Dante
Ao sair do shopping, ligo para Vicenzo, vencido. Meu irmão gargalha às minhas custas e diz para eu ligar para o Dominic, a boneca é italiana e lá não é tão popular quanto por aqui. Tenho uma ideia imediatamente, só preciso pedir ao meu irmão mais velho para mandar duas bonecas e não apenas uma. — Por que quer duas do mesmo modelo, Dante? Vai presentear outra criança? — ele pergunta quando ligo para pedir. — Isso não importa, apenas saiba que é imprescindível que mande duas, o quanto antes, por favor, Dom! — Imprescindível?! O que está tramando, hein?! Certo, se eu for para o Brasil, levo, caso não, mando como encomenda, vai chegar antes do Natal — ele responde tranquilamente. — Não, mano! Mande o quanto antes, preciso mesmo dessas bonecas aqui, as duas e mande para a minha casa — insisto e meu irmão suspira. — Ok, Dante. Deve chegar em dois dias, no máximo. — Perfeito, quando você volta? — Não sei, estou esperando a Lívia decidir se vai ou não passar o Natal aí comigo, porém, não sei se vou em todo o caso. — É uma pena, espero que consiga voltar, se tudo der certo, teremos uma nova agência para o marketing do consultório, pelo pouco que vi, parece que são bons. — Eu vi apenas o cartão da Emanuele, acho que já é o bastante. — Ótimo, temos que investir nesse aspecto, hoje o marketing é primordial, mande os portfólios para que eu veja antes de contratar, marketing ruim é tiro no pé — responde, sério. Dom é especialista em administração de empresas, ele e Vicenzo mantêm a empresa do nosso pai com muita competência. Eu escolhi a odontologia, nosso pai inicialmente não aceitou muito bem, mas Dominic e Vicenzo sempre apoiaram a minha decisão. Pedi que ele me ajudasse com meu primeiro consultório, e hoje estamos aqui. — Fique tranquilo, mando assim que fechar os detalhes com ela. — Ela? Dante, não deixe os seus olhos escolherem uma empresa só pela beleza de uma mulher, tem que ter talento ou seu trabalho vai para o ralo — ele repreende. — Ela é talentosa, vou provar, e isso que disse, não tem nada a ver, não somos envolvidos a esse ponto. — Sinto uma vontade estranha de proteger Emanuele, e nem a conheço. Contudo, nem mesmo Dom a conhece para julgá-la. — Tem razão, me deixei levar por sua fama, ela não tem nada a ver com isso, acredito em você. E assim que puder, mande o portfólio para começarmos a trabalhar nisso. Mas saiba que serei criterioso. — Claro, valeu, mano. Você é dez! — Eu sei que sou! — ele zombou e rimos. — Mande um abraço para todos, vou sair ainda hoje para comprar as suas bonecas — Dom diz com enfado. — Obrigado e não esqueça de mandar para a minha casa! — o lembro. — Ok, chefe, mais algum pedido? — ele rebate com ironia. — Por ora é só isso! Até mais, mano, obrigado. — Tranquilo, me paga depois, quando sairmos para beber. — Com a sua noiva no seu pé, duvido! — Deveria encontrar uma para você. — Quem sabe daqui a uns três anos? — Agora quem duvida sou eu, tchau, Dante. — Valeu, Dom! Desligamos. Ao menos a boneca, eu consegui, de certa forma. Poucos dias depois, assim como prometido, recebo as duas bonecas, Dom é mesmo demais. Ligo para Emanuele que aceita o meu convite para um café em uma das cafeterias que mais gosto. Quando chego, me adianto e peço dois cafés especiais e croissants, lembro que deixei as bonecas no carro e pego a bandeja de papelão com o meu pedido, indo até o lado de fora buscar. Ainda bem que estacionei por perto. Entro e a vejo, sentada. Ela está linda, com jeans escuros, e uma camisa social branca, seus cabelos cor de bronze, estão presos em um coque. Isso deixa os olhos dela mais azuis. Ela me vê e me aproximo. — Emanuele Velasquez! — Me sento com os cafés e croissants. — Dante Alvarenga! — ela responde sorrindo. — Achei que não viria. — Empurro um café em sua direção. — E por que não? — Não sei, um estranho que queria roubar a sua boneca te convida para trabalhar para ele… — Dou de ombros. — Parece esquisito e por falar nisso. — Pego a sacola da loja de brinquedos que Dom mandou e lhe entrego. Ela arfa. — Meu Deus, você encontrou a boneca, já tinha desanimado de procurar — ela diz parecendo confusa. — Quanto preciso lhe dar, deve ter custado uma fortuna, levando em conta que deveria ser uma das últimas. — Não foi nada, pedi ao meu irmão que mandasse da Itália, parece que por lá sobra esse modelo. — Imagina, não posso aceitar, por favor me diga quanto custou — Emanuele insiste. — Vamos fazer o seguinte, você faz um novo design para o meu cartão e ficamos quites — ofereço, assim posso mostrar algo ao Dom. — Não parece justo, mas ok. Olha, a minha agência é pequena, devo dizer antes que me contrate, trabalho para pequenos empresários e autônomos, não tenho grandes clientes — ela explica como se isso fosse algo ruim. — Isso é perfeito, assim terá mais tempo para mim! — Abro um sorriso e ela retribui, envergonhada. Ficar naquele café com ela, é uma das tardes mais agradáveis que já passei com alguém. E esse é o início de uma surpreendente amizade. Eu já não consigo fazer nada sem consultar a Manu. Passamos a sair juntos, almoçar, tomar café na mesma cafeteria de sempre, o que se torna o nosso point. Conheço a família dela e me divirto como nunca, os Velasquez são uma cópia da minha família, barulhentos, engraçados e implicantes. Porém, são muito bons. Nossa proximidade é rápida, ao ponto de eu conseguir contar para ela como são os meus encontros, não sei explicar, mas eu tenho a necessidade de contar. Nenhuma companhia é tão boa quanto a dela. Por isso, exponho alguns detalhes das minhas saídas. Nós ficamos tão próximos que já não consigo pensar em nada que não seja a Manu. É estranho, pois eu não tenho interesse amoroso nela. Ela é linda, mas eu não estragaria a amizade que temos, saindo por uma noite, pois é exatamente isso que faço, uma noite e nada mais. Certo dia a convido para sair, a noite está bonita e passo na casa dela para buscá-la. — Você está linda, Manu! — elogio depois que ela entra no carro. — Obrigada, você está lindo também. Aceno em agradecimento e seguimos para lá, o lugar é muito bom, tem música ao vivo, é arejado, animado e cheio. Nos sentamos, e fico de frente para ela, seus cabelos estão soltos e deixam o seu rosto corado, eu poderia me perder ali… mas mantenho o foco, com a Manu, não! — E então, o que quer beber? — pergunto, enquanto olho a carta de opções. — Vou ficar com uma tônica mesmo. — Certo, ainda é quinta, vou te acompanhar. — Chamo o garçom e faço o pedido de duas tônicas e batatas fritas. É inevitável não passar alguns segundos olhando para ela, que cora de forma muito tentadora. Ela não, Dante, a Manu é sua amiga. — Como uma mulher igual a você, fica solteira? — Balanço a cabeça, incrédulo, às vezes é inconcebível que ninguém tenha encontrado o coração dela, bem, além do outro cliente que sei que ela tem, o tal do Marcos. Tenho certeza de que aquele cara tem segundas intenções com a Manu e ela nunca notou. — Por muitos motivos, acredite, hoje em dia são poucos os homens que querem compromisso sério e isso é o que eu quero — ela diz, parecendo não se importar com o fato de estar sozinha. — Está certa, eu sou um deles, ao menos eu acho. — Abro um sorriso. — Mas se encontrasse uma mulher linda, engraçada, gentil e parceira, eu me casaria. Sabe, uma como você! — Dou uma piscadinha, brincando. O que estou fazendo?! Com a Emanuele não posso brincar desse jeito. — Não entendo o que quer dizer com isso — Manu murmura, confusa. — Acredita que nem eu? Não sei se conseguiria ficar com alguém por tanto tempo, temo começar algo mais sério e estragar as coisas, sei lá. — A encaro, não quero estragar nada com ela, Manu se tornou importante demais para eu deixar que o desejo estrague tudo. As batatas chegam e decido mudar de assunto, falamos sobre amenidades e nosso dia a dia. — Ai meu Deus, Dante Alvarenga! — um gritinho estridente nos alcança e olho surpreso ao ver quem é. — Oi Paloma, que sumida! — Joguei um charme na voz, sei que ela gosta. Paloma é uma gata que conheci na academia, linda e não quer compromisso, ela sim é a mulher ideal para mim. — Eu continuo no mesmo lugar, você quem não me procurou mais. — ela responde toda charmosa e não resisto. É uma boa hora para fugir da Emanuele, ou eu posso cometer alguma bobagem e magoá-la. E isso está fora de questão. — Podemos resolver isso agora mesmo — falo, de repente. — Hum, adorei a ideia — ela sorri, entregue. Imediatamente me preparo pedindo a conta. — Manu, quer uma carona para casa? — perguntei sem tirar os olhos das curvas generosas de Paloma. — Não, obrigada, peço um carro pelo app. Ela diz olhando para o seu celular. — Depois te digo como foi — digo apenas para ela ouvir e beijo o alto da sua cabeça. — Ok — é tudo que ela fala. Saio dali com a Paloma que em momento nenhum deixa a desejar. Infelizmente, depois desse episódio, Manu e eu acabamos nos distanciando um pouco. Não sei o que fiz de errado, só queria poupá-la do pior, pois nossa amizade é mais importante, além do mais, nunca notei interesse da parte dela. Nosso contato passa a ser mais profissional, principalmente quando ela vai ao consultório para as suas revisões dentárias. Aos poucos a loucura do meu trabalho e do dela, acaba por nos afastar de uma vez. Ainda nos falávamos, porém, aquela amizade inseparável de antes, acaba, infelizmente… ou não.