Adwig - Rainha Imortal
Adwig - Rainha Imortal
Por: Eder B. Jr.
Parte 1

Passos apressados. Isso além de ser incomum ali, significava um mal presságio. Era uma caverna, cuja entrada parecia um calabouço na parte mais sombria de um bosque desabitado. Sem flores, sem frutos, repleto de uma vegetação traiçoeira, espinhosa, gosmenta, venenosa. Uma surpresa fazer parte de um território elfo, que normalmente era o oposto disso. Mas ao aprofundar naquela caverna, não só a beleza elfa tradicional surgia, com sua luz e brilho, mas também outros detalhes tão espantosos, enigmáticos e grandiosos que nem pareciam daquele mundo. Os túneis pareciam se tornar corredores de um castelo imponente, enfeitado por aspectos naturais, que confundiam arquitetura inteligente com vida pulsante. Naquele local, passos de quem quer que fosse não eram comuns, muito menos apressados. A Rainha que vivia ali, apesar de ser a Rainha de direito daquele povo, hoje era mais tratada mesmo apenas como uma lenda para os que não sabiam que ela era real, ou como uma bruxa para aqueles que sabiam que alguém vivia ali. Poucos fiéis seguidores antigos a visitavam, trazendo notícias ou levando conhecimento para alguma causa generosa.

Adwig é uma das imortais daquele mundo, talvez a única ainda com tal nível, que não se deixou contaminar pelo poder. Milenar, acabou sucumbindo pela ignorância que, com a evolução, dominou a política dos elfos.

Passava pela cabeça dela a ironia que era alguém correndo em sua direção em relação ao tempo que ela já tinha vivido e que ela ainda iria viver. Nada poderia ser tão urgente.

E se quem corresse e surgisse frente Adwig fosse outro imortal, alguém que ela não via há centenas de anos? Seus olhos arregalaram quando ela percebeu de quem se tratava.

- Chegou a hora, irmã! A profecia está se cumprindo. Um raio trouxe um portal para levar nosso pai de volta. Temos que nos preparar.

Uma figura tão parecida com ela, mas a qual ela já quase não se lembrava de sua memória de tempos tão remotos, seu irmão gêmeo, parado à sua frente. Alto, pálido, magro, longos e lisos cabelos de um loiro acobreado, olhos escuros como a noite. Era como se ela se olhasse no espelho e não se reconhecesse mais.

- Isso é só uma história de criança, meu irmão! Depois de tanto tempo, você vem me procurar dizendo isso? - Respondeu, incrédula.

- Não, Adwig, chegou a hora de sairmos das cavernas e voltarmos a ser quem éramos.

- Teleret, não quero parecer pouco sentimental, mas todas as vezes que me visitou trazendo notícias de grandes acontecimentos, ou não eram verdadeiros, ou eram super valorizados. - Adwig disse, fitando o irmão. Reparava agora que ele estava mal vestido, roupas rasgadas, com a aparência de sujo, de quem não se cuidava a muito tempo, muito tempo mesmo. - E o que tem acontecido contigo? Por que está assim?

- Irmã, não podemos demorar. Você sabe que a passagem de tempo no planeta de nosso pai é diferente. Ele passa anos lá, mas aqui são poucas horas. Você sentiu que ele voltou, não sentiu? Eu o acompanhei desde então e ele disse que dessa vez só voltaria a entrar num portal se fosse chamado pela profecia. - Teleret realmente parecia muito transtornado, enquanto contava toda a história.

- Eu imaginei que pudesse ter sido ele mesmo. Da mesma forma que ele não fez questão de vir me ver, eu também não fui atrás dele. E sobre essa tal de profecia que nunca aconteceu, quem sabe não é outro amor que ele encontrou novamente em algum planeta? Outra mentira, outra cena, outra criação dele. - Adwig não demonstrava em sua feição, nem em seu gestual a mágoa e indignação que tinha com o pai, que trazia em suas palavras.

- Sei que você virá, mais cedo ou mais tarde. Preciso reunir os elfos! Se preferir, procure Mantelar, ele está no Vale dos Gigantes. Sei que nele você irá confiar. - Teleret saiu da mesma forma como surgiu.

Adwig voltou para suas escrituras. Continuava escrevendo suas memórias. Mas a cada palavra, a cada ideia, a cada lembrança, a voz de seu irmão voltava à sua cabeça. E se seu pai realmente tivesse sido chamado pela profecia? Ela foi preparada por toda sua infância para aquele momento. Finalmente poderia salvar seu povo. Finalmente poderia rever seus entes queridos que se foram. Finalmente a morte e talvez uma vida de verdade.

Adwig sabia que era incrivelmente linda dentro do padrão de beleza do seu mundo e isso era algo perto do absurdo, por serem os elfos, como um todo, muito parecidos. Mas ela ainda assim se destacava, praticamente brilhava. E ainda era imortal. A mais admirada das admiradas. Mesmo com tudo isso, sentia-se uma aberração. Era assim, justamente porque ela não era como todos os outros. Ela perdia as pessoas, que, diferente dela, envelheciam e morriam. Tinha mais poderes, era filha de um Deus, que não queria ser um Deus. Que diferente do que os elfos acreditavam em sua religião, contavam e cantavam em seus cultos, não era onipresente, não era onipotente, não era onisciente. Nem de longe. Apesar de ser criador da vida naquele planeta. Apesar de ser o único que podia se teletransportar para outros planetas e que conhecia outras formas de vida. Se lembrou também de Mantelar. Ele era um Tryper. Os Tryper eram descendentes miscigenados de elfos, fadas, gigantes e coraces, as 4 raças daquele mundo. A combinação das raças não era comum, tendo em vista que, depois da ruptura geológica do planeta, os povos eram geograficamente distantes uns dos outros e quando se aproximavam, guerriavam. A existência de um único rei ou rainha dos povos, a muito tempo era impossível e fazia parte dos acervos de lendas que acompanhavam as histórias de Deus, que também, aos poucos iam se perdendo com o tempo, sendo substituídas por histórias de outros deuses que surgiam no imaginário dos povos, que buscavam uma identificação mais próxima com seus deuses. E nesse contexto, os Trypers, rejeitados, foram se unindo, marginalizados, diferentes, inclusive entre si. Adwig se identificou com eles e os acolheu. Mantelar era ainda uma criança quando conheceu Adwig, que, nessa época, tentava se mostrar mais como uma bruxa boa do que uma elfa. Ela se passava por uma Tryper poderosa, mas não demonstrava todo seu poder. Mantelar via Adwig como uma heroína, seu grande exemplo a ser seguido e, quando mais velho, mais forte e mais poderoso, se tornou o protetor dela. Ela realmente não precisava de um, mas o papel era bem ocupado por ele e isso fazia bem não só a ele, como também a comunidade que se orgulhava do quase gigante, com aparência de elfo.

E, sem perceber, enquanto pensava nisso tudo, Adwig já estava chegando no Vale dos Gigantes. Porém, ela mal podia imaginar o que ia encontrar.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >
capítulo anteriorpróximo capítulo

Capítulos relacionados

Último capítulo