Ela sorriu, sem desviar o olhar.
— O que mais?
— Acho que tenho medo de crescer; levar as coisas a sério demais — suspirei. — Medo de não ser bom o suficiente. De falhar.
Lizza abriu a boca para dizer algo, e fechou. Repetiu o processo algumas vezes.
— Você não precisa ter medo de nada — ela se aproximou.
Regina nos chamava para lanchar com dois toques na porta. Lizza me estudou, mais uma vez, em busca de algo que eu não descobri. Suas mãos pararam no ar, em um gesto que mostrava que iria tocar meu rosto. Mas logo caíram ao lado do corpo. Seguimos para a cozinha, onde a mesa estava posta com alguns salgadinhos em uma bandeja, e uma garrafa de
Estacionei o carro longe da porta do barzinho, distante de onde o movimento se concentrava.— Está pronta? — perguntei, colocando uma mexa de seus cabelos para trás de sua orelha.— Pronta — suspirou, nervosa, e sorriu.— Eu sei que está se esforçando bastante para isso. Muito obrigado — beijei suas duas mãos.— Não precisa agradecer, Augusto — sorriu, amistosa. — Não é um favor.Também sorri e plantei um beijo em sua testa. Como de praxe, ela não me esperou abrir a porta do carro para sair. Passei meu braço em sua cintura e para minha surpresa, Lizza passou o braço em minhas costas. Entram
O burburinho da mesa um pouco distante me lembrava de que não estávamos a sós. Era possível escutar as batatas sendo fritas na cozinha, enquanto o aroma do bacon brincava no ambiente. Lizza parecia distante mais uma vez; não exatamente longe. Mas algo nela parecia voar no céu, ao invés de estar ali ao meu lado.Ela bebia o suco despreocupada, mexendo o canudo vez ou outra, sem demonstrar necessidade alguma em dizer uma palavra sequer. Pensei em vários assuntos para abordar, mas não consegui encontrar nenhum que se encaixasse de modo pleno na ocasião, naquele momento. Fora ela, surpreendentemente, quem quebrara o silêncio.— Você já levou alguma garota para um primeiro encontro? Formal, assim? — não me olhou enquanto falava. Ela corou, com um sorriso que eu nunca havia percebido em seu rosto. Havia decorado cada movimento dos seus lábios e sabia o que cada sorriso que Lizza soltava, significava. Mas aquele, me deixou cego.— Qual a melhor biografia que já leu? — olhou-me, ignorando o que eu havia dito, com um traço de maravilha ainda presente em seus lábios e uma vontade inegável em seus olhos de me dizer algo.— Ayrton Senna — comi outra batata e levei uma até a boca de Lizza.— Já ouvi dizer que é muito boa... — sorriu, doce.— Você tem muitos livros, Lizza?— Não muitos... Quando eu tiver uma casa, quero ter uma biblioteca. QuerCapítulo 33
Abracei Lizza com demora, em frente ao portão de sua casa, lutando drasticamente para conseguir me despedir.— Muito obrigada por essa noite — ela começou, sem se afastar. — Eu gostei bastante — lembrei-me de suas palavras. "Eu estou bem aqui". Depois daquilo, ela não deu mais nenhum indício de que estava realmente lá. Não se afastou, mas também não progrediu. Passamos a noite conversando sobre tudo que há em uma gama ampla de assuntos: política, economia, Estados Unidos, Coréia do Norte. Tudo, menos sobre ela e eu. Lizza parecia à vontade, à mercê dos meus olhos nos dela. Não voltou a me tocar, contudo, seu sorriso doce competiu bravamente com o brilho da lua durante todo o tempo em que ficamos
— V-Você é meu? —Lizza gaguejou, mas por alguma razão que desconheço, não deixou de me olhar.— Eu nunca pertenci a alguém antes, e agora eu sou completamente seu — olhei-a fundo. — Somente, e todo, seu — seus olhos, em um frenesi violento, corriam pelas minhas feições tão rápidos como se fossem sufocar; estava em busca de palavras, e eu desejei com todas as minhas forças que ela encontrasse algo para dizer. Mas sua caça parecia infinita, e quando estacionei em frente minha casa, ela ainda estava muda, e assustada. — É forte dizer isso, sabia? — virei-me delicadamente para ela, pegando sua bochecha em meus dedos.— Que você é meu? — sua voz falha saiu apenas como um cochicho.
— Não seja tão amável... — sussurrei como resposta. — Não sou essa pessoa boa que você acredita que sou.— Eu não te entendo, Augusto — puxou a mão e ficou em pé com um salto, levando a louça suja para a cozinha. — Você faz de tudo para me conquistar e quando está quase lá, vira a lata de lixo do seu passado em meus pés.— Não precisa agir desta maneira, Lizza — levantei-me, a seguindo.— E de que maneira eu deveria agir? — virou-se para me olhar. — Eu tenho a impressão de que está na soleira da porta e que vai passar por ela a qualquer momento, sem me avisar.— Você realmente acha isso
Estava com a cabeça quente. A discussão com Lizza me deixou à flor da pele; descamado. Minha mente entrou em ebulição; tantas coisas diferentes passeando pela minha memória que se tornava difícil organizar todas elas para enfim, começar a entende-las.O Augusto de Flávia não se importaria em tirar a roupa de Suzane ele mesmo. O de Daniela. O de Viviane. De quantas mais? Ela estava certa, claro que estava. Eu não conseguia sequer lembrar o nome de todas elas. Aquele Augusto não iria virar o rosto para não ver a mulher se despir, da forma que eu estava fazendo naquele momento. Aquele Augusto iria colocar um número a mais em sua lista.Mas não o Augusto de Lizza.Ali, enfrente àquela mulher que eu mal c
Lizza não apareceu durante a semana, plantada aos pés da árvore como uma flor murcha em plena primavera. As músicas não ressoaram no meu quintal imitando a última vez em que ela me evitou; a casa vizinha estava em completo silêncio, para meu desespero. Enquanto desejei que ela respondesse minha mensagem, sua casa gritou o vácuo para mim até eu ficar surdo.Sua ausência começava a machucar. Nunca imaginei amar alguém como eu a amava. Nunca entendi nada sobre meus sentimos, nem nunca soube manusea-los. E embora Lizza tenha me ensinado com uma maestria horrivelmente grande, eu me via com meu coração em minhas mãos, sem saber o que fazer. Para onde eu carregava aquilo? Como eu deveria agir?Um grande sufoco se instalou dentro de mim. Senti-me desolado; abruptament