||001|| Casa no Lago

   As vezes sinto vontade de largar tudo e fugir pra terra do nunca, mas do jeito que eu sou é capaz de eu me estressar até com o Peter Pan.

Não que eu seja tão brava assim, porém determinadas coisas me tiram muito do sério e se duvidar tenho até uma lista numerada de coisas que me deixam possessas e em número um está Isaac Miller.

O típico cara que qualquer garota sensata deveria manter distância, é o que eu mais tento fazer, o que não dá muito certo. Minha irmã mais velha e ele são melhores amigos desde quando eu nem sabia falar praticamente.

Isso é porque nossos pais sempre foram amigos e ficaram muito felizes quando descobriram que iam ter um bebê quase ao mesmo tempo, Isaac é apenas dois meses mais velho que Rebecca.

Já eu, tenho apenas dezesseis anos e não aguento mais escutar ele me chamando de "pirralha", mesmo a diferença sendo de um ano e meio. Eu sempre me mantive muito afastada dos dois, pois apesar de Rebecca ser minha irmã de sangue ela parecia gostar muito mais de Isaac e isso me magoava as vezes, parecia que eu não existia.

  Quando criança sempre implicávamos um com o outro e lembro que uma vez ele colocou um chiclete no meu cabelo e tive que usar uma toca horrorosa por meses, pois para tirar o chiclete mamãe teve que cortar uma parte do meu cabelo no que resultou em um buraco bem no meio da minha cabeça. Todas as minhas bonecas eram carecas, porque Isaac cortava os cabelos loiros de todas elas e mamãe ainda brigava comigo. Lembro também do dia em que ele me trancou no porão e esqueceu onde tinha enfiado a maldita chave, resultado: medo de escuro e de lugares fechados.

Com tantas histórias terríveis que temos "juntos" daria até para escrever um livro. Mas um dos maiores motivos que me mantém o mais longe possível dele é que eu já fui perdidamente apaixonada por Isaac Milles. Não posso negar, qualquer garota já foi, desde pequeno esse menino tinha esse dom de apaixonar qualquer garota e eu fui uma das idiotas e me arrependo amargamente por ter me declarado, ele não saiu do meu pé até entrarmos no ensino médio, que foi quando ele finalmente evoluiu de um nível de idiota que eu nunca pensei que fosse possível. —Ainda bem que a total falta da popularidade me tornou invisível até mesmo aos olhos do cara que passava praticamente 24h por dia na minha casa. Mas isso não me deixou chateada, pelo contrário, como eu já disse antes, qualquer pessoa que manter distância de pessoas como ele é uma pessoa inteligente. — Qualquer um percebeu, que o garoto que era apenas levado passou a ser totalmente descontrolado quando ele fez suas novas "amizades" e começou a frequentar festas e beber descontroladamente. Não foi falta de aviso de ninguém que se ele não sossegasse acabaria se dando muito mal e a sua recompensa por ser tão teimoso foi um presente do papai Noel, uma cartinha carimbada e assinada que dizia o seguinte: Reprovado.

Sua mãe ficou decepcionada, cuidar de um filho sozinha é muito complicado, seu marido faleceu quando éramos pequenos, foi a única vez em que vi ele chorar e depois disso ele se tornou totalmente vazio e insensível.

  A notícia de que Isaac foi reprovado não era novidade para ninguém, todos tiveram uma reação, meu pai por exemplo deu mais um de seus sermões; Rebecca chorou mais que ele dizendo que não poderiam fazer faculdade juntos e que sua formatura seria vazia sem uma foto ao seu lado com a roupa de formatura, já eu me arrependi de ter dito um "bem feito", pois ele bateu e voltou bem direto na minha cara quando percebi que ele provavelmente teríamos algumas aulas juntos.

  O pior de odiar uma pessoa é todas as outras ao meu redor consideram ela como da família, pois em todos os momentos ela estará lá pra te mostrar o porque de você odiá-la tanto.

  Momentos esse como agora, estamos indo para a casa da vovó e eu juro que vou enlouquecer. Minha mãe fez meu pai parar no meio da estrada para que Rebecca trocasse de lugar com Isaac, mas não adiantou nada, é como se Rebecca fosse invisível, ele continua me cutucando por cima dos ombros dela e finge que não está fazendo nada. Já tentei respirar fundo umas trinta vezes só para não jogar esse menino do carro em movimento.

— Se você me cutucar mais uma vez vou fazer você engolir esse dedo e não vai ser pela boca.

— Biancca e Isaac!

— Desculpa, tia. Não sei do que ela tá falando, eu juro que não to fazendo nada. — Ele levantou as mãos para cima.

— Que fingido. — Resmunguei revirando meus olhos. — Não é possível que você vai acreditar nisso.

— Chega! Eu não quero ouvir mais nem um pio de reclamação, se não seu pai vai parar e largar vocês dois na estrada para irem à pé.

Olhei para Isaac com o canto do olho e notei um sorriso estupido e provocativo em seus lábios, o resto do caminho fomos em silêncio, felizmente não era não longe assim, porque mesmo em silêncio eu não aguentava a presença daquele garoto.

Quando chegamos eu fui a primeira a saltar do carro, vovó nos esperava em frente a casa do lago e assim que me viu abriu seus braços me chamando para mais perto. Eu sempre adorei vir para cá, é como uma tradição, todo verão passamos alguns dias aqui fazendo companhia para os meus avós e eles definitivamente amam ter visitas.

— Que saudade da minha netinha! — Fui recebida com milhares de beijos e abraços. Assim que pude respirar ela segurou firme nos meus braços e me analisou de pé a cabeça. — Quando foi que você cresceu tanto? E esses peitos?

— Não cresceu tanto assim. — Escutei o murmúrio bem atrás da minha cabeça, era Isaac. — Oi vovó!

— Ela não é sua avó. — Respondi seu comprimento fazendo vovó gargalhar alto e partir para enche-lo de beijos.

— Tem vovó Meggie para todo mundo!

Percebi que Isaac me olhava por trás das costas da vovó com um sorriso debochado para mim, as vezes eu juro que tento não sentir vontade de matar esse garoto, mas esse sentimento é maior que eu.

Assim que entramos vovô começou a falar sobre sua nova coleção de carros em miniatura e que ofereceram dez mil dólares pela coleção completa, não que ele não diga isso todas as outras vezes que viemos para cá. Quando ele finalmente terminou eu e Rebecca fomos para os nossos quartos e fomos surpreendidas com uma bagunça imensa, acho que confundiram nosso quarto com o sótão.

— Onde a gente vai dormir? — Perguntou Rebecca tentando não pisar em algumas caixas que estavam jogadas no chão. A cama está cheia de quadros velhos cobertos por um pano branco.

— Ah! Me desculpem meninas, eu esqueci de avisar, Peggie disse que levaria isso embora amanhã, por isso vão ter que dormir no quarto de Isaac.

— Mas lá só tem uma cama!

— Vai ser só por hoje, não se preocupe.

Olhei para Rebecca horrorizada, ela parecia não se importar muito, pois Isaac é seu melhor amigo e dormir na mesma cama que ele não era algo de tão novo assim.

— Vamos, é só por hoje.

Felizmente era uma cama de casal, mas mesmo assim não era nada agradável, três pessoas dormindo em uma cama. Colocamos nossas malas do lado da estante e fomos almoçar. Passamos o dia inteiro jogando conversa fora, hoje infelizmente choveu e eu não consegui ir no lago, mas para compensar quando escureceu os velhos foram dormir e eu, Rebecca e Isaac ficamos jogando detetive.

— Meu Deus Isaac! Você rouba até no Detetive! — Resmunguei voltando o boneco dele duas casas.

— Eu não to roubando nada, sua doida.

— Tá sim! Você andou sete casa e eram cinco.

Vi ele revirando os olhos enquanto jogava seu corpo para trás ficando apoiado pelos cotovelos. Estávamos sentados no chão, e ele estava bem próximo de Rebecca, ele encostou a cabeça nela enquanto me olhava.

— Você é muito chata. — Ele resmungou.

— O que foi que você disse?

— Falei grego?

— Gente chega pelo amor de mim, não aguento mais vocês dois! Vou dormir.

Rebecca se levantou indo em direção ao quarto e nos deixando ali sozinhos, olhei para Isaac que também me olhava e suspiramos ao mesmo tempo revirando a cara.

— Eu vou dormir também. — Ele disse se levantando logo em seguida, mas eu puxei seu braço.

— Nem pensar, você vai me ajudar a guardar o jogo.

Ele resmungou algo que eu não consegui entender, mas me ajudou a guardar o jogo e colocou ele na prateleira no alto — já que eu não alcançava. Assim que entramos no quarto, minha irmã já estava deitada e pra variar estava bem na ponta, não acredito que ela fez isso comigo.

Fui até o banheiro para escovar os dentes e Isaac entrou no banheiro logo em seguida sem camisa e a cena me fez ficar um tempo observando seu abdômen. Confesso que apesar dessa garoto ser um encosto, pensa num encosto gostoso, mentira sou evangélica.

Isaac se deitou primeiro que eu e deixou o maldito do meio para mim, mas deixa eles, se depender de mim derrubo os dois da cama.

Me deitei ficando de barriga para cima, mas acabei mudando e virando para o lado direito e dando de cara com Isaac "dormindo".

Fiquei um tempinho observando ele de olhos fechados e notei que ele faz parte da minha família a muito tempo, tanto tempo que eu nem sei dizer se temos um cartão de natal sem ele na foto ou até mesmo se em algum Halloween não foi com ele que eu e Rebecca fomos pedir doces. O único dia em que eu me lembro que ele e minha irmã brigaram feio, não durou nem mesmo duas horas.

— Tá gostando do tá vendo? — Sai dos meus pensamentos e vi que Isaac sorria mesmo de olhos fechados.

— Não to olhando pra você.

Ele abriu seus olhos e até então não tinha percebido o quão próximo nós estávamos, um calafrio subiu pela minha espinha.

— Eu sei que a minha beleza é encantadora. — Ele disse piscando para mim e sorrindo meio embargado de sono.

— Você nem se acha. — Retruquei me afastando um pouco de seu rosto.

— Pode ser sincera, eu sei que você está adorando ficar deitada do meu lado.

— Eu preferia estar dormindo no chão.

Antes que ele tirasse minha paciência, eu me virei para o outro lado e me esforcei para dormir, não demorou pra acontecer já que eu estava muito cansada.

Logo de manhã, fomos acordados pela minha avó batendo uma colher de pau na panela e gritando feito uma doida as sete horas da manhã e eu aqui toda iludida achando que ia dormir bastante nas férias. No almoço fui literalmente barrada de encostar um sequer dedo nas panelas, mamãe disse que eu era horrível na cozinha, então subi para colocar um biquíni já que não tinha nada para fazer eu iria tomar um sol perto do lago. O dia está incrível então desci rápido para poder aproveitar o calor e assim que passei pela garagem atrai os olhares de um certo alguém.

Isaac estava ajudando vovô com o seu velho carro, mas interrompeu imediatamente o que estava fazendo para me encarar. Podia jurar que vi um sorrisinho em seus lábios antes que ele continuasse o que estava fazendo. Ignorei aquele pedaço de encosto e fui em direção a uma cadeira de descanso, coloquei minhas coisas de lado e me sentei observando o lago.

Bem a onde eu estava era um píer e logo ao lado havia árvore com uma corda amarrada, tentadora. Fiquei em frente aquela corda e segurei delicadamente sem sobrepor meu peso sobre ela, apenas observando se a árvore era firme, fiquei quase um minuto assim e deslizei minha mão sobre a corda desistindo de ir.

— Se você pensar muito não tem graça. — Escutei uma voz atrás de mim, quando me virei Isaac não estava mais como antes. Ele tinha tirado sua camiseta e estava somente de bermuda. Por alguns segundos meus olhos pairaram sobre seu abdômen. — O divertido é fazer rápido.

Ele se aproximou e tomou meu lugar na frete da corda e me deu uma piscadela antes de se agarrar na corna e se balançar, assim que ele se soltou deu uma cambalhota no ar antes de cair na água.

Senti um sorrisinho brotar entre os meus lábios e decidi fazer o mesmo que ele, sem a cambalhota claro, mas fui sem pensar e me diverti muito com aquilo, meu salto foi todo atrapalhado, mas Isaac tinha razão se pensar muito não tem graça.

Quando subi de volta para a superfície do lago, Isaac estava nadando na minha direção com um sorriso no rosto e eu me esforcei para dar um sorriso também, apesar dos momentos de cão e gato, as vezes Isaac é legal. Eu disse as vezes, mas isso tá mais pra quase nunca.

— Eu disse que era mais divertido do meu jeito.

Revirei meus olhos com a ênfase que ele deu em "meu" e joguei água na sua cara e foi assim que começamos um guerra. Isaac empurrava a água na minha cara e eu na dele. Quando saímos da água porque mamãe estava nos chamando, ele decidiu apostar uma corrida e foi hilário quando ele caiu de bunda no chão porque seus pés estavam molhados.

No almoço era o meu prato favorito strogonoff, quem inventou isso não é gente, é anjo! Repeti umas quatro vezes, mamãe ficou até brava, mas o que eu posso fazer?

No jantar pedimos pizza e ficamos conversando um pouco, mas assim que escureceu eu fui lá fora para observar as estrelas enquanto todo mundo ficou assistindo filme. Acho que a coisa que sempre adorei de lugares afastados foi o céu estrelado, na cidade não era assim, por conta de tanta luz e de tanta poluição quase não era possível se observar as estrelas. Fui até a beirada do lago e me deitei na grama fresca enquanto olhava para as tantas e milhares de estrelas bem em cima da minha cabeça.

Quando eu era pequena mamãe me falava que quando alguém morria, esse alguém se transformava em uma pequena estrelinha lá no céu e quando minha avó materna faleceu, eu ia todas as noites até o terraço dizer para ela o quanto sentíamos a sua falta.

Continuei deitada em silêncio por alguns minutos até alguém se deitar ao meu lado e também observar as estrelas, por estar um pouco escuro eu só consegui reconhecer quem era pela silhueta. Rebecca.

— Veio me procurar? — Perguntei tirando minha atenção do céu me voltando para o seu rosto.

— Eu precisava conversar.

— Sou toda ouvidos.

— Eu e O Liam terminamos. — Ela disse como em um suspiro, pelo seu tom de voz percebi que ela estava prestes a chorar. — Ele disse que agora que ele vai pra faculdade tudo vai ser diferente e que ele não quer bagagens.

Não era novidade para mim, Liam sempre foi um imbecil e desde que eles começaram a namorar terminaram e voltaram incansáveis vezes que eu até perdi a conta. Rebecca começou a chorar e eu não sabia o que fazer, mesmo depois de ter dado diversos conselhos sobre isso, ela sempre fazia o contrário.

— Eu sei que você gosta muito dele, mas isso aconteceu por um motivo, sei que é clichê demais, porém talvez ele não fosse o cara certo para você. — Dar conselhos de amor para mim era irônico até demais já que a minha vida amorosa vai de mal a pior.

— Mas eu gosto muito dele e eu não acredito que ele tenha feito isso comigo.

Eu acredito, não só acredito como eu já sabia que isso aí ia dar merda. Mas eu sei como o amor é cego, o se sei.

Eu não disse mais nada, apenas puxei ela para um abraço de lado e acariciei seus cabelos enquanto ela chorava encostada no meu ombro, o verão não podia começar de um jeito melhor.

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