Você não pode ter sempre o que quer
Mas se você tentar algumas vezes, sim.Você encontra o que precisa!”Toquei o interfone do edifício localizado na zona nobre de PortoAlegre, pressionando o 707. Olhei ao redor, tentando avistar algum rostoconhecido. "Será que ela não está?", pensei, vasculhando a bolsatentando encontrar meu celular.— Sim? — respondeu a voz familiar pelo interfone.— Professora? Sou eu, Ana.Ouvi um som metálico e, em seguida, o portão foi destrancado,empurrei-o com o corpo enquanto puxava a mala. O saguão era amplo eum porteiro estava ao lado do elevador. O homem careca devia ter quasesessenta anos enquanto linhas de expressão marcavam seu sorriso.Vestia uma camisa branca e calça social escura.— Boa noite, senhorita. Deixe-me ajudá-la com a bagagem.— Obrigada, mas não é necessário. — Não olhe os homens nosolhos por muito tempo, eles acharão que está se insinuando. Quanto menos contato, melhor. O senhor tem grandes planos para você, não deixe que o demônio a tente. A voz de minha mãe me veio à memória,causando um arrepio. — Estou aqui a convite da professora Laura Hoffmann — expliquei olhando para baixo.Ele olhou-me com uma expressão estranha, apertando o botão doelevador e mantendo-se em silêncio. As portas metálicas se abriram.Entrei e arrastei a mala comigo.— Obrigada — respondi. Apertei o botão indicando o número sete.As portas se fecharam, deixando-me aliviada por evitar conversasdesnecessárias.Senti um frio na barriga. Era a primeira vez que eu andava deelevador, mas já havia visto em filmes na escola. Olhei-me no espelho queia do chão ao teto, arrumei meus cabelos castanhos, passei a mãotentando tirar o volume, meu rosto estava pálido, a pele demasiadamentebranca. Maquiagem é falsa, tem de estar feliz com o que Deus lhe deu,nada de ficar se rebocando para parecer uma mulher da vida. A voz demamãe ecoou, mais uma vez, em minha mente.As portas se abriram e Laura me aguardava segurando um filhoteda raça beagle no colo.— Boa noite! Como foi a viagem?— Tranquila, vim lendo sobre sua última pesquisa...— Vamos entrar, assim você pode se acomodar. Estou preparandoa janta, aí você me conta sobre suas impressões — interrompeu-me aprofessora.Obedeci e a segui, entrando no apartamento perfeitamente organizado. A ampla sala exibia uma respeitável biblioteca, que instantaneamente atraiu minha atenção. Deixei a pesada mala ao lado do sofá e sentei-me, afundando nas macias e confortáveis almofadasvermelhas.— Pode se instalar no quarto no final do corredor, há uma cama desolteiro e uma cômoda onde poderá guardar seus pertences. Vou àcozinha ver como está o andamento do jantar. Hoje, minha colega virájantar conosco, assim nós podemos conversar melhor.Em silêncio, assenti com a cabeça. Estava encantada com tudoaquilo e muito nervosa, não queria desapontar de modo algum toda aconfiança depositada em mim.— Vou me trocar e já te ajudo a terminar o jantar — respondi emvoz baixa.Laura sorriu e deixou o filhote no sofá.— Ok.Em meu quarto, abri a mala, pus sobre a cama uma pilha comquatro calças jeans, duas claras, com lavagem surrada e outras duas maisescuras, a outra pilha era composta por mais quatro baby looks, semestampa: branca, preta, azul-celeste e verde-limão. Pendurei uma jaquetajeans no cabide na maçaneta, e por fim, uma pequena caixa com roupasíntimas. Guardei na cômoda meus pertences e pus a Bíblia que a mamãeme deu debaixo do travesseiro.A campainha soou e fui até a sala de estar. Laura cumprimentava ajovem que estava com um prato de bolo na mão.— Ah, vocês chegaram cedo, e ainda trouxeram a sobremesa. Entrem, por favor. Essa é a Ana, a jovem que lhe falei. Bárbara irá nosacompanhar em nossa pesquisa.Bárbara vestia uma saia floral e uma regata lisa, branca, o tom desua sapatilha combinava perfeitamente com a saia. Seus cabeloscastanho-claros estavam presos em um coque levemente despenteado. Asombra marrom realçou o verde de seus olhos e nos lábios havia umsimples brilho labial. "Difícil imaginar uma jovem tão bonita como ela,trabalhando como química", pensei com vergonha de estar usando umjeans branco e uma baby look preta.— Prazer! Sou Bárbara — disse ela, sorrindo. — E esse é meunoivo, Marcos.— Boa noite — cumprimentou ele.Sem perceber, prendi a respiração. Estiquei a mão direita ecumprimentei Bárbara, em seguida apertei a mão de Marcos e tive aestranha sensação de que antes de elas se tocarem, ele havia me dadoum choque, mas, é claro, que aquilo era apenas meu cérebro mepregando uma peça, o rápido contato foi o suficiente para que meuspelinhos da nuca se arrepiassem. Logo, desviei o olhar e afastei-me.— Essa é a minha sobrinha, Miriam, ela está passando umatemporada conosco, minha irmã está terminando uma pesquisa emGalápagos e para que Mimi não perdesse muitas aulas, ficou com agente.— Oi — a menina cumprimentou.Marcos media cerca de um metro e noventa, cabelos cacheadosnegros, usava barba bem feita, porte elegante. Lembrei-me de um atorque interpretou Rei Artur, filme exibido em uma aula de História, mas comcerteza ele era mais bonito.— Barbie e Ana, podem colocar a mesa. Os pratos e copos estão naquele aparador, e os talheres na gaveta. Marcos, se quiser ligar a televisão e assistir algo com a Mimi fique à vontade — explicou Laura,apontando para o aparador próximo à mesa de jantar.A mesa estava farta, repleta de comidas das quais eu jamais haviaprovado antes, o prato principal no centro, uma travessa de salmão combatatas grelhadas, pequenas rodelas de limão amarelo cercavam o peixe,saladas verdes e um arroz à grega, decorado com pequenas flores feitascom tomate-cereja.— Hum... parece estar delicioso — elogiou Barbie.Todos se sentaram e Marcos sentou ao lado da noiva, de frentepara mim e Mimi. Laura sentou por último, na ponta da mesa.— Sirvam-se, sem cerimônia.Fechei os olhos por alguns segundos e agradeci: "Obrigada,Senhor, por esta refeição", mas ao terminar, notei que ele me encarava.— Você estava orando? — perguntou curioso, enquanto servia umafatia do salmão."Isso é pergunta que se faça?!", pensei, constrangida.— Sim — respondi em voz baixa.— Ana mora no interior. Se formou com honras no Instituto Federal,a melhor durante quatro anos consecutivos. Recebi o currículo peladiretora quando falei que estava à procura de químicos talentosos paranosso projeto — explicou Laura, servindo quatro taças de vinho.Senti meu estômago embrulhar, estava desconfortável com asituação, podia senti-lo me analisando.— Sou teólogo e, atualmente, trabalho em uma tese sobre as manifestações do Divino. Por isso, a forma como orou me chamou a atenção — disse, após beber um gole de vinho. — Não quis constrangê-la.— Tudo bem. Não tenho vergonha de minhas crenças — respondi,bebendo meu vinho de uma única vez.O tilintar dos talheres e o silêncio à mesa foi quebrado por Barbie.— Se tudo der errado, deixaremos o laboratório e abriremos umrestaurante! Seu tempero é perfeito. Simplesmente divino — elogiouBarbie. — Espero que a sobremesa esteja à altura.Laura sorriu orgulhosa de seu feito. Estava com quase cinquentaanos, seus cabelos grisalhos na altura dos ombros, pele clara e olhosazuis intensos. Dizia que cozinhar era sua segunda paixão, mas aQuímica sempre veio em primeiro lugar.— Fosfoetanolamina é um composto que estamos desenvolvendohá alguns anos para a cura do câncer. O problema é que a P&P, dePipermen, está empacando o processo e dificultando nossos avanços. Jáobtivemos resultados impressionantes com vários pacientes. Nãopodemos ceder, isso vai revolucionar e enfurecer as indústriasfarmacêuticas...— Isso é sensacional! Em quantos pacientes foram testados? —indagou excitada.— Mais de cem — respondeu Barbie. — E os comprimidos tem ocusto muito barato, ficam em torno de sessenta centavos.Aquela era a primeira vez que eu havia bebido vinho, suave e doce,uma única taça havia sido suficiente para deixar minha visão turva e meusmovimentos lentos. Podia sentir um calor febril no rosto. Não, você não podia ter bebido, alcoólatra! A voz de minha mãe perturbando-me mais uma vez. Barbie e Laura foram até a cozinha buscar os pratos para a sobremesa, Mimi estava dormindo sentada, então Marcos levantou-se e a pegou no colo, acomodando a pequena no sofá. Eu não consegui desviar o olhar, acompanhando cada movimento.— Tudo bem? — indagou ele com um sorriso, exibindo dentesperfeitamente alinhados. Sim, ele havia percebido que eu o seguia com oolhar.— Sim. — Ana, você está doida, pare de ser oferecida, ele écasado, e se está retribuindo seu atrevimento é porque não presta. Vocêvai arder, não poderei salvá-la! — Cale a boca — sussurrei sem perceber.Marcos agora estava ao meu lado e pôs a mão em meu ombro. Eupodia sentir seu perfume cítrico. Inebriante.— O que você disse?— Nada. Vamos tirar a mesa? — Fiquei de pé, sentia-me um poucotonta, queria desviar o olhar, mas inexplicavelmente eu continuava ali,admirando-o. A diferença de altura entre nós era grande, pouco mais devinte centímetros. — Acho que estou um pouco...Estava prestes a perder o equilíbrio, então escorei-me em Marcos,apoiando as mãos em seu peito. "Vai arder", pensava, atordoada. "Ele étão quente... Ah, eu vou arder, com certeza".— Arder... — sussurrei.— Acho que o vinho te pegou de jeito — respondeu ele agarrando-me pelos braços, divertindo-se com a situação. — Vou te levar para oquarto para que possa se recuperar, ok?Marcos envolveu seu braço forte pela minha cintura e passou meubraço por seu pescoço, acompanhando-me até o quarto.— Por que você é tão quente? — indaguei com a voz lenta,enquanto ele me deitava na cama.Ele não respondeu, limitou-se a sorrir, então sentou ao meu lado eacariciou meu rosto. Deslizou os dedos pelo contorno dos meus lábios.— O que você está fazendo?Ele seguiu, com o indicador deslizando por meu rosto, tocando oqueixo, percorrendo o pescoço até chegar em meu peito. Eu tremia com aintensidade de seu toque, à medida que ia descendo, me excitando comojamais havia sentido, uma pressão angustiante, um desejo de sercompleta.— Eu quero — sussurrei, quase delirante.Marcos tirou a camisa, deixando à mostra sua pele morena clara eos músculos bem definidos. Aproximou o rosto o suficiente para que eusentisse a barba roçando em minha pele. Os batimentos estavamacelerados e de uma forma que jamais sentira, eles pulsavam em lugaresdiferentes do peito, na verdade, bem distantes do lugar de costume.As carícias tornaram-se mais intensas e arrebatadoras.Seu toque firme explorando-me, chegou a minha barriga.— Perfeita — ele sussurrou com voz grave.— Não aguento mais — implorei, enlouquecida enquanto ele beijava próximo ao meu umbigo.Mas eu ansiava por mais, ser preenchida por completo, precisava sentir o peso do corpo dele sobre o meu, o queria por inteiro. Sentia a umidade aumentar! Agora! — implorei mais uma vez.Batidas na porta do quarto me tiraram de meu sonho delirante, abrios olhos, estava sozinha em meu pequeno quarto, banhada em suor."Foi só um sonho!"