MAGNETISMO

ANGELIC...

Quando você acorda e dorme sob a atenção, literalmente, de todo mundo, é difícil ter alguma personalidade. Sorrir, ser gentil e recatada, não falar, não se afastar... as regras se tornam a única coisa segura. Ter amigos, uma vida adolescente comum ou uma infância livre não entram na lista de prioridades. Nada além dos protocolos entra.

Existe uma gaiola de ouro, e as coisas fora dela são frutos proibidos. Você se pergunta o que há lá fora, e quer viver tudo que puder viver, mas existe um limite bem demarcado. Este limite, para mim, é meu pai.

O presidente do país, e um dos homens mais ricos dentro dele. O tipo de pessoa que ama sua posição social, e, eventualmente, sua única filha. Há quem diga que ele preferiria ter um filho, mas se contentou em ter uma garota e poder moldá-la de acordo com sua vontade.

- Como está o perímetro? - Marcos, meu segurança pessoal, pergunta enquanto pressiona o ponto em seu ouvido. Ele escuta a resposta - Vamos entrar em um minuto.

Estamos no elevador do segundo andar da Casa Branca, quase prontos para entrarmos no salão de festas. Embora haja cuidados minuciosos antes da minha entrada em qualquer lugar, Marcos sempre reforça.

- Pronta? - ele olha para o relógio de pulso, depois para mim. Aceno.

Marcos aperta o botão no elevador para que as portas se abram, então nós caminhamos para fora.

No primeiro momento, as luzes embaçam minha vista. Este tipo de evento é sempre muito pomposo. Há fotógrafos nos extremos do local, garantindo a boa foto de cada um dos políticos na primeira página de seus blogs.

Estamos em um jantar diplomático, formal o suficiente para convidar os políticos mais importantes do país, informal o suficiente para convidar suas famílias também.

A Casa Branca não costuma ser um ambiente de festas. Meu pai odeia fazer sua candidatura parecer balbúrdia. Mas, hoje, em específico, faltam poucas semanas para as eleições, e as campanhas estão a todo vapor. Ele quer se mostrar sociável.

Avisto meu pai no meio do salão, logo abaixo do lustre, e para lá nos dirigimos. Nossos passos são lentos como a música clássica que os violinistas estão tocando. E conforme caminho atrás de Marcos, sinto a atenção das pessoas me perseguir. Eu não sou uma celebridade, mas quando apareço em público, gero curiosidade. As pessoas sempre esperam algo extraordinário de mim.

O local exala dinheiro. Todas as pessoas parecem douradas, uma mais poderosa do que a outra. As taças nas mãos graciosas, os saltos milionários, os ternos sob medida, as joias expostas.

- Angelic! - ouço meu nome ser chamado e paro, me virando na direção da voz.

Não vejo, mas posso apostar que Marcos está franzindo os lábios. A regra é simples: entrar no salão, me levar até meu pai e se manter por perto, sem mudança de planos.

- Angelic! - o Governador Tom Saint repete. Ele me alcança e estende a mão para um cumprimento.

- Olá, Sr. Saint - aceito sua mão estendida.

- É uma pena que Vicenzo não tenha podido vir - ele murmura.

- Realmente, uma pena.

Apesar de concordar, eu não estou incomodada com a ausência de Vicenzo Mares. Sempre que estamos no mesmo ambiente, as pessoas nos sufocam com seus comentários sobre o casal que sequer somos. É como se, quando estou sozinha, eu fosse nada, e então passasse a ser alguma coisa ao lado dele.

Uma vez, em um almoço beneficente, fui instruída a vestir a roupa menos colorida que pudesse, para não chamar mais atenção do que Vicenzo. Neste mundo, parece que mulheres como eu nunca saíram do século quinze.

- Você sabe, eu sempre pensei que vocês... - o Governador continua falando, mas eu paro de ouvir quando percebo que ele está apenas me usando para chegar ao meu pai e, talvez, conseguir uma mão amiga para sua campanha.

Sorrio para ele, como se estivesse ouvindo uma vírgula do que diz, e olho ao redor despretensiosamente. Agora meu pai está em uma conversa com outro homem.

- Você não acha? - Saint pergunta, e eu balanço a cabeça em afirmação.

Volto a olhar para meu pai, e meu coração erra uma batida ao perceber que o homem com quem ele conversava está olhando para mim. Assistindo meus movimentos. Seus olhos descem pelo meu corpo, mas não de uma forma maliciosa. Ele está capturando tudo de mim e gravando na mente.

Por instinto, olho para baixo, para ter certeza de que não há uma mancha no vestido que chamou sua atenção. Não há. Estou usando um vestido vermelho longo, sem alças, e luvas de cetim na mesma cor. Há mulheres mais bem-produzidas aqui, mas não estou mal.

- E então eu pensei que este ano seria diferente, porque a eleição será acirrada - o Governador continua.

Sinto a lateral do rosto queimar, porque os olhos daquele homem continuam em mim. Volto a olhar para ele, e então me sinto no direito de analisar seu corpo também.

Eu não queria ficar encarando, parecendo que estou atraída, mas algo nele me faz formigar, e não de uma boa forma. É como uma cobra, fascinante e igualmente venenosa.

Ele é muito alto, seus ombros são largos e os braços provavelmente musculosos, a julgar pela forma como o paletó se ajusta. Seu terno é cinza escuro, mas não chega perto de ser preto. A camisa é preta e não há uma gravata. No entanto, um lenço requintado está em seu bolso, e é branquíssimo.

Não posso ver muito de onde estou. A única coisa que posso sentir daqui é a autoconfiança exagerada, apenas pela forma como ele se porta no salão com mais presença do que o próprio presidente.

- Você já ouviu falar deles? - Saint pergunta, me obrigando a deixar de encarar o desconhecido.

- Provavelmente não - respondo - Se não for rude da minha parte, eu peço licença - antes de ouvir uma resposta, seguro a barra do vestido e começo a me afastar, sem me importar com Tom ou Marcos.

Conforme caminho para perto do meu pai, e consequentemente do homem, seus olhos me acompanham. E assim como todas as outras pessoas no salão, eu não consigo parar de olhar para ele. Talvez seja o atrevimento de estar ao lado do presidente e deixá-lo falando sozinho, ou a forma como não se importa com isso.

Me aproximando, começo a notar os detalhes dele. O corpo é robusto, mas o rosto é de uma sutileza m*****a. O nariz alinhado, a mandíbula marcada, os lábios esculpidos. Bonito, mas igualmente intimidador. E pela forma como passou os últimos dois minutos me encarando, eu diria que é aterrorizante.

- Angelic, querida - outro político me chama, e antes que eu possa reconhecê-lo, este me prende em um abraço.

- Oh... oi.

Apenas quando me solta, posso notar que é Pablo Santiago. Eu não sei exatamente o que ele significa para o país, mas sorrio educadamente.

- Meu pai está me esperando. Eu volto logo - digo, já me afastando.

Volto a olhar para o desconhecido, e desta vez estou mais perto. Me esquivo das pessoas, ignoro um cumprimento ou outro, e então, quando finalmente estou chegando perto deles, o homem diz algo para meu pai, acena e se afasta. Droga!

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