Eu empurrei a porta e entrei. Quando Pedro me viu, parecia um pouco surpreso, franzindo a testa com intensidade.
— O que você está fazendo aqui? Ou será que está me seguindo? — Ele perguntou, desconfiado.
Levantei o celular e fiz um gesto para ele, dizendo:
— Foi você quem me mandou mensagens.
Helena, fazendo um bico e puxando o braço dele em um gesto de carinho, disse:
— Presidente Pedro, eu só estava brincando, pedi para a Daniela trazer o iogurte. Você não vai brigar comigo, vai?
A testa de Pedro, que estava tão franzida, relaxou um pouco.
O mais estranho de tudo foi que, ao ver Helena me provocando e Pedro aceitando tudo com tanta indulgência, não senti nada. Não senti aquela angústia habitual, aquela sensação de desespero. Fiquei calma, apenas acenei com a cabeça, como se dissesse que estava entendendo tudo.
Pedro, por sua vez, parecia querer explicar.
— Daniela, a Helena só estava comigo em um evento...
Interrompi a explicação dele, estendendo o iogurte que eu havia trazido para ele.
Pedro havia bebido, então não podia dirigir.
Depois de cuidar de Helena, ele me acompanhou de volta.
O táxi já estava do outro lado da rua.
Quando comecei a andar na direção dele, Pedro esticou a mão e me puxou. Só então percebi que um carro passou a toda velocidade, quase me atingindo.
Se não fosse por ele, eu teria me machucado.
— Você não sabe nem olhar para os carros enquanto anda? — Pedro reclamou, com um tom apressado, apertando minha mão com força.
Por um momento, veio-me à memória a sensação de antes, quando atravessávamos a rua. Ele sempre segurava minha mão.
Eu parecia ter perdido essa lembrança há tanto tempo que, agora, me senti estranha, quase desconfortável com o gesto.
Felizmente, ao cruzarmos a rua, eu silenciosamente puxei minha mão de volta.
Na manhã seguinte, enquanto eu arrumava minhas coisas para ir ao trabalho, Pedro se ofereceu para me levar.
— Eu te levo, vai ser mais rápido.
Ontem, por causa dele, acabei dormindo tarde, e agora não daria tempo de pegar o metrô. Não queria ser difícil, então decidi aceitar a oferta e entrar no carro.
Abri a porta do banco do passageiro e fui tomada por um cheiro doce, tipicamente feminino, no ar.
O estofado do banco era rosa, e havia um travesseiro fofo decorando o assento.
Na frente, havia um adesivo fofo com os dizeres [Assento da Helena], quase como se o lugar fosse uma propriedade exclusiva dela.
Sempre tão rigoroso e respeitado no setor, Pedro agora permitia que pequenas coisas tão fofas e infantis ocupassem seu carro. Era, de fato, irônico.
Uma leve expressão de desconforto apareceu no rosto de Pedro, e ele tentou explicar:
— A Helena é só uma criança, não leve isso a sério.
“Ela é uma criança que tiraria fotos de casal com você, é?”
Essa frase quase escapou dos meus lábios, mas eu me contive. Afinal, Pedro havia postado no Twitter, no dia seguinte à nossa solicitação de divórcio, uma foto de casal e a legenda [Registrando cada um dos seus momentos tímidos.]
Era uma vingança por eu ter pedido o divórcio ou algo mais? Não importava. O que realmente importava era que, no fundo, em lugares que eu não podia ver, o coração dele já havia se desviado de mim.
Com um sorriso forçado, dirigi-me para o banco de trás e disse:
— Vou sentar atrás.
— Você não tomou café da manhã, né?
Pedro parecia querer quebrar o silêncio constrangedor e, então, me ofereceu uma garrafinha de leite.
Olhei para acima, onde havia uma caixa de snacks, cheia de diferentes biscoitos e bebidas.
Lembrei-me então de que Pedro tinha uma obsessão por limpeza e não permitia que ninguém comesse em seu carro.
Lembrei de uma vez, no início do nosso relacionamento, quando passei mal e tive uma queda de pressão no carro dele. Meus lábios estavam brancos, minha visão turva, e eu mal conseguia falar, sem forças nem para pedir um gole de água. Mesmo naquela situação, ele me negou a bebida.
Agora, Helena podia desfrutar desse tipo de indulgência sem problemas.
A diferença entre ser amada e não ser mais amada nunca foi tão clara.
Eu balancei a cabeça, recusando educadamente, e virei meu olhar para o movimento das ruas fora da janela.
Felizmente, logo chegamos à empresa, e eu fui direto para meu posto de trabalho.
De acordo com a lógica, eu deveria pedir demissão, já que Pedro e eu estávamos prestes a nos divorciar.
Porém, ainda estava responsável por dois projetos, e como sempre, sentia que precisava concluir tudo antes de ir embora.
A manhã e a tarde foram intensas, e com a falta de sono, minha energia estava bem baixa.
Quando finalmente me preparei para pegar a xícara e preparar um café, uma grande caixa de bolos foi entregue à empresa.
Logo, os colegas começaram a gritar e a comemorar.
— Dizem que foi o chefe quem trouxe os doces! Ele está sendo muito generoso!
— Ah, você não sabe de nada! É só porque a Helena está fazendo dieta, e o chefe deve estar com pena dela. Ele comprou os doces para ela e, de quebra, nos convidou também. Só estamos comendo porque a Helena pode!