Choque

— Eu não tive outra escolha, não podia ser a Nai, então tive que ser você...

— O que o senhor quer dizer com isso? — perguntei confusa.

— Te ofereci pro Henry, pra você ir ficar com ele. — Sentir uma lágrima descer pelo meu rosto, ele não podia estar falando sério. E quem pelo amor de Deus é Henry?!

— O senhor me vendeu???? — gritei pra ele, agora não importava se tinha alguém escutando ou não. Aquilo passou dos limites ele não podia ter me trocado por dinheiro.

— Eu não te vendi...

— Vendeu sim! O senhor me trocou por dinheiro!!! — respondi irritada.

— Eu não tive escolha, sua mãe piorou muito nas três semanas em que você ficou fora. — ele falou quase gritando também. 

Não consegui segurar minhas lágrimas, tudo culpa de uma maldita doença! E como se não bastasse, meu pai me vendeu!

— Em que o senhor usou o dinheiro? — perguntei torcendo para que ele não falasse do jogo.

— Eu não usei com jogo ou bebida. Henry me fez prometer que iria parar, meus gastos foram todos com a sua mãe e custos do hospital. 

— Eu... — Minha voz saiu rouca, eu tinha medo que a resposta do que eu ia perguntar fosse sim. — Vou ter que me casar com ele?

— Ele disse que não te obrigaria a isso. Henry não é qualquer um Lucy, só fiz isso por ele ser muito sozinho. Eu o conheço há muito tempo e sei muito bem que ele não faria mal a você...

— Mas eu quero ficar aqui pra cuidar da minha mãe! Eu não vou. não vou deixar ela sozinha!

— Ela não vai ficar sozinha eu e Nai vamos cuidar dela.

— Mas eu não quero ir, eu não vou! — falei com raiva.

— Você tem que ir, não posso simplesmente quebrar um acordo.

— Isso não é culpa minha. — respondi.

— Lucy... — meu pai suspirou cansado. 

— Não pai, eu não vou.

— Eu só usei esse dinheiro porque sua mãe estava piorando e os remédios dela são caros.

— E você precisava me pôr no meio disso?

— Eu não tive escolha. Ele vai cuidar bem de você!

Eu não queria ir, não mesmo. Eu não podia deixar minha mãe para trás. Ela tinha pouco tempo e eu queria aproveitar esse tempo. 

— E...quando ele vem ... er...? — eu perguntei soluçando, eu precisava saber, mas não queria.

— Ele vem hoje! — ele respondeu. 

— Não, hoje não, eu não posso ir hoje. — gritei sem me importar se alguém escutaria.

Saí dali chorando, e deixei meu pai para trás. Fui até a cozinha e minha mãe estava sentada ainda chorava e fazendo algumas caretas de dor.

— Mãe? — chamei me abaixando na sua frente.

— Sim, filha? — ela se virou pra mim com algum custo. 

— A senhora está bem? ta se sentindo mal? — perguntei preocupada.

— Eu vou falar com Henry, agente devolve o dinheiro... — ela começou. 

— Querida, a gente ainda precisa do dinheiro, você ainda tem que voltar ao hospital e ainda precisa dos remédios.

— Não acho que precise — ela disse disfarçando uma careta. — Não precisamos mais gastar com isso, não adianta mais...

— Mãe você não pode desistir assim... — eu não queria ver minha mãe desistindo, eu ainda precisava dela. Eu não queria perder ela, não mesmo.

— Não estou desistindo, só não quero que você seja obrigada a fazer algo que não quer por minha culpa.

Coloquei a cabeça em seu colo e comecei a chorar eu não queria ir, mas também não queria que ela parasse com o tratamento por causa de uma revolta minha.

— Eu vou ser mãe! — falei soluçando. 

— Você não precisa. — ela sussurrou.

— Eu vou sim, — respondi soluçando, enquanto ela alisava meu cabelo. — Vou fazer pela senhora.

— Me perdoe, filha, eu não queria que isso acontecesse...

— Você não tem que pedir perdão! Eu só não gostei de saber que vou ter que ir morar com um velho rabugento e tão cedo. — soltei.

— Henry não é velho e nem rabugento... — ela disse, fazendo uma careta.

— Ah, não?? — fiquei confusa de novo. 

— Não, na verdade ele é muito sério e calado, e ele só tem — ela parou de falar um pouco e começou a fazer uma conta mental. — seis anos a mais que você.

— Ele deve ser muito chato...

— Eu acho que você vai gostar dele. — ela falou.

— Tenho certeza que não! — respondi. Só de ele ter concordado com meu pai eu já não gostava dele.

O silêncio pairou na casa, meu pai estava finalmente mais calmo, eu não queria ir e já estava planejando um jeito de fugir assim que chegasse lá, mas eu faria qualquer coisa pela minha mãe. 

Eu estava nervosa e a tarde se arrastava como uma tartaruga! Eu não queria ir mas também não queria estar tão nervosa com tudo isso. Já eram três horas da tarde e nada de Henry aparecer. Não o conheço mas já não gosto dele, ele não me interessa nem um pouco. O mais importante para mim agora é a saúde da minha mãe e como acabaria isso tudo. Pelo menos eu não seria obrigada a me casar com ele, pelo menos acho que não...

Pensar em tudo o que havia acontecido e no que aconteceria me causava tristeza, ter que ir embora e descobrir que fora praticamente vendida pelo pai era horrível, mas saber que o dinheiro tinha sido usado para tratar minha mãe e que ela tinha amanhecido bem hoje era um enorme consolo pra mim, por isso aceitei esse acordo ridículo.

Uma angústia enorme estava me consumindo, deixar aquilo tudo pra trás era como arrancar um pedaço de mim, de toda a minha história. Meu mundo desmoronava na minha frente e eu não podia fazer nada para impedir minha própria queda. Uma queda em um mundo de solidão e sofrimento porque seria um grande sofrimento ter que deixar quem eu mais amava para trás quando ela mais precisava de mim!

Deitei em minha cama e deixei tudo sair, a dor, raiva, tristeza, agonia, frustração... tudo que me deixava perdida no escuro e sem saída. Lágrimas vieram e muitas, não consegui controlar, na verdade eu não tinha porque controlar, então deixei tudo sair, na tentativa de descarregar a angústia da alma...

Acordei duas horas depois, chorei tanto que acabei pegando no sono. O sol já quase se pondo, levantei e fui lavar meu rosto, com certeza minha cara não estava nada boa, mas eu me sentia bem mais leve e tranquila, apesar de ainda estar muito irritada e nervosa.

Fui até a cozinha, minha irmã preparou um chá para minha mãe e um lanche pra ela.

— Que horas são? — perguntei sem o mínimo ânimo. 

— Quase seis. — respondeu Nai saindo com a bandeja em direção ao quarto. — Tem pra você também se quiser.

— Obrigada! — respondi.

Peguei o chá que ela deixou pra mim e um pedaço de bolo, e comi. Não estava com muita fome, então peguei só um mesmo.

— Quero te pedir perdão pelo o que fez com você. Eu sinto muito... — escutei a voz de meu pai atrás de mim. 

— Pai, por favor, esqueça isso! Não quero mais falar disso. Já era, não tem mais volta, já está resolvido, eu vou! 

— Sinto muito...

— Tá tudo bem, pai.

— Não está zangada comigo? — eu estava um pouco, mas não adiantaria nada.

— Por enquanto não! — respondi sorrindo fraco. Eu não gostei nada de saber o que ele tinha feito. Mas eu iria embora e ficar brava com ele não adiantaria nada. Dei um abraço nele e fui até a porta, eu precisava tomar um ar fresco...

Não estava quente, eu usava um short jeans com uma blusinha fresca. Mas era como se algo me buscasse. Abri a porta sentindo o vento frio que chegava junto com a noite e uma presença diferente, ergui os olhos e o vi ali na porta...

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