Um

    Mal o ribombar da primeira badalada do grande sino tinha parado, e Ana já estava fora da cama. Enfiava as pernas nas calças enquanto lutava para se equilibrar.

                 – Ana –Maria gemeu da cama ao lado  –, você dormiu? – perguntou enquanto se sentava.

                 – O suficiente  –  Ana respondeu, agora enfiando os braços na camisa.

                A menina terminou de calçar as botas e correu para a porta do dormitório que se abria. Dona Raimunda, monitora de dormitório parou ao ver Ana; lançou lhe um olhar de reprovação que fez Ana parar, olhou para trás e viu que não tinha arrumado a cama, o que era quase um crime para dona Raimunda. Ana revirou os olhos antes de volta a cama e arruma-la.

                Quanta perca de tempo, Ana pensou resignada. Terminou de arrumar a cama o mais rápido possível e mais uma vez foi na direção da porta, mas outro olhar de dona Raimunda a fez parar onde estava.

                 – Penteie o cabelo, Ana – dona Raimunda disse gentilmente  –, não vai querer aparecer despenteada na frente dos mestres.

                Mais uma vez Ana revirou os olhos.

                Maria, diferente de Ana ainda estava se vestindo, um longo vestido de cetim verde tinha sido sua escolha.

               

                 – Um bom dia para todas, meninas – dona Raimunda entoou para as dez adolescentes que acordavam. – Hoje é o grande dia da escolha, hoje muitas de vocês se despedirão do templo Pai, e eu estou feliz, e ao mesmo tempo triste. Mas minha felicidade maior é saber que hoje cada uma de vocês seguirão seus caminhos.

                Dona Raimunda era uma Mãe do grande templo Pai. Uma senhora de sessenta que aparentava ter mal cinquenta. Como toda sacerdotisa do templo Pai, era uma senhora gentil, mas que sabia ser rígida quando necessário, uma voz tão suave quanto sua aparência, de pele parda e olhos verdes claros, olhos que podiam reprovar e ao mesmo tempo cativar. Ana não confiava nela, nunca confiava em ninguém que parecia ser muito bom, uma lição aprendida a duras penas, e do alto dos seus quinze anos se achava capaz de discernir quem era de verdadeiro e quem era de mentiroso, e na sua perspectiva, tinha alguma coisa muito errada com dona Raimunda.

                Naquele período, o templo Pai comportava cerca de trinta adolescentes, boa parte já tinha destino certo na cidade grande, exercendo os mais diversos dos trabalhos, já outros poderiam ir para outro templo em serviam as pessoas, outras iriam ficar e aprender a ser uma sacerdotisa do templo Pai – uma Mão de todos.  Esses aprenderiam que o templo protege da chuva e do sol, e as Mães das doenças e da solidão, além de educar, e amar. Toda mãe ama seus filhos.

                A maioria tinha destino certo, e aqueles que não tinham escolheriam hoje seu caminho, Ana era uma dessas. Ela tinha o desejo de ser advogada, mas isso mudou há dois anos, quando ela por conta própria investigou a morte de seus pais e descobriu a verdade em torno do misterioso acidente que lhes tirou a vida. Era o sonho de seu pai que ela seguisse seus passos, mas eles haviam lhe arrancado dela. Uma advogada não poderia trazer justiça, isso era a visão de seu pai, ela aprendeu que quando a injustiça causa morte, apenas uma bala pode fazer justiça.

                 –O desjejum será servido uma hora mais cedo devido às atividades de hoje. Boa sorte a todas – disse dona Raimunda. – E não, você vai esperar como todas as outras, Ana. – disse e saiu batendo a porta atrás de si.

                 –Uma mãe é justa com todas as filhas, Ana – Maria disse  –, e não seria justo você ir mais cedo que as demais.

                 –Ela não é minha mãe – Ana se limitou a responder.

                Ela acreditava que teria mais chances de provar seu valor para o lampião se falasse com ele as sós, mas a aquela velha decrepita havia estragado tudo.

                 – Não fale besteiras – Maria lhe lançou um olhar de reprovação. – E me ajude a pentear meu cabelo – disse jogando uma escova para sua amiga.

                Ana suspirou fundo, e como não tinha outra opção...

Os cabelos de Maria eram loiros e longos, contrastavam com seus olhos verdes escuros.

                 – Deveria colocar um vestido – Maria disse.

                 – Lampiões não usam vestido.

                 –Ana, você ainda esta com isso na cabeça? Sabe que garotas não podem ser lampiões. Quando você vai...ai! – Maria reclamou quando teve o cabelo puxado.

                 – Desculpe, estava embaraçado.

                 – Já está bom – Maria se virou para amiga. – Ana, seu cabelo está horrível, deixa eu pelo menos arrumar um pouco.

                Os cabelos de Ana eram negros e curtos, o comprimento chegava aos ombros. Seus olhos eram de um castanho escuro e profundo. Enquanto Maria era alta e graciosa, Ana era pequena e sem os dotes femininos que já eram esperados naquela idade.

                Só quando todas as meninas estavam devidamente arrumadas, tiveram autorização para fazerem o desjejum. Os meninos já estavam no refeitório. Tinham a vantagem de se arrumar mais rápido. Maria ficou na ponta do pé, procurando no meio da multidão, logo encontrou quem procurava. David acena para loira, que sorriu.

                 – Vamos, David está ali – disse puxando Ana pelo braço.

                David e Maria namoram escondidos, não que as mães não soubessem do romance, mas preferiam fazer vista grossa, afinal fazia parte da adolescência, e quem poderia dizer que não seria um amor para toda a vida.  As mães apostavam nisso, o que levava Ana acreditar que todas eram frustradas, embora dissesse que foi escolha estarem ali cuidando de órfãos, Ana apostava que prefeririam estarem casadas com um homem de verdade e não com um templo, que prefeririam cuidarem de seus próprios filhos, a crianças desconhecidas.

                David era bonito, alto, de pele parda, cabelos castanhos, rosto afilado combinando com os lábios que eram quase uma linha no rosto.

                 – Vai ser a diplomata mais linda dos cinco reinos—David disse.

                Maria sorriu e corou.

               – Que nojo – Ana fez careta  –, ainda bem que ainda não comi.

                Ao lado de David estava Henrique, um menino tímido que tinha o sonho de se tornar Poeta. Os poetas eram muito estimados nos cinco reinos; eram responsáveis por transformar em palavras os feitos de grandes homens, de guerras sanguinárias, além de serem obrigados a falar mais de um idioma.   Para Ana, era o mesmo que escolher retratar as aventuras do outros, ao invés de viver as próprias. Mas ela não o criticava, ela precisaria de poetas para contar sua historia.

                 – Bom dia! –Henrique cumprimentou. – Vocês estão nervosas?! Porque eu estou muito...

                 – Eu estou também—Maria respondeu.

                 – Urrum – Ana já tinha um pão enfiado na boca, e não deu muita atenção a Henrique. Ele era medroso, é claro que ele estaria nervoso.

                Enquanto Ana enfiava outro pão na boca,  Alice se aproximou. Alice era outra órfã filha do templo Pai, mas de pai, sua mãe havia ficado louca depois da morte do esposo, ninguém comentava sobre o assunto, mas todos tinha conhecimento da triste historia. Ela era branca de cabelos vermelhos e encaracolados, olhos castanhos claros, e algumas sardas no rosto. Ela queria ser cantora, e naquele ano poderia ser escolhida para seguir os passos de um famoso cantor. Viver de sua arte era seu verdadeiro sonho.

                Ela se juntou aos amigos. Eles eram inseparáveis no orfanato, e Ana se perguntava se aquele seria o ultimo dia que comeriam juntos. Temeu o futuro, ao mesmo tempo em que o desejava mais que tudo. Mas se deixava seduzir bem mais com o futuro inesperado; sempre odiou repetição, sempre odiou o previsível.

                 – Eu soube que o agulha negra desse ano é  Alex – David comentou.

                 – Alex?—Henrique se impressionou. – Dizem que foi ele que criou o tratado da fronteira, e para isso lutou contra o povo bárbaro sozinho. Ele nunca veio recrutar antes.

                 – Eu ainda não acredito que quer ser um agulha negra – Maria olhou gravemente para David que estava na sua frente.

                 – Um agulha negra é livre – David disse abrindo o costumeiro sorriso que usava quando falava dos terríveis homens de preto. – Eu poderei ir e vir, poderei ate mesmo ir onde você estiver. – sorriu, dessa vez o sorriso que pertencia a Maria. David tinha muitos sorrisos, Ana já tinha notado, amava cada um deles.

                 – Agulhas negras não são livres – o barulho  forte veio de trás de Henrique. – São covardes, que fogem quando a batalha começa.

                David se virou para encarar Tomas; um negro alto e forte. Ele dizia ter quinze anos, mas ninguém acredita. De ombros largos, braços fortes, queixo quadrado e pelo menos um cabeça mais alto que a maioria ali.

                 –Combina perfeitamente com você graveto – Tomas comentou enquanto passou as mãos fortes sobre os ombros de Henrique e David.

                Ana temeu o pior, os dois sempre brigavam por um motivo e outro, mas sabia que Tomas não faria nada com Alice por perto. Ele era apaixonado por ela, todos sabiam menos Alice, ou ela fingia não saber.

                 – Sente ai e faça algo mais útil – Ana disse. – Encha sua boca com alguma coisa que não seja essas merdas que você fala.

                 – Cuidado com a língua – Maria ralhou. – As mães já estão de olho em você.

                 – Deixe ela falar – Tomas sorriu. – Esquilos falantes são raros.

                 – Parem todos vocês! – Alice pediu. – Hoje é um grande dia, não podemos estragar com brigas.

                O desjejum seguiu sem maiores incidentes.

                Tomas contou vantagens de ter sido escolhido para o exercito com apenas treze anos, o que foi muito quase um sonho realizado. Sempre sonhou em ser soldado de fronteira. Sempre sonhou em lutar contra o povo bárbaro.

                Ignorando alguns risos de Tomas, David contou de como seria glorioso viver livre. Viajar para vários países, caçar bandidos, lutar contra o mal.

                Alice sempre cantara bem, fascinava qualquer um com quando cantava, bem mais é claro, Tomas que tinha coragem pra tudo, menos se declarar para menina ruiva. E Alice não parecia nem um pouco interessada no gigante, na verdade não parecia está interessada em ninguém.

               

                 – Chegou a hora, meus queridos – dona Maria entoou da porta do refeitório.

***

                O grande salão da escolha era perfeitamente quadrado. Em um dos cantos ficavam os futuros aprendizes, de frente para eles estavam as Mães lançando lhes olhares de incentivo. Também era dever delas dizer as qualidades e os defeitos dos órfãos para facilitar a escolha dos mestres.

                E no fundo do grande salão estavam os mestres; artistas, pistoleiros, cantores, cozinheiros, soldados, etc. Havia homens dos cinco reinos. Os que mais destacavam entre os homens ali, eram o lampião, que usava um longo sobretudo vermelho, e o agulha negra, que sempre estava usando vestes negras.

                Os jovens que já tinham destino certo tiveram os nomes chamados no inicio do ritual de escolha e não precisariam se apresentar para os mestres, já os demais tinha que fazer o possível para serem escolhidos. Seus futuros dependiam daquele dia, e o peso dessa verdade pesava sobre os ombros de Ana, que sabia o que queria, mas que também sabia que enfrentaria o preconceito por ser uma garota. Sabia o que aconteceria se não fosse escolhida, sabia... sabia de tanta coisa que era perturbador pensar, por isso escolhia pensar o mínimo possível.

                Dona Francisca era a oradora daquela apresentação, ela tinha que apresentar os adolescentes diante dos mestres.

                 –Henrique – ela chamou  –, apresente-se, por favor.

                Henrique  se dirigiu ao centro do grande salão. Mesmo à distância, Ana podia notar o garoto tremendo.

                 –Diga para eles meu bem – dona Francisca incentivou. – Diga que profissão deseja seguir.

                 – E-eu eu quero ser um poeta – ele conseguiu dizer.

                Entre os vários mestres um homem se ergueu. Era um homem magro com um terno azul marinho, uma cartola curta, usava um bigode fino.

                 – Me diga seu nome o mais alto possível – o homem elegante pediu.

                 –Henrique – o órfão usou toda sua convicção para dizer. Sabia que o pedido do poeta era para ver se sua voz era forte o suficiente para ser ouvida mesmo à distância.

                 –  O que as mães poderiam me dizer sobre esse jovem? – o poeta quis saber. Ele poderia tentar fazer o jovem dizer, mas sabia que o nervosismo atrapalharia o desempenho do garoto.

                Uma das mães se levantou. Ana não a conhecia, mas sabia que era monitora do dormitório masculino.

                 –Ele nunca foi um jovem ativo – ela começou. –Costumava trocar as brincadeiras de bangue-bangue, por livros. Aos treze anos já tinha lido as crônicas dos lampiões contadas em poesias pela famosa poetisa Iris de Malta.

                 – Muito bom! – o poeta avaliou mais uma vez o adolescente. – Sabe alguma dessas poesias decoras?

                 –S-sei sim – Henrique respondeu cada vez mais confiante. – A minhas favoritas.

                 – Recite uma – o poeta pediu sorrindo. – E não se preocupe você já foi aceito, só desejo saber se tem bom gosto como eu.

                Henrique mal pode conter a empolgação.

                 – O lampião surge na hora mais sóbria, no dia mais obscuro, acendendo a chama mortífera que envia para longe o mal do breu.

                 – Bom..! – o poeta exclamou. – Muito bom! – disse e olhou para as mães. – Eu o aceito.

                Henrique voltou para seu lugar não conseguindo conter o sorriso de orelha a orelha.

                 – Parabéns! – Maria disse baixinho, feliz pelo amigo.

                Dona Francisca tomou novamente à frente:

                 – Alice – chamou  –, agora e você querida.

                Enquanto todos – ao menos os normais – ficavam tímidos com uma plateia diante de si, Alice ficava mais confortável com uma plateia, do que diante de uma conversa a dois. Talvez porque ela apenas canta na frente da plateia, Ana cogitava.

                Alice se posicionou e disse:

                 –Desejo ser cantora – Alice disse.

                 –Então o que está fazendo falando? – disse um homem gordo de entre os metres, ele não fez questão de levantar. Era Gideão, um cantor excêntrico, e famoso nos cinco reinos.

                 – Terra de onça, terra de águia – Alice entoou seu perfeito soprano, em uma melodia doce e continua. – Vamos viajar por entre os rios...

                 – Pode parar – Gideão disse. – Tem talento, eu admito, mas mesmo os muitos talentosos começam no meu coral. Chegará à banda ou ao solo se me provar que além de talentosa é dedicada. Aceita esses termos?

                 –Sim, sim, eu aceito! – Alice respondeu mais que imediatamente.

                 – Ótimo – fez um gesto qualquer com mão. – Eu a aceito!

                Então foi a vez de tomas, embora estivesse tão nervoso quanto, sabia esconder mais que Henrique. Tomou o lugar de falar e disse depois de um incentivo de dona Francisca:

                 – Desejo ser soldado – ele disse. Era mera formalidade, mas isso não deixava de ser um teste, afinal era a primeira vez que via o general Julius.

                O general era um homem um tanto acima do peso, mas que mesmo assim visasse o quão forte era. Tinha boa parte dos cabelos grisalhos, embora não tivesse nem quarenta anos, o preço de ser um soldado a vida toda. Julius se levantou e foi ate o jovem:

                 – Já ouvir falar muito de você – o general comentou enquanto avaliava o jovem de perto, deu alguns tapas nos ombros de Tomas, e então se virou para as mães. – O que me podem dizer desse jovem?

                 –Como bem sabe – uma das mães se levantou. – Sempre foi um jovem muito forte, sempre muito ativo. Preferindo atividades, mesmo que pesadas a ficar parado...

                 – Forte eu já notei que é, quero saber se é inteligente?

                 – Depende de que tipo de inteligência está falando, general – a mãe retrucou. Elas tinham que falar a verdade sempre, mas não gostavam de falar abertamente dos defeitos dos seus filhos, embora fossem obrigadas algumas vezes.

                 – Quero saber se não vai atirar no próprio pé se lhe entregarem uma arma, e se sabe cumprir ordens.

                 –Lhe garanto que ele não atirará no próprio pé, e sim, ele sabe cumprir ordens.

                 –Eu o aceito – o general disse voltou para sua cadeira.

                 –David – Dona Francisca chamou depois que Tomas tomou seu lugar.

                David tomou o lugar de fala. Seus olhos pousaram imediatamente no agulha negra que estava praticamente oculto entre os mestres, num canto onde as sombras praticamente o escondiam, graças aos trajes sempre negros.

                 – Quero ser um agulha negra – ele disse.

                O agulha negra levantou-se vagarosamente, e caminhou ate David sem a menor pressa. Na verdade Ana nunca viu um agulha negra apressado em para fazer nada, embora tivesse a fama de serem muito rápidos no gatilho, mas claro, não mais que um lampião.

                O agulha negra era Alex, um omem temido, assim como todo agulha negra, mas esse tinha uma fama de ser cruel com seus inimigos, e aqueles olhos frios não negavam esse verdade. Olhos que agora estavam voltados para os de David, que lutava pra não desviar o olhar daqueles olhos penetrantes.

                 – Já fazia algum tempo que não via um jovem desejar ser um agulha – Alex disse baixo, sem desviar o olhar. – O que faz acreditar que vamos aceita-lo?

                 – Aprendo rápido, senhor ...

                 –Um agulha não tem um senhor – Alex o interrompeu.

                David abriu a boca para falar, mas descobriu que não sabia o que dizer. Escolheu o silencio.        

                Mesmo à uma distância segura, Ana sentia o peso daqueles olhos, admirou David por conseguir sustentar o olhar.

                 – Ele fala muito? – o agulha aumentou o tom da voz apenas o suficiente para as mães escutarem, sem nunca parar de encarar David.

                 – Nem muito, nem pouco –  uma das mães respondeu. – Mas sempre prefere o silêncio a falar bobagens.

                Ana viu os ombros de David relaxaram quando o agulha desviou o olhar.

               Alex  virou as costa pra o menino e deu um passo para longe, então seu braço direito se transformou um borrão, e no instante seguinte um revolver negro estava apontado para a cabeça do garoto, que ficou estático. O som de várias armas sendo engatilhadas encheu o ar, mas o agulha negra não se importou com as armas apontadas para ele, continuou a apontar o revolver para a testa do garoto, que agora estava com um pé atrás, de lado para Alex.

                 –Bons instintos – o agulha comentou devolver o revólver ao coldre. – Eu o aceito.

                David ainda tremia ao volta para seu lugar. O único que não sacou a arma, Ana notou, foi o lampião, que continuava sentado do mesmo modo relaxado.

Ana parabenizava a coragem de David, enquanto Maria tomava a frente de fala.

 – Meu nome é Maria – ela sorriu. – Meu sonho é ser diplomata.

 – Um sonho nobre – uma diplomata se levantou. –Trazer paz para os cinco reinos é uma honra. Diga-me, querida, você sabe ler e escrever?

 – Sim, senhora .

A diplomata se virou para as mães.

 – O que me podem dizer sobre ela?

Foi dona Raimunda que se levantou:

 – Sempre foi ela a tentar separar as brigas dos colegas – ela informou. – Começou a fazer isso ainda muito nova. Eu sei que toda diplomata precisa ser inteligente, ter a mente rápida. E posso garantir que Maria sempre se destacou nos estudos.

 –Sabe algum outro idioma? – a diplomata quis saber.

 – Infelizmente não temos condições de ensinar aqui, mas se tivesse eu tenho certeza que ela também se destacaria. Sempre aprendeu muito rápido.

 – É o suficiente para mim – a diplomata sorriu. – Eu a aceito.

O coração de Ana enfureceu-se, quando percebeu que agora era sua vez. O nervosismo a paralisou, só percebeu que dona Francisca estava chamando seu nome quando Maria cutucou suas costelas. Rapidamente tomou o lugar de fala.

               

                 – Diga querida – dona Francisca incentivou.

                Mais um segundo de paralisia, então falou.

                 – Quero ser uma lampião.

                Ela esperava exatamente aquela reação. Murmúrios de surpresa tomaram o salão.

                O lampião levantou a cabeça.

                 – Ela está nervosa – dona Francisca tomou a frente. –Ela sempre falou bem, ler e escrever. É ótima quando se trata de argumentar, ela daria uma ótima advogada. Não é mesmo, Ana?

                O coração de Ana agora parecia uma fera enjaulada.

                 – Mas eu quero ser uma lampião.

                 – Não seja tola, garota – o general Julius disse. – Uma menina não pode ser um lampião. Onde já se viu? A sacerdotisa tem razão, ela está nervosa. – ele se virou para o advogado presente. – Então, oque acha da menina?

                 –Ela me parece bem decidida – o homem respondeu.

                 – Mulheres não usam armas – o general determinou. – Todos sabem!

                Uma discursão se iniciou. Muitas mulheres presentes se indignaram com a declaração do general, que parecia irredutível quanto a sua opinião.

                No meio da confusão, os olhos de Ana encontraram os do lampião. Ele sorria, parecia estar se divertindo com tudo aquilo. Ele piscou para ela e deu um tiro pra cima silenciando a todos.

                 –Ah! – ele exclamou. – Perdoe meu bom amigo, o general só não soube se expressar. Não é que as mulheres não podem atirar, a verdade é que uma mulher nunca vai atirar como um homem. O que não deixa de ser verdade. É claro que o general não vai se opor a uma mulher aprender a atirar. – o lampião se aproximou do general e o abraçou e falou no seu ouvido:  – lembre-se que as coisas não estão fáceis. – O lampião se referia ao movimento de mulheres que tinham começado um movimento, lutando por mais direitos. O clima no reino não estava muito bom por conta disso.  O general se calou.

                O lampião se aproximou da menina, ainda sorrindo para ela.

                 – Você não é louca, é? – perguntou com uma levantada de sobrancelhas.

                 –N-não.

                 – Quer mesmo ser uma lampião?

                 – Quero!

                 –Hum.. – Alexandre fingiu pensar com a mão no queixo barbudo. – Eu acredito nela. Eu a aceito.

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