Cinco mil anos e alguns meses se passaram desde a quarta guerra mundial. Lívia conseguiu concluir sua jornada com sucesso, mas, ao chegar em Globo Central, sua sorte mudou. O ataque à capital da resistência destruiu a redoma de proteção e os soldados do Imperador a sequestraram. Do alto de suas naves, o Imperador observa a Terra. Um planeta tão rico e desolado, lar de um passado feliz de sua família. Será que ele vai conseguir levar seu império à glória de outrora? ★ Romance de Ficção Científica. ★ Livro 2 (final) da Duologia Terra e Céu. © 2019. Registrada na Biblioteca Nacional, não permitida a reprodução.
Ler maisAinda estava se acostumando as interfaces daquela nave ostensiva e poderosa.
Em seus tons de preto, prata e branco, lhe trazia familiaridade. A falta de cor era algo que se acostumara, dentre calabouços e espeluncas nos últimos anos.
O que ele não conseguia se acostumar era com os ambientes amplos, com boa sonoridade e o fato de que todos pareciam respeitá-lo só com um aceno de cabeça.
Ah, claro, e o poder.
Não o poder que lhe vinha como comandante principal e o título de Imperador, mas o controle. Fechou as mãos esticadas para a frente, puxou-as um pouco para si e girou-as levemente para a direita. A nave respondeu imediatamente, seguindo os seus comandos.
Estava em seu sangue.
Ele não acreditou da primeira vez que ouviu, achava que não tinha acreditado até que finalmente a viu obedecê-lo, poucos ciclos atrás.
Ainda o assombrava ter tanto poder. A nave mais poderosa do universo, a frota mais temida e respeitada de todas as galáxias, respondia ao seu sangue. E apenas o seu.
Exceto...
Suspirou.
Aquela aventura estava sendo um pouco mais complicada do que deveria. Traições e perdas. Sempre soube que seria difícil, só não entendia o quanto do seu coração teria que definhar pelo bem maior.
Agora já entendia uma parte do problema. Ainda brigava para que perdesse menos do que parecia que teria que perder, mas já doía.
Virou-se de costas para a porta de sua sala principal, imponente em tons de preto e ainda sem muitos toques pessoais. Precisava começar a se sentir bem ao menos naquele lugar, mas como fazer isso quando ainda tinha tanto de seu antigo ocupante?
Lá estava ela.
A visão lhe tirou de seus pensamentos. Já tinha visto uma parte do universo e a visão da Terra ainda lhe tirava o ar.
Era um lindo planeta quebrado.
Encostou sua mão na parece de vidro de seu escritório e a tela respondeu. A imagem da Terra, em tempo real, foi encolhida para exibir uma da Terra em seus tempos áureos ao lado.
Quase assustador. O antigo planeta azul agora era um lampejo de verde, amarelo e cinza.
Suspirou. Jogou a imagem do planeta azul por cima do planeta verde. No lugar vazio, cálculos começaram a ser feitos, cálculos terras inutilizáveis, danos, radioatividade. Anos terrestres para conserto, medidas necessárias. Um dia, talvez, aquele planeta voltasse a ser azul.
Um dia, depois de muitos anos terrestres.
Empurrou as duas imagens e os cálculos e a visão em tempo real apareceu novamente. O Imperador do universo suspirou, apaixonado. Mesmo destruída, era um dos lugares mais belos que já havia visto. Se lembrava muito bem de quando a vira da primeira vez de tão alto e parecia ainda mais bela agora.
Imaginava como seria se estivesse inteira.
A larga floresta Esmeralda era estonteante, ao contrário do resto do planeta, prosperara na adversidade. Resistira através dos anos de consequências da guerra e até mesmo multiplicara em tamanho. Brilhava, mesmo à luz do dia, com seu veneno fatal.
Tivera que ordenar que seus soldados usassem proteção e ficassem pouco tempo em terra firme. Alguns deles eram mais sensíveis e ele achava que não sobreviveriam muito tempo em contato com aquele ambiente tão hostil.
Uma luz vermelha se acendeu na parte inferior de seu painel de vidro e ele clicou sobre ela. O rosto de seu imediato apareceu por cima da imagem do planeta, sério e prático.
"Senhor, pegamos ele em uma das edificações do globo" anunciou. O Imperador acenou, aliviado. Era menos um problema. "Estava com a garota".
Sua garganta se fechou em um nó apertado e ele teve dificuldade em engolir sua saliva. Quando falou, a voz saiu saiu falhada e mais aguda que o normal, mas seu imediato teve o respeito de não esboçar nenhuma reação.
— Com a garota? — Perguntou, quase não acreditando no que estava ouvindo.
"Sim, senhor" respondeu o imediato. "Ela deu mais trabalho que ele, na verdade".
O Imperador franziu a testa para a declaração e apenas se dignou a concordar coma cabeça. Marco, o imediato, aguardou. O Imperador trincou os dentes, ainda não muito acostumado ao fato de que todos esperavam que ele ordenasse o próximo passo. Não fazia muito tempo em que ele que ouvia ordens da resistência.
— Você sabe o que fazer com ele — disse. — E ela... Traga-a para mim agora.
Marco concordou, arriscou uma breve reverência e encerrou o contato. A imagem da Terra quase morta estava escura, mesmo depois de encerrada a tela sobre ela e talvez tivesse algo a ver com sem humor. Com um aceno, o vidro escureceu, mas o brilho esverdeado o incomodou, então acenou novamente e a tela ficou inteiramente branca.
Letras começaram a aparecer e ele se pôs a ler o relatório da inserção à Terra, sendo escrito em tempo real por cinco mãos. Foi-se no trecho que narrava sobre o outro lado do planeta, do qual não fizera parte intimamente. Muitos criminosos presos, mais que em Esmeralda. Suspirou.
O tempo não demorou a passar enquanto estava distraído com a leitura, mas seu coração permaneceu atento, estourando de nervoso em seu peito a cada segundo a mais que aguardava.
Não faltava muito agora.
Concentrou-se. Uma lista de prisioneiros de Esmeralda começou a ser redigida em algum lugar da frota. Abriu o arquivo, percebendo que estava em ordem alfabética. Não demorou para reconhecer um nome ou outro, torcendo o nariz.
A incursão se tornava cada vez mais difícil e mais pessoal.
O aviso prévio de movimentação nos arredores do escritório do Imperador do universo apareceu em seu visor. Seu imediato tinha permissão máxima e acesso a todos os cantos da nave, mas o aviso ainda aparecia quando ele se aproximava do escritório e era um pouco mais urgente quando vinha acompanhado. Clicou no aviso e moveu a mão esquerda para que aumentasse.
Um vídeo abriu, a visão dos corredores mais próximos. Marco vinha a frente, sua posição altiva quase o fazia invejá-lo por tamanha naturalidade em posições de poder.
Atrás deles. Três guardas continham uma figura pequena e magra. Os longos cabelos negros balançavam ao protesto da garota, o que fazia o caminho ser ainda mais demorado.
O imperador sorriu. Na tela, apertou o botão verde, desativando o alarme e a visualização dos futuros visitantes. Fechou sua leitura, a tela voltou a ficar preta e a sala escureceu.
E, no breu, ele aguardou.
— O que você acha? — Henrique perguntou para Lívia.Estavam em trajes de gala, sentados à mesa de seu escritório, enquanto Henrique lhe apresentava, finalmente, uma pena alternativa para Jefferson, um mês terráqueo após deixarem seu planeta natal. Lívia não aceitava que penas de morte existissem em um império pacífico e, apesar de Henrique não ser a favor da pena de morte, entendia que Jefferson vivo era um risco que não poderiam correr.O hemisfério norte da Terra era inabitado e não seria capaz de dar suporte à vida por mais algumas dezenas de rotações, mas havia uma faixa de Terra em que a radioatividade tinha caído o suficiente; uma região fria e inóspita, onde já era possível tirar alimento através de pesca de peixes de água salgada.Lívia estava encarando os dados que
— Meu tempo para a Terra está se esgotando, Liv — ele disse.Henrique percebe as mudanças imediatas na postura de Lívia, o desconforto claro em seu gestual. Observa enquanto ela congela, parte por parte, primeiro seu olhar, que perde uma parte do brilho quando suas pálpebras se abrem um pouco mais em choque pela informação. Depois, as maçãs do rosto que se movem para esconder o sorriso leve que antes ela exibia. Sua mão para de se mover, a seguir, encerrando a leve carícia que ele recebia em seu pulso ao mesmo tempo em que toda sua coluna enrijece à informação.— A ideia de ir embora e te deixar está… — Henrique estava com a voz falhada de dor e buscou a palavra certa para exemplificar como se sentia. — Me devorando por dentro. Eu… Eu sei que você não confia em mim ainda. Sei que fez suas concessões para&helli
— Sua segunda lua foi ontem e vocês nem estão se vendo mais — Marco lhe lembrou, enquanto caminhavam pelos corredores. — Quando vamos partir?Henrique e Lívia não se viam desde sua conversa na sessão de criogenia da nave. A voz dela continuava ecoando na mente dele, seus questionamentos sobre se tornar seu tio, sobre Jefferson, sobre tudo.Queria poder ter mais tempo, tinha certeza que ele poderia resolver seus problemas, mas os dias passaram-se rápido demais e agora ele não tinha mais o que fazer.— No próximo levantar da estrela — Henrique disse. — Amanhã de manhã.Marco estava consternado, porém aceitou suas ordens. Era uma partida num momento próximo e os oficiais iriam aceitar sua decisão. Também justificava caso Henrique precisasse passar o dia fora — aproveitando seus últimos momentos em casa.&mda
— Você está bem? — Henrique perguntou, voltando-se à mulher. — Liv? — Chamou, quando percebeu que ela não tinha lhe dado a devida atenção, perdida em pensamentos.Ela levantou o olhar e tinham lágrimas brilhando, mas sem derramar. Seus sentimentos dançavam à sua frente: raiva, frustração, medo, nojo, decepção, tristeza… Henrique entendia o que ela se sentia, tinha analisado a traição de Jefferson diversas vezes no meio daquela confusão.— Pareço bem? — Perguntou.Henrique negou com a cabeça e caminhou até ela, ajoelhando-se à sua frente. Ela desviou o olhar dele e encarou a câmara, onde Jefferson estava congelado. Parecia estar segurando a respiração porque sequer se mexia. Se não fosse aquela nova e melhorada Lívia, ela estaria rolando ao chã
— Cinco minutos, senhor — o cientista designado pela criogenia o avisou, assim que adentraram a sala. Dois funcionários se aproximaram com casacos de tecidos resistentes a temperaturas mais frias e entregaram a Henrique e Lívia. — Pode estar frio lá dentro. Preparamos a sala, na medida do possível, para aguentar as alterações de vocês. O comandante está realizando um pouso de emergência, também.Lívia tinha os olhos arregalados enquanto vestia o seu casaco, observando Henrique e o cientista, sem compreender muito bem a conversa, mas entendendo o geral. Ela era inteligente o suficiente para perceber o uso do plural nas alterações. Será que ela também conseguiria controlar a nave? Por quê?— Só posso recomendar cautela, senhor — ele continuou explicando. — O sujeito estará contido à cama de criogenia e h&aac
— Ninguém aguenta mais ver você brincando de casinha. Ser Imperador tem seus privilégios e você está gozando de todos eles, mas as responsabilidades você não quer?Henrique estava sem saída. Sabia que Marco estava sendo duro porque ele merecia. Todo o universo estava aguardando para que ele resolvesse seus problemas e ele permanecia tentando se resolver com Lívia, com a esperança de poder, pelo menos, ter um pouco de si mesmo.A reunião da manhã tinha sido um fisco total. Todos os oficiais restantes já estavam perdendo a paciência e o respeito com a permanência de Henrique na Terra. Pelos corredores, os soldados de cargos mais inferiores sussurravam mentiras para justificar a demora: que ele jamais queria sair de casa, que ele era igual ao tio e só pensava em si e outras coisas ridículas.E todos tinham razão, ele sabia.Par
Último capítulo