almoço.

Quando o alarme no meu celular finalmente tocou, aliviei-me e preparei-me para sair da empresa. Na recepção, encontrei Katherine arrumando as suas coisas e notei outra mulher no seu lugar.

— Katherine — a chamei, aproximando-me do balcão.

— Srta. Portman — cumprimentou, erguendo os olhos para me olhar.

— Não precisa chamar-me de senhorita. Bom, é que eu não conheço nenhum restaurante por aqui. Gostaria de saber se vai almoçar e se pode mostrar-me um restaurante nas redondezas — pedi.

Ela deu a volta no balcão, ficando de frente para mim.

— O meu turno terminou, mas podemos almoçar juntas, se quiser. Há um restaurante ótimo a dois quarteirões daqui.

— Sim, claro, isso seria bom. Eu gostaria muito — concordei, e juntas saímos da empresa em busca de um breve alívio na rotina agitada.

O restaurante ficava realmente a dois quarteirões da empresa, e para o meu agrado, o menu era bem mais tentador do que eu imaginava; como preciso ficar um tempo bem longe de fast-food, a única maneira será gastar o meu precioso dinheiro em refeições a sério.

A minha mãe ficaria orgulhosa dessa minha decisão.

O bom é que o nosso pedido não demorou muito a chegar, e eu pude constatar que se tornaria o meu atual e mais querido local para os meus almoços.

— Vai lidar com isso o tempo todo, garanto-lhe — Katherine disse enquanto bebia o seu refrigerante.

Sem dar muitos detalhes, perguntei algumas coisas sobre a mulher que estava na sala do Sr. Radcliffe e um pouco sobre ele também. Afinal, Katherine está obviamente há mais tempo que eu na empresa e pode dar-me algumas dicas.

— Ela é namorada dele? — perguntei, atenta, enquanto bebia o meu café.

— Advogada particular — corrigiu e aproximou-se um pouco de mim. — Há quem diga que têm um lance, nada muito sério — se endireitou. — Mas também não posso afirmar nada. Se for verdade, eu não me surpreenderia. Penso que ela acha que também exerce algum poder na empresa.

— Isso é um problema. Paciência não é o meu forte — levei a xícara com bebida amarga aos meus lábios, sorrindo.

— Bom, de agora em diante terá que ser. Ainda não viu nada — ela riu, e o empregado de mesa pousou a conta da mesa.

— Como assim? — perguntei, tentando parecer tranquila. — Tem como isso piorar?

— Você precisa perceber uma coisa, Ruby. Não se trata unicamente apenas de Melissa. Ainda há as modelos. Elas, sim, fazem a vida do pessoal um inferno. É como se fossem as donas e você, a escrava. Foi exatamente por isso que decidi pedir para manter apenas meio turno, mesmo que eu receba bem menos do que no início.

— É tão mau assim? — ri nervosa, e ela olhou-me seriamente com uma mistura de compaixão.

— Por que você acha que nenhuma secretária executiva permaneceu durante tanto tempo? Bom, ou é isso, ou há coisas bem piores acontecendo — afirmou firmemente.

A revelação de Katherine lançou uma sombra de inquietação sobre o meu entusiasmo inicial. Ao que parecia, o desafio que eu enfrentava como secretária executiva naquela empresa não se resumia apenas à figura imponente de Melissa Maribor. As modelos, com suas exigências e atitudes tirânicas, adicionavam uma camada extra de complexidade ao cenário já tenso.

Comemos em silêncio por alguns momentos, enquanto eu processava a informação recém-adquirida. A decisão de Katherine de reduzir as suas horas de trabalho parecia uma estratégia de autopreservação diante do ambiente hostil que permeava a empresa.

— Katherine, eu não sabia que era tão complicado aqui. Por que você continua? — perguntei, tentando entender a sua motivação.

Ela suspirou antes de responder, revelando um cansaço que ultrapassava o físico.

— Às vezes, Ruby, precisamos do emprego. Não é fácil encontrar algo melhor lá fora, e eu tenho contas a pagar. Além disso, o Sr. Radcliffe é um excelente pagador, e isso acaba compensando muita coisa.

As palavras dela ecoaram nos meus ouvidos enquanto eu considerava as implicações de permanecer naquele ambiente. Poderia eu lidar com a pressão, as personalidades difíceis e as complexidades que surgiriam? Eu não era muito boa em levar desaforo em casa. E a promessa de uma boa compensação financeira competia com a perspectiva de enfrentar desafios diários.

Terminamos a nossa refeição, e Katherine insistiu em pagar a conta. 

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