Laura colocou a última peça de roupa de volta no armário, respirando fundo para acalmar a tempestade de emoções que sentia. O reencontro com as crianças havia sido avassalador, mas ela sabia que ainda tinha muito o que resolver. Ao fechar a pequena bolsa, um som inesperado a trouxe de volta ao momento.
Toque, toque, toque.
A batida na porta a fez gelar por um segundo. Assim que abriu, Lucas estava ali, imponente como sempre, mas com um olhar que misturava seriedade e algo mais que ela não conseguia decifrar.
— Laura, precisamos conversar.
Ela assentiu, dando um passo para o lado para que ele entrasse. Lucas caminhou até o centro do quarto, as mãos nos bolsos, enquanto Laura encostava a porta.
— Eu sei que você está passando por um momento difícil — começou ele, a voz baixa, mas carregada de intenção. — Mas preciso entender exatamente o que está acontecendo.
Laura respirou fundo, tentando organizar os pensamentos.
— Sr., eu não estava planejando contar isso, mas minha mãe... — Sua voz falhou, e ela desviou o olhar. — Ela está doente. Meu irmão mais novo está tentando cuidar dela sozinho, mas... ele é apenas uma criança.
Lucas a observava com atenção, os olhos fixos em cada palavra que saía de sua boca.
— Eu precisava ir, Sr. Não era porque eu não me importo com as crianças ou... — Ela pausou, as mãos trêmulas. — Mas eu não posso ignorar a minha família.
Lucas deu um passo à frente, aproximando-se dela.
— Laura... — Ele hesitou por um segundo. — Me diga a verdade. Você está pensando em sair porque precisa de dinheiro?
Ela hesitou antes de assentir, visivelmente constrangida.
— Não consigo pagar o tratamento que ela precisa. Os remédios, o transporte, tudo está fora do que eu posso arcar. E não quero que pense que estou tentando usar isso como desculpa...
— Laura, pare com isso — interrompeu Lucas, firme, mas com compaixão. — Se você for embora agora, tentando resolver isso sozinha, vai se afundar. E, pior, não vai conseguir ajudar sua mãe como ela precisa. Nem seu irmão. Nem as crianças aqui.
Laura o encarou, em silêncio.
— Me deixe ajudar. Eu posso pagar pelo melhor tratamento. Posso mandar alguém de confiança cuidar da sua mãe e do seu irmão, para que você não precise abandonar tudo o que construiu aqui.
— Eu... eu não posso aceitar isso — disse ela, balançando a cabeça. — Não quero ser um peso, e...
Antes que pudesse terminar, Lucas a puxou para perto, envolvendo-a em um abraço apertado. Laura ficou tensa por um momento, mas logo relaxou, deixando as lágrimas fluírem livremente.
— Você não é um peso, Laura — sussurrou Lucas. — Nem para as crianças, nem para mim.
Enquanto estava em seus braços, algo mudou dentro de Laura. O que era aquele calor que sentia? Por que o coração batia tão rápido?
Do outro lado da porta entreaberta, Vanessa observava tudo. Seus olhos ardiam de raiva enquanto ela apertava as mãos em punhos.
— Isso foi longe demais — murmurou para si mesma. — Laura tem que sair daqui.
Quando Lucas finalmente a soltou, ele manteve as mãos em seus ombros, olhando diretamente em seus olhos.
— Vá ver sua mãe. Certifique-se de que ela ficará bem. Mas saiba que... esta casa estará sempre aberta para você.
Laura assentiu, enxugando as lágrimas.
— Obrigada, Sr. Eu vou fazer isso. Vou vê-la e... depois decido o que fazer.
Lucas sorriu levemente, um gesto raro que fez o coração de Laura dar um salto involuntário.
— Apenas não demore muito. As crianças precisam de você... e eu também.
Laura desviou o olhar, sentindo o peso daquelas palavras.
Enquanto Lucas saía do quarto, Vanessa se afastou silenciosamente, o plano já se formando em sua mente.
— Se ela voltar depois disso, não será mais como a heroína da história — disse para si mesma.
No fundo, Vanessa sabia que precisava ser cautelosa. Lucas era perspicaz, mas as emoções que ele claramente estava começando a desenvolver por Laura a tornavam mais perigosas.
Laura passou a noite pensando em sua próxima ação, o coração dividido entre a lealdade à sua família e o vínculo crescente com as crianças... e, agora, com Lucas.
Enquanto isso, no quarto ao lado, Vanessa escrevia uma mensagem para alguém cujo nome Laura nunca ouvira antes.
— Laura não vai saber o que a atingiu — murmurou Vanessa, apertando "enviar".
Na manhã seguinte, Laura acordou com uma sensação estranha. Ao abrir a porta do quarto, encontrou um envelope endereçado a ela. O papel pesado e o lacre indicavam algo formal. O coração acelerou enquanto ela passava o dedo pela borda, prestes a abri-lo, quando ouviu passos no corredor.
Lucas apareceu ao virar o corredor, o olhar preocupado pousando imediatamente no envelope. A expressão séria de Lucas sugeria que algo grande estava prestes a acontecer.
— Vejo que você encontrou — disse ele, parando à sua frente.
— O que é isso, Sr.? — perguntou Laura, a voz carregada de inquietação.
— Leia — respondeu ele, as mãos nos bolsos, um misto de nervosismo e determinação no rosto.
Laura abriu o envelope, puxando um papel elegante com o brasão da família impresso no topo. Conforme lia as palavras, a surpresa tomou conta de seu rosto.
— Você quer me ajudar... financeiramente? — Ela ergueu os olhos para ele, incrédula.
Lucas deu de ombros, sua expressão indecifrável.
— Não é caridade, Laura. É uma maneira de garantir que você possa cuidar da sua mãe sem precisar abrir mão do que construiu aqui.
— Mas por que faria isso?
— Porque eu me importo. Com você, com as crianças, com o que temos construído. E não vou permitir que você enfrente isso sozinha.
Antes que pudesse responder, Vanessa apareceu no corredor, impecável como sempre.
— Algum problema aqui? — perguntou, o tom doce escondendo a clara intenção de interromper a conversa.
Laura rapidamente guardou o envelope no bolso, mas Vanessa não deixou de notar o gesto.
— Lucas, podemos falar? — Vanessa insistiu, lançando um olhar afiado para Laura.
— Não agora, Vanessa — respondeu ele, a voz firme.
— Vai se arrepender de me ignorar assim — murmurou ela, virando-se e desaparecendo pelo corredor.
De volta ao quarto, Laura se sentou na beira da cama, o envelope ainda em mãos. Ela sabia que a oferta de Lucas vinha de um lugar genuíno, mas aceitar aquilo significava entrar ainda mais na vida daquela família — algo que claramente incomodava Vanessa.
O que ela estava realmente fazendo ali? Por que era tão difícil sair?
Enquanto ponderava, Shofia apareceu na porta, segurando um desenho.
— Tia Laura, fiz isso para você.
No papel, havia um desenho de Laura, Theo e Shofia no jardim, todos sorrindo.
— Você é parte da nossa família agora — disse Shofia, com um sorriso inocente que partiu o coração de Laura.
Enquanto Laura se perdia em pensamentos, Vanessa estava em seu quarto, ao telefone.
— Preciso que você faça algo para mim — disse ela, a voz baixa. — Sim, sobre a babá. Quero informações sobre o passado dela, qualquer coisa que eu possa usar.
Do outro lado da linha, uma voz respondeu, e Vanessa sorriu.
— Perfeito. E rápido, antes que ela tenha chance de sair daqui.
Naquela noite, Laura estava na cozinha organizando algumas coisas quando Lucas entrou.
— Não acho que tivemos a chance de terminar nossa conversa — disse ele, recostando-se no balcão.
— Sr., eu não posso aceitar sua ajuda. Não é certo.
Ele suspirou, passando a mão pelos cabelos. Um gesto que ele sempre repetia quando estava nervoso.
— Laura, você está sempre colocando todo mundo à frente de você mesma. Quem cuida de você?
Antes que ela pudesse responder, o som de vidro quebrando ecoou no andar de cima. Ambos congelaram por um segundo antes de correrem para ver o que havia acontecido.
Ao chegarem, encontraram Theo chorando no corredor, cercado por cacos de vidro. Ele havia derrubado um vaso pesado enquanto tentava alcançar um brinquedo na prateleira.
— Theo! — Laura correu para ele, verificando se havia algum ferimento.
Lucas também se ajoelhou, o rosto preocupado.
— Você está bem, filho?
Theo assentiu, soluçando.
— Eu só queria pegar meu avião...
Laura o abraçou, aliviada por ele estar bem.
Enquanto isso, Vanessa observava a cena de longe, os olhos estreitados.
— Essa mulher ainda vai cair — murmurou.
Mais tarde naquela noite, enquanto Laura se preparava para dormir, ouviu algo deslizar por baixo de sua porta. Era uma folha de papel, simples, mas o que estava escrito nela fez seu sangue gelar:
"Você não pertence a esta casa. Vá embora antes que seja tarde."
Laura olhou para o corredor vazio, o coração batendo forte. Quem poderia ter enviado aquilo? E o que mais estaria por vir?