Capítulo 8 Kallistēi

— O que você precisa Perséfone é fugir para o mundo inferior e ficar lá até podermos convencer Zeus ou que Ares se canse de esperar. — sugeriu Hermes.

— Não tem jeito de escapar para o mundo inferior, Hecate a pedido de Hera fez uma proteção para o Olimpo para Hades não entrar, e para Perséfone não sair até o dia de seu casamento.- Apolo pronunciou.

— Se ela agir naturalmente como se finalmente estivesse voltando a si, não ficaria tão vigiada.- Hermes sugeriu.

— Não iria adiantar. Ares iria desconfiar.- Afirmei.

— O que precisamos é acabar com essa aliança dessas deusas. Hera, Athena e Afrodite, trazer discórdia entre elas, e seria uma distração suficiente para você fugir Perséfone.- Hermes queria chegar a algum lugar…eu estava começando a entender.

— Precisamos de Éris.- anunciei.

— A filha desprezada de Zeus e Hera?- Apolo perguntou confuso.

— Não só a filha desprezada, mas a deusa da discórdia meu irmão.- Hermes sorria de modo diabólico, não me contive e sorri com ele feliz por entender oque ele planejava.

— Vocês se esquecem que nenhum de vocês tem amizade com Éris, nem no Olimpo ela vive e não tem porque ajudar vocês.- Apolo analisou.

— Está enganado Apolo, Éris tem muito apreço por mim.- Hermes revelou e eu pude imaginar o tipo de apreço que ela tinha.

Apolo riu daquilo.

— Tudo bem deixarei vocês maquinando o mal e vou beber um pouco de Hidromel, quer um pouco Perséfone?- perguntou irônico.

Meneei a cabeça em negativa.

— Perséfone, vou fazer esta viagem até Éris, vou convencer-la a nos ajudar a causar discórdia no Olimpo e então você poderá fugir.- Hermes estava decidido a ir e eu senti uma sensação estranha...

Como se essa decisão fosse mudar muitas vidas, mas que de alguma forma estivesse fadado a ocorrer.

Hermes me orientou a pedir uma festa em honra a minha volta para eu poder mostrar estar feliz com o rumo dos acontecimentos, foi exatamente o que fiz.

Mas só fui atendida na noite anterior ao casamento.

Deméter vibrou com isso dizendo que eu havia voltado ao normal, finalmente o ar obscuro do submundo havia saído de mim, ela disse.

Era tudo uma tortura para mim, experimentar vestidos, e ter de ouvir como o casamento seria bom para mim.

Eu pensava em Afrodite que havia mentido tão descaradamente, porquê?

Para proteger Ares?

Que paixão doentia!

Haveria um banquete dos deuses está noite em honra ao casamento, eu me encarava no espelho com o vestido azul-escuro escolhido por Ares para a ocasião, me lembrei das palavras de Hades sobre nunca me obrigar a casar.

Eu havia passado tanto tempo enganada sobre sua personalidade daquela forma?

Não teria sido melhor eu ter permanecido no mundo inferior?

Este mundo dos deuses me parecia tão mais obscuro agora.

— Você esta assim melancólica porque amanhã é seu casamento.- Deméter afirmou aparecendo no quarto.

Uma lágrima escorria por meu rosto, enquanto eu acariciava o anel com aquela pedra tão diferente.

Era única, dos portões de Hades.

- Talvez você tenha razão.- menti para ela.

Havia já cinco dias da partida de Hermes, eu pensava enquanto caminhava para o banquete acompanhada de Deméter.

Esta era minha última noite como uma mulher livre, não tinha mais esperanças de algo mudar.

Hades não viria me salvar desta vez. Hera junto a Hecate, haviam se certificado muito bem para que Hades não entrasse no monte Olimpo, usando de magia.

As portas do salão foram abertas e era tudo deslumbrante, uma mesa enorme com todas as iguarias que alguém pudesse desejar, todos os deuses importantes estavam presentes, comiam, bebiam e conversavam.

A todo momento apareciam para me parabenizar pelo casamento.

Corri o olhar pelo salão e avistei Ares ao lado de Hera, estava com sua habitual roupa de batalha, completamente imponente, arrogante, orgulhoso.

Era muito parecido com a mãe.

Olhei para minha mãe ao meu lado, radiante acreditando que este casamento estava me salvando de Hades.

— Perséfone quando estiver casada nunca mais terá que se preocupar com aquele ser vil, aquele coração negro do Hades.- ressaltou ao meu lado.

Como eu não havia em todos esses anos, percebido que Deméter não sabia julgar caráter de ninguém?

Ela não tinha ideia que estava me entregando ao lobo.

Hera e Ares caminhavam até nós como se fossem os donos do mundo, e, na verdade eles eram.

— Não poderia estar mais linda Perséfone.- elogiou Ares e eu senti asco.

- Com toda a certeza está como a mais bela das joias.- Hera concordou.

Joia, era isso que eu representava para ela, uma joia que daria de presente ao filho para ser mais dominante na vida dele.

Hera tinha a necessidade de controlar tudo e todos ao seu redor.

— Perséfone esta muito ansiosa para o casamento.- Deméter afirmou animada.

Eu permanecia encarando Ares, que exibia um sorriso cínico.

— Eu tenho certeza que sim.- concordou Hera.

Mas vi em seus gélidos olhos que ela sabia exatamente como eu me sentia, só não se importava.

— Porque não deixamos o casal a sós para conversarem Deméter?- sugeriu Hera.

— Ah sim! Claro você tem toda razão, eu preciso te mostrar as flores que farei surgirem para amanhã, irei adornar na coroa de flores que preparei para Perséfone.- Deméter foi se distanciando com Hera me deixando ao lado de Ares, para meu horror.

— Você devia mudar essa sua cara de enterro.- provocou ele.

— Perto de você é a única cara que tenho desejo de mostrar, você me causa repulsa da cabeça aos pés.- retruquei.

Ares me encarou enfurecido, mas não mexeu nenhum um músculo contra mim.

Em vez disso exclamou.

— E Hades o deus dos mortos não causava repulsa a você?!

— Sendo sincera, não!- rebati.

- Talvez Hades tenha afinal roubado o que tentei roubar naquela noite, ou você o tenha dado por vontade própria.- Ares insinuou.

Como ele ousava insinuar que eu havia entregado minha virtude a Hades?

Maldito seja Ares.

— Se soubesse que iria ter que me casar com você, teria tido uma noite de diversão com ele.- retruquei e fiquei muito feliz diante de sua expressão furiosa.

Me afastei de Ares com um sorriso acenando para as musas, as deusas que sorriam para mim.

Parei diante do banquete e belisquei uma carne.

Me lembrei de Hades, passei dias no quarto trancada esperando que a qualquer momento ele viesse para exigir que eu fosse sua esposa, mas ele não fez isso.

Oque teria acontecido se eu tivesse permanecido lá e aprendido a lutar?

Teria mudado algo do meu destino? Teria eu mais voz sobre ele?

— Perdida em pensamentos Perséfone?- Uma voz conhecida surgiu ao meu lado.

Ártemis me encarava com um olhar diferente.

Seus cabelos negros estavam presos atrás da cabeça, vestia um vestido branco com lindos adornos de borboletas, usava uma tiara prateada.

Era incrivelmente parecida com Apolo, eram gêmeos é claro.

— Estava sim.- respondi e seus olhos verdes me analisaram com cuidado.

— Sabe Perséfone, desde seu nascimento nunca simpatizei muito com você.- Ártemis revelou simplesmente.

Eu a encarei surpresa.

— É uma pena, eu sempre admirei você.- pronunciei, e seus olhos verdes se encontraram com os meus.

— Você sempre andava para cima e para baixo com Afrodite, uma deusa que não tem coração e nem amor, irônico não? Ela ser considerada a deusa do amor, mas no final só ama a si própria. Eu nunca confiei em deuses apaixonados por si mesmos… Lembra-se de Narciso?- ela perguntou.

Assenti que sim.

Eu me lembrava de Narciso.

— Você o amaldiçoou.- respondi.

— Sua vaidade o amaldiçoou.- ela corrigiu.- eu estava um dia com meu arco na floresta cuidando dos animais, iria me encontrar com Apolo quando conheci a ninfa Eco.

Seus olhos verdes marejaram ao falar dela.

— Eco não é a ninfa que ajudou Zeus a esconder uma amante?- Ártemis assentiu.

— Hera a amaldiçoou por isso, retirou sua fala própria a condenando para sempre a repetir as dos outros, extremamente apaixonada por Narciso ela o seguia por todos os lados o admirando e o amando Perséfone, sua devoção aquele rapaz me cativou.

— Mas você não pôde retirar sua maldição?- indaguei.

— Não.- respondeu com tristeza.- eu vi como ele a tratava sempre a recusando, maltratando, seu orgulho e arrogância era um veneno, sua beleza o fazia ferir a todos ao seu redor, sempre acreditando que ninguém estava a sua altura, eu vi dia após dia ele ferir Eco, e todos ao seu redor…

— Foi por isso que você o amaldiçoou.- constatei.

— Minha maldição foi fazer ele se apaixonar por quem sempre ele foi apaixonado.- Ártemis revelou.

— A si mesmo.- comentei.

— Narciso definhou admirando seu próprio reflexo no rio.- Ártemis confirmou.

Olhei para Ares orgulhoso, prepotente e arrogante, quem dera ele fosse um mortal e eu pudesse amaldiçoar ele.

— Sempre acreditei que você se casaria com Hermes ou Apolo.- Ártemis revelou seguindo meu olhar.

— Hermes é meu amigo desde sempre.- contei com um aperto no coração ao lembrar dele.

Era minha única esperança.

— Mas ele já amou você, e foi rejeitado não é?- Ártemis insinuou.

A muitos anos Hermes havia se declarado para mim, mas eu nunca o vi desta forma.

— Apolo não teve a oportunidade de se declarar imagino, e agora os dois virão você uma flor delicada ser entregue ao deus da guerra. Agora eu simpatizo com você, e penso que fiz a escolha certa não querer ser uma flor delicada onde minha vontade nunca prevalece.- pronunciou.

Eu não discordei de Ártemis, só observei a mesma se afastar para o meio da festa, ela estava certa.

Se eu fosse uma deusa feroz e inteligente como Athena, ou livre e selvagem como Ártemis, não estaria sendo um mero presente de alguém.

Alisei o anel em meu dedo e pensei nas palavras de Hades.

"Prisioneira de minha própria fragilidade"

Era exatamente assim que me sentia.

Uma prisioneira, muito mais agora em casa do que no mundo inferior.

As portas do salão foram abertas e como um raio Hermes entrou por ela, com um sorriso no rosto e carregando uma pequena caixa de ouro.

Me virei para olhar para ele que caminhou diretamente para o trono onde estava Hera deixou a caixa no chão e pronunciou as seguintes palavras.

— Estava eu em minhas grandes viagens, e encontrei esta caixa com os dizeres gravados nela, o Olimpo".

— Abra, garoto.- ordenou Hera.

Hermes abriu a caixa de ouro revelando uma maçã de ouro reluzente.

Seu brilho parecia hipnótico e todas as deusas se aproximaram para admirar sua beleza.

— Para quem está endereçado Hermes?- perguntou Zeus.

Hermes abriu um sorriso malicioso e vi em seus olhos que ele havia conseguido a ajuda de Éris.

— Não fui agraciado com um nome, só mandou esta palavra gravada na maçã. — Hermes pegou a maçã de ouro a erguendo para a visão de todos, gravada nela a palavra *Kallistēi.

— Para a deusa mais bela do Olimpo.- Anunciou Hermes.

— Sou eu!

— Sou eu!

Diversas deusas disseram em uníssono, inclusive Hera, Athena e Afrodite reivindicando a posse da maçã dourada.

Nota da autora.

Éris na mitologia grega é filha de Zeus e Hera, desprezada por Hera por segundo a mãe não ter beleza suficiente, a casaram com o deus Éter, deus do espaço imaterial.

Nutre um profundo rancor dos olimpianos, principalmente de Hera.

**Kallistēi em grego antigo pode significa a mais bela, ou pode ser traduzido para a mais merecedora.

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Escrevi com muito carinho para vocês.


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