Capítulo Dois - 2

Parte 2...

Eu achei estranho porque ela era muito novinha pra ficar sozinha ali na esquina. Meus pais são esquisitos. Minha mãe só vive ocupada e o meu pai está sempre pela rua. Ainda assim, eu acho que eles não iam me mandar ficar em uma esquina esperando por alguém. É um pouco perigoso, mesmo sendo cedo.

Ela olhou pra mim e seus olhos tinham uma certa mágoa. Eu não entendia, mas achei que ela não deveria estar ali. Me levantei e estiquei a mão para ela.

— Você quer vir comigo para minha escola?

A minha ideia era levá-la comigo e pedir ajuda a uma professora para descobrir quem ela era mesmo e onde morava. Na escola tem psicólogos e também a diretoria tem contato com a polícia. Isso poderia ajudar. Pelo menos ela não ia ficar ali sozinha.

Ela me deu um sorriso delicado e levantou, segurando minha mão, mas antes que eu falasse mais alguma coisa, senti uma mão forte em meu ombro, me puxando para trás.

— Você é maluco garoto?

Eu me virei para olhar para trás e até ergui as sobrancelhas. Era um homem alto, de cara feia, olhando para mim de jeito estranho e que me puxou de perto dela.

— Você é o pai dela?

— Não... - me empurrou e eu quase caí e a puxou pela mão — Sou o tio dela - ele deu um puxão forte nela — Vamos!

Ela me olhou com cara assustada e eu fiquei na frente dele.

— E como é o nome dela? - perguntei cruzando os braços.

— É Carolina - ele respondeu com um cigarro na boca.

Eu não sabia o nome dela. Olhei para ela que fez que sim com a cabeça. Então ele era o tio dela mesmo.

— Sai da frente moleque - ele me empurrou de novo e saiu, arrastando-a pela mão.

Eu fiquei sem saber o que fazer. Queria ajudar, mas tinha que ir para a escola. Não conhecia a menina e ela não negou que o homem fosse seu tio.

Fiquei parado coçando a cabeça, pensando no que fazer. Um carro parou ao lado da calçada e ele a empurrou para dentro. Ela ficou me olhando e eles saíram.

Eu só tinha dezesseis anos. Não tinha mesmo uma ideia certa do que aquela garota estava fazendo ali e também não era um problema meu. Apesar disso, eu fiquei ainda uns três dias me sentindo estranho por ter deixado o cara a levar assim, do nada.

Escuto meu cachorro derrubar algo na sala. É melhor ir logo me arrumar para descer com ele, antes que comece a bagunçar tudo por aqui. Depois ainda tenho que me organizar para ir trabalhar.

Não é fácil ficar lendo pilhas e pilhas de documentos, mas faz parte do trabalho e não dá pra correr. No momento tenho três casos para defender. Um deles não é complicado e praticamente já está resolvido, mas preciso fazer toda a burocracia pedida pela lei.

É uma merda!

Tem alguns casos que são tão absurdos que eu gostaria de pular toda a parte burocrática e já ir logo pra cima da pessoa, encher a cara dela de t***s e jogar no fundo de uma cela e deixar que fosse esquecida.

Algumas coisas são bem difíceis de engolir, mas eu não posso burlar o sistema, ainda que muitas vezes eu fique revoltado com as coisas que chegam até minha mesa.

E de vez em quando eu fico revoltado. Há dois meses estive em um caso e ajudei o promotor a prender um playboy vagabundo, um filhinho de papai que se aproveitou de uma colega e a estuprou dentro da própria faculdade.

Não foi um caso difícil de resolver, haviam muitas provas contra o playboy, mas como acontece muitas vezes, ele só ficou preso três dias e depois saiu.

Filho de gente muito rica, estava acostumado a fazer tudo o que queria e por isso não aceitou quando a garota não quis ficar com ele. Foi uma ofensa e ele planejou tudo.

Só esqueceu que a faculdade tinha câmeras espalhadas e filmaram quando ele a atacou e a puxou para uma das salas e cometeu o crime ali dentro.

Só que a garota não ficou calada também, ela botou a boca no trombone e contou para todos o que ele havia feito, inclusive para a polícia que até que agiu da forma certa, mas infelizmente, o juiz não fez seu trabalho adequado.

Pra mim é um absurdo que pessoas pagas para fazer cumprir a lei, sejam tão ridicularmente safadas e vendidas para o dinheiro, deixando o povo à mercê de sua própria sorte.

O playboy foi solto, voltou para a faculdade que também não tomou nenhuma atitude e no final a garota foi quem teve que abandonar os estudos e ainda ficou sendo a mentirosa e culpada.

Esse tipo de hipocrisia me deixa muito puto da vida. É uma injustiça que gente correta precise conviver com gente vagabunda que está aqui apenas para criar problemas para os outros. Mas, como sou advogado, não posso dizer em corte o que realmente penso sobre isso.

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