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O Desbravador de Mundos
O Desbravador de Mundos
Por: Nanda Érica
Cap 1 - Entre Sangue e Cinzas

CAP 1- Entre sangue e Cinzas

Diante dos sons de crânios se partindo, ossos estalando e gritos desesperados ecoando como um pesadelo vívido, o pequeno príncipe despertou. Tremores surdos subiam pelas pernas da cama de carvalho, fazendo até seus dentes chocalharem.

Piscou os olhos tentando entender a realidade. Mechas dos cabelos loiros caíam sobre os olhos azuis; ele as afastou com cuidado e passou a mão pela testa, confuso. O quarto permanecia imerso na penumbra azulada da madrugada, mas algo estava errado.

O ar, que normalmente cheirava à maresia de Nerevia, estava pesado, impregnado de um odor metálico e acre de sangue. Por baixo da porta, uma luz estranha, laranja e trêmula, dançava como um fogo de artifício doentio.

“Será só mais um pesadelo?” pensou. Mas o tremor no chão era real demais.

Ele não se lembrava de quando os pesadelos haviam começado, mas ultimamente tornaram-se frequentes e o fazia confundir sonhos com realidade.

O quarto parecia o mesmo de sempre: paredes, brinquedos, os desenhos feitos com a irmã. Mas o cheiro acre e metálico, os gritos ao fundo... aquilo não fazia sentido. Nerevia era o mais seguro dos Quatro Reinos. Nenhuma ameaça jamais cruzou os oceanos e as defesas aquáticas do país.

Um estrondo o trouxe violentamente de volta. A porta foi arremessada contra a parede e César, seu tutor, surgiu ofegante, com os olhos arregalados.

— Jovem príncipe! Que bom que você está vivo! Rápido, venha comigo!

— O que está acontecendo?! — perguntou o menino, com o coração disparado.

— Eu explico no caminho! — respondeu César, puxando-o pelo braço com uma força desesperada. — Venha!

Era crime grave tocar um membro da realeza, mas, naquele instante, nenhuma regra parecia importar.

Correram pelos corredores outrora dourados e cheios de vida. Agora eram um campo de morte. Faina, a cozinheira que tantas vezes lhe sorrira ao oferecer bolos escondidos, jazia entre louças e talheres espalhados. Guardas com quem treinava estavam tombados, o chão manchado de vermelho. O ar era uma mistura nauseante de ferro e fumaça.

O príncipe tropeçava em meio ao horror de armaduras, destroços e partes de corpos humanos, mas César continuava puxando-o com força.

— Ali! Peguem o príncipe! — uma voz ecoou.

Alguns homens com armaduras ornadas por rosas azuis e espinhos avançaram.

“Reino Stoneval...?” Notou o príncipe antes de ser puxado novamente por César.

Chegaram ao quarto do rei, local proibido a qualquer súdito. César abriu a lareira e revelou uma passagem secreta. O príncipe ficou boquiaberto; passou a infância inteira explorando o palácio e nunca tinha visto aquilo.

— Entre! — ordenou.

César empurrou-o para dentro da passagem escura e húmida. As mãos do tutor tremiam enquanto ele retirava as roupas de príncipe de Darius e lhe vestia uma túnica grosseira de camponês qualquer. O príncipe tentou protestar, confuso, mas antes que pudesse falar, o tutor o interrompeu com um olhar firme, quase desesperado.

— Sua vida depende disso.

— O que está acontecendo?! — perguntou Darius, a voz falhou.

César segurou o rosto, forçando o menino a encará-lo. O semblante do seu mestre refletia o horror daquela destruição.

— Escute com atenção. O reino foi atacado. Os outros três reinos... eles se uniram contra nós. A sua família... já não existe.

A cabeça de Darius abanou. Um zumbido agudo encheu os seus ouvidos, abafando os sons da batalha lá fora. Não. “Ele está mentindo. É um pesadelo.”

— Mas como? Por quê?

— Disseram que o seu pai fez um pacto com o Submundo — a voz de César falhou, e ele desviou o olhar por um segundo. — É uma mentira, claro...Eu acho... O que importa é que eles estavam atrás da família real.

César segurou os ombros do menino e o encarou.

— Lembre-se do que te ensinei sobre o equilíbrio do mundo, Oryn e Yin e Yang! — a sua voz era um grito rouco por cima do barulho das explosões. — Ele foi quebrado! Agora talvez estejamos mais pertos do fim do mundo.

Um estrondo sacudiu a sala. Magias de terra e fogo explodiam contra as paredes. O menino de dez anos sentiu o peso de um mundo ruindo sobre seus ombros. Imagens felizes vieram-lhe à mente: o pai ensinando-o a segurar uma espada de madeira, a mãe ajeitando seus cabelos, a irmã correndo atrás dele no jardim, rindo com as bochechas coradas. Tudo aquilo agora parecia um sonho distante.

Ao engolir em seco, foi como se tivesse uma pedra descendo devagar pela garganta. O oxigênio parecia rarefeito. Uma pressão insuportável explodia em sua cabeça, distorcendo sons, imagens e pensamentos. O mundo virou um borrão. Restava apenas uma verdade: sua casa havia sido destruída.

— Para onde vamos...? — murmurou o príncipe, quase sem voz.

Mas a expressão de César dizia tudo.

— Para viver. E, um dia... para lutar! Você precisa sair daqui antes que nos encontrem.

— Você não vem...? — no fundo ele já sabia a resposta.

— Eu não posso. Você é o último da linhagem Draven. Sua vida é mais importante que a minha, qualquer castelo ou coroa. Continue respirando, mesmo que seus ossos se quebrem. Mesmo que a esperança morra. — O olhar firme de César era sincero. — Não desista de viver.

César ergueu uma barreira de água, condensando a umidade do ar.

— Corra para a grande floresta. E não olhe para trás. Depois, no pé da colina, embaixo de uma ponte, há uma entrada secreta para um bunker. Lá terá tudo que precisa, inclusive uma biblioteca que conta a história do mundo. Use o conhecimento para sobreviver. Você precisa ir até lá, viva como plebeu e sobreviva! — Ele respirou fundo, enquanto mais pedras estalavam contra sua magia enfraquecida.

— Se perguntarem seu nome, diga que é Darius. Era o nome do meu irmão... já falecido. Nunca, jamais revele quem você é. Nunca diga seu nome verdadeiro. E não confie em ninguém. Mas faça amigos, se possível.

Mais um feitiço rasgou a parede, espalhando detritos. Um fragmento passou a centímetros do rosto de Darius. Ele se assustou tanto que urinou nas roupas. Vergonha o queimou por dentro, mas ele só tinha dez anos. Era apenas uma criança.

— Viva por eles. Cresça. Lute. Vingue Nerevia — disse César, com a voz firme, mas os olhos cheios de compaixão.

A barreira de água começou a se desfazer, rachando como vidro sob pressão. Do outro lado, mais soldados avançavam.

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