Codinome: Delta
Codinome: Delta
Por: Everton Timóteo
Prólogo

A Organização Ômega ostenta uma reputação de trinta e dois anos de importantes e extremamente relevantes descobertas científicas, o que inclui desde cosméticos milagrosos para senhoras com mais de sessenta anos até vacinas para as mais variadas enfermidades. Não havia um profissional da saúde na cidade de Westfield que não sonhasse trabalhar com a equipe da Ômega. A remuneração dos profissionais era altamente generosa, sem contar os inúmeros benefícios e as constantes oportunidades de reconhecimento nos maiores laboratórios do Planeta.

Nos últimos dias, porém, uma grande agitação podia ser percebida por todos os colaboradores. Diversos cientistas de alta patente subiam eufóricos para o enigmático oitavo andar. Por algum motivo, ninguém, nem mesmo o pessoal da limpeza, tinha acesso àquele andar. O acesso era permitido somente com cartões especiais de identificação que os cientistas guardavam como se estivessem protegendo seus próprios filhos. Todos, sem exceção, mantinham expressões sisudas, sem a menor intenção de parecerem cordiais. Definitivamente, seja lá o que estivesse acontecendo, estava completamente fora da rotina daquele lugar. Todo esse mistério não pôde deixar de ser percebido pela jovem cientista chinesa Annchi Zhang que apesar da pouca idade era muito respeitada até mesmo pelos cientistas mais experientes da Ômega.

Embora a Dra. Zhang tivesse o seu próprio cartão de identificação para acessar o oitavo andar, sempre era barrada pelo Dr. Brendon Davis, que alegava que o grande projeto no qual estava envolvido há semanas deveria ser acompanhado por especialistas de vasta experiência e não por uma biomédica recém-formada. O Dr. Davis era a personificação da arrogância e da prepotência. Nunca perdia a oportunidade de relembrar a todos o quanto era protegido pelo Governo dos Estados Unidos e que cada palavra que saísse de sua boca, se possível, deveria ser escrita em uma pedra e transformada em lei. Todos na Ômega temiam aquele homem, menos a Dra. Zhang, que nas ocasiões em que era obrigada a compartilhar o mesmo ambiente que ele, expunha suas opiniões e também convicções sem o menor medo do cientista chefe, o que o deixava visivelmente furioso.

Não foram poucas as vezes em que o Dr. Davis tentou demitir a Dra. Zhang pelo mais fútil dos motivos. Porém, todas as suas tentativas acabaram sendo frustradas, pois o Conselho Farmacêutico estimava muito a Dra. Annchi Zang, pois ela tinha uma rapidez quase sobrenatural para descobrir e desenvolver antivirus, o que contribuía para a criação de medicamentos caríssimos e por consequência, a enorme lucratividade da Ômega. Por essa razão, o Dr. Davis sempre apelava para os constrangimentos e agressões emocionais, ridicularizando a carreira da Dra. Zhang pelo fato de ser mulher.

Certa ocasião, os dois se encontraram por um dos corredores do laboratório da Ômega. O Dr. Davis a encarou, com um sorriso malicioso e provocador.

— Que bom encontrá-la por aqui, Dra. Zhang! Pausa o café?

— Sim, eu resolvi descer um pouco para respirar, dar uma volta e tomar um café, como o senhor bem disse. Estou surpresa em encontrá-lo aqui embaixo, mesmo com toda a agitação no oitavo andar.

O Dr. Davis imediatamente percebeu o sarcasmo na afirmação da Dra. Zhang.

— Temos tudo sob controle, doutora! Tenho os melhores profissionais sob a minha supervisão. Estamos prestes a concluir o projeto que irá mudar radicalmente a história da empresa.

— Imagino que seja mesmo um projeto revolucionário, doutor. Já que tivemos que oculta-lo do Conselho Farmacêutico quando vieram realizar a auditoria semestral.

As palavras atingiram o Dr. Davis como se fosse um soco na boca do estômago.

— Quem lhe disse que tivemos que ocultar o projeto do Conselho?

A Dra. Zhang se aproximou um pouco mais e colocou o seu rosto próximo do rosto do chefe, diminuindo o tom de voz.

— Não sejamos infantis, Dr. Davis! Em todos esse anos de empresa, nunca se viu tamanha agitação como no dia da última auditoria. Parecia que a Área 51 estava sendo invadida por jovens curiosos procurando um extraterrestre. Algumas pessoas achavam que estava acontecendo um incêndio no laboratório. O elevador não parou o dia inteiro. Dezenas de funcionários desciam, subiam e corriam feito loucos usando uniformes contra radiação. Não sei como os membros do Conselho não acharam estranho toda aquela balbúrdia.

— Todos nós fomos pegos de surpresa naquele dia! Aqueles desgraçados do Conselho sempre aparecem sem prévio aviso. Tivemos que alterar todos os protocolos de segurança. Não podíamos correr o risco de uma contaminação externa.

— Protocolos de segurança são alterados em casos de emergência, doutor! O que pareceu naquele dia foi que estavam pegando um monte de merda e colocando embaixo do tapete!

Subitamente, a expressão do Dr. Davis se tornou quase sombria. Ele encarou a Dra. Zhang do alto de seus 1, 85 de altura.

— Está fazendo uma acusação extremamente grave, Annchi! Acho melhor tomar cuidado com o que sai de sua boca.

— Se o que estiver saindo da minha boca forem calúnias, Doutor Davis.. Acho que o senhor não tem com o que se preocupar, não é?

Dizendo isso, a biomédica o encarou mais uma vez e seguiu pelo corredor, esbarrando de propósito no ombro do chefe. O Dr. Davis apenas acompanhou o trajeto da mulher pelo canto dos olhos, sem virar a cabeça. Furiosamente, ele avançou para o elevador e apertou o botão do oitavo andar. Fechou os olhos e respirou profundamente. Ele sabia que precisava de toda a concentração que pudesse conseguir.

Quando o elevador chegou ao oitavo andar, as portas se abriram. O Dr. Davis avançou pelo corredor. Diferente de todo o resto do prédio, o oitavo andar parecia mais escuro e frio. Por qualquer que fosse o motivo, ninguém suportava ficar mais de duas horas naquele lugar. Ninguém, exceto o Dr. Davis. O oitavo andar tornou-se sua segunda casa, seu império particular. Mais especificamente, a sala 407, onde estava sendo desenvolvido o projeto que ele considerava um grande sonho, prestes a se realizar em breve. Somente em pensar no resultado que aquele trabalho iria lhe trazer, um sorriso estampava-se automaticamente em seu rosto. Podia se dizer, sem sombra de dúvidas, que o chefe da Ômega estava inteiramente obcecado pelo experimento.

Quando o Dr. Davis estava a poucos passos de chegar à sala 407, um jovem de cabelos loiros vestido com um jaleco branco veio correndo ao seu encontro. Ele transpirava, parecia estupefato e empolgado.

— Dr. Josh Smithers... O que aconteceu? Aonde está indo com tanta pressa?

O jovem Dr. Smithers ficou por alguns instantes respirando de maneira ofegante com as mãos nos joelhos. Em seguida, começou a gargalhar freneticamente, como se tivesse acabado de saber que ganhou na loteria. O Dr. Davis manteve sua expressão rígida e voltou a perguntar:

— Dr. Smithers, o que há com você? Tenho muito o que fazer. Caso não consiga me contar agora, com sua licença eu preciso...

— Nós... conseguimos! - enfim disse o jovem cientista.

— Como é? O que disse?

— Conseguimos, doutor! Orpheu finalmente está completo!

Dr. Davis não estava conseguindo absorver o que o seu subordinado estava lhe dizendo. Ele apenas o encarava, esperando que o Dr. Smithers repetisse pausadamente cada palavra. Quando o jovem finalmente se recompôs, conseguiu olhar nos olhos do chefe e dizer de maneira razoável.

— Finalizamos o protótipo do vírus Orpheu! Não resta mais dúvidas. Todos os testes foram um sucesso. As propriedades, os efeitos, tudo ocorreu de acordo com o que planejamos - ao dizer isso, Dr. Smithers ergueu uma pequena seringa em sua mão. Seringa essa que estava no bolso direito do seu jaleco. Certamente planejava fazer uma grande surpresa ao seu chefe. Atitude essa que seria esperada por um jovem cientista que deseja impressionar seus superiores e, por que não, talvez sonhar com uma promoção - Aqui está uma pequena dose do que conseguimos.

— Isso é fabuloso - Dr. Davis se aproximou do jovem e começou a falar em um timbre de voz, como se estivesse diante de uma importante descoberta arqueológica - Finalmente vamos mudar a nossa história, Dr. Smithers!

Dr. Davis estendeu cuidadosamente a mão para que Josh Smithers lhe entregasse a seringa contendo o vírus. Ao segurar o experimento em sua mão, Dr. Davis aproximou a seringa do seu rosto para tentar olhar com mais atenção o conteúdo no receptáculo. Era uma substância azulada e borbulhante. Ele nunca vira nada parecido com aquilo na vida. E imaginou que os outros cientistas também não viram. Até aquele momento.

— O relatório de operações também está finalizado, doutor! - disse o Dr. Smithers - Queira me acompanhar, por favor?

O Dr. Davis pareceu não ter ouvido o que disse o jovem. Continuava olhando fixamente para a seringa e para o seu sinistro conteúdo. Ele sorria e dava algumas gargalhadas em voz baixa, porém audíveis ao Dr. Smithers, que parecia estar ficando preocupado.

— Doutor Davis? Está tudo bem? Gostaria de apresentar nosso relatório ao senhor.

— Me responda, Dr. Josh... O quanto realmente você está disposto a nos ajudar com o projeto Orpheu?

A pergunta soou terrivelmente estranha. Porém, o Dr. Smithers procurou manter a postura e respondeu:

— Estou disposto de corpo e alma, senhor! Agradeço muito ao senhor pela oportunidade de fazer parte desse momento importante da empresa e também agradeço imensamente por confiar inteiramente em meu trabalho!

— De corpo e alma... Gostei muito do que disse, Dr. Smithers. É realmente tudo o que preciso. Corpo... e alma!

Nesse momento, o Dr. Davis virou-se para o jovem cientista e caminhou lentamente em sua direção. Josh Smithers notou que o chefe segurava a seringa com uma firmeza maior do que o normal e que o homem adotava uma expressão que podia se jurar que era demoníaca. Instintivamente, Josh começou a se afastar para trás.

— Doutor Davis... O senhor está bem? Por favor, tome mais cuidado com isso, senhor! Ainda não sabemos... o quanto ele é poderoso!

Ainda avançando, Brendon Davis olhava fixamente para o jovem e disse em um sinistro timbre de voz:

— Você está certo, doutor... Ainda não sabemos. Mas é exatamente por isso que você está aqui!

— O que quer dizer, doutor? Eu não entendo!

Mal terminou de proferir a última palavra, Dr. Smithers foi violentamente surpreendido com uma investida do seu agora alucinado chefe. o Dr. Davis correu na direção do jovem e aplicou com toda a força a seringa do vírus Orpheu no ombro do Dr. Smithers.

— Chegou a hora de nos ajudar de verdade, Dr. Josh! Me mostre o quanto nossa criação é poderosa!

Em menos de um minuto, a temperatura do corpo do Dr. Josh Smithers se elevou quase infinitamente, tendo início uma febre sobrenatural. A dor de cabeça que se apossou do homem foi tão terrível que ele caiu ao chão e antes que começasse a gritar freneticamente, o Dr. Davis tirou o seu jaleco, enrolou o máximo que pôde em sua mão direita e tapou a boca do Dr. Smithers, que agora se contorcia e se debatia alucinado. A pupila de seus olhos pareceu ter desaparecido e a febre não parava de aumentar. Então, após quase três minutos inteiros de agonia, o Dr. Smithers perdeu subitamente todos os sentidos e seu corpo se entregou rapidamente ao terrível sono da morte. Foi incrível a velocidade com que o corpo do Dr. Smithers recebeu os efeitos do vírus Orpheu. Definitivamente, era um recurso implacável e letal.

— Isso é incrível! Você se foi em apenas alguns segundos, Josh! Nem teve tempo de agonizar. Imagine por quanto iremos vender pequenas quantidades do Orpheu às maiores potências militares do mundo. Iremos faturar bilhões de dólares. Não se preocupe, a Ômega irá cuidar bem de sua família, doutor! Você foi extremamente importante para essa pesquisa. Vou cuidar para que você seja sepultado como... Vejamos.. um herói de guerra!

O Dr. Davis estava prestes a se levantar e encenar um grande teatro. Ele iria correr feito louco gritando por socorro, alegando que o Dr. Smithers havia sofrido um mal súbito na sua frente. Rapidamente ele tirou a seringa do ombro do cadáver e a inseriu no bolso do seu jaleco. Porém, antes que o Dr. Davis pudesse fazer qualquer movimento, sentiu uma mão fria e forte agarrar a sua perna.

— Mas que porra é...

Era impossível de acreditar, mas de alguma forma, o Dr. Josh Smithers voltou à consciência e com a mesma rapidez com a qual havia desfalecido. Porém, havia algo de estranho no jovem. Seus olhos eram fundos, o seu rosto era extremamente pálido e não tinha expressão. Ele rosnava feito um animal e agarrava a perna do Dr. Davis com tamanha força que parecia que iria arrancá-la. Dr. Davis se debatia frenética, mas não conseguia se livrar das garras do outro homem.

— O que está fazendo, Josh! Me solte! isso foi... um acidente! Eu iria devolver a seringa a você, mas acabei escorregando. Juro que irei recompensá-lo generosamente pelo brilhante trabalho. Não, melhor do que isso. Vou contar sobre você à Casa Branca, sobre a sua incrível descoberta. Agora me solte, Josh!

Josh parecia não estar ouvindo nenhuma palavra dita pelo Dr. Davis. Sua boca permanecia aberta e a saliva não parava de escorrer. Ele agora agarrou a perna do chefe com a outra mão. Os gritos guturais do jovem colocavam o Dr. Davis em pânico.

— Mas o que aconteceu com você? Merda, será um efeito do vírus?

Dr. Davis lutava com todas as suas forças para livrar a sua perna das garras da criatura que antes era o Dr. Smithers. Com a perna que estava livre, ele deu um chute fortíssimo na cabeça do jovem, mas não pareceu surtir efeito. A criatura apenas balançou a cabeça com força e agora parecia querer morder a perna do Dr. Davis. Percebendo a bizarrice, o cientista começou a chutar a cabeça do Dr. Smithers por várias vezes seguidas, até que finalmente conseguiu livrar a sua perna.

No entanto, o pior ainda estava por vir. Inexplicavelmente, o Dr. Smithers se levantou rapidamente, como se não tivesse levado golpe algum. Seu corpo estava estranho, totalmente rígido. Seus olhos eram vazios, sua boca escura e sua língua preta como se estivesse totalmente infectada. Ele avançou lentamente na direção do Dr. Davis, que se afastava para trás e indagava:

— Doutor Smithers... Mas que merda é você?

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