No entanto, eu ainda não estava pronta para contar a verdade.
— Ultimamente, tenho me sentido um pouco exausta, por isso pensei em sair por uns dias, só para conhecer alguns lugares próximos. Não pretendo ir muito longe.
Em seguida, mostrei a ele os guias de viagem que vinha folheando.
Ao perceber que eu dizia a verdade, Damien finalmente afrouxou o aperto no meu braço.
— Que bom, então. Eu sabia que você não seria tão mesquinha assim. Afinal, é só uma pesquisa sobre antídoto de cura. Para alguém com as suas habilidades, isso não representa nenhum desafio. Como irmã mais velha e minha futura companheira, é mais do que justo que cuide da Sera, sua irmã ômega. E não precisa se preocupar por ter perdido essa chance de se tornar Curandeira-Chefe, até porque você pode simplesmente conquistar outro avanço numa próxima oportunidade.
Foi então que o celular dele tocou: era Ethan, ligando do hospital.
— Damien, onde você foi? A Sera acordou, e assim que percebeu sua ausência, começou a se ferir de novo. O corte se abriu e ela está sangrando muito. Você precisa voltar depressa.
Ele correu na mesma hora em direção à porta, mas ainda teve tempo de se virar e me dizer:
— Vá viajar, se é isso que quer. Só não vá longe demais.
Respondi com um sorriso silencioso.
"Fique tranquilo. Não vou tão longe... Só até um ponto onde você jamais conseguirá me alcançar de novo."
Ao passar pelo jardim, Damien lançou um olhar às cinzas irreconhecíveis no balde de ferro e franziu a testa. Ainda com um incômodo no peito.
Mas logo afastou esse sentimento.
Pois já que eu havia sido tão fria, ele não precisava mais sentir culpa por alguém como eu.
Ainda assim, por alguma razão, não conseguia afastar a sensação de que eu escondia algo.
— Para de imaginar coisas. — Murmurou para si mesmo. — Para onde ela poderia ir, afinal?
— Neste momento, cuidar da Sera é mais importante. Não posso me distrair.
Pensando nela, Damien virou as costas e, mais uma vez, me deixou para trás.
-
Nos dias seguintes, rompi com meu antigo círculo social e me juntei a um grupo de jovens lobos, explorando todos os pontos turísticos da cidade.
Cercada por pessoas da minha idade, o ambiente era leve e revigorante:
Assistíamos ao pôr do sol no topo de montanhas e cantávamos ao redor de fogueiras sob o céu estrelado.
Naquele lugar, não havia laços familiares que machucassem nem amores que destruíssem por dentro. E, conforme os dias passavam, eu percebia com mais clareza que viver por si mesma era o que realmente importava.
A última parada da minha viagem foi um leilão noturno, onde seriam exibidos e vendidos cristais e pedras preciosas de valor histórico.
Como curandeira, eu adorava observar diferentes tipos de pedras de cura, na esperança de encontrar inspiração para desenvolver novos remédios para lobisomens.
No entanto, eu mal havia me sentado perto da janela, pronta para contemplar com tranquilidade as relíquias do dia, quando avistei figuras familiares atravessando a entrada da casa de leilões.
Entre elas, estava Sera.
Coincidentemente, aquele também era o dia em que ela receberia alta do hospital.
Ela entrou acompanhada por Damien e pelos homens da família Blackwood.
Damien, como forma de comemorar a recuperação de Sera, havia decidido adquirir para ela um raro cristal de cura azul.
Sem hesitar, todos se acomodaram nas cadeiras mais nobres do salão.
Champanhe, presentes, bolo… tinham preparado de tudo para Sera.
Coisas que eu nunca tivera.
E agora, todas aquelas pessoas estavam ali, diante dela, como se fosse uma pequena princesa com o mundo aos seus pés.
Meu pai, então, pegou uma taça de vinho das mãos de um funcionário e a entregou a Sera, sem hesitar.
Damien, por sua vez, reagiu imediatamente, demonstrando preocupação.
— Tio Marcus, o ferimento da Sera acabou de cicatrizar. O álcool pode comprometer os reflexos da loba e ainda enfraquecer o processo de regeneração. Por favor, não permita que ela beba.
— Como assim? Num dia tão especial, ninguém vai brindar comigo? Que tal você beber por ela, Damien?
— Damien, não se preocupe. Só um pouquinho não vai me fazer mal. — Sera se aproximou do ouvido de Damien com doçura. — Já que o tio está de bom humor hoje, não quero atrapalhar. Me deixa beber, por favor.
A forma como os dois se comportavam era, para qualquer observador, exatamente como um casal vinculado e apaixonado.
Ao perceber isso, Ethan logo começou a provocar:
— Se não vão beber, então por que não se beijam logo?
Com isso, os olhos do meu pai brilharam.
— Isso, isso! Se vocês dois se beijarem, eu deixo a Sera em paz.
O rosto dela ficou instantaneamente vermelho.
Mas não houve qualquer sinal de recusa.
Em vez disso, ela lançou um olhar direto para Damien.
Seus olhos brilhavam com sedução, e o queixo se ergueu de forma sutil.
Como se esperasse por alguma reação.
Aquele olhar foi suficiente para fazer a boca de Damien secar. Por um breve instante, ele hesitou.
Foi então que Sera se inclinou e selou seus lábios aos dele.
Damien não esperava tanta ousadia. Seu primeiro impulso foi afastá-la.
No entanto, assim que sentiu o corpo quente e macio de Sera pressionando-se contra o seu, acabou cedendo.
Não resistiu.
A respiração se acelerou, e ele começou a retribuir o beijo com intensidade.
Ao redor, a família aplaudiu com entusiasmo.
— Finalmente! — Meu pai riu alto. — Já estava me perguntando quando vocês iam parar com esse joguinho.
— Até que enfim, irmão. — Disse Ethan com um sorriso leve. — Desde o início, dava para ver que a Sera era perfeita pra você.
Do canto da janela, assisti à cena em silêncio, sem me mover.
Enquanto Damien a beijava, suas mãos envolviam o rosto dela com firmeza, e os dedos de Sera se entrelaçavam nos cabelos dele.
Ambos estavam tão absorvidos um pelo outro que, por um instante, parecia que nada mais existia além daquele beijo.