Capítulo 2: Olhos sem vida.

Novamente, bem cedo, Bernard bate à porta e a destranca. Ele chama Steve para fora, para mais um dia de trabalho. Ele novamente entrega um balde e um esfregão para o rapaz e desta vez o leva para o refeitório. O refeitório era grande e estava bem sujo, principalmente por que entre os civis que comiam ali, haviam crianças que derrubavam muita comida no chão. Bernard disse:

- Quando acabar, te dou o abridor da lata. O problema é que aquele feijão vence amanhã, é melhor limpar rápido.

Depois de dizer isso, o homem volta para sua sala e os soldados armados se põem de prontidão na porta do refeitório. O rapaz se põe a esfregar o chão. Ele esfrega rápido, querendo terminar logo, mas parte da sujeira estava bem grudada no chão. Ele esfrega e esfrega. Ele então vê alguém entrar no refeitório e ir até a cozinha. Era Melanie, a garotinha sobrevivente da família que ele e os outros tinham matado. Ela pega um punhado de comida em uma vasilha e depois vai até Steve. Ela dá um chute no balde, derrubando toda a água pelo chão. Logo depois ela sai do refeitório, se despede dos soldados que asseguravam o local e volta para o quarto dela.

Steve já havia esfregado metade do refeitório, mas teve que esfregar mais rápido do que nunca agora, ou a água derramada iria secar. Ele

esfrega e esfrega, tentando espalhar a água que foi derramada. Ele se vira para os soldados e pergunta:

- Não podem trazer outro balde?

- Não. – responde um deles, rindo da situação.

Ele volta a esfregar. Parte da água já havia secado, mas ainda dava para limpar uma outra parte. Ele limpa até aonde dá, mas depois a água seca totalmente. Bernard volta para o refeitório, para ver o progresso do rapaz. Quase tudo estava limpo, mas ele vê que uma parte do chão ainda estava suja. Ele olha para Bernard e para os outros soldados e então pega o esfregão e vai para a parte que ainda estava suja. Ele se abaixa e esfrega com força o chão, usando o esfregão. Ele consegue tirar a sujeira com muito esforço, mas rala os dedos todos.

Bernard então o parabeniza, vai até a cozinha e pega um abridor de latas. Ele vê uma mulher lá, virada para a parede. Ele põe o abridor em cima da mesa e se aproxima dela. Ele diz:

- Senhora, me desculpe mas não pode mais pegar comida hoje. A última a pegar foi uma garotinha, a alguns minutos atrás.

A mulher não responde. Bernard a segura pelo ombro e a puxa de leve. Ela se vira e dá um grito ensurdecedor. A pele dela tinha veias altas e os olhos estavam vermelhos em volta. Ela tenta atacar Bernard, mas ele corre da cozinha. Ela o segue até o refeitório e no meio do caminho cai no chão e começa a se contorcer e gritar. Os soldados logo apontam as armas e Steve levanta o esfregão.

A mulher se levanta lentamente e se vira para os soldados. Os olhos dela estavam completamente brancos. Ela havia se transformado em um dos zumbis. Ela andou em direção a eles, mancando de uma perna. Subitamente ela se vira para Steve e anda em direção a ele. Ela tenta o agarrar, mas ele se defende com o esfregão, empurrando ela para trás. Ela cai no chão e os soldados abrem fogo. Ela vira o rosto para eles enquanto leva os tiros, até que um deles acerta a cabeça dela. Ela para de se mover. Sangue havia espirrado por todo o lado. Bernard olhou para Steve e disse:

- Ainda está sujo.

Steve foi até o corpo da mulher, pegou em mãos o esfregão e começou a esfregar o sangue. Todos os soldados olharam para ele, surpresos com o que ele estava fazendo. Bernard então disse:

- O que está fazendo?

- Limpando ué! Você disse que ainda está sujo. Meus amig... os outros que estão comigo tem que comer. Preciso do abridor. – O rapaz continua a esfregar.

- Levem ele para o laboratório para ver se está infectado. Por um cacete, que cara escroto! – Bernard saiu da sala logo após dizer isso.

Os outros soldados pediram para que Steve parasse de limpar e o guiaram até o laboratório, mantendo distância dele. Haviam muitos cientistas lá trabalhando em um tipo de pesquisa. Os soldados entraram empurrando Steve e o jogaram dentro de uma sala com um espelho falso e fecharam a porta. Os soldados pediram para os cientistas verificarem se o rapaz não estava infectado.

Steve olhou em volta, sem saber ao certo aonde ele estava. As paredes eram brancas e não havia nada ali. Um gás é liberado na sala. Steve olha em volta, mas não vê lugar nenhum para onde correr, então simplesmente espera que o gás não seja letal. Em poucos minutos, a sala está toda coberta com o gás. Ele não sente nada diferente com o gás e se sente mais tranquilo, mas ainda acha aquilo estranho. Alguns segundos se passam e o gás se dissipa. A porta da sala se abre e ele é tirado de lá. Os cientistas chegam perto dele e apontam uma lanterna branca para o olho dele. Eles apagam a lanterna e cochicham algo entre si e então dizem aos soldados que podiam levar o rapaz, pois ele não estava infectado.

Os outros assassinos dormiam no quartinho, quando a porta é aberta e Steve é jogado lá dentro de novo. A porta é trancada e os soldados vão embora. Yumi acorda com o som de Steve caindo no chão. Ela se aproxima para ver se estava tudo bem com ele. Ele parecia cansado, mas nada anormal. Os outros três então são puxados para fora da sala e levados ao laboratório, para fazer o mesmo teste. O teste também dá negativo para eles e então são levados de volta para o quartinho. A porta mais uma vez é trancada e eles são deixados lá, no chão frio.

Depois disso, soldados levavam os civis para o mesmo laboratório ao qual haviam levado Steve antes. Precisavam fazer os testes de infecção também, já que havia tido um incidente com um infectado ali. As pessoas fizeram os exames uma de cada vez, formando uma fila no corredor. Não parecia haver outro infectado.

Mais uma noite passa. Mais uma vez, Bernard acorda Steve bem cedo. Bernard vê que os assassinos não tinham uma aparência boa. Estavam pálidos e ficando meio magros e com marcas das picadas de inseto. Fazia um certo tempo que não comiam nada. Steve recebe um novo trabalho, desta vez de limpar os corredores. O rapaz se prepara pra mais um dia de trabalho, mas para a surpresa dele, naquele dia os outros três também se ofereceram para ajudar. Bernard estava achando tudo aquilo meio suspeito, mas permitiu que ajudassem. Todos eles trabalharam juntos, mas sem falar um com o outro. No fim do dia, ganharam outra lata de feijão, desta vez com o abridor. Voltaram para seu quartinho e abriram a lata. O problema agora era onde iriam colocar o feijão para comer. Eles não têm escolha a não ser despejar um pouco de feijão nas mãos. Cada um deles pega um punhado e come. No quartinho não havia nada, eles não podiam lavar as mãos ali, então eles lambem as mãos e depois esfregam na roupa.

Algumas semanas se passam. Eles trabalham duro dia após dia, limpando cada canto da base e ganhando sempre uma lata de feijão no fim de cada dia. A causa do incidente com a mulher infectada ainda não havia sido descoberto. Os cientistas ainda investigavam a causa, mas não pareciam progredir muito. Os civis ainda eram alimentados e cuidados, mas pareciam estar se acostumando mais a ficar ali. Bernard era um tanto simpático com os civis e até dava porções extras de comida para as crianças. No entanto, ainda era bem duro com os assassinos. Os quatro voltaram a se falar aos poucos. Enquanto limpavam o banheiro pela terceira vez no mês, Steve pergunta para Yumi:

- Yumi, o que é a tatuagem de dragão nas suas costas? Eu vi sem querer a um tempo atrás.

- Isso? Bem... Tudo bem, eu conto. – Os outros 3 voltam a atenção para ela.

- Eu fiz isso em homenagem ao meu pai. Ele era da Yakuza, era o dragão da família. Ele foi morto por outro clã, outra família. As duas famílias entraram em guerra. Nossa casa foi invadida por alguns deles. Alguns homens que haviam servido meu pai protegeram a mim e a minha mãe. Ela fugiu comigo, para me proteger. Eu não sei o que aconteceu depois, com as duas famílias. Nos mudamos do Japão para cá. Anos depois, minha mãe foi morta por um assassino profissional. Eu não sei porque, ou quem o mandou. Entrei para o ramo em busca de vingança. – Explicou Yumi, com uma expressão triste no rosto.

Pela primeira vez, um deles se abriu com os outros. A história dela não justificava matar pessoas, mas era mais entendível. Os outros três

ficaram em silêncio ao ouvir a história dela. Steve a abraçou por trás. Ela pareceu um pouco desconfortável quando ele fez isso, mas não disse nada. Eles então voltaram a limpar. Yumi pareceu meio nervosa e sem jeito pelo resto do dia. Depois que eles terminam, Bernard vem lhes trazer mais uma lata de feijão. Steve então se irrita e diz:

- Vem cá, o que espera com isso? É sempre a mesma coisa a dias. Eu quero mudar, não ser um faxineiro. Me de algo de verdade pra fazer, não me importo com o que seja.

- Rapaz, calma. Tudo tem seu tempo. Comece pelas coisas pequenas primeiro. Você não vai se tornar um santo do dia pra noite, agora pega os malditos feijões, volta pro seu quartinho e fique feliz com isso! – Bernard empurra a lata de feijão nas mãos de Steve.

Steve se irrita, pega a lata e volta para o quartinho com passos pesados. Ele entra no quartinho e joga a latinha para Adam. Adam quase a deixa cair e percebe que Steve estava descontente. Ele se recusou a comer naquela noite. Sentou-se virado para a parede e passou a noite em claro naquela posição. Na manhã seguinte, Bernard destrancou a porta e quando abriu, Steve já estava de pé, esperando. O homem se assustou ao ver o rapaz já de pé mesmo antes do horário de costume. Sem dizer uma palavra, Steve pegou o esfregão e o balde e foi para o corredor. Os outros três também pegaram seus baldes e se juntaram a ele.

Bernard observou eles trabalhando por um tempo. Ele começava a se perguntar se Steve realmente queria mudar. Se eles não tivessem sido capturados, será que ele iria querer mudar? Dada a situação, não dava para saber. Ele então volta para sua sala, com algumas questões ainda sem resposta em mente. Enquanto esfrega o chão, Steve sente uma sensação ruim sobre si mesmo. Ele não achava que começar com coisas pequenas faria muita diferença. O rapaz então dá um grito, larga o esfregão e se agacha, com as duas mãos na cabeça. Ele parecia sentir dor.

Os outros falavam com ele, tentando ajuda-lo, mas ele não parecia estar ouvindo. Em sua mente, imagens horríveis queimavam. Imagens de coisas que ele causou. Vidas que ele tirou. Ele gritava coisas como:

- Não fui eu! NÃO! PARE! ABRA OS OLHOS!

O resto do grupo abraçou ele e tentou contê-lo de forma calma. Ele se balançava e gritava ainda mais alto, até que parou e sua consciência voltou para o agora. A respiração dele estava pesada e os olhos dele arregalados. Ele então se levantou com a ajuda dos outros e eles disseram para ele descansar um pouco. Os três continuaram a limpeza, mas ainda pareciam preocupados com ele. Ver o rapaz daquele jeito fez Adam ter lembranças também. A vida dele antes de ser um assassino já foi boa. Ele entendia a vontade de Steve de mudar.

A única do grupo que ainda não demonstrava muita vontade de mudar ou arrependimento era Lívia. Ela sempre foi a mais violenta do grupo, e a mais impiedosa. Ainda assim era a que parecia ter mais medo dos mortos-vivos e de tudo o que acontecia. No fim do dia, outra latinha de feijão foi ganha e Bernard percebeu que Steve não parecia bem. O rapaz foi levado de volta ao quarto com a ajuda dos outros três. Eles dividiram o feijão e Yumi ajudou Steve a comer, pois ele tremia de nervoso. Nesta noite, Yumi deitou-se ao lado de Steve, para que ele se sentisse mais calmo. Ele olhou nos olhos dela e se sentiu menos estressado. Yumi era um tanto bonita, e parecia mais jovem do que realmente era.

Na manhã seguinte, Bernard não foi ao quartinho. Os assassinos acharam estranho. Adam foi até a porta e percebeu que estava destrancada. Ele saiu e viu soldados armados do lado de fora. Foi até eles para saber o que acontecia:

- O que foi? Aonde está o general? Não tem trabalho hoje?

- Ele não está não. Volte para o quarto – respondeu um deles.

Adam voltou para o quartinho, ainda suspeitando do que acontecia. Os outros também pareceram confusos. O que será que estava acontecendo?

Do lado de fora, dois veículos blindados rondam a base. Haviam muitos mortos-vivos andando por lá. No topo de um dos veículos, estava Bernard. Ele segurava a arma com a qual o veículo era equipado e atirava em alguns zumbis que estavam próximos ao veículo. Os soldados pareciam procurar por alguma coisa. Bernard então pegou seu rádio transmissor e contatou alguém dentro da base:

- Tem certeza de que a viu aqui fora?

- Tenho sim senhor – respondeu a pessoa que atendeu o rádio.

- Continuem procurando – diz Bernard, falando com os soldados que dirigiam os veículos.

Eles continuam a dirigir em volta da base, atropelando e atirando em alguns zumbis. A base era agora localizada em uma cidade devastada. Tudo em volta era cinza. Bernard olha para os prédios e casas que estavam mais próximas da base. Ele vê na janela de uma casa, uma garota de cabelos loiros e um casaco laranja. Ela não parecia infectada. Ele então grita:

- Lá, lá está ela! – O homem aponta para a casa na qual viu a garota.

Os veículos vão em direção daquela casa. Chegando lá, Bernard e alguns soldados descem dos veículos. Eles entram na casa, com cautela. Um grupo de zumbis estava dentro de um dos quartos e avança contra eles. Eram 5 no total, todos pessoas de meia idade. Os soldados disparam contra eles, sangue espirra nas paredes e os zumbis caem no chão. Ainda tremem um pouco ao levar os tiros, mas não representavam mais ameaça. A garota de casaco laranja desceu as escadas correndo ao ouvir os tiros. Bernard fica decepcionado ao vê-la:

- Isso não é ela, seus incompetentes. Droga, é melhor do que nada!

A garota fica confusa ao ouvi-lo dizer aquilo. Ela olha para os zumbis mortos, e depois para os soldados. Ela então vê os veículos do lado de fora, pela janela. Ela pergunta de forma tímida:

- Posso ir com vocês?

- Claro que sim, me desculpe – respondeu Bernard, de forma simpática.

A garota andou até os soldados e eles a escoltaram até os veículos. Bernard subiu no alto de um dos veículos de novo. Eles então voltaram para a base. Chegando lá, levaram a garota para junto dos outros civis. Bernard ainda parecia decepcionado. Um dos soldados disse:

- Não se preocupe senhor, vamos encontrá-la.

Bernard deixou cair uma lágrima e apertou a mão do soldado. Ele então voltou para sua sala. Ele ligou sua vitrola e ouviu um pouco de música, sozinho. Era um tipo de música country, porém mais lenta. Mais tarde naquele dia, ele ordenou que os soldados levassem os quatro assassinos ao refeitório, para jantarem junto aos outros civis.

Os quatro ficaram surpresos ao serem levados ao refeitório. As pessoas em volta ainda não olhavam para eles, mas pelo menos teriam algo decente para comer. Desta vez, um prato para cada um é servido. A porção de comida também é semelhante à das outras pessoas. Melanie olha para eles com raiva, de uma mesa bem em frente à mesa deles. Adam se sente mal com o olhar da garotinha. De uma outra mesa, levanta-se um homem alto e forte e vai até a mesa dos assassinos. Ele olha para Adam e diz:

- Quem vocês pensam que são? Acham que podem comer junto de nós, pessoas de bem?

Adam olha para o homem, mas não responde nada. O homem então levanta o prato de Adam e Adam segura o braço dele. Os dois trocam um olhar de raiva. O homem cospe na comida de Adam. Adam solta o braço dele e se levanta. Os dois continuam se encarando, até que Adam joga a comida do prato na cara do homem. O homem acerte um soco em Adam. Depois de levar o golpe, ele vira para o homem e também o soca. Os dois então começam uma briga, trocando socos e chutes. Adam tinha a vantagem de ser um assassino, mais acostumado com combates. O homem já sangrava pelo nariz e estava atordoado. Os soldados então seguraram Adam e o levaram para fora do refeitório. O homem que começou a briga limpa o sangue do rosto, olha com raiva para os outros assassinos e volta para sua mesa.

Eles acabam de comer e saem do refeitório. Ao invés de serem levados ao quartinho, eles são levados até a sala de Bernard. Chegando lá, eles veem que Adam já estava na sala. Bernard como

sempre, estava com os pés em cima da mesa. Ele aponta para Steve e diz:

- Você pediu! Vocês farão algo mais do que limpar hoje. Vocês, eu e alguns soldados iremos lá fora. Acabou a moleza de vocês!

Eles olham um para o outro, parecendo preocupados. Steve no entanto pareceu disposto a fazer isso. Bernard saiu da sala e pediu que o seguissem. Eles andaram pelo corredor até uma outra sala, um tanto escura. Bernard ascendeu a luz. Haviam caixas de papelão espalhadas e empilhadas por toda a sala. Bernard pôs uma delas em cima de uma mesa de ferro que tinha no meio daquela sala. Ele abriu a caixa e tinha ali algumas coisas que pertenciam aos assassinos. Eram as coisas que foram pegas no primeiro dia que os soldados encontraram eles, incluindo a katana de Yumi.

Bernard apontou para a katana e disse que ela podia pegar. Ela pegou a espada, alisou a bainha com a mão direita como se estivesse sentindo falta da arma e a prendeu na cintura. Ela parecia satisfeita em ter aquilo de volta. Bernard disse aos outros que também se preparassem. Eles pegaram algumas das armas que estavam ali dentro. Steve pegou duas pistolas e seu facão. Adam pegou a faca de caça e uma submetralhadora. Lívia pegou um lança-granadas.

- Não façam eu me arrepender de dar armas a vocês – disse o general.

Bernard então os guiou até o lado de fora da base. Os corações de todos batiam rápido. A ansiedade tomava conta de Steve e o medo tomava conta de Lívia. Bernard logo vai pra cima do veículo blindado e lhes diz para entrar. A cidade estava escura. O farol dos veículos iluminava as ruas e alguns zumbis andando por lá.

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