O cheiro do jantar invadiu a cozinha de Ana, e Rafael sentiu um misto estranho de familiaridade e uma pontada de nervosismo. Lily, sentada à mesa, comia com o entusiasmo contagiante de uma criança, mas os olhos de Rafael se desviavam constantemente para Ana. Ela parecia tão à vontade em seu novo espaço, uma aura de leveza e alegria que chamava sua atenção. E essa aura, ele percebia com uma crescente confusão, o atraía mais do que ele gostaria de admitir. Enquanto Lily tagarelava sobre o dia na escola, Rafael lutava contra seus próprios pensamentos. Ele estava confuso. A alegria genuína que sentia pela liberdade dela era inegável, mas a forma como seu coração acelerava cada vez que seus olhos se encontravam com os dela o deixava apreensivo. Sua atração por Ana era palpável, quase física, um calor que se espalhava pelo peito sempre que ela sorria para ele ou quando seus dedos se roçavam ao pegar um guardanapo. As poucas vezes em que Ana sorria ou ria, uma corrente elétrica parecia perc

Pedro acordou com a cabeça latejando, o gosto amargo do álcool na boca e uma confusão mental que tardou a se dissipar. A luz tênue que filtrava pela janela não era a de seu quarto, e o cheiro de perfume feminino pairava no ar. Aos poucos, as lembranças da noite anterior, nebulosas e fragmentadas, foram retornando: a boate, o uísque, o descontrole, e por fim, Sofia. Virou-se devagar, e lá estava ela, adormecida ao seu lado, os cabelos espalhados pelo travesseiro. Uma onda de desgosto o invadiu, mas ele a conteve. O pensamento nas palavras do médico ecoando e o bebê que ela esperava, era seu filho, agiu como um freio invisível. Não havia mais volta. Com um esforço considerável, Pedro se desvencilhou dos lençóis e levantou-se. Seus movimentos eram lentos e dolorosos, cada músculo do corpo protestando. Não olhou para Sofia novamente. Pegou metade de suas roupas espalhadas pelo chão, dessa vez não fez nada estupido pelo menos. Vestiu-as apressadamente e saiu do apartamento dela sem faz

Depois de colocar Lily na cama, Rafael se recostou na cadeira de balanço da varanda, o ranger suave da madeira acompanhando o ritmo de suas memórias. Quase quatro anos haviam se passado, mas o eco daquela ligação ainda o assombrava. A noite avançava no céu de Flecheiras , um contraste cruel com o céu cinza opressivo do dia em que seu mundo desabou. A voz do outro lado da linha estava embargada, hesitante, e a cada palavra a ficha caía, pesada e fria. Sua irmã, Lívia, e seu marido, Ricardo, mortos. Um acidente. E no meio daquele vazio, um fio tênue de esperança e terror: Lily, a sobrinha de apenas dois anos, estava viva, hospitalizada em Flecheiras. Ele lembrava da corrida desesperada, o carro engolindo a distância entre sua vida agitada na capital e aquela pequena cidade do litoral. Rebeca, sua noiva, tentara consolá-lo, suas palavras soando ocas diante da amplitude da perda. Eles acolheriam Lily, era o plano, natural e inquestionável. Ou assim parecia. As primeiras semanas em Flec

Pedro suspirou, o peso do mundo parecendo repousar sobre seus ombros. O cansaço não era apenas físico; era uma fadiga profunda que atingia seus ossos, sua alma. Seu psicológico estava abatido, um campo de batalha onde a culpa, a raiva e o desespero travavam uma guerra incessante. As palavras de sua mãe gritando em seus ouvidos, os apelos de Ana ainda ecoavam em seu coração, se tivesse ouvido ela, dividido o fardo de ajuda Sofia, ele não teria dado espaço para essa situação se criar. A vergonha pública, a ruína financeira iminente e a perda irremediável de Ana formavam um coquetel amargo que ele era forçado a engolir. A mente, antes afiada e estrategista, agora estava turva, mas uma chama perigosa começava a brilhar nas profundezas de seu ser: a chama da vingança.Com uma voz rouca e sem emoção, Pedro chamou Antônio._ Antônio, preciso que você entre em contato com esses sites de fofoca imediatamente. Exija que tirem essa matéria do ar. Ameace-os com processos, com tudo o que temos. Qu

De volta ao chalé, depois de um banho revigorante, as duas se sentaram na varanda, observando as estrelas que começavam a salpicar o céu. _ Então", Jéssica começou, com um tom de voz casual, mas um brilho de curiosidade nos olhos, quem era o moço gato da praia? E a menininha fofa? Ana sentiu as bochechas esquentarem um pouco, e tentou disfarçar. _ Ah, aquele é o Rafael, ele...ele tem um barco, faz...passeios marítimos na região. E a Lily é a sobrinha dele. Eles são bem legais. Jéssica a observou, notando a leve mudança na voz da amiga. _ Legal mesmo. Vi a troca de olhares de vocês. Parece que tem algo mais ali, Ana. Ana balançou a cabeça, virando o rosto para o mar. _ Não, Jess. Não tem nada. Eu nem quero pensar nisso, de verdade. Acabei de sair de um casamento, preciso de paz, de me encontrar. Não quero dar nome a nada que eu esteja sentindo. Jéssica suspirou, compreendendo a apreensão da amiga. Ela sabia que Ana precisava de tempo, de espaço. _ Eu entendo, Ana. Não vou insi