POV:Estela Sete dias. Sete dias desde que Isa desapareceu. A cada amanhecer, a mesma sensação: como se alguém tivesse arrancado uma parte de mim enquanto eu dormia. Abro os olhos esperando ouvir sua voz pela casa, o barulho das músicas baixas que ela gostava de ouvir no quarto, até o resmungo típico quando eu a chamava para tomar café. Mas não há nada. Só silêncio. Um silêncio que me sufoca. Não sei como ainda estou de pé. Talvez porque o corpo aprendeu a se mover sozinho. Levanto. Tomo banho. Coloco o jaleco. Vou para o hospital. Examino pacientes. Falo com colegas. Mas não sou eu quem faz nada disso. Sou uma sombra. Uma máquina programada para repetir movimentos. As palavras de Lorenzo me perseguem. “Se for não, será a última vez que nos veremos. Se for sim, eu te protejo. Você e sua família.” Eu disse sim. E ainda assim, perdi Isa. Às vezes me pergunto se meu sim não foi uma espécie de sentença. Se no instante em que aceitei, alguma engrenagem oculta começou a

POV:Isa Foi só um dia. Vinte e quatro horas. Mas parecia uma eternidade. Abri o notebook logo cedo, com a expectativa quase infantil de encontrar uma mensagem dele me esperando. Nada. Fiz o login, fiquei olhando a tela em branco, atualizando de tempos em tempos, como se isso pudesse fazer as palavras aparecerem. Nada. Enviei um “oi”. Esperei alguns minutos. Apaguei. Depois escrevi de novo, dessa vez com um coração tímido no final. E o cursor ficou piscando na tela, solitário. Me peguei pensando em como era estranho sentir tanto por alguém que eu mal conhecia de verdade. Mas era como se ele tivesse aberto uma porta dentro de mim, e agora que ela estava entreaberta, o silêncio do outro lado doía. Tentei me distrair, mas cada vez que o barulho de uma notificação ecoava no quarto, meu coração disparava. E toda vez não era ele. No fim da tarde, percebi que estava com o notebook aberto, olhando para o mesmo ponto da tela há quase meia hora. Era ridículo.

POV: Estela Eu nunca imaginei que o som de uma caneta contra o papel pudesse se transformar em um grito. Não era um grito audível, não ecoava nas paredes do salão, mas dentro de mim soava como um trovão, reverberando até arrancar meu ar. A mesa diante de mim era sólida, escura, tão imponente quanto os olhos frios do homem do Conselho que me estendia os documentos. Ao lado dele, a juíza de casamento sorria com aquele profissionalismo estéril, como se estivesse apenas registrando um contrato de compra e venda, e não esmagando uma vida. Minha mão tremia quando Lorenzo, ao meu lado, empurrou a caneta em minha direção. O toque dos dedos dele sobre os meus não trouxe consolo. Era firme, como se me lembrasse que não havia escolha. “Assine, Estela.” A voz do conselheiro atravessou o ar como uma lâmina. Olhei para Lorenzo. Seus olhos eram ternos e furiosos ao mesmo tempo, mas ainda assim estavam cheios de algo que me queimava: impotência. Se ele, o homem que parecia mover montanhas com um

Narrado por Isa Meu coração estava tão alto que achei que ele ia ouvir. As mãos suadas, a boca seca, e quando ele parou na minha frente, tive a sensação de que minhas pernas iam falhar. — Oi… — murmurei, a voz quase presa. Ele sorriu, como se aquilo fosse a coisa mais natural do mundo. Um sorriso tranquilo, seguro. Diferente do caos que eu sentia por dentro. — Oi — respondeu, suave. — Finalmente. Finalmente. A palavra me atravessou. Eu queria dizer algo inteligente, algo que mostrasse que eu não era só uma menina desajeitada. Mas o que saiu foi um tropeço. — É… eu… desculpa se… se eu demorei. — As frases emboladas, sem sentido, me fizeram corar na mesma hora. Eu queria me enfiar em um buraco. Ele apenas balançou a cabeça, com paciência. — Não precisa se desculpar. Você está aqui. Isso é o que importa. Aquele tom… doce, quase protetor. Ninguém nunca tinha falado comigo assim. Era como se cada palavra dele tivesse sido escolhida para me acalmar. Tentei sorrir, ma

POV: Estela Nove dias. Nove malditos dias. Desde que Isa desapareceu, o tempo tinha se transformado em uma tortura. O sinal do celular captado no sétimo dia queimava como ferro quente na minha mente — um ponto fixo no mapa, mas intocado. Esperando. Observando. Esperando mais. Enquanto isso, eu só ouvia o relógio bater, cada segundo arrancando um pedaço de mim. Sinto minhas mãos tremerem. Tento forçar a respiração, mas o ar entra rasgado, preso no peito. Onde ela está? Está com frio? Está assustada? O pensamento me dilacera. Se eu fechar os olhos, vejo Isa chamando por mim, e eu... eu não consigo responder. A porta se abre. Eu ergo a cabeça devagar e encontro Lorenzo. Ele fecha atrás de si, e por um instante o ambiente parece encolher. — Estela... — ele começa, a voz baixa. — Você demorou. — corto, sem paciência, sem forças pra suavizar nada. Ele franze o cenho, mas se aproxima. — Eu precisava organizar as coisas. Eu rio seco, amarga. — Organizar? Já se passaram nove dias, Lo