Foi só nesse momento que a expressão de Lorenzo mudou.
— Estela, o que tá fazendo?!
Mas ela nem sequer olhou pra ele.
Segurava a tesoura com firmeza, cravando-a mais uma, e outra vez, contra a própria coxa.
O branco do vestido se tingiu de vermelho num piscar de olhos.
Lorenzo ficou parado, atônito.
Ela preferia se machucar a deixar que ele a tocasse?
A ideia o atingiu como um soco no estômago.
Um incômodo violento cresceu dentro dele.
— Estela! — Gritou, agarrando o pulso dela com força. A tesoura caiu no chão com um baque surdo.
A dor lancinante percorreu o corpo dela, mas trouxe de volta alguma clareza à mente enevoada.
Nesse exato instante, ouviram palmas vindas do andar de baixo. Estavam chamando por ela, a aniversariante, para fazer o discurso final.
Estela afastou Lorenzo com um gesto brusco e saiu.
Desceu as escadas com firmeza, ignorando o sangue que escorria pelas pernas.
Ao vê-la naquele estado, a plateia se levantou em choque, muitos soltando exclamações.
Mas Estela não se abalou.
Manteve o queixo erguido. O vermelho no vestido brilhava como uma rosa selvagem na beira do abismo.
Ergueu a taça, forçando um sorriso:
— Feliz aniversário pra mim. Vinte e nove anos. Que o futuro seja brilhante.
E com isso, desabou no chão.
No meio dos gritos, Lorenzo correu e a segurou nos braços.
...
Estela ficou inconsciente por um dia e uma noite.
Quando teve alta e voltou para casa, mal teve tempo de desfazer as malas da viagem. Lorenzo chegou, acompanhado de Helena.
— Já investiguei sobre o remédio. — Disse ele, visivelmente desconfortável. — Foi um engano. Você não teve nada a ver com isso.
Estela não respondeu.
Ao lado, Helena já chorava de novo.
— A culpa foi minha... Eu falei besteira e o Lorenzo acabou te culpando. Pra me desculpar, desenhei seu vestido de noiva, Estela. É meu presente de aniversário pra você...
Só então Estela olhou para o vestido nas mãos da garota.
A lembrança da vida passada veio como uma onda.
Ela soltou uma risada fria.
— Você costuma desenhar vestidos sem olhar a numeração? Esse aí, nem entra em mim.
Na vida anterior, na véspera do casamento, Helena também aparecera com um vestido que afirmava ter feito com carinho.
Lorenzo, sem discutir, cancelou o modelo que Estela tinha escolhido com tanto cuidado e a obrigou a usar o da Helena.
O problema? O vestido era minúsculo. Ela sequer conseguia respirar com ele.
Naquela vez, Lorenzo só respondeu:
— É só emagrecer.
Nos dois dias que antecederam o casamento, Estela passou fome e sede.
E, no altar, acabou desmaiando.
Mas nesta vida, ela não ia repetir os mesmos erros.
Ao ouvir sua resposta, o rosto de Helena empalideceu.
— M-me desculpa… — Murmurou, tremendo. — Quando desenhei o vestido, eu só conseguia pensar como seria... se eu fosse a noiva… por isso acabei…
Lorenzo ergueu o olhar para ela num sobressalto. Havia algo nos olhos dele, um turbilhão de emoções que ele tentou esconder.
Helena cobriu a boca, desesperada, como se só então percebesse o que acabara de dizer.
O silêncio caiu como uma cortina pesada.
Até que Estela quebrou o clima, com um sorriso gélido.
— Sendo assim, por que não veste você?