Dim!Drim!Dim!Drim...
O som irritante do despertador gritava a mais de meia hora. Chamando a atenção de todos na casa. Exceto quem ele deveria acordar.
A garota sentiu um cutucão nas costas, acordando preguiçosamente, seus olhos aos poucos vão dando origem a imagem de uma mulher – cabelos pretos amarrados em um rabo de cavalo e no corpo usava roupas típicas de escritório. Sua mãe.
– Michelle, anda menina, você vai se atrasar para a escola.
– Ah?
– Olha a hora! – gritou a mulher.
– Ah. Não grita! – A menina enfiou a cabeça entre os travesseiros e respondeu – Já vou, que saco!
A mulher parou em frente ao espelho do guarda-roupa da filha, arrumando (o que já estava ótimo) em suas vestes.
– Já arrumou as coisas para ir pro sítio do seu avô? – perguntou ela.
Michelle passou a semana inteira se preparando para ir para a fazenda de seu avô, arrumou malas, marcou com o pessoal – afinal, que graça tem ir para um sítio sozinha? – convidou sua amiga de infância, Brenda, chamou também seu namorado e a amiga de escola. Todo "okay", dentro dos conformes.
– Já chamou seus amiguinhos? – continuou a mulher.
– Amiguinhos? Mãe! – A menina sentou na beira da cama. – Já. Já arrumei todo, sim.
– E quem vai levar vocês?
A mulher, abriu as cortinas, deixando entrar os raios de luz solar pelo quarto.
Michelle arregalou os olhos com a claridade queimando seu retina, ainda meio sonolenta. Levantou a mão até a boca para cobrir um bocejo repentino.
– Nossa, eu não tinha visto isso. – Ela boceja novamente. – Obrigada, mãe. Vou me lavar, tomar um banho e já desço tomar café. Vou ver um Uber para levar a gente.
– Ta. – A mulher riu da situação dos cabelos de sua filha. – Mas, seu irmão vai junto.
Essa simples frase acabou com o dia de Michelle.
– Por que, mãe? – reclamou a garota – Ele é uma peste!
– Olha, que ele é seu irmão. Fora isso eu e seu pai temos negócios a resolver fora da cidade e você vai cuidar dele.
Michelle olhou para a mãe com desânimo.
– Não adianta fazer essa cara.
– Mas, o Matheus nem gosta de sítio. – Tentou convencer a mãe que não era uma boa ideia levar o irmãozinho.
– Sem essa Michelle, ele vai e ponto. Ou ninguém vai a lugar nenhum, mocinha.
Michelle levantou nervosa, pegou o uniforme no guarda-roupa e saiu em direção ao banheiro com a cara virada.
– Que saco nunca vou ter sossego! – Ela trancou a porta atrás si. – Todo lugar que eu vou aquela peste tem que ir junto.
Ela reclamou com as paredes durante o banho. Uma de suas manias estranhas.
A água fria caiu sobre suas costas, fazendo a menina dar um pulo.
– Mas, que saco! – gritou ela – Quem mexeu nessa bosta de chuveiro?
Michelle era baixinha, pobre coitada, nesses momentos todo que poderia desejar era uns dez centímetros a mais de altura.
Ela pegou o rodo (sempre teve um rodo no banheiro da casa, para puxar a água pro ralo), se esticou e com a ponta do rodo mudou a temperatura do chuveiro.
Ao tomar banho e fazer sua higiene matinal, ela se dirigiu para o quarto com uma toalha ainda na cabeça.
– Onde foi que eu deixei? – pensou alto.
Não encontrava sua mochila, para variar. Desistindo de procurar, ela decide usar a velha, arrumando outras roupas novamente.
– Anda Michelle! – gritou sua mãe do andar de baixo da casa.
– Tô indo!
A menina nem tinha tomado café ainda.
Ela entrou num aplicativo de transporte para contratar um motorista para levá-los. Conversou com um rapaz do aplicativo, porém nada ficou bem decidido. Seu smartphone vibrou enquanto ela arrumava a cama. Era do aplicativo.
(– Eu não eu vou para aquelas áreas, é muito distante.)
– Ahahaha. Idiota.
Michelle bufou de raiva. Até que alguém lhe veio à cabeça, uma pessoa que não lhe custaria nenhuma moeda. Ela entrou em sua lista de contatos e chamou o primo, como uma alternativa, sem custos.
– Oi, Douglas?
– Oi, Mi, quanto tempo?
– Né, você vai fazer algo hoje e nesse final de semana?
– Não. Por quê?
– É que assim, eu convidei a galera pra ir passar um tempo no sítio do vovô, e nenhum de nós tem carteira de moto...
– Entendi. — interrompeu à garota — Você quer que eu leve vocês?
– Exato!
– Só posso depois do expediente
– disse o rapaz que trabalhava em uma oficina.– Tá, estaremos em frente ao meu colégio.
– Ok, então. Tenho que desligar agora.
– Tá, tchau.
Michelle desceu correndo as escadas. Já eram 07h05, não daria tempo nem de tomar uma xícara de leite.
– Meu Deus, menina! – falou a mãe dela, repreendendo a garota – Anda passa.
– Eu nem comi nada.
– Tem dez reais no porta-luvas do carro, pegue e compre algo na escola.
"Maravilha, comer gordura logo cedo"
Pensou ela, fazendo uma cara de "Sério mesmo?"Entrou no carro. Por um azar, nada estava dando certo para ela naquele dia.
– Está com o pneu furado! – gritou a mulher que tinha o cabelo preso num rabo de cavalo.
– Que? – Michelle sai do carro. – Só pode ser praga isso, não é possível.
A mulher ligou para o marido. Enquanto a ligação chamava, disse a filha:
– Pegue os dez reais e compre uma passagem de ônibus.
– E o meu lanche?
– Você não vai morrer se não comer hoje – disse a mulher, já nervosa. – Alô...
A garota saiu em direção ao ponto de ônibus. Não estava acostumada a pegar lotação, sentir o maravilhoso cheiro de suor dos outros. Coitada.
O tempo passou e nada de nenhum ônibus, que diabos estava acontecendo com ela naquele dia? Nada estava dando certo. A esse ponto a aula já havia começado e obviamente ela perderia a chance de passar de série.
Na escola, teria uma palestra em uma igreja antiga para a disciplina de Educação Religiosa, do qual ela ficou de recuperação ou coisa parecida, e ela, atrasada.
Finalmente um ônibus vermelho, lotado, estacionou e abriu as portas para levá-la até a escola.
– Vai ter que ir de pé! – gritou o motorista.
– Tá, fazer o que.
Pelo menos, ela já tinha combinado com sua amiga, Brenda, para buscar o seu irmãozinho, a peste do Matheus na escolinha. Assim, se livrando daquele "encosto" – segundo ela.