OBSCURO
OBSCURO
Por: Ksartah
OLHOS DE MEL

Me olho no espelho e parece que falta algo, mexo nos meus longos cabelos, pego um vestido azul e mostro a Isa que sorri animada, ela está mais animada do que eu para ir nessa festa. Coloco o vestido e não sinto nada de mais, eu estava desanimada desde que terminei o meu relacionamento a dois meses, era um amor de infância que virou uma bola de neve desde que o Léo e eu sofremos um incidente com o meu carro, muita coisa mudou depois desse dia, e ao invés de guardarmos segredos, decidimos nos separar, e aquele amor todo virou uma grande indiferença. 

- E aí o que achou ?! - me viro olhando pra Isa, esperando sua aprovação.

- Ficou ótimo, só precisa se maquiar, eu dou um jeito nisso, senta-se aqui. - Disse ela me sentando na cama com sua bolsa de maquiagem.

- Nada muito forte, por favor. - disse com cara de desprezo.

Enquanto ela me maquiava o frio na barriga aumentava, fazia tanto tempo que não saia para lugar nenhum desde que me mudei da casa dos meus avós. Os meus pais morreram em uma viagem quando eu tinha 8 anos, eles foram soterrados em um túnel que estava em construção, e depois disso eu fiquei morando até os 19 anos com meus avós, acho que eu merecia isso, eu queria me divertir, conhecer gente nova, e ao mesmo tempo que tudo isso me animava, me desanimava também pelo fato de me sentir um peixinho fora d'água.

- Prontinho bebê, o que achou ? - ela disse mostrando o espelho.

- Uau, parece até que fique bonita.- disse empolgada.

- Você é bonita Alice, para de ser boba e vamos logo que  estamos muito atrasadas.

Depois de prontas fomos em direção ao carro da Isa, ela ligou o carro e logo em seguida ela olhou para o painel do carro e disse nervosa dando um tapa no volante - Droga, preciso abastecer.

- Tem um posto aqui perto.- disse apontando a direção.

Chegando no posto, desci do carro e fui até a conveniência junto com a Isa, decidimos comprar umas bebidas pra levar, tinha muita gente no posto, estávamos quase sendo atendidas quando um estranho entrou na frente com uns amigos.

- Ei não tá enxergando a gente não.- a Isa disse nervosa.

- Desculpa, podem ir na frente não vimos vocês.- disse o estranho.

- Mas claro que vou na frente, aliás já estávamos.- Isa continuou.

O estranho me olhou de cima a abaixo, eu abaixei a cabeça tentando esconder o constrangimento da situação, pegamos a bebida e fomos para o carro da Isa, do carro eu podia ver ele tentando olhar para o carro.

- Cara esquisito né ?! - eu disse olhando.

- Gente esquisita você quis dizer, bom vamos embora,  já me irritaram.- ela disse arrancando com o carro.

Eu estava ansiosa, era uma festa de alguns amigos em comum, apenas um social mas mesmo assim eu estava ansiosa, precisava beber para manter uma conversa sem parecer estranha, eu estava com vergonha das meninas ficarem perguntando do meu e, do meu emprego, de qualquer coisa que eu não quisesse comentar naquele momento.

Quando a Isa parou o carro, e eu vi aquela galera toda olhei pra ela com desaprovação, eu achava que seria um social, mas na verdade tinha gente que eu nunca vi na vida, pessoas bebendo e conversando na parte de cima da sacada da casa. Descemos e eu segurei na ponta da mão dela e ela foi me guiando até entrarmos, começamos a cumprimentar os conhecidos da Isa que nos levaram até a geladeira de bebidas.

- Está tudo bem amiga? - A Ana encostou nas minhas costas de leve.

- Vou levando. - Eu sorri sem graça.

- Fiquei feliz que veio, vai te fazer bem sair e socializar. - Ana disse tentando me confortar.

- A melhor parte é essa. - Peguei o copo e o levantei sem graça.

- Amigaaaaaaa, amoooo essa música. - A Ana saltitou.

- Ei eu conheço essa música. -  Isa disse animada, estava tocando Billie Eilish - bad guy.

Eu virei dois copos e quando fui ver já estava lá no meio com as meninas dançando, essa felicidade momentânea que as festas fazem é sensacional, eu não conseguia pensar mais em nada, depois de algumas músicas o ritmo foi diminuindo, eu e a Isa fomos para a sacada tomar um ar, ou tentar por conta dos fumantes. Eu e Isa começamos a conversar do quanto a vida no trabalho era tediosa, trabalhávamos juntas em uma empresa de marketing, era um tédio os caras idiotas do escritório, e alguns clientes, mas felizmente gostávamos de lá.

- Você acredita que eu vou ter que trabalhar com o Caio no projeto novo da empresa.- ela disse com raiva enquanto dava um gole na garrafa de cerveja.

- E qual é problema ?-  eu disse curiosa.

- O problema é que ele é um idiota, ele fica toda hora me ferrando pra direção, tentando mostrar que só porque sou mulher sou incapaz de fazer meu trabalho direito, eu jamais sairia com o pessoal do escritório para beber, um monte de babaca que não se segura perto de uma mulher.- ela respirou fundo.

- Eu vou ter que concordar, sem condições de sair com eles.- eu sorri.  - Você acredita que esses dias eu fui recarregar o cartucho da impressora e o Caio veio me perguntar se eu queria ajuda olhando pros meus peitos.- eu disse com repúdio.

- Que lixo, uma hora eu dou um soco naquela cara de pato dele.- ela riu.

- Irei brindar quando isso acontecer.- sorri.

- Um brinde ao ódio pelo Caio.- ela levantou a garrafa.

- Ao ódio.- brindei.

- Porque tanto ódio ?!- disse a Ana vindo até nós com dois rapazes.

Quando me virei pra olhar com quem ela estava senti um calafrio, era o rapaz do posto aquele estranho com aqueles olhos de mel e o cabelo negro, eu fique paralisada olhando pra ele e o amigo dele se virou e disse :

- Ódio porque, vocês são lindas, deviam estar felizes.- ele sorriu.

- Ah não, eu não tenho psicológico pra isso.- a Isa saiu e foi se perdendo na multidão.

- Qual o problema dela hoje - a Ana disse estranhando a situação.

- Homens.- eu sorri.

- Bom deixa eu te apresentar, esse é o James.- ela apontou em direção ao estranho.

- Oi. - acenei a distância sem graça.

- Acho que já nos conhecemos não é ?- ele me olhou de cima a baixo, parecia que ele estava me avaliando.

- Bom como já se conhecem, vamos deixem eles conversarem.- Ana saiu saltitante com o outro rapaz.

- Muito conveniente você em Ana.- olhei pra ela brava.

- Adoro fazer isso.- disse sorriu.

- Desculpa, eu posso ficar ?! - o estranho sentou na mesa em frente a sacada aonde eu estava.

- Sim, e desculpa minha grosseria, é que ela fica me empurrando para todo mundo.- eu disse olhando para a rua tentando disfarçar a situação.

- Eu não sou todo mundo, e a propósito eu também me senti usado.- ele sorriu.

Começamos a beber e conversar, ele parecia tão interessado em me ouvir em saber o que eu fazia da vida, músicas que eu gostava, e muitos outros assuntos, ele foi gentil e até pegou cerveja pra mim, estava tudo indo bem até eu ver o Léo com outra garota, meu sorriso desapareceu.

- Quer mais cerveja ?- disse James me tirando dos pensamentos.

 - Acho que já estou bem, obrigada.- eu disse meio cabisbaixa.

- É alguém que gosta ?- ele disse sinalizando com a cerveja em direção ao Léo no andar de baixo.

- Quem? - me fingi de desentendida.

- O cara que você não para de olhar desde de que ele chegou.- ele disse se aproximando de mim.

- É o meu ex, a gente terminou faz dois meses.- eu disse olhando pra ele.

- Que chato, pelo jeito não acabou bem.- ele foi chegando mais perto ainda quase encostando em mim.

- Foi tenso, gritaria, fogo, e alguém caiu de uma escadaria.- eu disse sorrindo.

- Como assim? - ele sorriu.

- Estou brincando.- eu olhei naqueles olhos de mel paralisada, eu conseguia sentir o seu perfume, a pele dele era tão pálida que parecia um papel brilhando a luz da noite.

Ele me segurou pra perto e me beijou, parecia que eu estava beijando algodão, era macio, intenso, e eu conseguia sentir seu corpo todo perto do meu, eu não consigo contar quanto tempo durou, só sei que foi algo que eu precisava naquele momento, esqueci a multidão, ele me olhou e sorriu.

- Desculpa, achei que precisava.- ele disse me olhando com malicia.

- tudo bem.- eu tossi tentando disfarçar a situação.

- Você viu quem tá aqui ?! - a Isa disse surpresa, dei um pulo.

- Quase me mata do coração.- eu disse assustada.

- Ele não tem vergonha mesmo, que droga de mundo pequeno.- ela disse apontando pro céu com a garrafa.

- Vamos amiga, tá tarde.- eu disse tirando a garrafa dela.

- Acho que já vou indo também.- o James disse sério.

- A gente se encontra por ai, obrigada pela noite.- eu disse com a mão estirada esperando ele apertar.

- Não precisamos mais de formalidade.- ele disse me dando um selinho leve e eu fiquei paralisada.

A Isa me olhou como se ele tivesse cometido um crime, eu sem graça sorri e acenei com a mão enquanto saia olhando pra trás, ele nos viu indo até o carro pela sacada, e eu acenei novamente. O que tinha acontecido comigo, preciso me recompor, do nada chegar alguém aleatório e mexer comigo por nada, eu precisava me curar do passado antes de pensar bobagens, meu Deus foi só um beijo e eu já estou pensando no futuro, credo. Respirei fundo e tirei os pensamentos por um momento, e fiquei escutando minha amiga contar sobre o que rolou com ela na festa, meus pensamentos iam e voltavam sobre o James, de repente escutei meu telefone, era uma mensagem do Léo, escondi o celular da Isa, eu não queria sermão. Quando chegamos na frente de casa eu me despedi da Isa e fui correndo para casa, fingi que precisava usar o banheiro com urgência, olhei para o celular e lá estava a mensagem do Léo: 

"Desculpe não sabia que não estaria na festa, eu posso te ligar?"

Eu sou uma pessoa muito direta, então já fui logo ligando para saber o que ele tinha para falar, poxa já não bastasse tudo o que aconteceu, e ele ainda vem com DESCULPE, sério. Ele atendeu o telefone e antes de dizer qualquer coisa eu já comecei :

- Sério que depois de dois meses a primeira coisa é desculpe, o que você quer? - disse nervosa.

- Eu não sabia que você estaria na festa, você nem gosta de sair.- ele respirou fundo e continuou.- Bom pelo visto você superou, e eu também.- ele me provocou.

- Olha essa conversa não vai levar em nada, por favor não me mande mais nada, não fique fodendo com o meu psicológico novamente com aquela história do acidente, não fique se aproveitando da situação, você me causas coisas que não fazem bem pra mim.- eu disse tentando recuperar o fôlego.

- Eu disse pra você procurar ajuda psicológica, você se faz de vítima o tempo todo, nem tudo é sobre você, fiquei meses em casa pensando na gente - ele disse nervoso.

- Eu não vou me dar o trabalho de te responder, desculpe.- desliguei o telefone.

Ele ficou ligando umas 8 vezes, eu tive que desligar o telefone, a insistência dele em me incomodar era nítida, eu o ignorei e fui tomar um banho, eu não queria ser sincera pra mim mesma, mas eu precisava de ajuda psicológica, mas não porque eu tinha algo de errado, mas sim eu estava muito mal com tudo, eu precisava me curar disso.  Quantas vezes eu tive crises de ansiedade porque eu me sentia excluída diante dos amigos dele, ele sugava minha alegria, e tudo mudou entre a gente depois do acidente. Terminei o banho coloquei o pijama e me afoguei nos travesseiros, eu preenchia a cama com eles pra ignorar o vazio dela, não demorou muito para cair no sono, a bebida ajuda a dar um soninho legal.

Acordei cedo pra fazer minha caminhada matinal, e andei até uma praça que tinha bastante árvores, era fresco, e estava nublado, fui andando em direção as  grandes árvores, estava vazio, comecei a correr até que um cara estranho começou a correr muito rápido, eu comecei a cortar o caminho pelas árvores para saber se ele estava me seguindo,  então ele correu mais rápido ainda, eu comecei a correr até não ter mais fôlego, conseguir chegar perto de umas casas, olhei para os lados perdida e eu tinha perdido o cara de vista, então quando me virei me dei de cara com um corpo alto.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >
capítulo anteriorpróximo capítulo

Capítulos relacionados

Último capítulo