CAPÍTULO 02 - A ÚLTIMA CAÇADA

— O que? Por que eu faria isso? — Orion perguntou inquieto. — Teve outra visão? Algo ruim está para acontecer, não está?

— Não sei com clareza, mas preciso que você esteja seguro... Por favor, eu insisto que saia da alcateia hoje! — Supliquei, mesmo sem poder enxergar, senti que ele ponderava. — Orion?

— Está bem..., Mas e você? — Suspirando, senti que ele se erguia.

— Ficarei bem, apenas se mantenha seguro, você é como um irmão para mim. — Esforcei um sorriso.

— Irmão... — Rosnou o ômega contra o gosto. — Acho bom estar viva quando eu retornar à alcateia!

— Farei o meu melhor!

Senti que ele havia saído. Em uma prece, clamei à Deusa:

— Por favor, proteja o meu amigo e irmão de coração.

Cedi novamente à exaustão dos ferimentos e despertei em minha escuridão com um forte chute em minha barriga. Gemi desesperada, sentindo as lágrimas se acumularem, e farejando a nuance dos cheiros, percebi de alguém conhecido que estava presente e furioso.

— M*****a, me deixou mal na frente do Alfa hoje! — Ele sussurrou agarrando meus pelos puxando-me para cima antes de deferir mais um chute em meu corpo.

— Eu? — Choraminguei. — Me perdoe, Dante.

Agarrando minha cabeça, Dante aproximou seu hálito do meu focinho, acabei me mijando de medo.

— Criatura nojenta. — Ele me soltou rosnando. — Quando nos unirmos, será questão de tempo até sua vida ser ceifada de uma vez por todas. Aí poderei ter uma companheira de verdade.

— Como a Esmeralda? — Falei entre as presas com ódio.

— Com ciúmes? — Gargalhando frio, ele me agarrou novamente. Meu corpo estava mole e fraco, não suportando mais tamanha tortura. — Você nunca será capaz de me dar o que quero ou de suprir minhas necessidades. Olha só para você... Nem mesmo a Deusa teve pena de uma loba como você!

— Se passarem desta noite vivos, quem sabe Esmeralda não lhe dê o que deseja. — Sorri ironicamente, sentindo as vibrações do chão mudarem. O ar estava mais carregado, o aroma que vinha de fora estava tomado por poder, ódio e sangue.

— O que você quer dizer com isso? — Rosnou Dante enfurecido.

— Dante? Já preparou a presa? — Brandou o Alfa a passos firmes.

— Sim, meu rei... — Jogando-me no chão, Dante respondeu ao rei com veemência. Estremeci compreendendo suas palavras; meu pai não me deixaria em paz, não aguardaria minha recuperação antes de me machucar novamente.

— Meu Alfa... — Sussurrei com medo de ser repreendida. — Não estou em condições aceitáveis para ser uma presa digna para sua caça... Eu te imploro, me dê esta noite para me recuperar.

Algo agarrou firme minha carne, dilacerando-a como se rasgasse um pano ao meio. Gritei de dor, tremendo descompassada.

— Se quiser se alimentar hoje, loba inútil, terá que contribuir com a alcateia de alguma forma! — O hálito podre e sanguinário de meu pai fazia minhas entranhas se contorcerem em repúdio. — Não me decepcione dessa vez, sabe como fico diante de presas fáceis.

Suas palavras me causaram calafrios. Assenti em silêncio, permitindo que as lágrimas escorressem.

— Sim, meu rei... — Sussurrei, entregue ao meu destino.

Sendo arrastada, ouvia muitos lobos cochicharem e rirem da minha situação. Ao longe, pude escutar:

— Até que enfim o Alfa vai se livrar da amaldiçoada... — Rosnou um lobo.

— Talvez assim a Deusa volte a nos abençoar... — Comentou uma loba.

Ali compreendi tudo. A razão pela qual a caça retomaria sendo o rei Lycan a me caçar... Não era mais um treino de caça; estava diante de uma execução iminente, onde meu próprio pai brincaria com meu medo e desespero, acabando com minha carne antes de ceifar minha vida, destruindo até mesmo meu espírito.

Eu tremia compulsivamente, fraca, com as dores latentes do meu corpo. Me soltaram, rindo sombriamente. Ouvi Hunter dizer:

— Corra, presa, que seja uma última e prazerosa caçada. — Ele rugiu em minha orelha lupina. — Te darei a vantagem da distância, vá, corra rápido.

Mesmo trêmula, comecei a correr, tropeçando e caindo diversas vezes. Parei ao que parecia ser uma árvore oca, onde encolhi meu pequeno corpo lupino em lágrimas, com o coração batendo descompassado e freneticamente. Ergui o focinho ao céu, inalando ao redor e clamando em voz alta à Deusa:

— Por favor, minha Lua, eu te suplico, me dê uma morte rápida sem muita dor... Já não suporto mais!

— Corra para o destino, minha criança... — A brisa sussurrou, soprando em minha face, trazendo um aroma amadeirado com toques de orvalho. — Siga...

— Destino? — Murmurei quando ouvi seu rosnado.

— Eu sinto seu cheiro repugnante, m*****a prole do inferno... — Brandou Hunter, vibrando o chão com suas patadas fortes. — Hoje você se juntará a sua mãe, aquela loba decepcionante que não prestou nem para me gerar uma cria digna de um alfa!

— Maldito! — Rosnei com raiva, voltando a correr.

A brisa em minha face se tornou mais intensa, a cada caminho que pensava em seguir a intensidade dos ventos me arrastava em outra direção. Porém, seus passos ecoavam cada vez mais perto, até que senti sua forte presença sobre meu corpo e peso sobre minhas costas.

Hunter havia me localizado, saltando sobre meu corpo, mordendo com força. Grunhi aflita diante da dor, caindo bruscamente de cara no chão. Divertido, o Alfa esfregou meu focinho na terra fria da mata, se deliciando com a minha dor.

— Seu lixo, eu a odeio tanto, deveria tê-la matado assim que nasceu! — Ele rugiu enfurecido. — Desde o dia em que você nasceu só trouxe desgraças à alcateia, vou corrigir este erro nos livrando de você lentamente.

Agarrando minhas patas, o rei Lycan as quebrou ao meio, e eu me contorcia em desespero, gemendo.

— Pai, por favor.... — Implorava e clamava. — Apenas me mate!

— Cala a boca, criatura inferior. — Recebi um soco potente no rosto, sentindo que meu maxilar havia deslocado, me impedindo de falar ou até mesmo rosnar.

Suas garras se aprofundaram em minha carne, rasgando as laterais, e minhas forças foram se esvaindo junto ao líquido viscoso vermelho que se mesclava ao meu pelo. Suas agressões já não surtiam mais efeito, eu estava anestesiada pela dor e sentia meu fim chegar.

— Presa inútil, se quer consegue resistir por tanto tempo... — Senti algo quente sendo derramado em meu corpo... O odor de urina era intenso, ardendo nas feridas abertas. — Agora morra! Arfei quando fortes patadas foram deferidas sobre meu crânio, pressionando-o contra o chão da floresta. Em minha escuridão, privada de enxergar, agradeci à Deusa por não ver minha vida sendo ceifada por aquele que deveria me proteger como loba e como pai.

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