Um idiota

Miguel

Olhei pela janela do meu escritório no bairro da Lagoa, no Rio de Janeiro, e a sensação que eu tinha era de ter sido feito totalmente de idiota e que o único culpado por aquilo era eu mesmo e aquilo me deixava bastante irritado.

Eu não havia sido completamente enganado por uma mulher, pois dizer aquilo seria uma grande hipocrisia da minha parte, quando todos, mas todos mesmo, não apenas a minha família e os amigos também, tentaram me avisar sobre quem ela era de verdade.

Além dessas pessoas mais próximas, até mesmo alguns funcionários e parceiros de negócios insistiam que eu deveria pensar melhor sobre a ideia de casamento e que eu poderia apenas continuar como já estávamos, em um relacionamento cômodo e em que poderíamos sair a qualquer momento, sem mais problemas ou dificuldades.

Mas eu, totalmente concentrado em fazer negócios e aproveitar a boceta sempre disposta e pronta para mim, não dei ouvidos àqueles que só estavam tentando ser leais a mim, ao contrário do que aconteceu com a minha ex-esposa.

Agora, eu me encontrava em uma situação desagrádavel e com um grande problema em mãos, uma vez que não pretendia aceitar de forma alguma, que a Talita fiDanie com um centavo do meu dinheiro, fora o estritamente necessário e não era exatamente pelo dinheiro em si, e sim por que ela não merecia nem mesmo a minha simpatia, quanto mais sair daquele casamento arrancando de mim alguns milhões.

Mas ela estava dificultando o divórcio exatamente por isso, é claro, pois ela era cínica o suficiente para, mesmo depois de todos os absurdos que ela cometeu com todos que me cercavam, ainda exigir dinheiro como compensação pelo que ela passou ao meu lado. 

Um completo absurdo!

Ela estava fazendo exigências ridículas para assinar o acordo de divórcio e aquilo estava sendo muito desgastante e me deixando verdadeiramente estressado, pois a Talita se tornou uma pessoa que eu queria bem longe de mim, mas que precisava tolerar a sua presença constante, não mais fisicamente, como quando nós ainda não havíamos entrado com a ação para o divórcio, mas em conversas de família e, principalmente com o meu advogado, uma vez que eu não pretendia ceder nenhum milímetro da minha posição sobre aquele assunto e ela parecia tão disposta a brigar quanto eu mesmo me sentia. 

— Eu entendo a sua raiva, Miguel. – Eduardo Dornelles, meu advogado, que também era um grande amigo na vida pessoal, falou em seu tom sempre conciliatório. – Mas acredito que se você ceder em alguns pontos, todo o processo será feito de forma mais rápida. 

Eduardo havia acabado de me comunicar que a Talita havia entrado com um pedido oficial de divórcio e exigido urgência, além de uma medida protetiva, pois ela alegou que se sentia ameaçada e que temia pela própria vida.

— Eu não vou concordar com nenhum dos pontos daquele acordo de divórcio ridículo que a Talita elaborou com essa advogada pedante e completamente maluca que ela conseguiu arrumar. 

Meu amigo sorriu a menção da advogada e pela forma como ele fez isso, eu entendi que ele não concordava com as minhas colocações sobre a advogada e aquilo me irritou bastante.

Joguei a caneta que estava em minhas mãos para que batesse no amigo da onça que eu acreditava ser meu amigo, mas ele tinha bons reflexos, era inegável e se afastou a tempo de evitar que o objeto o acertasse, me fazendo suspirar com desagrado.

— Você não pode se referir a advogada da Talita dessa forma, Miguel. 

— E qual o problema? Estou falando a realidade dos fatos. Ela é louca, se pensa que vou atender a exigência de sua cliente.

— Não conhece a profissional que Danielle Rocha é. Eu posso afirmar, com toda a convicção, que ela não é nenhum pouco boba ou “maluca", como você a denominou agora. 

— Você se engana ao pensar dessa forma. Eu tenho ouvido falar sobre os feitos da excelentíssima Danielle Rocha nos tribunais, sempre exigindo compensações financeiras para os tormentos de suas clientes durante o casamento e não serei mais um caso de sucesso para ela. – Falei com desdém.  

— Vejo realmente que está bem informado, Miguel. Mas, se a Danielle tem conseguido ganhar todos os casos em que coloca suas mãos, é por ser realmente muito boa no que faz e você não deve cantar vitória antes da sentença final. 

Era bastante notável, pela pela forma como ele falava da tal advogada, que o Eduardo estava mesmo encantado com a mulher e eu não gostei nenhum pouco de ouvir o seu tom de admiração, uma vez que ela estava do lado oposto ao nosso e era, portanto, nossa inimiga agora.

Não me importava o fato de a advogada ser completamente linda e vibrante e se parecer com um furacão esfuziante ao passar, deixando todos caídos por ela, algo que eu pude constatar quando estive em um evento de negócios realizado há mais de um ano, por um parceiro de negócios e que, por coincidência do destino, era também sócio do escritório no qual a Danielle trabalhava.

Descobri aquilo ao me envolver em uma conversa animada com algumas amigas que também estavam presentes no evento, assim como minha prima Patrícia e sua esposa Samara.

Apesar de a conversa ter girado em torno dos feitos da advogada Danielle Rocha, eu não tinha sido derrubado por seu carisma e nem seria, com toda a certeza. 

Estava acostumado a conviver com mulheres belíssimas e não seriam seus olhos da cor de mel derretido e sua boca carnuda e apetitosa, de lábios vermelhos brilhantes, que iriam conseguir fazer isso.

E estava bastante nítido que ela também não havia simpatizado comigo, pois me olhou com visível irritação durante todo o tempo em que estive no evento e, quando minha prima me pediu uma carona até a sua casa, e eu saí acompanhado pelas duas mulheres, a Patrícia e a Samara, pensei que seria fuzilado, apenas com o olhar que a Danielle me dirigiu.

— Ela está se achando a defensora das mulheres indefesas. Mas o que ela não sabe, pelo menos ainda não, é que a Talita não é nenhuma pobre coitada. Ela é uma víbora e armou para cima de mim e qualquer um que tenha convivido conosco pode confirmar isso. 

Voltar a pensar na Talita não era uma boa ideia, tampouco. Eu ainda não tinha conseguido engolir o fato de que havia caído na lábia de uma oportunista igual a um grande otário. Aquilo era muito difícil de aceitar e eu me recusava a sair perdendo ainda mais naquela história.  

— Acredito que você não pode criticá-la, tão pouco. Você mesmo caiu na personagem que a Talita mostra ao mundo, como pode criticar Danielle? . 

— Não me lembre desse fato. 

— Como se você conseguisse esquecer, concorda? — Meu até então advogado fez questão de salientar.

O Eduardo tinha razão e eu não revidei a sua perfeita colocação, no entanto.  

Levei a mão até os meus cabelos, os assanhando, me sentindo desolado mais uma vez. A verdade é que eu estava inconformado, essa era a melhor palavra para definir como eu estava me sentindo no momento atual e aquilo só poderia mudar quando saísse a sentença do processo de divórcio, que me deixaria livre da Talita de uma vez por todas.

Claro que eu também precisava sair vitorioso, pois, caso contrário, eu teria a liberdade, mas não teria a satisfação de saber que ela não tirou nada de mim, além de tudo o que já havia tentando me prejudicar. 

Lembrei de quando eu havia conhecido a Talita, quase dois anos atrás. 

Ela estava trabalhando para uma campanha publicitária da Pontes, a qual estava sendo desenvolvida pelo setor de marketing da minha cadeia de lojas de departamentos e a linda modelo Talita Andrade conseguiu chamar a minha atenção de imediato com a sua beleza estonteante, o que eu não sabia ainda era que tudo aquilo não passava da superfície e por dentro ela era podre.

Nós começamos a sair juntos e apenas alguns dias depois, ela já estava praticamente instalada em meu apartamento, sem que eu nem mesmo a convidasse para tal.

O que acontece é que a Talita sempre alegava que ainda estava com sono e, como eu precisava sair para trabalhar, ela me tranquilizava dizendo que depois pegaria um táxi e iria para seu próprio apartamento.

Quando eu voltava do trabalho à noite, a Talita ainda estava lá e como ela sempre me recebia de um modo bem atrativo, com sexo, eu apenas aproveitava o fato de a ter a minha completa disposição.

Até que chegou um momento em que ela alegou que seu próprio apartamento estava passando por uma reforma e pediu para ficar apenas alguns dias comigo em minha cobertura na Barra e como era muito conveniente para mim, eu concordei sem dar muita atenção ao fato.  

Sem que eu me desse conta do que realmente estava acontecendo, uma vez que eu estava em um momento de grande agitação dentro da empresa, devido a aposentadoria do meu pai e a minha consequente promoção a CEO da Pontes, a Talita estava realmente morando comigo e organizando os detalhes para o nosso casamento, mesmo sem que eu tivesse feito nenhum pedido a ela e, ainda assim, aquilo não soou como um sinal de alerta.  

Eu deixei as coisas seguirem, afinal, estava tudo tão cômodo e tranquilo, a rotina era agradável e ela não fazia exigência alguma, mesmo que eu saísse todos os dias muito cedo e sempre chegasse bem depois do jantar, ela nunca reclamava das minhas ausências ou qualquer outra coisa. 

A Talita que me fez de bobo era sempre bem humorada e fazia tudo para me agradar, algo que me seduziu facilmente e eu precisava admitir que fui eu que facilitei todo o processo para ser enganado por ela.

E então, eu pensei, “por que não?” Eu estava com trinta e dois anos e já estava na hora de formar uma família, como a minha mãe costumava repetir a todo o momento de maneira irritante. 

Mas mesmo com a insistência em que eu deveria formar minha própria família, eu não poderia culpar a minha mãe tampouco, uma vez que Talita não foi em momento algum bem aceita por minha família e eles me alertaram que ela não era a pessoa que estava se mostrando ser para mim.

E mesmo com todos insistindo em tentar me mostrar a verdade sobre a minha então “noiva conveniente", eu não ouvi ninguém e fui em frente com aquela loucura. Aceitei que nosso casamento fosse marcado e liberei todos os recursos necessários aos gastos que ela quis fazer para tal. 

A única coisa com a qual eu não pude concordar de forma alguma, foi com o seu desejo de um casamento na igreja Para o meu total alívio, eu não fui tão longe na burrice. Mas sobre as outras coisas, fui um completo idiota e agora estava sofrendo as consequências dos meus atos. 

— Sobre a advogada da sua esposa, eu mesmo já a presenciei no tribunal algumas vezes e ela faz valer os honorários que cobra. Então, já te aviso que seria mais fácil para nós que você resolvesse ceder um pouco em sua determinação de não colaborar com o processo.

— Ex- esposa. Salientei, me sentindo irado por ter que passar por todo aquele trâmite.  — Para quando será a audiência de conciliação? 

— Amanhã, às nove.  

— Vou precisar desmarcar um compromisso importantíssimo por causa daquela...  

— Olha o linguajar, amigo. Você não pode deixar que as emoções o dominem, principalmente amanhã durante a audiência com o juiz. 

— Você está certo, é claro. Preciso me controlar, ou amanhã posso falar algo que complique a minha situação nesse processo rídiculo. Seria tão mais simples se apenas assinarmos logo esse divórcio!

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