Elas se encontraram em um terminal rodoviário. Yágilla foi com o motorista, desceu do carro, abraçou Kassandra e perguntou:
— O que está acontecendo, Ka? Ele te fez algo? Chorando, Kassandra contou que o havia pego com outra novamente e que estava cada vez mais insuportável morar lá. — Calma — Yágilla respondeu. — Vamos para a minha casa. A gente conversa, você se acalma, o que acha? Ela concordou entraram no carro, no trajeto ela só chorou nervosa. Na casa de Yágilla, sentindo um acolhimento que há muito tempo não recebia, Kassandra finalmente se permitiu desabafar. As palavras saíam em meio a soluços, desorganizadas no início, mas depois ganhando um fluxo de dor e ressentimento acumulados. — Eu não aguento mais, Yágilla! — Kassandra começou, as mãos tremendo. — Eu... eu não sei nem por onde começar. Parece que a minha vida virou um pesadelo desde que meus pais se foram. O Andy mudou completamente. No começo, ele era tão carinhoso, tão protetor. Eu confiava nele cegamente, sabe? Yágilla ouvia atentamente, segurando a mão de Kassandra em alguns momentos. — Eu nem percebi o que estava acontecendo. Ele me convenceu a fazer empréstimos! Ele colocou tudo no nome dele, a nossa casa, e eu não tenho nada. Ele tirou meu dinheiro, meu nome. A voz de Kassandra embargou. — E ele me trata como... como uma empregada. Ele me obriga a limpar a casa, a cozinhar para ele. Me humilha o tempo todo, diz que eu não sirvo pra nada, que sou burra. E as traições... Ah, Yágilla, as traições são a parte mais cruel. Ele nem se esconde mais. Hoje de manhã, eu cheguei e eles estavam lá, na nossa sala, pelados! Uma garota que a gente conhece! Ele nem se importa! Kassandra respirou fundo, tentando controlar a torrente de emoções. — E a cirurgia... Ele me largou no hospital, foi me ver por cinco minutos e nem tocou no assunto do abo.rto. Acha que estou mentindo quando digo que sinto dor. E me ameaça, Yágilla! Ele me ameaçou me jogar da escada no trabalho dele! Disse que ninguém ia acreditar em mim, que ele tem a versão perfeita. Eu estou com medo. Muito medo. Eu não tenho para onde ir, não tenho dinheiro, não tenho trabalho... Eu me sinto presa. As lágrimas voltaram a rolar pelo rosto de Kassandra, e Yágilla a abraçou apertado. — Eu só queria que tudo voltasse ao normal, mas eu sei que não vai. Eu só queria ter um lugar para ficar, para me recuperar e tentar recomeçar. Mas parece que cada porta que eu bato está fechada. A casa de Yágilla era uma casa bonita, de classe média alta, com portão fechado automático. Yágilla olhou para Kassandra com compaixão e disse: — Olha, fica tranquila, esquece o Andy. Vamos ter um ótimo dia. A gente cozinha algo bem bom e leve, você conversa, vai se distrair... Vou te ajudar! Preciso te contar a minha vida também. Enquanto Kassandra ainda estava absorvendo as palavras de Yágilla, ela foi ao banheiro, o portão automático se abriu fazendo barulho, revelando um carro entrando na garagem, pela janela Yágilla espiou, Valentino entrou, acompanhado por Andreyna. A menina vestia uma fantasia de princesa e, animada, correu para os fundos da casa, provavelmente para o jardim, acompanhada por uma amiguinha que vinha logo atrás. As meninas nem viram as duas na sala. Kassandra voltou, mais calma. Valentino caminhou até a sala, com um sorriso gentil no rosto. Seus olhos azuis, antes carregados de seriedade, agora brilhavam com um carinho genuíno ao encontrar Yágilla. — Oi, meu amor — ele disse, inclinando-se para beijar Yágilla com ternura. O beijo foi longo e afetuoso, cheio de cumplicidade. Depois de beijar a esposa, Valentino se virou para Kassandra, um sorriso educado em seu rosto. — Boa tarde, Kassandra, espero que esteja se sentindo melhor. Kassandra falou um "oi" cabisbaixa. Yágilla levantou-se e disse, com um brilho nos olhos: — Você vai conhecer os monstrinhos agora, querida. Elas foram até uma edícula no fundo do quintal. As meninas estavam brincando de casinha. Yágilla abriu a porta e disse: — Filha, posso entrar na sua casa? Trouxe uma amiga da mamãe para conhecer você. Andreyna respondeu que não queria conhecer Kassandra. Kassandra ficou surpresa com a franqueza da menina. Yágilla entrou à frente, e Kassandra ficou parada na porta do quarto. Yágilla saiu com a menina no colo. Andreyna era linda, fez uma careta para Kassandra. Ela tentou conversar, mas a menina não lhe deu bola. Saíram do quarto. Yágilla chamou Kassandra para ir à cozinha. Kassandra sentou-se à mesa. Yágilla começou a cozinhar uma massa e abriu um vinho. Ela era bastante comunicativa, enquanto ela, sentindo-se péssima, falava muito pouco. De repente, Yágilla disse: — Kassandra, eu vi no seu olhar a sua tristeza quando te conheci. Não sei, vi algo em você diferente. Por mais normal que você tentou ser, eu sabia que tinha algo errado acontecendo. Kassandra respondeu: — Eu nunca estive tão triste, Yágilla. Se você me conhecesse há um ano atrás, iria gostar da pessoa que eu era, simpática e alegre, irradiava luz. Yágilla aproximou-se e disse, abraçando-a: — Eu gosto da pessoa que você é, boba, pelo menos o que vi até agora. Olha, até me arrepia. Kassandra, no que eu puder te ajudar, eu vou. Queria que alguém tivesse feito algo por mim quando eu precisei. Acredite, eu entendo o que você está passando. Yágilla se afastou um pouco do abraço, com os olhos brilhando de uma nova ideia. — Sabe, Kassandra... por falar em ajudar, eu estava mesmo precisando de uma babá com urgência. Minha vida anda uma loucura com a Andreyna e meus compromissos. E eu... — ela hesitou por um segundo, com um leve sorriso. — Eu sinto que você seria perfeita para isso. A edícula no fundo do quintal, onde as meninas estavam brincando, é bem confortável e seria seu quarto. Você teria seu espaço e ganharia R$ 2.000,00 por mês. O que você acha? É um lugar seguro, e você não estaria sozinha. Eu... eu quero te ajudar.