Ponto de vista de Mia
Sentei-me na sala de estar escura, observando as horas passarem. A casa parecia mais vazia do que o normal. Kyle não tinha vindo para casa desde o incidente no escritório três dias atrás. Eu sabia que ele estava me punindo, mas ainda esperava.
O relógio bateu meia-noite. Depois uma. Depois duas. Nada de Kyle.
Meu telefone vibrou, me assustando. Uma mensagem de uma velha amiga da faculdade iluminou minha tela.
"Ei, estranha! Há quanto tempo. Café amanhã?"
Jeo Parker. Não tinha notícias dele há anos. Na faculdade, passávamos incontáveis horas juntos no estúdio de arte. Ele sempre acreditou no meu talento, mesmo quando eu não acreditava.
Hesitei antes de responder. Um café não faria mal, faria?
"Claro. Onde?"
Na manhã seguinte, me vi em um café tranquilo no centro. Jeo já estava lá, seu sorriso familiar aquecendo o ambiente. Ele se levantou quando me viu, e fiquei impressionada com o quão bem o tempo o tinha tratado. Seu cabelo escuro estava elegantemente bagunçado, seus olhos azuis tão gentis quanto eu me lembrava.
— Mia Williams — ele disse, me puxando para um abraço gentil. — Ainda linda como sempre.
Corei, desacostumada com tal afeto aberto.
— Você também está bem, Jeo.
— Pedi chocolate quente para você em vez de café — ele disse enquanto nos sentávamos. — Você nunca conseguiu aguentar café pela manhã.
O simples fato de que ele se lembrava fez minha garganta apertar. Quando foi a última vez que alguém notou um detalhe tão pequeno sobre mim?
— Então — ele começou —, ouvi dizer que você está trabalhando na K.T. Enterprises?
Assenti, mexendo meu chocolate quente.
— No RH.
— Sério? — Suas sobrancelhas se ergueram. — A garota que pintou aquele mural incrível no hall da universidade acabou no RH?
— As coisas mudam — disse suavemente.
— Elas não precisam mudar — ele se inclinou para frente. — Na verdade, é por isso que eu queria te encontrar. Minha empresa de design acabou de conseguir um projeto enorme. Estamos procurando talentos novos, e imediatamente pensei em você.
— Eu?
— Não banque a surpresa, Mia. Você sempre foi a garota mais talentosa. Lembra daquela bolsa que você recusou?
Eu me lembrava. Tinha sido logo depois que Kyle me contratou como sua secretária. Convenci a mim mesma de que estar perto dele era mais importante do que perseguir meus sonhos.
— Não sei, Jeo. Faz anos desde que desenhei qualquer coisa.
— Apenas venha ver o estúdio — ele implorou. — Sem pressão. Só dê uma olhada.
Seu entusiasmo era contagiante. Pela primeira vez em dias, me peguei sorrindo.
— Talvez eu possa...
— Mia.
Aquela voz. Meu sorriso congelou.
Kyle estava na nossa mesa, sua expressão ilegível. Ele usava um terno preto impecável. Parecia perfeito, intocável.
— Sr. Branson — disse automaticamente, minha voz pequena.
Jeo se levantou, estendendo a mão.
— Kyle Branson? Sou Jeo Parker. Fiz faculdade com a Mia.
Kyle ignorou sua mão. Seus olhos estavam fixos em mim.
— Uma palavra, Mia.
Não era um pedido. Levantei-me tremendo, evitando o olhar preocupado de Jeo.
— Mia — Jeo chamou atrás de mim. — Pense no que eu disse, ok?
O maxilar de Kyle se contraiu. Ele me conduziu para fora, sua mão no meu cotovelo. Seu toque queimava através da minha manga.
— Quem é ele? — a voz de Kyle estava baixa, perigosa.
— Apenas um velho amigo.
— Amigos não olham um para o outro desse jeito.
Libertei meu braço.
— De que jeito? Do jeito que você olha para Taylor?
Seus olhos brilharam.
— Isso é diferente.
— Como? Como é diferente, Kyle?
— Porque você assinou um contrato — ele se aproximou, me prensando contra a parede. — Você concordou com certos termos. Nenhum relacionamento com outros homens durante nosso casamento.
Ri amargamente.
— Nosso casamento? É assim que você chama esse acordo?
— Ainda é legalmente vinculativo — seu hálito acariciou meu rosto. — Ou você esqueceu?
— Não — sussurrei. — Não esqueci nada. Incluindo onde você esteve nos últimos três dias.
Algo piscou em seus olhos. Culpa? Raiva? Não conseguia mais distinguir.
— O que eu faço não é da sua conta.
— Mas o que eu faço é da sua conta? — desafiei. — Isso não é justo, Kyle.
— A vida não é justa — ele endireitou a gravata. — Lembre-se do nosso acordo, Mia. Não me faça lembrá-la novamente.
Ele se virou para ir embora, então pausou.
— E diga ao seu amigo para parar de perder tempo. Você não está disponível.
— Ele está me oferecendo um emprego — disse para suas costas.
Kyle parou. Virou-se lentamente.
— O quê?
— Um emprego. Na empresa de design dele — ergui meu queixo. — Eu costumava pintar, antes...
— Antes do quê?
— Antes de me tornar sua secretária — as palavras tinham gosto amargo. — Antes de assinar seu contrato.
A expressão de Kyle escureceu.
— Você não está considerando isso.
— Por que não? Você me suspendeu de qualquer jeito.
— Temporariamente — ele se aproximou novamente. — Você é minha esposa, Mia.
— Sua esposa? — encontrei seu olhar. — Porque parece que só sou sua esposa quando é conveniente para você. Quando você precisa mostrar ao conselho como é estável. Quando precisa de alguém para aquecer sua cama.
Suas mãos se fecharam em punhos.
— Isso não é verdade.
— Então onde você esteve nesses últimos três dias, Kyle? Com Taylor?
Kyle agarrou meu pulso, não forte o suficiente para machucar, mas firme.
— Você sabia o que era isso desde o início. Não aja como se eu tivesse te enganado.
— Não — sussurrei. — Eu me enganei. Achei que talvez... talvez se eu fosse paciente o suficiente, gentil o suficiente, se eu seguisse todas as suas regras... — libertei meu pulso. — Mas eu estava errada, não estava?
Algo piscou em seus olhos.
— Mia...
— Você não pode controlar todos os aspectos da minha vida, Kyle. Não mais.
— O contrato...
— O contrato diz que não posso ter relacionamentos com outros homens. Não diz nada sobre aceitar um emprego — endireitei minha coluna. — A menos que você esteja com ciúmes?
Sua risada foi áspera.
— Ciúmes? Dele? Não seja ridícula.
— Então não há problema, não é?
Ficamos ali, encarando um ao outro. Por um momento, achei que vi algo em seus olhos. Mas então sua máscara voltou ao lugar.
— Tudo bem — ele disse friamente. — Aceite o emprego. Mas lembre-se do seu lugar, Mia. Você ainda é minha esposa.
— Não, Kyle. Sou sua funcionária que por acaso assinou um contrato de casamento. Há uma diferença.
— Discutiremos isso em casa — ele disse finalmente.
Sem outra palavra, ele se virou e foi embora. Desta vez, deixei que fosse.
Meu telefone vibrou com uma mensagem de Jeo.
"Você está bem? Quer terminar nossa conversa sobre o emprego?"
Encarei a mensagem por um longo tempo. E digitei de volta: "Me conte mais sobre a posição."