Capítulo 01 — Uma Proposta Inesperada — Parte 04

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Portsmouth, Alguns Dias Depois

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Portsmouth está localizado no Condado de Hampshire, na costa sulina da Inglaterra. Existiam alguns pontos interessantes no lugar, como a fortificação de madeira que ficava na ponta do porto construída por Henry V e reconstruída em pedra por Henry VIII, que mandou erguer o Castelo Southsea também. Além de manterem uma doca seca no Porto, o lugar era considerado uma importante base naval usada pela Marinha Real Britânica. Havia sido daqui que Nelson deixou a Inglaterra para a Batalha de Trafalgar, para não mais retornar vivo. O fato deixou Hendrick perturbado por segundos. Apesar disso, Nelson cumpriu sua missão e agora, Hendrick precisava cumprir sua própria missão, ainda que necessitasse dispor da própria vida da mesma maneira.

O pensamento de Hendrick estava ligado naquela consideração enquanto o navio HMS Sea Dragon, ao comando de sua bandeira, saía do porto lentamente. Hendrick havia dado algumas ordens antes e agora contemplava do passadiço, sua Esquadra ganhar mar aberto, rumo à obrigação de proteger a Inglaterra custasse o que custasse. Rumo a um destino desconhecido. Não estava com medo exatamente, porém, num momento, foi rezar na Igreja de São Thomas de Canterbury, erguida em torno de 1180 pelos cônegos Agostinianos do Priorado de Southwick, na terra que John de Gisors concedeu-lhes. Esteve na missa e pediu que Deus abençoasse-o naquela missão vital. Queria que aquele coro de Anjos que cantavam na sua cabeça estivesse dizendo Amém.

Apesar de tamanho cuidado, Hendrick pressentiu que naquela altura, os inimigos já descobriram que estava saindo em missão. Esperava que a primeira estratégia aconselhada pelos seus superiores desse certo. Para adequar outros pontos acerca do encargo de Hendrick, houve uma segunda reunião em que estiveram presentes o Secretário de Estado Para Guerra e As Colônias, Robert Banks Jenkinson, segundo Conde de Liverpool. Isso, juntamente com o Secretário de Estado Para Assuntos Estrangeiros, Richard Wellesley, primeiro Marquês Wellesley, um irmão de Arthur Wellesley, primeiro Visconde de Wellington, que estava comandando um regimento contra as tropas de Napoleão na Península Ibérica naquele momento.

Nessa segunda reunião, além de serem tratadas que medidas preventivas tomariam caso Hendrick malograsse na missão, depois de algumas discussões e debates, ficou estabelecida que determinação inicial adotariam. A ordem seria que Hendrick permanecesse fazendo vigilância constante no Canal da Mancha com parte da Esquadra de vinte e nove navios que comandasse, com o resto dos navios vindos se unir a Força Naval quando seus Superiores tivessem a certeza absoluta da iminência do ataque dos Rousseaus ou quando Hendrick mandasse uma mensagem em tempo para que viessem finalmente. Além disso, seus subalternos tinham ordens de obedecê-lo em tudo, em qualquer movimento estranho tinha carta branca para operar como quisesse. Com a Ilha de Rocher envolvida naquela passagem, possuindo uma localização estratégica entre a Inglaterra e a França, o mínimo sinal de estranheza oferecia um perigo bem maior. Como a Ilha de Rocher contribuiu com alguns navios para a Armada de Napoleão, o combate seria no Canal da Mancha mesmo, infelizmente.

"O que não entendo, é que mesmo Rocher vigiada dia e noite pelos nossos navios, essa ilha conseguiu reconstruir parte de sua Esquadra que vai assessorar Napoleão na tentativa de invadir a Inglaterra pela segunda vez e tudo bem debaixo dos nossos narizes praticamente, o que vem provar ser proeza desses dois irmãos Rousseaus, devo reconhecer", Hendrick considerou também.

O dado indicava que a situação era ameaçadora realmente. Qualquer passo em falso e cairiam nas garras de Napoleão. E aquilo era algo que Hendrick deveria evitar a todo custo. Assim, como não poderia usar da mesma tática de Nelson contra os Franceses, tinha que inventar algo novo, algo que surpreendesse seus inimigos. Por isso, Hendrick colocou seu cérebro para funcionar, ainda mais sabendo que o inimigo estava oculto pela metade agora, precisando descobrir onde partiria o primeiro ataque, porém nenhum pressentimento bateu-lhe, por enquanto...

Só que depois de alguns momentos, o pensamento de Hendrick recaiu sobre sua prima Ebonnie. Terá sido uma atitude ponderada tomá-la como noiva antes de partir da Inglaterra finalmente? Naquela madrugada em que esteve meditando na biblioteca, a solidão que sentiu havia sido tão intensa, que decidiu aceitar Ebonnie. Mesmo sentindo que não amava-a, pensava que se dariam bem um com o outro. Ebonnie era tudo que um homem poderia esperar numa mulher e sabia que seria uma excelente esposa. Porém, como Hendrick considerou antes, não amava-a. Não como amou Caroline, a mulher que adorou com loucura, quase idolatria. E isso deixou Hendrick perturbado. Nunca foi homem de travar atitudes impulsivas, contudo, tendo dado sua palavra de honra à Fanny, mãe de Ebonnie, assim não poderia voltar atrás também.

A única atitude prudente de sua parte havia sido dissuadir Ebonnie de casarem antes de sua partida, porque Hendrick não queria deixá-la viúva se não voltasse vivo. Era ruim imaginar que deixaria Ebonnie naquela condição depois do casamento, tudo apesar de saber que a jovem choraria pelo seu passamento de qualquer maneira. Se tivesse considerado essa possibilidade, teria proposto casamento depois do retorno. Ebonnie queria anunciar o noivado no jornal The London Gazette logo, porém, com sorte, convenceu Ebonnie que deveriam manter aquele compromisso em segredo, por enquanto, para não comentarem com ninguém e que a divulgação do noivado aconteceria quando regressasse para a Inglaterra. Ebonnie apenas aceitou as condições por temer que Hendrick mudasse de opinião, mesmo quando a desculpa seria que pretendia dar-lhe a oportunidade de aproveitar um noivado e um casamento tradicional que qualquer mulher tinha chance de possuir.

Mas Hendrick não mudaria de opinião nunca. Era um Cavalheiro e se comportaria como tal, ainda que estivesse reconsiderando alguns pontos de sua atitude precipitada agora. Talvez fosse melhor se casar com Ebonnie realmente, uma boa moça que proporcionaria-lhe amor, outros filhos e uma nova família. Isso seria o que Hendrick mais precisava no momento e rezava para que voltasse vivo para cumprir sua intenção.

O mais curioso nisso, havia sido que a própria Caroline percebeu que quando Ebonnie era criança, dava demonstração de amor um pouco mais intenso por Hendrick, mesmo que não passasse de uma menina no período. Apesar de Hendrick estranhar o comentário de Caroline e não gostar nem um pouco da piada que lançou sobre algum dia morrer, podendo se casar com Ebonnie caso quisesse, se lembrou disso agora. Assim, se não tivesse sido a própria Caroline quem implorou-lhe pouco depois de cair doente, que tentasse ser feliz com outra mulher depois que falecesse, talvez Hendrick não tivesse feito aquela proposta para Ebonnie...

Uma vez, quando Ebonnie era pequena, Hendrick ouviu de seus próprios lábios, uma declaração de amor.

— Hendrick, um dia, quero casar com você! — Ebonnie sorriu-lhe de modo pueril. — Acho que tia Caroline entende isso também!

Hendrick quase engasgou com aquela declaração, feita na frente de Caroline, que começou a gargalhar, não de vergonha, mas diante da ingenuidade da menina. Hendrick pensava nisso agora.

Durante anos, relutou em colocar outra mulher no lugar de Caroline, mas a falta de uma presença feminina estava ficando tão pesada, que não mais conseguia carregar sozinho, precisava de companhia. Com isso, resolveu aceitar o amor que Ebonnie vinha oferecendo-lhe finalmente e implorava para Deus, para que tivesse tomado a decisão adequada. Porque senão, sairiam magoadas duas pessoas naquele caos completo.

Mas mesmo repensando sobre tudo aquilo, Hendrick sorriu diante da alegria que Ebonnie sentiu ao pedi-la em casamento. A surpresa tinha sido tão grandiosa, que Ebonnie se lançou no seu pescoço e para espanto de Hendrick, quase deu-lhe um beijo apaixonadíssimo, mas desviou seu rosto a tempo. Por mais que nunca ficasse bem uma donzela se comportar daquela maneira impulsiva, até que Hendrick gostou que pudesse ter acontecido um selinho, tinha que reconhecer, mas precisava preservar a castidade de Ebonnie.

Depois que o espanto inicial passou, ambos conversaram sobre suas dúvidas e aspirações posteriores. Ebonnie era engraçada e inteligente, mas algumas vezes, parecia insegura com relação ao amor de Hendrick pela sua pessoa. Isso, porque em determinado ponto da conversa, chegou a comentar que as pessoas declaravam que Hendrick gostava de mulheres loiras como Caroline e como Ebonnie era morena, temia que Hendrick terminasse abandonando-a logo. Apesar dele considerar aquilo um disparate no começo, não conseguiu controlar uma boa risada ao garantir para Ebonnie que caso fosse verdade, não teria pedido-a em casamento então.

Só que agora, ao rememorar o espantoso comentário de Ebonnie sobre apreciar melhor as loiras, o interior de Hendrick teve que concordar em metade com aquilo. No entanto, se estava empenhado com a doce donzela que sempre amou-o com devoção, casaria com Ebonnie querendo ou não querendo, o resto poderia se reparar com o tempo, Hendrick esperava.

E foi com esse pensamento que depois de dar uma última olhada para Portsmouth, que já ficava cada vez mais longe das vistas humanas, resolveu começar a dar as primeiras ordens de sua missão...

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