Nem mesmo se quisesse, Harry conseguiria descrever o que sentiu e pensou quando as cortinas se abriram e Esther apareceu com o vestido de noiva. Ela sempre foi linda, mas naquele momento parecia uma miragem ou alucinação diante dele.
Sabe aquelas cenas de filmes românticos onde o personagem se encanta com a beleza da moça, e os dois parecem estar vivendo em câmera lenta enquanto ela o observa timidamente, com as bochechas vermelhas? Isso poderia descrever perfeitamente aquele momento. Se prestasse atenção, Harry podia escutar a batida do seu coração, que parecia querer sair de seu peito. Ele nem piscou, ainda petrificado no sofá diante dela. — Fale alguma coisa – Esther quebrou o silêncio, ainda constrangida. Ele engoliu em seco antes de ter qualquer outra reação. Harry sentia que nenhuma palavra do dicionário poderia descrever a beleza da mulher à sua frente. Sim, pode parecer exagero, mas era o que seu coração apaixonado gritava enquanto batia cada vez mais rápido no peito. Talvez devesse se preocupar com um ataque cardíaco, mas aquela sensação única e extraordinária aquecia seu peito e o fazia se sentir ainda mais vivo. Naquele momento, Harry soube o que fazer. Não poderia viver sabendo que nunca confessou o que sentia por Esther. Estava decidido: ainda naquele dia mudaria tudo entre eles, ignorando a parte de sua mente que dizia “ela pode vê-lo apenas como um amigo”. Passará anos ouvindo essa voz, acovardando-se e impedindo-se de ser feliz por medo. — “Ah, ela ensina as luzes a brilhar! Parece pender da face da noite como um brinco precioso da orelha de um etíope! Ela é bela demais para ser amada e pura demais para este mundo! Como uma pomba branca entre corvos, ela surge em meio às amigas. Ao final da dança, tentarei tocar sua mão, para assim purificar a minha. Meu coração amou até agora? Não, juram meus olhos. Até esta noite eu não conhecia a verdadeira beleza” – Harry recitou “Romeu e Julieta” com um grande sorriso enquanto se aproximava de Esther. Ela deu uma gargalhada ao ouvir aquilo, tão gostosa que inclinou a cabeça para trás. Ele sorriu ao ver a alegria em seu rosto pela primeira vez em muito tempo. — Harry, não seja bobo – ela bateu de leve em seu peito. Harry segurou sua mão e a beijou. Era um gesto simples, mas ainda parecia íntimo. Para ela, aquela frase não passava de uma brincadeira de seu melhor amigo, mas Esther era sua Julieta, e ele estava tão fascinado por sua beleza quanto Romeu. Talvez seu coração sentisse o mesmo amor divino que William Shakespeare narrou naquele romance arrebatador. — Você está linda; não consegui encontrar palavras para descrever sua beleza neste momento. Ela sorriu, com as bochechas ainda mais vermelhas, o que Harry achou estranho, pois eram raras às vezes em que ele a fazia ficar tímida. — Obrigada, Harry – ela voltou a encará-lo antes de balançar a cabeça, como se quisesse afastar um pensamento. — O que acha de comermos um x-burguer depois daqui? Minha mãe está me deixando louca com esse casamento; ela não me deixa comer nada sem aprovar antes – Esther revirou os olhos. E novamente aquele semblante preocupado e triste substituiu o brilho em seu olhar. Sempre que Esther mencionava aquele casamento, Harry sentia como se levasse um tapa na cara e voltasse à realidade. Assim que entraram, ouviram o som de um sino sobre a porta, dando boas-vindas. A lanchonete tinha um ar rústico; sempre que iam ali, ele sentia que voltava no tempo. Uma vitrola tocava uma música de Elvis Presley ao fundo, e o cheiro de café e chocolate se espalhava pelo ambiente, enquanto o piso recém-encerado refletia as luzes do teto. Foram em direção à mesa que sempre usavam no fundo, onde tinham mais privacidade para conversar. Logo, um garoto desajeitado com óculos grandes e um semblante nada amigável apareceu com um bloco de notas. — Sejam bem-vindos, posso anotar o pedido? Parecia uma frase decorada que era obrigado a repetir constantemente. — Vou querer um x-burguer com batata frita e milkshake de morango – Esther pediu com um sorriso. — O mesmo para mim – Harry acrescentou. O garoto saiu dali sem dizer mais nada, com o mesmo semblante descontente, e Esther olhou para Harry, rindo. — Não podemos julgá-lo; lembra de quando tínhamos a idade dele? – Harry comentou. — O tempo passou rápido demais. Lembro-me de que sonhávamos em ser adultos, e agora eu só queria poder voltar no tempo. Era tudo mais fácil – Esther disse, pensativa, com um semblante triste. Harry pegou sua mão sobre a mesa e lançou-lhe um olhar de compaixão. Ele entendia aquele sentimento; tudo parecia menos complicado quando eram mais jovens, e sentia-se livre, sem precisar pensar nas consequências. Nem ele mesmo sabia como aquele jovem aventureiro se tornou o homem certinho que só pensa em trabalho; seu eu do passado certamente se decepcionaria com essa nova versão. — Você tem algum arrependimento? – Harry tentou soar o mais natural possível, mas por dentro estava ansioso pela resposta. Esther mordeu o lábio enquanto ajeitava uma mecha do cabelo que insistia em cair sobre o rosto. Ela parecia apreensiva, pensando na resposta certa. — Tenho vários, mas o principal... gostaria de ter continuado a ser aquela garota que vivia sem se importar com o amanhã. — Essa garota deve estar aí em algum lugar ainda. Esther levantou seus olhos cor de avelã e o encarou de uma forma eletrizante. — Seja como for, não dá para voltar e mudar tudo – suspirou. Antes que Harry perguntasse o que a incomodava, os pedidos chegaram. Esther lambeu os lábios antes de dar a primeira mordida no lanche, soltando um gemido de satisfação enquanto mastigava. Harry estava paralisado, observando a cena à sua frente. Era excitante e mexia mais com seus sentimentos do que ele gostaria. Ele até se esqueceu de sua preocupação com o rumo que aquela conversa estava tomando. Pegou o milkshake, buscando algo gelado para refrescar o calor que sentia.