Peguei a jarra de água em minhas mãos. Logo ela começou a vibrar em uma intensidade grande demais para que eu pudesse segurá-la e sua água passou a se mexer dentro dela, saltando para fora. Soltei a jarra me assustando e ela caiu no chão e quebrou, fazendo cacos por todos os lados da caverna.
- Sinto muito, eu não sei como pude deixar cair, eu...
- Tudo bem, eu não estava com sede. Na verdade, apenas pedi que me alcançasse à água porque queria fazer um teste com você.
- Teste?
- Um teste de magia. Apenas aqueles que têm a magia no sangue conseguem dar vida aos elementos, e você tem. Isso faz de você uma bruxa.
- Ok, eu não estou ficando louca, eu não estou...
- Você é uma delas...
Pronto pensei, tudo que ele tinha de lindo ele tinha de louco.
- Uma delas? Do que está falando?
- É uma Rasmus, não é?
Parei para observá-lo. Ele sabia meu sobrenome, ele me conhecia, sabia quem eu era, isso fazia dele um pouco menos louco.
- Sim, como sabe que eu...
- Por que conheci sua mãe. Demorei em reconhecer os traços, o cheiro, a energia, mas agora posso ver que não estou enganado sobre você. Desde que atravessou a barreira e veio parar aqui, as coisas na floresta ganharam mais brilho, magia, luz, foi você quem trouxe tudo isso. Não sabe como esse povo vem esperando por esse momento; depois que Hely morreu, acreditávamos que nunca voltaríamos a lutar novamente.
Meu coração disparou e parou de funcionar por alguns segundos quando ele disse o nome de minha mãe. Sim, ele me conhecia muito melhor do que eu mesma, ele era a outra parte da minha família que eu não sabia que existia.
- Conheceu minha mãe?
- Sim, tanto sua mãe quanto sua avó; sua avó lutou comigo e foi quem me lacrou aqui. Sua mãe já me conheceu lacrado e não consegui convencê-la a tempo de me libertar, mas você é uma Rasmus, você pode me soltar.
- Isso não faz sentido algum, minha vó não... – Nessa hora eu me lembrei que minha avó não era quem eu pensava que eu era, lembrei que minha mãe tinha sido adotada e que provavelmente eu nunca tinha conhecido minha avó de verdade. – Desculpe, na verdade eu acho que não conheci a minha avó... – Olhei para o punhal que ele tinha cravado no peito. - E por que eu deveria soltá-lo? Se Tiina o prendeu aí é porque certamente fez algo contra ela; e se minha mãe não o soltou, talvez seja porque deve permanecer preso.
Novamente aquele sorriso de tirar o fôlego.
- Tem toda razão, vejo que é mais esperta do que eu pensava. Mas prometo lhe contar toda a história, se me soltar... – Ele parou de falar e olhou para a fenda: – Rápido! Se esconda, eles não podem vê-la aqui. Corra rápido!
Olhei para os lados, procurei algum lugar nas sombras para que pudesse me esconder e me coloquei atrás de uma rocha. Não demorou muito para que dois guardas entrassem na caverna.
- Parece que a magia da floresta também te atingiu Kaarl; vejo que está mais forte hoje do que nos últimos dias.
Dessa vez, ele não sorriu.
- São os bons ares desse lugar, meu corpo tem se acostumado à escuridão.
- Ou será que é por que uma energia muito grande foi libertada hoje, mais cedo?
- Não sei do que estão falando.
- A rainha sentiu essa energia, viemos averiguar. Tem certeza de que não sabe de nada?
Kaarl sorriu a contragosto.
- Estou preso aqui há 60 anos, como posso saber de alguma coisa?
Os dois guardas se olharam e um deles desferiu um golpe contra o estômago de Kaarl.
- Não subestime nossa inteligência, sabe muito bem que não tem poderes aqui e que se quiséssemos já poderíamos ter acabado com você há muito tempo.
Kaarl abaixou o rosto. Os dois correram os olhos pela caverna e se retiraram.
Esperei um tempo para ter certeza de que tinham ido embora e voltei para junto de Kaarl.
- Eles bateram em você, meu Deus! Está bem?
Dessa vez, ele sorriu.
- Vou sobreviver.
Porém, o punhal sangrava um pouco agora, manchando a camisa branca.
- Está sangrando.
- Acontece às vezes, não vou morrer por conta disso. Mas agora, sobre o que conversávamos? Vai me soltar ou não?
- Se eu soltar, você vai me contar sobre minha mãe e me ajudar a voltar para casa?
Vi um brilho se formar nos olhos dele.
- Sim, eu prometo, vou lhe contar tudo e, de quebra, te ajudar a ir para casa.
Aproximei-me com cuidado... Eu não deveria estar fazendo isso, mas ele era minha única esperança, tinha sido legal comigo e eu tinha que retribuir. Eu não sabia se estava fazendo certo ou não, mas eu não queria ficar naquela terra, eu queria minha família louca de volta.
Segurei o punhal com força entre os dedos e o senti vibrar. Kaarl me olhou e entreabriu os lábios, Deus, como podia ser tão belo?
Sem fazer muito esforço, removi o punhal que o prendia. A parede então tremeu e uma onda de calor dominou todo o espaço, me deixando tonta. Vi uma luz brilhar no peito de Kaarl e o corte onde o punhal havia estado antes começou a se fechar como em um passe de mágica. A luz, porém, não era clara como as outras que eu tinha visto antes, era em um tom vermelho alaranjado; meus olhos se fixaram naquela luz e mais uma vez eu fui apagando.
- Anna? Anna? - disse ele com um tom preocupado. Eu devia estar com uma cara estranha, porque ele me segurava pelo rosto e dava tapinhas na minha face. Meus olhos se fecharam lentamente e tudo escureceu.