Torre de Mana
Torre de Mana
Por: Pedro P.R.
Cap 1

Coloquei minha última carga no galpão e limpei o suor da testa. Hoje o dia estava sendo bem movimentado para compensar o feriado de amanhã e mais ainda porque muitos dos funcionários mais novos tinham faltado. Bem, não os funcionários mais novos, mas sim aqueles que estavam para fazer vinte anos no momento, aqueles iguais a mim.

Apesar de que eu não sou tão impulsivo como eles.

- Ei, Miguel, que bom que você não se juntou aos irresponsáveis – uma voz rouca falou vinda de um andar acima de mim no galpão como se estivesse lendo meus pensamentos.

Olhei para cima e dei um sorriso amarelo para o supervisor que estava passando e voltei a focar no trabalho.

Diferente dos outros, eu prefiro seguir com cautela e não apostar todas as minhas fichas em um evento sobrenatural como aquele que acontecia todo o ano novo. Não, esse não era mais seu nome, agora nós chamávamos a virada de um ano para o outro de o Dia da Convocação.

Isso já acontecia a quarenta e três anos quando a primeira convocação aconteceu e mudou de vez o mundo como ele era conhecido, ou pelo menos é o que os livros antigos falam.

Antigamente o mundo era divididos em vários países governados por diferentes tipos de governos que estavam vivendo uma época de falsa paz onde as guerras aconteciam em sua maioria nas sombras, mas tudo mudou após a primeira convocação, ou melhor dizendo, alguns anos depois disso.

Mas isso não vem ao caso agora.

No momento, eu, Miguel, um entre muitos outros órfãos do Orfanato Santa Clara, estou no meado dos meus vinte anos e com isso sou um dos elegíveis para a Convocação. Por isso meu supervisor brinca sobre eu estar aqui trabalhando enquanto muitos da minha idade estão se preparando para o dia de amanhã.

A Convocação, caso você esteja se perguntando, é um fenômeno sobrenatural que acontece todos os anos e dura algumas poucas horas pelo mundo todo. Segundo as pessoas que já passaram dos seus vinte anos, durante a virada do ano, todos receberão um convite em forma de uma voz etérea dentro de sua cabeça.

Aqueles que aceitam, desaparecem de nosso mundo e são transportados para a Torre de Mana, um lugar cheio de mistérios e riquezas, assim como perigos sem fim.

Todos aqueles que voltam da Torre de Mana retornam sabendo usar a mana, um poder que não existia nesse mundo no passado. A mana pode ser usada de diferentes formas, como para fortalecer o corpo, usar magia ou encantar objetos. Aqueles que controlam a mana governam o mundo atual.

E isso responde à pergunta que muitos fazem quando descobrem que mais da metade daqueles que entram na torre pela primeira vez acabam morrendo. Porque entrar em um lugar onde sua chance de sobreviver é menor do que 80%?

Bem, sua chance de morrer é alta, mas mesmo assim a recompensa para caso você consiga voltar faz tudo valer a pena. Você deseja poder? Riqueza? Fama? Liberdade? Tudo pode ser alcançado desde que você sobreviva na Torre.

Por isso, mais da metade das pessoas que fazem vinte anos escolhem por escalar a Torre de Mana e para o bem ou para o mau, eu serei uma dessas pessoas.

Desde meus doze anos eu venho fazendo trabalhos, sejam legais ou ilegais. Tudo para juntar o dinheiro necessário para me equipar para a Convocação.

E por sorte eu tenho quase tudo pronto, por isso não estou com pressa desesperada como a maioria dos meus colegas de trabalho que provavelmente deixaram muitas das preparações para última hora.

Eu gostaria de ter colocado minhas mãos em mais algumas coisas antes de amanhã, mas assim é a vida, já é um milagre que um órfão como eu irá para a Torre medianamente equipado.

Uma sirene começa a tocar e minha alegria alcança o ápice. Finalmente acabou o expediente e estou livre.

Me juntei aos poucos que vieram trabalhar hoje na fila para receber o salaria diário e saio do galpão onde estava trabalhando com um sorriso satisfeito no rosto.

Lá fora, nas ruas da cidade das Cinco Torres, eu dou uma boa olhada em volta.

Os velhotes do orfanato costumavam dizer que antes da chegada da Convocação as cidades eram compostas por inúmeros prédios que chegavam quase até os céus, que as ruas eram asfaltadas e que o uso de armas nas ruas era proibido.

Mas agora, as casas em volta do distrito comercial tinham no máximo uns quatro andares de altura. Muitas das ruas eram feitas de barro, pelo menos ali na periferia da cidade e pelo menos metade das pessoas que andavam na rua tinham algum tipo de arma em mãos.

Muitos andavam com espadas curtas ou facas longas presas aos cintos. A maioria deles não devia fazer a mínima ideia de como usar aquelas armas adequadamente, mas dava a eles um senso mínimo de segurança no mundo em que vivíamos atualmente.

Outra coisa que os velhotes do orfanato costumavam comentar com um certo nível de graça, era que as pessoas hoje em dia se vestiam como uma mistura de pessoas modernas e da idade média.

Você podia ver um rapaz usando bermuda, tênis, camiseta e um cinto de couro com uma espada curta embainhada. Ou uma mulher usando um longo vestido com espartilho e um chapéu de abas longas sobre a cabeça. 

Os vestuários de todos se misturavam, desde civis, até seguranças de lojas e a guardas da cidade. Era algo de certa forma… fantástico.

Enquanto eu me movo pela cidade em direção ao orfanato, eu não posso deixar de reparar naquilo que deu o nome a essa cidade.

A cidade das Cinco Torres, com suas cinco torres cinzentas dividindo a cidade em cinco distritos principais e mais um punhado de distritos periféricos como aquele onde eu estava no momento.

Em cada uma daquelas malditas e altas torres se encontrava um dos senhores dessa cidade. Um dos cinco magos que governavam essa região. Cada um deles era um Convocado da Primeira Geração. Eles tinham entrado na Torre nos primeiros anos e saído de lá como portadores de grandes poderes. 

Hoje eles governavam como reis essa cidade e suas famílias lutavam pelo poder, cada uma querendo ser mais poderosa que a outra e pisando nas pobres almas que faziam aquela cidade funcionar.

Aquilo era o que muitos chamavam de o retorna da velha nobreza, ou o que quer que isso significasse.

Malditos velhotes e suas frases velhas do velho mundo.

Então, voltando as cinco famílias lideradas pelos cinco senhores da torre que governavam essa cidade. Eles seriam um saco de se lidar, se outras sete facções não tivessem surgido na cidade para poder igualar um pouco as coisas.

Veja bem, os cinco não são aliados, de forma alguma. E essa desunião foi o que deu a sete grandes empresas a chance de crescer na região.  Cada uma dessas empresas era gerida por um punhado de pessoas que tinham conseguido grandes poderes e riquezas nas Torre de Mana, e por mais que eles não ousassem desafiar os cinco senhores da cidade, eles ainda possuíam um poder a ser respeitado.

Agora deixemos de lado os poderosos da cidade que eu provavelmente nunca me envolverei e vamos focar no que está a minha frente porque acabei de chegar no orfanado Santa Clara.  Um lugar maravilhoso, com um belo jardim, um casarão de dois andares e um punhado de velhos e velhas cuidando de várias crianças abandonadas por seus progenitores ou que os perderam por algum caso infeliz da vida.

E é claro, tem aqueles que assim como eu já são maiores de idade, mas continuam por aqui, já que não temos para onde ir e podemos ajudar com as despesas.

- Já chegou, Mi? – Uma senhora perguntou enquanto molhava as plantas do jardim.

- Boa tarde, Elena. – Essa senhora chamada Elena é uma das mais gentis mulheres do mundo. Uma grande tia que vai cuidar de suas feridas e deixar você levar doces escondidos para o quarto quando ninguém estiver olhando.

Mas por mais que eu ame essa vovó gentil, eu também sei que ela é uma conversadeira de primeira e se eu vacilar, acabarei ficando preso com ela aqui no jardim até a hora de ir dormir.

É por isso que entro rapidamente no orfanato após uma rápida troca de palavras.

O orfanato por si é um dos maiores edifícios do nosso distrito e isso é grassas a influência de Mestre Jorge, um velho que fez parte dos primeiros grupos a serem convocados para a Torre e é grassar a esse velho que eu tenho a chance de mudar meu destino.

Enquanto caminho pelos corredores do orfanato, eu vejo inúmeras crianças correndo e brincando para todos os lados. A essa hora as tarefas deles já terminaram e pelo mês em que estamos eles já não possuem nenhuma aula já que estão de férias.

Vê-los correndo de um lado para o outro me lembra um pouco do passado, quando eu e os outros corríamos e brincávamos por esses mesmos corredores.

- Miguel? – Uma voz me chamou de repente me fazendo parar de andar e olho para dentro de um quarto para ver um homem um pouco mais velho do que eu repreendendo um garoto que devia ter no máximo uns quinze anos de idade.

- E aí, Fabinho – o cumprimento e já me preparo para continuar meu caminho quando Fabinho faz um gesto pedindo para que eu espere.

Sinceramente, eu gosto dele, mas ele era a única pessoa que eu não queria me encontrar no momento.

Fabinho tinha vinte dois anos e tinha sido um dos membros do orfano a entrar na Torre dois anos atrás. Ele retornou depois de uns cinco meses lá dentro, mas seu retorno não foi tão glorioso assim.

Um olhar para seu braço esquerdo, ou melhor dizendo, para a falta dele, era uma mostra bem simples dos perigos da torre.

Segundo o que eu sabia, Fabinho tinha chegado até o quarto andar da torre onde mal tinha conseguido sobreviver para retornar. Ele tinha retornado com pouquíssimos itens que valessem alguma coisa e apesar de poder usar mana agora, suas habilidades eram consideradas bem medíocres e seu único poder de nota era que ele podia acalmar qualquer animal perto dele.

- Desculpa, acho que te fiz esperar tempo demais – falou enquanto saía do quarto e caminhava pelo corredor comigo.

- Sem problema. O que o garoto fez?

- Nada demais, eu só estava aconselhando ele porque ouvi outras crianças dizendo que ele estava pensando em se juntar a guarda da cidade.

Hum, isso é bem interessante. Bem, além de se tornar um convocado, há outra maneira de conseguir se tornar um usuário de mana ou ter um futuro um polco promissor - Primeiro vamos esclarecer uma coisa. O Mestre Jorge, o velho convocado que gere esse orfanato, sempre treinou os jovens daqui para que eles soubessem se defender e isso abriu as portas para muitos de nós como seguranças ou guardas e até mesmo como soldados - mas apesar de assinar um contrato para servir alguém ter seus méritos, eu preferiria não colocar meu futuro nas mãos de terceiros.

- Então, o que você quer conversar? – pergunto a Fabinho apesar de já saber qual será a resposta dele.

- Vocês vão mesmo entrar na Torre? – A pergunta dele veio em um sussurro quase inaudível.

É, eu já esperava por isso. Desde que voltou, Fabinho sempre tentou desmotivar qualquer um que tentasse seguir o caminho da Torre de Mana. Eu entendo ele, suas experiências lá não foram nem um pouco boas e mesmo assim ele ainda é um dos sortudos que voltaram com vida, mas mesmo assim, ainda é um saco ter ele tentando se meter nesse assunto.

- Eu acho que você já deve ter conversado com os outros e essa não é a primeira vez que você vem conversar comigo. Já não sabe a resposta?

Ele balança a cabeça com tristeza. Provavelmente era sua última tentativa de me desmotivar a ir, mas eu acabei com suas chances antes mesmo dele começar a se aprofundar no assunto.

- Tenha cuidado, Miguel. A Torre é um mundo completamente diferente do nosso e um passo errado pode significar seu fim. – Ele se vira para ir embora, mas hesita antes de falar novamente. – E acima de tudo, não confie em ninguém.

Com essas palavras sinistras ele vai embora e me deixa sozinho no corredor.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >
capítulo anteriorpróximo capítulo

Capítulos relacionados

Último capítulo