No dia seguinte, Léo me chamou para passearmos juntos. Eu já não tinha nenhuma forma de divertimento a não ser sair para procurar emprego. Então não parecia ruim sair com um amigo. Eu me arrumei mais que o normal. Eu sabia que ele gostava de mim e não queria decepcioná-lo com minha aparência cansada dos últimos dias. Não que eu tivesse interesse nele, mas o fato de ter a certeza de que ele se interessava por mim me deixava um pouco mais vaidosa que o normal.
Ele me buscou à tarde com seu carro. Minha mãe fazia gosto de meu namoro com Léo, afinal, ele era de uma família de muito mais renome do que a nossa. Na verdade, acho que ela queria que eu me envolvesse com qualquer homem que pudesse proporcionar melhores condições financeiras para nossa família. Não sei se esse era o sonho de todas as mães do Reino de Noriah, mas da minha mãe era. E sim, meninas da minha idade eram usadas muitas vezes como moeda de troca entre as famílias, atendendo somente à interesses financeiros. Por sorte minha família jamais me obrigaria a casar com um homem se não fosse da minha vontade. Independente da situação que estivéssemos vivendo.
Quando entrei no carro dei um beijo no rosto dele. Léo estava bem vestido e perfumado. Mas não era novidade, pois ele sempre estava assim. Era um homem apresentável, com seus mais de 1,90 metros bem distribuídos. Ele tinha olhos claros e cabelos loiros lisos. Eu não o considerava um homem bonito, mas também não era feio. Ele não era o tipo de homem que eu me envolveria ou mesmo teria interesse se não fosse o fato de ele sempre ficar em cima de mim, fazendo-se notar o tempo todo.
- Kat, obrigada por aceitar meu convite. Eu estava com saudade.
- Obrigada por convidar, Léo.
Logo estávamos em uma praça sossegada. Ele comprou dois sorvetes e sentamos no chão, no gramado, observando o movimento e o balançar das árvores floridas anunciando a primavera.
- Kat, eu gostaria de conversar seriamente com você.
Eu terminei meu sorvete e deitei no chão, olhando o céu azul com nuvens se movendo rapidamente por causa do vento. Eu não queria ter aquela conversa. Estava com tantos problemas...
- Kat, você me ouviu? – ele perguntou.
- Sim...
- Achei que não tivesse ouvido.
- Eu... Ouvi. Pode dizer. – falei sem realmente me interessar pela conversa. Nem olhei para ele.
Quando percebi, Léo virou-se para mim e me deu um beijo na boca. A brisa leve me afagou e de alguma forma eu gostei de beijá-lo.
- Eu... Quero que você aceite ser minha namorada. – ele falou mais uma vez, sendo que aquela não era a primeira vez que me pedia.
- Eu aceito. – falei, sem pensar muito.
Se eu queria ou não... Nunca tive certeza. Mas estar sozinha há tanto tempo, com tantos problemas me fez ter um pouco de piedade dele... E de mim mesma. Se não desse certo nós terminaríamos e tudo bem. Continuaríamos sendo somente amigos novamente.
Ele quase não acreditou no que ouviu. Vi um sorriso largo brotar da boca de Léo. Achei que ele perguntaria o motivo de eu ter aceitado, mas ele não o fez. Simplesmente me abraçou e ficou como eu, olhando para o céu, com medo de qualquer palavra estragar aquele momento.
Depois demos uma volta pelo parque, de mãos dadas, trocamos alguns beijos e quando estava amanhecendo, ele me deixou de volta em casa.
Quando entrei em casa, minha mãe e Leon estavam sentados à mesa, conversando. Assim que cheguei, eles me chamaram ansiosos.
Eu queria contar para minha mãe que eu e Léo estávamos namorando, para alegrá-la um pouco. Mas ela estava com um sorriso tão imenso que acho que ela nem precisava daquela notícia.
- O que houve? – perguntei.
- Olhe. – ela disse mostrando a carta aberta na mesa.
Eu não precisei abrir, pois ela já havia aberto a carta endereçada a mim. Havia o brasão de Noriah Sul, então eu sabia que se tratava de uma correspondência vinda do castelo. Estava escrito:
“Senhorita Lee
Selecionada para etapa 1 para o cargo de dama de companhia da rainha.
Esperamos por você na segunda-feira, no castelo de Noriah sul, munida de documentação comprobatória da sua identidade.
Usar roupa adequada. Proibido uso de maquiagem ou esmalte, bem como tintura nos cabelos.
Atenciosamente
Olhei para minha mãe e Leon perplexa:
- Eu... Estou dentro da primeira etapa? Isso é... Impossível.
Minha mãe me abraçou e Leon fez o mesmo. Eu duvidava que ele soubesse o que realmente estava acontecendo. Eu não sabia se estava feliz. Candidatei-me à vaga na certeza de que não seria escolhida. Sabia que não seria fácil chegar ao fim de todas as etapas, mas e se eu conseguisse? Como trabalhar ao lado da rainha se eu a odiava?
- Por que não posso usar maquiagem, esmalte ou tintura no cabelo? – perguntei confusa ao reler a breve carta.
- Eu... Não sei. – disse minha mãe. – Mas acho que descobrirá na segunda. – ela disse sorrindo.
Eu fui até o quarto de meu pai. Ele já estava deitado, do mesmo jeito depressivo. Nem parecia a mesma pessoa que entrou no carro real.
- Pai... Você já deve saber que fui selecionada para a primeira parte do processo de dama de companhia da rainha.
- Sim... – ele disse. – Sua mãe gritou tanto que acho que todo o bairro ouviu.
Rimos:
- Ela está feliz. – observei.
- Sim... De vez em quando, muito raramente, isso acontece.
Eu o abracei. Sabia o que ele estava tentando dizer.
- Pai...
- Fale, minha Kat.
- O que você foi fazer no castelo?
- Eu disse que tinha uma carta na manga.
- Então... O fato de eu ser chamada tem a ver com você ter ido ao castelo?
- Sim... Por isso foi tão rápido o processo.
- Então quer dizer que eu vou ser a dama de companhia da rainha?
- Não... Só quer dizer que eles colocaram você dentro das pré- selecionadas. Agora precisa fazer a sua parte. Ninguém sabe quem você é...
- Mas... Quem você conhece dentro do castelo que fez isso por nós?
- Bem, é uma longa história, Kat.
- Não acha que está na hora de eu saber sobre isso? Eu vou estar dentro do castelo, porque você me colocou lá. Eu preciso saber o que está acontecendo.
- Eu... Conheço... O rei Alfred. – falou meu pai em voz baixa.
- Como assim? – perguntei sentindo meu coração batendo mais forte. Meu pai conhecia o rei?
- Trabalhei para ele... Há muitos anos atrás.
- Mas... Você falou com ele mesmo?
- Sim.
- Pai... Então por que não pediu dinheiro em vez de uma vaga de emprego para mim? Seja lá o motivo pelo qual ele lhe ajuda... Que sei que deve haver uma explicação...
- Por que... Ele já me deu dinheiro uma vez. – falou Adolfo envergonhado.
- O rei Alfred já lhe deu dinheiro? Mas por quê? O que você sabe sobre ele ou a monarquia que lhe fez receber dinheiro dos Chevalier?
- Nós já fomos... Amigos.
- Como assim? Você é amigo do rei Alfred?
- Kat, querida, como eu disse... Faz muitos anos.
- Pai... Conte-me a verdade.
- A verdade é que Alfred conseguiu colocar você dentro do castelo. O resto depende da sua inteligência, que eu sei que tem de sobra.
- Se eu falasse meu sobrenome, o rei saberia que sou sua filha?
- Talvez...
- Há algo mais que você possa me contar?
- No momento, não. – ele disse fechando os olhos e fingindo sono.
Saí dali e fui para o meu quarto completamente confusa. Eu sempre soube que havia segredos dentro da família Lee, mas que eles estavam interligados de alguma forma à família real jamais passou pela minha cabeça. Mas eu precisava descobrir o que era e quem entre os Lee sabia.